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19 maio 2025

Rebaixamento da nota de crédito dos EUA

A agência Moody’s rebaixou nesta sexta-feira a classificação de crédito dos Estados Unidos em um degrau, de “Aaa” para “Aa1”, citando dívida e juros crescentes, “que são significativamente mais altos do que os de soberanos com classificação semelhante”.

“Sucessivas administrações e o Congresso dos EUA falharam em chegar a um acordo sobre medidas para reverter a tendência de grandes déficits fiscais anuais e custos crescentes de juros”, disse a Moody’s em um comunicado, ao mudar sua perspectiva para os EUA de “negativa” para “estável”.

Fonte: aqui.

O mais interessante é que o mercado subiu na segunda. 

Uma fraude de 2 bilhões de libras


A Ernst & Young (EY) está sendo processada por negligência no Reino Unido, em um caso que envolve cerca de £2 bilhões (aproximadamente US$ 2,7 bilhões), devido à sua atuação como auditora da NMC Health entre 2012 e 2018. A NMC, uma operadora de hospitais com sede nos Emirados Árabes Unidos e listada na bolsa de Londres, entrou em colapso em 2020 após a descoberta de mais de US$ 4 bilhões em dívidas ocultas.

O processo foi iniciado pela administradora judicial Alvarez & Marsal, que alega que EY falhou em detectar sinais claros de fraude contábil durante os anos em que auditou a NMC. Entre as falhas apontadas estão a falta de acesso ao livro razão da empresa e a ausência de confirmações bancárias independentes, o que teria permitido que os executivos da NMC manipulassem os registros financeiros.

A EY nega as acusações, argumentando que foi vítima de uma fraude complexa e orquestrada pelos próprios executivos e acionistas da NMC, e que não tinha como detectar o esquema devido à sua natureza sofisticada.

Fonte: aqui

Próximo presidente da Romênia

 

Poucas pessoas sabem que a Romênia fala uma língua latina. E agora, o seu próximo presidente tem uma formação incomum: matemática. Mas não é algo tão corriqueiro, pois ele foi duas vezes escore máximo na prestigiosa Olimpíada de Matemática.


O Problema dos Três Corpos (2)

Ontem falamos sobre a série O Problema dos Três Corpos e hoje eu, infelizmente, descobri que ainda não há previsão de estreia para a segunda temporada. 

Segundo a revista Esquire, o alto custo da primeira temporada é um dos principais fatores que colocam a continuação em xeque. Cada episódio teria custado cerca de US$ 20 milhões, o mesmo nível de investimento de A Casa do Dragão. Para comparação, Game of Thrones (em sua 8ª temporada) ficou na faixa de US$ 15 milhões por episódio. 

 O ScreenRant aponta que esse valor coloca Três Corpos entre as séries mais caras da Netflix. E a Forbes foi além: segundo reportagem, o custo total foi de US$ 233,1 milhões, o que dá uma média de impressionantes US$ 29,1 milhões por episódio, valor semelhante ao da consagrada Stranger Things.

Ainda assim, há esperança. O site Omelete noticiou que a continuação está nos planos, mas só deve chegar em 2028 (!!). As gravações, inclusive, foram realocadas do Reino Unido para a Hungria, onde o governo oferece um incentivo fiscal de 30% sobre os custos de produção.

Multa do UBS por uma investigação criminal

O banco suíço UBS Group AG concordou ontem [5 de maio] em pagar US$ 511 milhões para resolver uma investigação criminal do Departamento de Justiça dos EUA que concluiu que o Credit Suisse (o banco que o UBS comprou em 2023 [1]) ajudou americanos ricos a escapar de impostos sobre mais de US$ 4 bilhões em pelo menos 475 contas offshore. O acordo surge mais de uma década depois de o Credit Suisse se ter comprometido a pôr termo a tais práticas [2]. 

No caso mais recente, o Credit Suisse admitiu ter conspirado para ajudar indivíduos ricos a preparar e apresentar declarações fiscais falsas dos EUA entre 2010 e 2021 e descobriu-se que falhou repetidamente na divulgação completa de contas offshore às autoridades. O acordo ocorre dois anos depois de o Comité de Finanças do Senado dos EUA ter concluído que o Credit Suisse tinha violado o seu acordo de confissão de 2014 com o governo dos EUA.

O UBS disse que não estava envolvido na má conduta, que ocorreu antes de o UBS comprar o Credit Suisse por US$ 3,2 bilhões sob um acordo mediado pelo governo suíço para evitar uma potencial crise bancária [3].

[1] A questão da contabilidade dessa aquisição é muito interessante e foi tratada no blog anteriormente

[2] Isso deve ter pesado no valor da multa

[3] Até então, eram os dois grandes bancos da Suíça. 

Fonte: 1440 newsletter

18 maio 2025

Resenha: O Problema dos Três Corpos

Escrever para o blog é uma tarefa interessante. As minhas resenhas presenciais são falhas ao não entrarem em detalhes, pois considero tudo spoiler. De vez em quando, não leio nem a sinopse e me deixo levar pela capa, título ou autor. É uma prática que me trouxe ótimos frutos e recomendo. Todavia, como a ideia aqui não pode ser essa, tentarei sintetizar sem estragar a experiência. 

Hoje quero conversar sobre “O Problema dos Três Corpos”, obra que faz parte de uma trilogia de ficção científica escrita pelo chinês Cixin Liu. O primeiro livro recebeu o prestigiado prêmio Hugo de melhor romance de ficção científica em 2008 e, atualmente, é considerado um clássico moderno. 

A saga merece o seu tempo e atenção, caso se interesse por física, suspense, mundos extraterrestres e, até história (por que não?). Na narrativa, alguns cientistas se envolvem em projetos ultrasecretos sobre ondas sonoras e a possibilidade de uma comunicação extraterrestre. Nessa brincadeira, uma civilização alienígena à beira do colapso decide aproveitar o embalo e planeja uma invasão. O pano de fundo da história é a China, meio à Revolução Cultural, no final dos anos 1960. 

Há uma adaptação louvável na Netflix. Quando a iniciei, achei o início lento e precisei me ajustar ao clima, mas, após esse momento inicial, me peguei fascinada. Pausa para a minha inabilidade em elogiar algo que quero que você assista, mas não quero influenciar a experiência. ...! 


Há apenas uma temporada disponível na Netflix, então, quando a terminei, fui sedenta ler o livro que já estava na minha pilha há algum tempo. Eu estava imensamente interessada na continuidade da história e, como estava envolvida com a magia da conclusão da primeira temporada na Netflix, achei a leitura arrastada, acabei deixando-a de lado. Mas voltei, persisti e terminei. E posso afirmar: é um bom livro. 

E aí fui para o segundo. Gente! Que livro!!! Que livro!!! O terceiro também é sensacional. A trama é muito bem estruturada; o universo que sustenta a saga é construído e alimentado de forma sólida. Os personagens são interessantes, as explicações envolvendo física e pesquisa são didáticas e fascinantes. O desenrolar da história não perde o fôlego, muito pelo contrário, é cada vez mais eletrizante. Parece que com a experiência, o Cixin Liu cresceu ainda mais e se superou de novo e de novo. 

O único problema que encontrei foi o tamanho da letra na versão impressa. Ela é um pouco menor do que o padrão; eu tenho a vista muito ruim, então acabei deixando de lado e comprando o ebook para o Kindle. 

Na época, minhas expectativas estavam tão medianas que troquei meu exemplar físico no sebo de livros usados. Um pouco mais à frente, acabei comprando novamente um exemplar, para presentear meu irmão, que se interessou ao acompanhar a minha experiência. Alerta de spoiler: ele ainda não leu. Acho que entregar quase duas mil páginas para alguém de uma só vez não é a melhor forma de incentivá-la a ler. Porém, prometo que vale a pena! 

Vale a pena? Com certeza! Se ficção científica não é a sua praia, sugiro que ainda assim dê uma chance à série. Embora haja diferenças consideráveis entre a adaptação e o livro, a primeira temporada se saiu excepcionalmente bem. Acredito que, em alguns aspectos, ela é até melhor do que o primeiro livro. Um alerta: devido a essas diferenças, não recomendo assistir à primeira temporada e, em seguida, partir para o segundo livro. O primeiro livro da saga é o menor, então, se você se interessar, vale o investimento.

Você pode comprar o livro na Amazon com o nosso link afiliado: aqui.

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Sombart

Sombart, Werner (1863–1941)

Werner Sombart, influente economista político, nasceu e morreu na Alemanha. Estudou direito, economia, história e filosofia nas universidades de Berlim, Roma e Pisa, e acabou se tornando professor de economia em Berlim. Foi aluno dos chamados socialistas de cátedra (Kathedersozialisten), como Schmoller e Wagner, e, quando jovem, tornou-se marxista. No entanto, provavelmente era inteligente demais para permanecer marxista por muito tempo e acabou se tornando um crítico do marxismo. De fato, sua obra Der Moderne Kapitalismus (O Capitalismo Moderno), publicada em 1919, é na verdade um livro que elogia o capitalismo, no qual previu que esse sistema atingiria seu auge no século XX.


Mais tarde, já idoso, Sombart tornou-se um apologista do Nacional-Socialismo, mas os nazistas não o aceitaram plenamente nesse papel, principalmente porque suas observações sobre o papel dos judeus na Idade Média entravam em conflito com as teorias do regime.

Em termos de volume de publicações e traduções, Sombart pode ser considerado um dos economistas de maior sucesso de sua época. No entanto, ele não fundou uma escola de pensamento nem deixou discípulos de suas ideias, sendo hoje visto mais como uma curiosidade histórica. Isso provavelmente se deve ao fato de que combinou as origens sociais e históricas de seu pensamento econômico em uma mistura empolgante, porém instável, de forma que as gerações seguintes passaram a considerar pouco científica.

Essas chamadas “proposições de Sombart” receberam atenção significativa na literatura contábil. Yamey (1950, 1964) as revisou criticamente em dois artigos, Winjum (1972) identificou “apoio acadêmico substancial à tese de Sombart”, e Kenneth S. Most (1972) reconheceu algum mérito nelas. As proposições se referem ao papel da contabilidade no desenvolvimento do capitalismo. Sombart chegou a afirmar que a introdução da contabilidade foi de importância máxima para o desenvolvimento do capitalismo — e, claramente, tal percepção merece estudo especial.

Sombart partiu de uma Europa feudal pré-capitalista, na qual o objetivo de cada homem era garantir o suficiente para sua subsistência. Observou, então, que em determinado momento o motivo do lucro substituiu a satisfação de necessidades pessoais como força motriz da sociedade. Ele levantou a questão: por meio de que mecanismos isso ocorreu? O que transformou o artesão pré-capitalista no fabricante capitalista? Sua resposta foi que o ser humano desenvolveu duas capacidades: calcular e poupar. E a importância da contabilidade estaria justamente em unir essas duas habilidades em uma poderosa ferramenta de gestão: a firma capitalista, vista como uma entidade contábil.

De forma resumida, Sombart viu a invenção da escrituração por partidas dobradas como um instrumento para objetivar o conceito de capital. Ele escreveu que “a representação da firma por meio das contas, especialmente a representação dos interesses de propriedade na forma das contas de capital, torna objetiva a ideia de riqueza, dissociando-a das pessoas humanas envolvidas na empresa”. A ideia de capital desvinculava-se de qualquer objetivo de satisfação de necessidades ou motivações pessoais dos participantes da firma, e isso levou diretamente à formulação do racionalismo econômico. Por esse caminho, a produção e a distribuição tornaram-se objetos de cálculo, o que significava que as ferramentas da matemática podiam ser usadas para planejar poupança e investimento e fomentar o crescimento do capitalismo.

Em uma passagem marcante, Sombart citou as palavras que Goethe colocou na boca do cunhado de Wilhelm Meister: “A escrituração por partidas dobradas é uma das mais belas descobertas do espírito humano.” E prosseguiu explicando: “Para se compreender corretamente seu significado, ela deve ser comparada ao conhecimento que os cientistas desenvolveram desde o século XVI sobre as relações no mundo físico. A escrituração por partidas dobradas surgiu do mesmo espírito que produziu os sistemas de Galileu e Newton e o conteúdo da física e da química modernas. Por meios semelhantes, organiza percepções em um sistema, e pode ser caracterizada como o primeiro Cosmos construído puramente com base no pensamento mecanicista. A escrituração por partidas dobradas captura para nós a essência de um mundo econômico ou capitalista do mesmo modo que, mais tarde, os grandes cientistas usaram para construir o sistema solar e os glóbulos do sangue. Sem muita dificuldade, podemos reconhecer na escrituração por partidas dobradas as ideias de gravitação, da circulação do sangue e da conservação da matéria. E até mesmo num plano puramente estético não podemos olhar para a escrituração por partidas dobradas sem espanto e admiração diante de uma das mais artísticas representações da fantástica riqueza espiritual do homem europeu.”

Kenneth S. Most The History of Accounting

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Schreiber ou Grammateus

Schreiber, Heinrich (c. 1496–1525)

O segundo texto publicado sobre a escrituração por partidas dobradas foi escrito por um matemático e professor de aritmética alemão, Heinrich Schreiber, também conhecido como Henricus Grammateus. A obra de Schreiber, Ayn neu Kunstlich Buech (Nuremberg, 1518), incluía capítulos sobre álgebra, aritmética comercial, música e contabilidade. O texto de Schreiber foi revisado e reimpresso diversas vezes após sua morte; foi plagiado duas vezes durante o século XVI.


Schreiber não imitou a Summa de Arithmetica (1494), de Luca Pacioli; parece ter derivado seu sistema de partidas dobradas da prática comercial alemã. Ele utilizava três livros contábeis: um diário, um razão de mercadorias e um razão de dívidas. As compras eram lançadas no lado esquerdo das contas de inventário no razão de mercadorias, e as vendas no lado direito. No razão de dívidas, que continha contas a receber, a pagar e de caixa, as dívidas eram registradas no lado direito, e os pagamentos a credores no lado esquerdo. As contas a receber eram lançadas no lado direito, e os recebimentos no lado esquerdo. Assim, não havia uma posição fixa para os lançamentos de débito e crédito. Também não eram apurados separadamente os saldos a receber de devedores nem os saldos a pagar a credores no razão de dívidas.

Schreiber apresentou 10 regras para o registro de compras e vendas e descreveu o tratamento das despesas. O lucro ou prejuízo de cada tipo de estoque podia ser apurado subtraindo-se as compras das vendas. Ele reunia esses lucros e prejuízos individuais ao final de seu diário. Concluía com um teste rudimentar de exatidão contábil: “Some os recebimentos, o que lhe é devido e, então, as mercadorias restantes; e da soma total subtraia os pagamentos, o que você ainda deve, e se o saldo restante for igual ao lucro, então está correto.” Esse cálculo, que equipara o lucro ao ativo líquido, funcionava apenas porque as contas ilustrativas de Schreiber não continham saldos iniciais de ativos ou passivos.

Michael Chatfield para The History of Accounting

Ele também é conhecido como Henricus Grammateus

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Schmidt


Schmidt, Julius August Fritz (1882–1950)

As contribuições publicadas de Fritz Schmidt são numerosas e substanciais em conteúdo. Ele publicou 16 livros — sendo o mais conhecido, no campo da contabilidade, sua obra-prima Die Organische Tageswertbilanz (1929) — e mais de 120 artigos sobre temas que abrangem práticas de bolsa de valores, câmbio e bancárias, contabilidade orgânica a valor corrente, custos e precificação, teoria dos ciclos econômicos, trustes e teoria da tributação, além de questões ligadas à educação e à profissão de economista.

Karl Schwantag, aluno de Schmidt, sugere que uma das maiores contribuições de Schmidt foi seu olhar sistemático, buscando proposições gerais a partir de particularidades observadas no cotidiano. Suas publicações podem ser divididas em três fases:

1. 1907–1918: livros e artigos nos quais registrou observações sobre práticas de bolsa e bancárias, resultando na catalogação e classificação de formas e métodos empresariais;

2. 1918–1936: obras voltadas à formulação de avanços teóricos em contabilidade e economia empresarial a partir das observações feitas na fase anterior;

3. obras posteriores nas quais consolidou os esforços da segunda fase, buscando uma teoria consistente de administração empresarial.

Os trabalhos de Schmidt em contabilidade ocorreram nas primeiras décadas do século XX, durante uma transição no pensamento europeu em administração de empresas — da teoria estática, orientada para o balanço patrimonial, para uma abordagem mais dinâmica, voltada para a apuração do resultado.

Schmidt, juntamente com o acadêmico holandês Theodore Limperg Jr., é reconhecido na literatura anglo-americana como um dos precursores teóricos das versões modernas da contabilidade a custo de reposição. Embora haja controvérsias quanto à primazia, argumenta-se que Schmidt exerceu o impacto mais precoce e relevante nesses desenvolvimentos. Sua contabilidade orgânica a valor corrente calcula o resultado da operação com base nas receitas correntes subtraídas dos custos correntes dos fatores de produção. Assim, os gastos com materiais, mão de obra e até itens indiretos, como depreciação, são todos avaliados a custo de reposição nas respectivas datas de venda, e os ativos do balanço patrimonial devem ser apresentados por seus custos de reposição à época.

Quaisquer alterações nos valores de reposição dos ativos não monetários não eram consideradas receitas (ou perdas), mas sim variações de capital, sendo registradas separadamente no sistema de Schmidt em uma conta de ajuste de capital (Wertberichtigungskonto). Schmidt afirmava que os mesmos dados de entrada poderiam ser usados tanto para elaborar a demonstração de resultados quanto o balanço patrimonial. Por isso, era descrito como dualista, em contraste com alguns outros monistas da Betriebswirtschaftslehre (ciência da administração empresarial), que sustentavam ser impossível usar os mesmos dados para ambos os fins.

O sistema de Schmidt baseava-se na manutenção dos valores físicos relativos na economia. Schwantag destacou outro aspecto em que o termo "relativo" se aplicava: o valor do capital empregado seria automaticamente ajustado em relação ao grau de satisfação das necessidades dos clientes.

A contabilidade orgânica de Schmidt teria ainda o benefício adicional de mitigar a natureza cíclica da atividade econômica. Esse aspecto foi citado pelo australiano Gottfried von Haberler, uma das principais autoridades sobre ciclos econômicos antes da Segunda Guerra Mundial. Mecanismos inovadores e pragmáticos de indexação, como Indexbuchführung e Goldmarkbilanz, tão comuns na Alemanha no início da década de 1920, eram vistos por Schmidt como soluções parciais. Esses métodos falhavam ao não analisar as empresas e sua contabilidade no contexto da economia de mercado — especialmente em seu estado deprimido do pós-guerra. Nesse sentido, careciam de uma perspectiva orgânica e relativa.

Fica evidente que Schmidt via a contabilidade como parte integrante de qualquer teoria de equilíbrio econômico, situando a teoria da firma — e a contabilidade empresarial — no contexto de uma economia dinâmica. Também é claro que sua teoria buscava incorporar a experiência prática dos efeitos da inflação e da queda de produtividade decorrentes da Primeira Guerra Mundial e do período pós-guerra, que levaram à desorganização da moeda, ao desgaste do estoque de ativos fixos e ao enfraquecimento sem precedentes das capacidades físicas e produtivas.

A natureza orgânica fundamental da teoria contábil de Schmidt é bem captada por Schwantag, que também sugere outro aspecto positivo e duradouro de sua obra: o reconhecimento de que a unidade monetária é "flexível na realidade e que essa flexibilidade precisava ser considerada ao mensurar". Alguns seguidores holandeses das ideias de Limperg sugeriram que o sistema de Schmidt era excessivamente focado nos problemas da guerra e da inflação — que seria específico demais para certos eventos e, portanto, não ofereceria uma teoria geral da contabilidade ou da administração empresarial. Essa visão é contestada por Clarke e Dean (1990).

As percepções de Schmidt sobre as funções da contabilidade são relevantes. A conexão entre ação econômica e mensuração foi essencial para o desenvolvimento de sua teoria contábil. Embora reconhecesse que a unidade de medida é variável, Schmidt não incorporou mudanças gerais no nível de preços às demonstrações contábeis. Em vez disso, orientava os gestores a fazerem a correspondência física entre os ativos e passivos monetários de uma entidade. Isso ficou conhecido como seu "princípio da identidade de valores", que foi amplamente criticado pelos teóricos contábeis alemães Eugen Schmalenbach e Walter Mahlberg na época, por considerarem que refletia visões totalitárias. Pode-se argumentar que essa política gerencial de equiparação entre ativos e passivos monetários foi um antecedente das soluções buscadas pelos ajustes de alavancagem nas propostas do Reino Unido, na metade dos anos 1970, sobre contabilidade a custo corrente.

A trajetória profissional inicial de Schmidt é instrutiva. Ele foi professor de administração de empresas na Universidade de Frankfurt, tendo anteriormente acumulado nove anos de experiência prática nos setores de varejo, atacado, manufatura, livrarias, seguros e importação e exportação internacional. Posteriormente, estudou formalmente e lecionou economia em diversas universidades alemãs.

Por ser um economista formado e um observador atento das atividades de bolsa e câmbio estrangeiro, não é surpreendente que seus escritos se baseassem no pensamento econômico contemporâneo, especialmente na teoria dos preços, no marginalismo e nos trabalhos do economista americano Irving Fisher sobre indexação. Tampouco surpreende o reconhecimento explícito de sua dívida intelectual com os economistas clássicos, como o inglês David Ricardo (1772–1823) e o americano Henry Charles Carey (1793–1879). Esses dois autores haviam proposto que os custos de reposição dos fatores de produção eram relevantes para empresários ao planejar suas ações.

Como observa Schwantag, isso não significa que Schmidt aceitava de forma acrítica as ideias econômicas da época. Suas propostas de contabilidade orgânica ampliaram e sistematizaram as ideias baseadas em preços de venda de Pawel Ciompa (1910), e as ideias baseadas em custo de reposição de Ilmari Kovero (1912) e Emil Fas (1913).

Os trabalhos de Schmidt obtiveram reconhecimento internacional. Foram publicados não apenas em alemão, mas também em holandês (1923), inglês (1929) e em uma tradução japonesa de Die organische Tageswertbilanz (1929), publicada em 1934. Suas ideias também ganharam visibilidade no Segundo Congresso Internacional de Contadores em Amsterdã, em 1926, e no Terceiro Congresso Internacional em Nova York, em 1929.

Reconhece-se que as ideias de Schmidt influenciaram o contador americano Henry Whitcomb Sweeney no desenvolvimento de seu mecanismo de contabilidade estabilizada. A ligação estabelecida entre a Stabilized Accounting de Sweeney (1936, 1964) e as propostas do pós-Segunda Guerra Mundial sobre contabilidade a custo corrente assegura a influência contínua de Schmidt no desenvolvimento contemporâneo do pensamento e da prática contábil.

Frank L. Clarke e Graeme W. Dean - The History of Accounting. Foto aqui

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Peruzzi


Peruzzi

Entre 1300 e 1345, as casas mercantis e bancárias mais poderosas de Florença eram os Bardi, os Peruzzi e os Acciaiuoli. Em 1336, os Peruzzi — os segundos maiores entre esses “pilares da Cristandade” — tinham 15 filiais na Europa Ocidental, no Norte da África e no Levante. Os registros contábeis dos Peruzzi situam-se entre a escrituração de partida simples e a de partida dobrada. Incluíam vários diários mantidos de forma independente e mal integrados. Cada lançamento no livro-razão era referenciado, mas os dois lados de cada conta ainda não eram colocados lado a lado. Em vez disso, os débitos eram lançados na parte da frente do livro e os créditos na parte de trás. Embora fossem usadas contas de receitas e despesas, nenhuma verificação aritmética de igualdade era tentada, e os lucros eram determinados não pelo fechamento do livro, mas pelo inventário dos ativos e a dedução desses em relação ao total de passivos e capital.

— Michael Chatfield para The History of Accounting

Existiram muitos Peruzzi, mas a firma com o nome, gerenciada por meia dúzia de membros da família, é que merece nossa atenção. A dimensão dos negócios, com base em Florença, permite estimar que era o segundo maior banco da Europa, com quinze filiais, do Oriente Médio até Londres, todas capitalizadas com mais de 100 mil florins de ouro e operadas por aproximadamente 100 agentes comerciais.

A origem do capital dos Peruzzi era o setor têxtil: lã inglesa, transformada em tecido de alta qualidade em Bruges, era comprada por agentes dos Peruzzi e distribuída às luxuosas cortes de Paris, Avignon ou enviada de volta a Londres. As conexões dos Peruzzi exigia agentes e instrumentos de crédito, o que expandiu os negócios e estabeleceu uma rede internacional. E a casa Peruzzi estava no início do desenvolvimento das partidas dobradas. 

No início do século XIV, a principal atividade dos Peruzzi havia se deslocado para o comércio atacadista de mercadorias em larga escala para a atividade bancária, área pela qual são mais lembrados: papas, nobres, burgueses, cidades e abadias recorriam a empréstimos concedidos pelos Peruzzi. No entanto, grandes clientes também implicavam grandes riscos. Em 1343, o consórcio Peruzzi entrou em colapso e foi à falência em 1345, junto com seus parceiros de capital de risco, os Bardi. Já comentamos isso aqui. 

17 maio 2025

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Solomons


Solomons, David (1912–1995)

David Solomons foi autor de importantes artigos e livros sobre teoria contábil, definição de normas, contabilidade gerencial e educação contábil, sendo também um consultor muito requisitado por institutos profissionais de contabilidade e órgãos normativos.

Solomons é talvez mais conhecido por ter escrito a primeira grande exposição do conceito de "valor para o proprietário" dentro da contabilidade a valor corrente, por ter previsto o declínio do conceito de lucro nas determinações contábeis, por ter atuado como redator principal do Relatório Wheat, que levou à criação do Financial Accounting Standards Board (FASB), por ter redigido a segunda declaração conceitual do FASB sobre características qualitativas da informação contábil e por defender a neutralidade como atributo indispensável para a definição responsável de normas.

Solomons obteve seu diploma de Bachelor of Commerce pela Universidade de Londres em 1932, tendo estudado na London School of Economics (LSE). Tornou-se contador público (chartered accountant) em 1936 e trabalhou em um escritório em Londres até 1939, quando, com o início da guerra, alistou-se como soldado raso no Exército Real e foi promovido no ano seguinte. Durante a guerra, passou quase três anos em campos de prisioneiros na Itália e na Alemanha, onde ensinou contabilidade a seus companheiros de cativeiro.

Em 1946, tornou-se professor de contabilidade na LSE, onde foi fortemente influenciado por Ronald S. Edwards, economista industrial que havia publicado vários artigos importantes sobre história dos custos e teoria contábil na revista Accountant durante a década de 1930. Em 1955, Solomons tornou-se o primeiro professor de contabilidade da Universidade de Bristol e, em 1959, atravessou o Atlântico para assumir uma cátedra na Wharton School da Universidade da Pensilvânia. Obteve o título de Doutor em Ciências pela Universidade de Londres em 1966 e, em 1974, foi nomeado o primeiro Arthur Young Professor na Wharton School. Aposentou-se da universidade em 1983.

Solomons presidiu associações acadêmicas de contabilidade em dois países: em 1958, foi presidente da Association of University Teachers of Accounting (mais tarde renomeada como British Accounting Association), e entre 1977 e 1978 foi presidente da American Accounting Association (AAA). Em 1980, a AAA selecionou Solomons como Educador Contábil Excepcional, e em 1989 o Institute of Chartered Accountants in England and Wales (Instituto Inglês) concedeu-lhe seu Prêmio Internacional. Em 1992, ele foi incluído no Accounting Hall of Fame (Hall da Fama da Contabilidade).

O primeiro artigo importante de Solomons, publicado em 1952, tratava da história da contabilidade de custos. Ele revisou o famoso ensaio de 1950 de Sidney Alexander, professor de economia em Harvard, intitulado "Income Measurement in a Dynamic Economy", após o qual Solomons concluiu, com pesar, em 1961, no artigo "Economic and Accounting Concepts of Income", que não era operacionalmente viável isolar mudanças nas expectativas do conceito de “renda econômica” de Alexander, o que diminuía sua utilidade como medida satisfatória de desempenho empresarial.

Foi nesse artigo de 1961 que Solomons fez sua famosa previsão: “no que diz respeito à história da contabilidade, os próximos vinte e cinco anos poderão ser vistos, posteriormente, como o crepúsculo da mensuração do lucro.” Em 1987, ele reconheceu que sua previsão não se concretizou, e que talvez sua vocação não fosse a de vidente.

Em 1966, Solomons publicou um importante ensaio, "Economic and Accounting Concepts of Cost and Value", sobre a formulação do “valor para o proprietário” de James C. Bonbright, professor de Finanças da Universidade de Columbia, no qual abordava a valoração de ativos. Ele deu impulso a esse conceito nos debates sobre contabilidade a valor corrente, expressando-o em notação de desigualdade. Direta ou indiretamente, esse trabalho influenciou o Comitê Sandilands, no Reino Unido, e o FASB, nos Estados Unidos, em suas deliberações sobre contabilidade em contextos de inflação.

Em 1965, David Solomons escreveu seu primeiro livro, Divisional Performance: Measurement and Control, no qual relatou uma pesquisa com 25 grandes empresas e apresentou recomendações sobre as melhores formas de avaliar e controlar operações descentralizadas. Foi um estudo pioneiro, que lhe rendeu, em 1969, o prêmio Notable Contribution to the Literature Award do American Institute of Certified Public Accountants (AICPA).

Solomons presidiu um comitê formado em 1970 pela American Accounting Association (AAA) com o objetivo de propor um processo mais eficaz para o estabelecimento dos "princípios contábeis geralmente aceitos", diante da ampla decepção com o desempenho do Accounting Principles Board. Após a publicação do relatório do comitê em 1971, ele foi nomeado para integrar o Wheat Study do AICPA, cujas recomendações de 1972 levaram, em 1973, à criação do Financial Accounting Standards Board (FASB). Solomons redigiu o primeiro rascunho do relatório.

Ele também redigiu a declaração de conceitos do FASB sobre as características qualitativas da informação contábil (1980) e prestou consultoria a um comitê especial do AICPA sobre a estrutura e a autoridade do que viria a se tornar o Auditing Standards Board. Em 1989, a pedido do Research Board do Instituto Inglês, elaborou um quadro conceitual conciso para consideração do Accounting Standards Committee do Reino Unido, que publicou naquele ano as Guidelines for Financial Reporting Standards.

Em 1986, ele sintetizou suas ideias sobre definição de normas e o quadro conceitual no livro Making Accounting Policy: The Quest for Credibility in Financial Reporting, uma obra exemplar em termos de rigor, erudição cuidadosa e redação persuasiva. No campo da educação contábil, Solomons foi convidado pelos seis órgãos de contabilidade das Ilhas Britânicas a realizar um importante estudo de longo prazo sobre educação e formação contábil, que concluiu em 1974 com o título Prospectus for a Profession.

Solomons deixou uma marca importante e salutar tanto na literatura contábil quanto nas deliberações de política dos institutos profissionais de contabilidade e dos órgãos de definição de normas.

— Stephen A. Zeff - The History of Accounting

leia mais aqui e aqui


Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Fiori


Flori, Ludovico (1579–1647)

Em 1633, Ludovico Flori, um jesuíta de Palermo, publicou o segundo manual impresso sobre contabilidade monástica. Trattato del Modo di Tenere il Libro Doppio Domestico derivava seus procedimentos contábeis básicos e grande parte de sua exposição do Indrizzo Degli Economi (1586), do beneditino Dom Angelo Pietra. Ambos os autores descreveram um sistema surpreendentemente semelhante à contabilidade moderna. Ambos acreditavam que as contas monásticas poderiam ser melhor analisadas, não pela inspeção do razão, como faria um comerciante, mas sim por meio do exame de demonstrações financeiras separadas.

Flori foi o primeiro autor a insistir que as transações fossem alocadas aos seus devidos períodos fiscais. Isso exigia uma distinção clara entre receitas do ano corrente e lucros e perdas de períodos anteriores, que deveriam ser encerrados diretamente no capital. Flori contabilizava separadamente os ativos de longo prazo e os de curto prazo; descreveu e ilustrou lançamentos contábeis compostos; e discutiu as vantagens de prever receitas e despesas. Contas de compensação (suspense accounts) aparecem pela primeira vez em seu texto.

Assim como Pietra, Flori defendia o encerramento anual do razão, mas utilizava uma conta de balanço, não apenas para comprovar a exatidão do razão, mas também para facilitar seu encerramento e reabertura. Edward Peragallo e Federigo Melis consideram a obra de Flori a melhor exposição da contabilidade italiana anterior a 1800.

Michael Chatfield - The History of Accounting. Leia também aqui

Contadores dos Medici

Contabilidade dos Médici

O Banco Médici foi fundado em 1397 e durou quase 100 anos, embora tenha operado apenas na Europa Ocidental e nunca tenha se tornado tão grande quanto as casas bancárias Bardi ou Peruzzi. Os Médici utilizavam a contabilidade por partidas dobradas para avaliação de crédito, gestão e controle, auditoria e até para o cálculo de impostos sobre a renda. Todos os anos, em 24 de março, os livros das filiais bancárias eram encerrados e cópias de seus balanços patrimoniais eram enviadas para a sede em Florença.

Esses balanços listavam separadamente o valor devido por cada cliente, de modo que, às vezes, os demonstrativos continham mais de 200 itens de linha. Como as dívidas incobráveis eram a principal ameaça à solvência de um banqueiro medieval, a auditoria feita pelo gerente-geral e seus assistentes envolvia a análise da conta de cada devedor para verificar se não havia sido concedido crédito excessivo e para identificar contas duvidosas ou vencidas. Uma auditoria completa também exigia a presença dos gerentes das filiais. Eles eram convocados a Florença uma vez por ano, se residissem na Itália, e pelo menos a cada dois anos, se vivessem no exterior.

A fraqueza desse sistema de auditoria interna era que as filiais não eram regularmente visitadas por auditores itinerantes. O banco sofreu grandes perdas devido a gerentes de filiais descontrolados e insubordinados, além de uma falta geral de coordenação. Nem mesmo o seu poder, como banqueiro papal, de obter a excomunhão de quem não pagasse receitas da Igreja, foi capaz de salvar o Banco Médici, que faliu em 1494.

A contabilidade de custos industriais, assim como a contabilidade por partidas dobradas, teve origem na Itália renascentista. Durante os séculos XV e XVI, as sociedades industriais dos Médici controlavam duas oficinas de lã e uma fábrica de seda em Florença. Os fabricantes têxteis dos Médici compravam lã bruta e vendiam o tecido acabado, que havia sido produzido por artesãos em suas próprias casas. Como cada fase da produção era realizada por uma guilda diferente, cada etapa do processo de conversão precisava ser registrada em um livro de memorandos separado, que mostrava a quantidade de tecido entregue por cada trabalhador e os salários pagos ou devidos.

Uma conta de compensação, chamada “tecido fabricado e vendido”, combinava o custo de cada lote de material com a receita de sua venda, apresentando, ao final, o lucro obtido com todo o tecido vendido durante o período operacional. Como a manufatura era feita por trabalhadores externos que possuíam suas próprias ferramentas, os custos indiretos (overhead) eram ignorados no cálculo dos preços de venda.

Os comerciantes italianos do sistema de produção descentralizada (putting-out system) talvez não tenham sido os primeiros a usar a contabilidade de custos para racionalizar a produção, mas, em sua época, não tinham rivais. Eles podiam, por exemplo, importar lã bruta da Inglaterra, manufaturá-la e enviar os tecidos acabados de volta para vender na Inglaterra por preços inferiores aos dos produtores locais.

Do verbete The History of Accounting

Não há um nome específico de um profissional contábil responsável pela contabilidade dos Médici. 

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Eugène Léautey


Eugène Léautey (1845–1909) foi um teórico francês da contabilidade de grande influência na transição entre os séculos XIX e XX. Reconhecido por sua abordagem crítica, minuciosa e comprometida com o rigor técnico, destacou-se pela busca de uma doutrina contábil racional, moderna e sistematizada. 

Antes de sua obra mais conhecida, La science des comptes mise à la portée de tous (1889), escrita com Adolphe Guilbault, Léautey publicou dois livros fundamentais:

"Questions actuelles de comptabilité et d'enseignement commercial" (1881), uma crítica feroz à precariedade do ensino comercial francês e à falta de preparo dos professores de contabilidade, propondo sua sistematização e o uso pedagógico da prática profissional.

"L’enseignement commercial et les écoles de commerce en France et dans le monde entier" (1886), um extenso estudo comparativo sobre escolas comerciais, com destaque para a excelência do modelo americano e o exotismo das instituições russas, defendendo um currículo técnico estruturado e um sistema de certificações para a profissão contábil.

Léautey propôs a criação de três níveis profissionais: tenedor de livros, contador e perito-contador, sob supervisão de uma câmara nacional de experts. Ele também criticou duramente a contabilidade pública francesa, defendendo a adoção de balanços estatais anuais — como já fazia a Itália — e apontou as falhas da legislação contábil do Código de Comércio de 1807.

Ao longo da vida, escreveu obras que se tornaram referência, como Principes généraux de comptabilité (1895) e Le rôle social de la comptabilité et des comptables (1904). 

Baseado em Jean-Guy Degos, Les premiers travaux d’Eugène Léautey, théoricien comptable à la charnière du 19è et du 20è siècle

16 maio 2025

Capítulo final (?) na disputa J&F e Paper Excellence

A disputa entre a JeF Investimentos e a Paper Excellence pelo controle da Eldorado Brasil Celulose, que se estendia desde 2018, chegou ao fim ontem [15 de maio de 2025]. A JeF, holding dos irmãos Batista, anunciou o pagamento à vista de R$ 15 bilhões para adquirir a participação de 49,41% da Paper Excellence na Eldorado. 

A controvérsia teve início em 2017, quando a JeF vendeu 49,41% da Eldorado para a Paper Excellence por US$ 1,1 bilhão, com o compromisso de transferir o controle total após 12 meses. Entretanto, divergências sobre o cumprimento das condições contratuais levaram a uma série de litígios judiciais e arbitrais no Brasil e no exterior, incluindo uma arbitragem na Câmara de Comércio Internacional em Paris, na qual a Paper Excellence buscava uma indenização de US$ 3 bilhões. Pelo valor acertado agora, parece que as demandas da Paper Excellence foram atendidas. 

A disputa envolveu cerca de uma centena de advogados e figuras importantes da República, como o então advogado Cristiano Zanin, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Michel Temer, o ministro Ricardo Lewandowski e a advogada Roberta Rangel, esposa do ministro do STF Dias Toffoli. A Paper Excellence estimou ter gasto aproximadamente R\$ 300 milhões em honorários advocatícios durante o processo.

Com a aquisição da totalidade das ações, a JeF encerra uma das maiores disputas corporativas do país e assume o controle da Eldorado Brasil Celulose.

O desafio de mensurar um objeto histórico


Eis o texto original:

Uma rara cópia original da Magna Carta de 1300 foi identificada nos arquivos da Faculdade de Direito de Harvard. Comprada em 1946 por apenas 27,50 dólares (equivalente a cerca de 477 dólares atualmente), ela foi arquivada incorretamente por décadas e durante muito tempo foi considerada apenas uma réplica. Agora, confirma-se que o pergaminho de pele de carneiro é um dos apenas sete exemplares originais ainda existentes, emitidos pelo rei Eduardo I naquele ano.

Historiadores britânicos descobriram sua importância após encontrarem uma imagem digital em alta resolução na internet. Em seguida, usaram luz ultravioleta e imagem espectral para comparar os textos físicos e verificar sua autenticidade. Eles acreditam que o documento foi enviado originalmente para o distrito parlamentar de Appleby-in-Westmorland, na Inglaterra, e mais tarde adquirido por livreiros de Londres de um herói de guerra da Força Aérea Real, antes de ser vendido para Harvard.

Assinada pela primeira vez em 1215 pelo rei João, a Magna Carta estabeleceu o princípio de que ninguém — nem mesmo um monarca — está acima da lei. A versão de 1300, conhecida como Confirmação das Cartas, reafirmou esses direitos e ajudou a lançar as bases do direito constitucional, incluindo a Constituição dos Estados Unidos.

(Da newsletter 1440). Imagem aqui

Veja a dificuldade de mensuração de um ativo histórico. Em sua origem, o custo histórico de 27,50 dólares poderia hoje equivaler a apenas 477 dólares, se corrigido monetariamente — cerca de 17 vezes o valor original. No entanto, o que o torna um objeto historicamente valioso são suas características. O fato de ter sido considerado uma réplica levou o documento a ser tratado, durante décadas, como um ativo de baixo valor. A descoberta de que o documento não apenas era original, mas também raro, tornou o processo de mensuração de seu valor muito mais complexo.

Do ponto de vista contábil, esse caso evidencia os limites do custo histórico como base de mensuração. Afinal, o exemplo mostra como a contabilidade tradicional pode não refletir a relevância histórica, cultural ou de mercado de um ativo. Mesmo o valor justo pode ser difícil de determinar em situações de raridade extrema e ausência de transações comparáveis. Isso levanta discussões sobre a utilidade das informações contábeis nesse tipo de contexto.


Nudges em aula de matemática


Um estudo de larga escala conduzido por pesquisadores de diversas instituições investigou se "nudges" comportamentais — lembretes enviados por e-mail — poderiam melhorar o desempenho em matemática de alunos do ensino fundamental nos Estados Unidos. A pesquisa envolveu cerca de 140.000 professores e 3 milhões de estudantes que utilizam a plataforma online Zearn Math.

Foram testados 15 tipos diferentes de mensagens semanais enviadas aos professores, com o objetivo de incentivá-los a engajar mais ativamente seus alunos nas atividades matemáticas. O nudge mais eficaz resultou em um aumento de 5,1% no progresso dos alunos, mas, após ajustes estatísticos, esse impacto foi estimado em 3,3%. Em média, os alunos cujos professores receberam os nudges completaram 1,81 lições durante o período de quatro semanas, em comparação com 1,78 lições completadas por alunos cujos professores receberam lembretes mais genéricos.

Apesar de estatisticamente significativos, os efeitos dos nudges foram modestos e menores do que o esperado pelos pesquisadores. Ou seja, os empurrões podem não ser suficientes para melhorar substancialmente o desempenho em matemática dos alunos.

Via aqui

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 Elogio e mais trabalho

15 maio 2025

Taxando o Papa

 Eis que curioso:

A eleição do Papa Leão XIV, nascido Robert Prevost em Chicago, traz um conjunto único de desafios para o primeiro pontífice americano, especialmente no que diz respeito às suas finanças.

Como cidadão dos Estados Unidos, Leão XIV pode enfrentar uma conta tributária substancial com o governo dos EUA devido ao sistema de tributação global do país, que se aplica a todos os cidadãos, independentemente de onde vivam.

Os EUA são um dos poucos países que tributa seus cidadãos sobre a renda mundial, e, como resultado, Leão XIV provavelmente precisará apresentar uma declaração de impostos, o que pode incluir algumas complexidades adicionais.

Seu papel como chefe do Vaticano, com grande controle sobre as finanças da instituição, pode resultar em uma responsabilidade tributária ainda maior, afirmam especialistas à Fortune. 

O salário de Leão XIV como papa é fixado em 30.000 euros por mês, aproximadamente US$ 33.000, o que resulta em uma renda anual de cerca de US$ 396.000. De acordo com a legislação fiscal dos EUA, isso provavelmente resultará em uma responsabilidade fiscal federal e de seguro social estimada em cerca de US$ 135.287, segundo o contador de Washington Hector Castaneda.

Embora alguns especulem que o governo dos EUA possa conceder uma isenção devido à posição de Leão XIV, especialistas em impostos, como Timothy Fogarty, professor de contabilidade na Case Western Reserve University, são céticos.

“Não existe uma isenção geral para líderes religiosos ou chefes de estado”, afirmou Fogarty à Fortune, ressaltando que a legislação dos EUA mantém o direito de tributar os cidadãos sobre sua renda global, independentemente de seu papel religioso ou status diplomático.

As empresas mais valiosas do mundo

 As empresas com maior valor de mercado estão no gráfico a seguir:

As cores são os países de origem. A maioria delas são dos Estados Unidos. A primeira empresa na lista não americana é a Aramco, com 1,6 trilhão de valor, na sexta posição. 


As fontes de receita das universidade dos EUA

As universidades dos Estados Unidos estiveram nas manchetes nas últimas semanas. Um dos temas em destaque foi o corte de verbas do governo federal para algumas das melhores universidades do mundo. Mas como essas instituições são financiadas?

O gráfico apresenta os dados de financiamento com base em estatísticas oficiais referentes a 2023, abrangendo 1.592 instituições. 

Cerca de 28% dos recursos vêm dos governos estaduais. As mensalidades e taxas representam 21% do total, ou 81 bilhões de dólares. Esse valor tem crescido nos últimos anos, mas ainda não cobre todos os custos operacionais. As chamadas fontes privadas respondem por 51 bilhões de dólares, ou 13% do financiamento. O desafio dessas fontes é que os recursos geralmente são vinculados a finalidades específicas, como bolsas de estudo ou centros de pesquisa determinados.

Gráficos

 Da Bloomberg, sobre Warren Buffett:





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Fonte: aqui
 

14 maio 2025

Ilusão do conhecimento e Trump

 


Do texto de Tim Harford:

Um estudo extraordinário realizado pelos economistas Brad Barber e Terrance Odean, publicado há um quarto de século, analisou o desempenho de mais de 1.600 investidores que abraçaram a revolução da Internet na década de 1990, passando da negociação por telefone para uma das primeiras negociações baseadas na web. Barber e Odean compararam esses investidores a outros semelhantes que mantiveram a familiar tecnologia baseada em telefone. “Aqueles que mudam da negociação por telefone para a negociação on-line experimentam um desempenho incomumente forte antes da mudança, explicaram Barber e Odean, ” aceleram suas negociações depois de ficarem online, negociam de forma mais especulativa e experimentam um desempenho abaixo da média.“

O que aconteceu? A explicação mais plausível é a ilusão “de conhecimento” —, um fenômeno psicológico bem estabelecido de que as pessoas que recebem mais informações não se tornam muito melhores em previsões, mas se tornam muito mais confiantes. A nova plataforma online deu aos investidores falsa confiança e tentou-os a negociar com demasiada frequência, bem como tornou essas negociações especulativas mais baratas e fáceis. Paradoxalmente, se tivessem suportado a aparente desvantagem de se apegarem a um método de negociação mais lento, mais caro e menos rico em informação, teriam tido um desempenho substancialmente melhor como resultado.

Novo papa e doadores

O texto mostra os desafios do novo papa na questão financeira. 

O que o Papa Leão XIV representa para os doadores? - Muitos observadores do Vaticano jamais imaginaram que veriam o dia em que um americano seria eleito papa. E então Leão XIV apareceu na sacada da Basílica de São Pedro.

Em retrospecto, a elevação do cardeal Robert Francis Prevost, nascido em Chicago, faz muito sentido — tanto por sua capacidade de mobilizar a vital base de doadores americanos quanto por sua liderança espiritual. (Apesar de, em seu primeiro discurso ontem, ele não ter mencionado os Estados Unidos, nem dito uma palavra em inglês.)

Por que isso importa?: Os americanos podem já não estar indo à missa em massa, mas continuam sendo uma potência quando se trata de doações.

E o novo papa é visto como uma liderança estável, capaz de dar continuidade às reformas contábeis iniciadas por seu antecessor. Francisco nomeou Prevost, de 69 anos, em 2023 para um dos principais cargos do Vaticano, dando-lhe influência sobre os rumos futuros da Igreja. “Ele preenchia todos os requisitos”, disse o veterano analista do Vaticano John Allen ao The New York Times.

Antes do conclave, vários grupos de doadores disseram ao DealBook que estavam apreensivos com a votação para a sucessão, esperavam continuidade fiscal e temiam que um novo papa desfizesse os esforços de Francisco para trazer mais transparência às operações do Vaticano. (Alguns especialistas também previram ao DealBook que um candidato com uma visão forte de negócios poderia se tornar um papável competitivo.)


As finanças do Vaticano estão em desordem. Embora Francisco tenha ordenado auditorias internas mais rigorosas, o déficit do papado ainda cresceu significativamente na última década, e o fundo de pensão enfrenta passivos de cerca de 2 bilhões de euros (US\$ 2,25 bilhões), segundo o Wall Street Journal.

Nos últimos dias de seu pontificado, Francisco tentou fortalecer os laços com os doadores. Em fevereiro, enquanto se recuperava de uma pneumonia, foi criado um comitê de alto nível para arrecadar fundos para a Cúria — a hierarquia administrativa do Vaticano — a fim de cobrir os déficits orçamentários.

A aposta de Francisco era que os doadores se mostrariam tão dispostos a financiar a burocracia da Igreja quanto as diversas missões e causas sociais espalhadas pelo mundo.

A política merece atenção. Os católicos dos EUA tendem a se inclinar mais para o Partido Republicano, e tinham uma visão amplamente positiva de Francisco — mesmo que ele tenha entrado em conflito com o presidente Trump em questões como imigração.

Vale observar como eles irão enxergar o novo papa: em fevereiro, uma conta nas redes sociais em nome de Prevost expressou críticas ao vice-presidente JD Vance, compartilhando um artigo que classificava a interpretação que o vice-presidente faz da doutrina cristã como “equivocada”.

IA, direito autoral e passivo


Uma das questões polêmicas no desenvolvimento da inteligência artificial refere-se à violação, ou não, de direitos autorais. Sabe-se que algumas das ferramentas que utilizamos atualmente, como a IA da Meta, foram treinadas com materiais protegidos por lei — como reportagens e livros — sem a devida autorização. O resultado disso tem sido uma série de disputas legais entre as empresas de IA e os detentores desses direitos.

Na semana passada, um relatório foi apresentado pelo Escritório de Direitos Autorais dos Estados Unidos, indicando que houve pirataria no treinamento dessas IAs, com o uso indevido de livros, filmes e outras obras, em violação aos direitos autorais. Embora o Escritório não possua poder normativo, seus pareceres são frequentemente utilizados pelos tribunais como base para decisões judiciais. Dois dias após a divulgação do relatório, a chefe do Escritório foi demitida. Eis um dos trechos do documento:

"fazer uso comercial de vastos conjuntos de obras protegidas por direitos autorais para produzir conteúdo expressivo que concorra com elas nos mercados existentes, especialmente quando isso é conseguido através de acesso ilegal, vai além dos limites estabelecidos de uso justo"

Um processo desse tipo irá representar um grande passivo para empresas de tecnologia, que desenvolveram suas ferramentas sem a permissão dos donos da obra original. 

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Fonte: aqui
 

13 maio 2025

IFRS 18 será adotada no Brasil?


Quando o Iasb começou a fase final de tramitação e aprovação da IFRS 18 - Demonstrações Financeiras Primárias, esperava-se que o CPC já estivesse começado os preparativos para a tradução e adaptação da nova norma para as empresas brasileiras. Muito tempo depois da aprovação, eis que surge uma pequena notícia: o CPC estaria começando a tratar do assunto. Eis a notícia:

(...) está sob análise do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) para consequente divulgação de um novo pronunciamento técnico. O grupo, criado especificamente para tratar do assunto [1], avalia a tradução oficial [2] da IFRS 18 a partir de um documento inicialmente preparado pelo Instituto de Auditoria Independente do Brasil (Ibracon). A intenção é que o novo pronunciamento técnico entre em audiência pública no fim de 2025 [3].

[1] Acho estranho ser necessário criar um grupo específico para o assunto. 

[2] Isso pode dar a entender que o pronunciamento não seria uma tradução somente da IFRS18. Novamente sem entender.

[3] Estamos em maio e já se passaram muitos meses da aprovação final da IFRS 18. Seriam mais 7 meses até a audiência pública. Novamente, parece lento. 

Foto aqui

Um pequeno presente para Trump


O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, enfrenta críticas após aceitar um luxuoso jato Boeing 747-800 avaliado em aproximadamente US$ 400 milhões, oferecido pela família real do Catar. A aeronave seria utilizada como substituto temporário do Air Force One.

A decisão gerou preocupações éticas e legais, com críticos argumentando que o presente pode violar as normas dos Estados Unidos sobre funcionários federais de aceitam presentes de governos estrangeiros. Além disso, há temores sobre possíveis conflitos de interesse, dado o histórico de Trump com negócios no Golfo Pérsico e as ligações do Catar com grupos como o Hamas.

Leia mais aqui

Trabalho em contabilidade e IA

Trabalho de Stanford:

Este artigo oferece evidências iniciais sobre a integração e o impacto da Inteligência Artificial Generativa (IA) na contabilidade, tanto no nível dos contadores quanto das tarefas. Utilizando uma abordagem multimétodo, identificamos inicialmente padrões heterogêneos de adoção, benefícios percebidos e preocupações centrais com base em dados de painel coletados de 277 contadores. Em seguida, formalizamos essas percepções oriundas da pesquisa por meio de um modelo teórico estilizado, com o objetivo de gerar previsões corroborativas. Por fim, em parceria com uma empresa de tecnologia que fornece software contábil baseado em IA, analisamos dados de campo inéditos provenientes de 79 empresas de pequeno e médio porte, abrangendo centenas de milhares de transações. Documentamos ganhos significativos de produtividade entre os adotantes da IA, incluindo um aumento de 55% no suporte semanal a clientes e uma realocação de aproximadamente 8,5% do tempo dos contadores de tarefas rotineiras de inserção de dados para atividades de maior valor, como comunicação empresarial e garantia da qualidade. O uso da IA também está associado a melhorias na qualidade dos relatórios financeiros, evidenciado por um aumento de 12% na granularidade do razão geral e uma redução de 7,5 dias no tempo de fechamento mensal. Verificamos ainda a existência de complementaridades entre a IA e a experiência dos contadores: profissionais experientes utilizam a automação de forma seletiva e aumentam sua intervenção quando as pontuações de confiança da IA indicam incerteza. Uma análise preliminar de um experimento de campo piloto adicional oferece insights sobre o potencial impacto de erros da IA. Em síntese, nossos achados destacam o papel da IA como uma tecnologia potencialmente capaz de ampliar — e não substituir — a expertise profissional na contabilidade.

Pesquisa bem relevante para nossa área. O original está aqui

Trabalho e IA


Apresentamos evidências de como a inteligência artificial generativa altera os padrões de trabalho de profissionais do conhecimento, utilizando dados de um experimento de campo randomizado, com duração de seis meses e abrangência intersetorial. Metade dos 7.137 trabalhadores participantes recebeu acesso a uma ferramenta de IA generativa integrada aos aplicativos que já utilizavam para e-mails, criação de documentos e reuniões. Constatamos que o acesso à ferramenta de IA, durante o primeiro ano após seu lançamento, impactou principalmente comportamentos que os trabalhadores podiam modificar de forma autônoma, e não aqueles que exigiam coordenação para serem alterados: os trabalhadores que usaram a ferramenta em mais da metade das semanas da amostra passaram 3,6 horas a menos por semana — ou 31% menos tempo — lidando com e-mails (a estimativa de intenção de tratamento é de 1,3 hora) e concluíram documentos de forma moderadamente mais rápida, mas não apresentaram mudanças significativas no tempo gasto em reuniões.

Três dos quatro pesquisadores são da Microsoft e a ferramente é o Copilot. Artigo pode ser baixado aqui

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 Fonte: aqui

12 maio 2025

O desafio de arrumar as finanças do Vaticano


Além da liderança espiritual de mais de 1.400 milhões de católicos do mundo, o falecido papa Francisco lutou com uma tarefa mais temporal: supervisionar as finanças complexas e opacas do menor país do mundo.

Francisco chocou muitos dentro das instituições financeiras da Santa Sé com a sua campanha anticorrupção de alto perfil, que incluiu uma operação policial do Vaticano em 2019 na própria burocracia da cidade-estado por causa de um negócio imobiliário questionável.

Apesar desses esforços, o seu sucessor enfrenta um desafio financeiro assustador. Embora gere receita por meio do turismo, doações e investimentos, o Vaticano opera com um défice orçamental significativo e o seu fundo de pensões enfrenta uma enorme deficiência estrutural.

Quando Francisco assumiu em 2013, as finanças do Vaticano haviam sido atormentadas por décadas de negócios desastrosos e acusações de má conduta. Em nenhum lugar isso era mais evidente do que no IOR (Instituto para as Obras de Religião), o banco do Vaticano.

Fundado pelo Papa Pio 12 em 1942 para administrar as finanças e investimentos do Vaticano, e para garantir sigilo durante a Segunda Guerra Mundial, os seus escândalos abrangeram ligações com a máfia e o crime organizado, alegações de negociação com ouro nazi e conexões com a misteriosa morte de um homem conhecido como “o banqueiro de Deus”.

Francisco propôs-se a colocá-lo num curso diferente —frequentemente contra forte oposição de burocratas do Vaticano, tradicionalistas e figuras poderosas dentro da cúria que beneficiavam do status quo.

“A resistência à agenda de reforma do Papa Francisco tem sido massiva, mas as coisas no IOR mudaram, porque fomos mais resistentes do que a resistência”, disse Jean-Baptiste de Franssu, presidente do banco do Vaticano, ao Financial Times.

O banco do Vaticano é onde organizações católicas como ordens religiosas, instituições de caridade e dioceses, bem como clérigos e funcionários da igreja, têm contas. Esta entidade financeira administra cerca de 5,4 biliões de euros em ativos de clientes e registou um lucro líquido de mais de 30 milhões de euros em 2023.

O banco de propriedade do Vaticano opera separadamente da Apsa (Administração do Património da Sé Apostólica), um fundo soberano de facto para a Santa Sé, a administração da igreja.

O terceiro pilar das finanças do Vaticano é o fundo de pensões da Santa Sé, um esquema de benefício definido para funcionários do Vaticano que tinha um passivo não financiado de quase 1,5 biliões de euros há uma década, de acordo com relatórios financeiros obtidos pelo The Pillar, uma organização de notícias católica. Esse número provavelmente aumentou desde então, disse a publicação.

Francisco deixa um “legado misto” na reforma financeira, disse Ed Condon, editor e cofundador do The Pillar. “Ao nível institucional, ele fez um ótimo trabalho: o banco do Vaticano e a Apsa eram sinónimos de práticas comerciais obscuras quando ele chegou, e agora têm um atestado de boa saúde.

“Mas, por outro lado, o Vaticano não está mais perto —na verdade, está muito mais longe— de ter um orçamento equilibrado.”

Talvez o escândalo histórico mais notório esteja relacionado ao colapso de 1982 do Banco Ambrosiano, o maior banco privado da Itália, no qual o banco do Vaticano possuía uma participação. Na época, o banco do Vaticano era dirigido pelo arcebispo americano Paul Marcinkus, cujo conhecimento de finanças se resumia a um curso acelerado de seis semanas em Harvard após a sua nomeação em 1971.

Marcinkus envolveu-se em negócios ilícitos com um banqueiro ligado à máfia e com Roberto Calvi, o poderoso chefe do Banco Ambrosiano. Mais tarde, descobriu-se que Calvi fazia parte de um esquema para lavar dinheiro através de empresas offshore, transferir pagamentos ilegais para partidos políticos italianos e financiar negócios clandestinos de armas.

O colapso do Banco Ambrosiano deixou o banco do Vaticano com cerca de 250 milhões de dólares em perdas. Pouco antes disso, o corpo de Calvi foi descoberto pendurado num andaime na Ponte Blackfriars, em Londres. Tijolos e pedras estavam enfiados nos seus bolsos, ele tinha quase 7.500 libras em dinheiro, e as suas mãos estavam amarradas atrás das costas.

A morte de Calvi foi inicialmente considerada suicídio, mas um tribunal italiano posteriormente determinou que foi um assassinato. Ninguém foi condenado pela morte.

Três décadas depois, quando Francisco foi eleito, o banco do Vaticano permanecia em desordem. Naquele ano, o seu diretor e vice-diretor renunciaram após a prisão de um alto clérigo italiano por acusações de corrupção e fraude. O Moneyval, o órgão de vigilância anti-lavagem de dinheiro do Conselho da Europa, alertou que o banco corria o risco de ser incluído na lista negra.

Francisco se propôs a enfrentar o problema, instalando uma gestão financeira mais profissional para reduzir a influência clerical. Em 2014, de Franssu, ex-CEO da Invesco Europe, foi nomeado presidente do IOR, que havia divulgado seu primeiro relatório anual meses antes. Milhares de contas bancárias inativas foram fechadas.

Mas o processo de reforma foi turbulento. Em 2015, Libero Milone, ex-presidente da Deloitte na Itália, foi nomeado auditor-chefe da Santa Sé, mas foi destituído dois anos depois após solicitar informações sobre “centenas de milhões de dólares” mantidos fora dos livros por entidades ligadas ao Vaticano na Suíça.

Milone, que moveu uma ação por demissão injusta, disse que restaurar a confiança dos católicos na integridade financeira do Vaticano seria fundamental para reverter o declínio nas doações. De acordo com o Vaticano, estas caíram 23% entre 2015 e 2019 e continuaram a diminuir.

“A Igreja só sobreviverá se equilibrar as suas finanças”, disse. “A única maneira de acertarem as suas finanças é se os doadores tiverem fé de que serão gastas por causas justas —da maneira certa, no valor certo.”

Ainda assim, houve progresso. Quando de Franssu assumiu o IOR, apenas um banco internacional estava disposto a atuar como banco correspondente, fornecendo serviços bancários noutras jurisdições em seu nome. “Agora há mais de 45”, disse.

O IOR iniciou ações judiciais em várias jurisdições contra o ex-gestor de fundos italiano baseado em Londres, alegando que o banco foi defraudado num grande investimento imobiliário em Budapeste em 2012. Esse financiador, Raffaele Mincione, contestou as alegações e foi absolvido de fraude num caso no Tribunal Superior de Londres, embora o juiz tenha considerado que o Vaticano tinha motivos para se considerar “completamente decepcionado”.

Em 2017, o banco do Vaticano aderiu à iniciativa da Área Única de Pagamentos em euros da UE para pagamentos transfronteiriços. Quatro anos depois, garantiu a classificação mais alta possível do Moneyval para combate à lavagem de dinheiro e ao terrorismo. Logo depois, Francisco decretou que todos os ativos geridos para instituições da Santa Sé devem ser supervisionados pelo banco.

As autoridades do Vaticano sinalizaram atividades suspeitas que levaram à descoberta de um escândalo sobre um empreendimento imobiliário na Sloane Avenue, em Londres, no qual o Vaticano investiu a partir de 2014, resultando em perdas de 200 milhões de euros para a Santa Sé.

Em 2019, os cardeais ficaram atónitos quando a polícia do Vaticano invadiu a Secretaria de Estado do Vaticano, a burocracia central da cidade-estado, por causa do investimento. A investigação levou à condenação do cardeal Giovanni Angelo Becciu, outrora uma figura poderosa, por múltiplas acusações de peculato e fraude.

A abordagem pública —Francisco disse que “esta é a primeira vez que o pote é aberto de dentro para fora, e não de fora para dentro”— foi “um grande choque para alguns internamente”, disse de Franssu.

Na sequência, Francisco retirou da Secretaria de Estado investimentos no valor de centenas de milhões, colocando os seus ativos financeiros sob o controle da Apsa.

A Apsa agora administra todos os cinco mil ativos imobiliários da Santa Sé, principalmente em Roma, mas incluindo propriedades na França, Reino Unido e Suíça. Também assumiu a gestão de doações de católicos em todo o mundo, um fundo conhecido como Óbolo de São Pedro.

Os ativos sob gestão da Apsa estavam próximos de três biliões de euros em 2023. Isso incluía ativos móveis —principalmente títulos de curto prazo e dinheiro— e imóveis, apenas 30% deles alugados para lucro. A Apsa registrou lucros de 46 milhões de euros em 2023, acima dos 38 milhões do ano anterior.

A maior parte das receitas do Vaticano vem de imóveis e universidades, escolas e hospitais católicos. Estes geraram mais de 65% da receita de 770 milhões de euros da Santa Sé há três anos, o número mais recente disponível, de acordo com o conselho económico do Vaticano.

Cerca de 24% vieram de doações discriminadas —fundos destinados a uma causa específica— e 6% do Óbolo de São Pedro. O restante veio do banco do Vaticano e do turismo.

Francisco impôs cortes salariais aos cardeais e procurou conter outros gastos. O Vaticano também vendeu alguns ativos imobiliários, segundo o The Pillar. Mas as demonstrações financeiras de 2023 mostraram que o défice operacional da Santa Sé era de 83 milhões de euros. O seu fundo de pensões alertou em novembro que não seria capaz de cumprir as obrigações a médio prazo.

O conclave para eleger o 267º líder da igreja começa na próxima semana. Dependendo de quem sair vitorioso, as finanças podem ou não continuar sendo uma prioridade, disse uma pessoa próxima ao Vaticano.

Em última análise, os esforços de reforma do Papa Francisco colocaram-no contra “metodologias enraizadas no Vaticano” e “disputas profundamente arraigadas em torno do dinheiro”, disse Condon. “Dinheiro é poder no Vaticano… e muito disso é muito zelosamente guardado.”

E acrescentou: “No final, o Papa Francisco foi de certa forma conquistado pelo grande mantra do Vaticano: ‘mas sempre fizemos assim’. E o problema é que a maneira como sempre fizeram está a levá-los muito perto de uma grave crise de liquidez.”

Fonte: aqui, original do Financial Times

Mapa invertido do IBGE e a representação fiel


O IBGE, através do seu presidente, divulgou um "novo mapa-mundi", onde o Brasil tem posição de destaque na representação e o hemisfério "sul" está na parte de cima da representação. Logo depois disso, redes sociais foram tomadas por comentários críticos e irônicos. 

Qualquer mapa não apresenta a representação fiel do mundo. A mais conhecida representação, denominada Mercator, é conhecida por exagerar no tamanho da Groelândia e do Canadá. A reportagem do link destaca o conflito entre o atual presidente e o sindicato de funcionários, mas a discussão é bem mais interessante. O mapa invertido não é novidade, estando presente, por exemplo, na Austrália. 

Mas mostra os limites da representação fiel na contabilidade e em outras áreas. Fazer de conta que ela existe pode impedir avanços no sentido de melhor a qualidade da contabilidade. 

Inovação e regulamentação

O resumo:

Investigamos o impacto da regulação de divulgação sobre a inovação corporativa. Explorando os limiares existentes na regulamentação europeia, constatamos que obrigar as empresas a divulgar demonstrações financeiras reduz o número de empresas inovadoras e os gastos médios com inovação por empresa, mas não reduz os gastos totais com inovação no setor como um todo. Nossos resultados sugerem que a regulação impõe custos de natureza proprietária às empresas, o que desencoraja a atividade inovadora, especialmente entre as empresas menores. Também demonstramos que a regulação gera efeitos positivos de transbordamento de informações para outras empresas (como concorrentes, fornecedores e clientes), especialmente as maiores. Complementamos nossa análise com medidas alternativas de inovação, incluindo patentes, e corroboramos os resultados com uma análise das mudanças na divulgação decorrentes de uma reforma de fiscalização na Alemanha. Em suma, a regulamentação europeia de divulgação financeira possui efeitos agregados e distributivos sobre a inovação corporativa. Importante destacar que ela parece concentrar as atividades inovadoras em um número menor de empresas, principalmente as maiores, o que pode refletir características institucionais do contexto analisado ou forças econômicas mais amplas.