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09 dezembro 2024

Conflito de interesse no Itaú 2

Conforme era esperado, a CVM abriu processo administrativo para investigar as denúncias feitas pelo Itaú contra seu ex-diretor financeiro, Alexsandro Broedel, e o consultor, Eliseu Martins. 

Há pouco tempo, o Itau tinha demitido o diretor de marketing por uso irregular do cartão corporativo. Mas o caso agora parece ser mais grave, pois há uma petição formal por parte do Itaú e o envolvimento de Eliseu Martins, um dos maiores nomes da história da contabilidade do Brasil. 


No mercado, o preço da ação do Itau apresentou um pequeno aumento. Isso poderia ser um indicativo de que a reação do mercado foi favorável. Aqui um link bastante favorável ao Itaú.

Os valores envolvidos parecem ser significativamente baixos em comparação com o impacto gerado pela situação. É possível que a atitude do Itaú esteja relacionada a questões internas, possivelmente influenciadas pela saída de Broedel, o que acabou afetando Martins. Em outras palavras, essa postura pode refletir as decisões de alguns diretores da instituição. No entanto, essa é apenas uma hipótese.

Reabertura de Notre Dame


A catedral de Notre Dame foi reaberta depois de uma extensa restauração. Em 2019, um grande incêndio destruiu parte da igreja, um símbolo muito conhecido em todo o mundo. Na época, fizemos diversas postagens no blog comentando sobre o desafio contábil que um sinistro como esse representava para a contabilidade (aqui, aqui, aqui e também aqui).

Na restauração, um dilema básico é se reproduz exatamente a estrutura que existia antes do incêndio ou se constrói um novo templo, com todas as benesses que a modernidade proporciona. Geralmente a decisão é intermediária, tentando preservar as características que tornaram a catedral famosa, com materiais e técnicas próximos ao original de 1163, quando foi construída, mas aproveitando para incorporar algumas modernidades, como uma estrutura mais preparada para um incêndio. Há uma estimativa de 15 milhões de visitas no ano após a reabertura.

Coisas que aprendi em 2024

Uma tradição de final de ano que leio com atenção é a lista de 52 coisas que aprendi de Tom Whitwell. A lista começou em 2014, mas chama atenção para fatos curiosos. Se quiser conferir a lista completa de 2024 clique aqui, onde há o link para cada um dos fatos. Eis uma pequena amostra de alguns fatos:

  • Para destacar a evasão fiscal, a Coreia do Sul introduziu placas de carro neon verde feias para carros de empresa com valor superior a US$ 58.000. As vendas de carros de luxo caíram 27%.
  • No início dos anos 1980, em São Francisco, várias gangues que cortavam assentos operavam no sistema de transporte BART, gerando taxas extras e horas extras para reparos. Elas usavam padrões específicos de cortes para que as equipes de reparo soubessem quem pagar pelo favor.
  • Tabloid é uma linguagem de programação baseada em manchetes sensacionalistas: "Todo programa deve terminar com POR FAVOR, CURTA E ASSINE, porque você precisa crescer sua audiência."
  • Em 1800, 1 em cada 3 pessoas no mundo era chinesa. Hoje, é menos de 1 em cada 5.
  • Pessoas com sobrenomes começando por U, V, W, X, Y ou Z tendem a ter notas 0,6% mais baixas do que aquelas com sobrenomes de A a E. Sistemas modernos de gestão de aprendizado classificam trabalhos alfabeticamente antes da correção, então os últimos são avaliados por corretores cansados e irritados. Alguns professores invertem a ordem para Z a A, e os resultados se invertem.
  • O técnico do Arsenal, Mikel Arteta, contratou uma equipe de batedores de carteira profissionais para roubar telefones e carteiras de seus jogadores durante um jantar, para ensinar a importância de estar sempre alerta e preparado.
  • Nos anos 2020, mais de 16% dos filmes têm dois pontos no título (como Superman: Man of Steel), um aumento de quase 300% desde os anos 1990.
  • Entre os anos 1920 e 1950, milhões de "inimigos do povo" — frequentemente elites educadas — foram enviados a campos de prisioneiros na União Soviética. Hoje, as áreas ao redor desses campos são mais prósperas e produtivas do que áreas similares. 
  • Em 2024, cerca de 10% do PIB de Anguilla virá de taxas pelo domínio .ai. 

Mais dois países entram no clube das economias hiperinflacionárias

Da newsletter da EY: 


A Nigéria e o Egipto têm agora uma taxa de inflação acumulada de três anos superior a 100%. 

Os dados publicados pelos governos da Nigéria e do Egipto indicam que a taxa de inflação acumulada a três anos de cada país excedeu 100% em 31 de Agosto e 30 de Setembro, respectivamente.

A ASC 830, Foreign Currency Matters [norma do Fasb sobre o assunto], exige que uma entidade estrangeira em uma economia altamente inflacionária remensure suas demonstrações financeiras usando a moeda de relatório de sua controladora a partir do início do período de relatório, incluindo períodos de relatório intermediários, após o período em que a economia se torna altamente inflacionária. Uma economia é considerada altamente inflacionária quando tem uma taxa de inflação acumulada de aproximadamente 100% ou mais durante um período de três anos. (...)

A publicação mais recente publicada pelo Grupo de Trabalho de Práticas Internacionais (IPTF) após a sua reunião de maio de 2024 inclui dados para países que se previa atingirem taxas de inflação cumulativas a três anos superiores a 100% no ano em curso ou que deveriam ser monitorizados de outra forma. Espera-se que a IPTF emita uma publicação atualizada em dezembro. 

Foto: aqui

Complexidades das normas ambientais preocupa

As regulamentações de ESG (Ambiental, Social e Governança) estão evoluindo rapidamente no mundo todo, exigindo maior responsabilidade das empresas para monitorar e reportar seus impactos ambientais.  Eis aqui um exemplo de como haverá uma necessidade de harmonização nas normas que estão sendo emitidas nesse momento pelos reguladores:

No Reino Unido, a declaração das emissões de escopo 1 e 2 é obrigatória, enquanto o escopo 3, que abrange emissões indiretas na cadeia de suprimentos, é voluntário. Isso é um diferente na União Europeia (UE), da qual o Reino Unido fazia parte até recentemente, onde as regras são mais rígidas, como a CSRD (Diretiva de Relatórios de Sustentabilidade Corporativa), a CSDDD (Diretiva de Devida Diligência em Sustentabilidade Corporativa) e a EUDR (Regulamento Europeu de Desmatamento), que entrará em vigor em 2025. 

A EUDR exige que empresas europeias garantam que suas cadeias de suprimentos sejam livres de desmatamento e que os produtos estejam em conformidade com as legislações locais, abrangendo matérias-primas como café, cacau, óleo de palma e produtos derivados. A não conformidade pode resultar em multas de até 4% do faturamento e confisco de produtos.

Para atender a essas exigências, as empresas precisam realizar auditorias internas rigorosas e adotar softwares avançados de gestão de dados e análise de riscos. Contadores desempenham um papel central no cumprimento das normas, e plataformas automatizadas de ESG serão essenciais, especialmente diante da escassez de profissionais qualificados, um desafio crescente no Reino Unido.

Queijo Minas é Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade


Desde a última quarta-feira, o queijo Minas artesanal foi reconhecido pela Unesco como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. O produto é fabricado desde o século XVIII, mas somente em 2002 o processo de produção artesanal foi reconhecido no Brasil pelo Iepha como patrimônio imaterial brasileiro.

A diferença entre o queijo Minas e outros queijos artesanais brasileiros está na adição de um fermento natural, que confere ao produto seu aroma, sabor, odor e textura característicos.

Com o reconhecimento do queijo, o Brasil agora conta com sete patrimônios culturais imateriais reconhecidos internacionalmente: além do queijo, a arte Kusiwa – Pintura Corporal e Arte Gráfica Wajãpi (desde 2003), o Samba de Roda do Recôncavo Baiano (desde 2005), o Frevo (desde 2012), o Círio de Nossa Senhora de Nazaré (desde 2013), a Roda de Capoeira (desde 2014) e o Complexo Cultural do Bumba Meu Boi do Maranhão (desde 2019).

Como filho de um ex-fabricante de queijo, considero a notícia interessante. No entanto, confesso que desconheço os benefícios práticos de tal título, além de despertar uma curiosidade natural.

08 dezembro 2024

Conflito de Interesse no Itaú

O sábado de manhã surpreendeu o mercado financeiro e a comunidade contábil com a notícia de uma denúncia contra o ex-diretor financeiro do Itaú, Alexsandro Broedel. Para o Itaú, a questão envolve um possível conflito de interesse na atuação de Broedel, uma vez que ele autorizou a contratação do professor Eliseu Martins. Até aqui, nada de extraordinário, considerando que Eliseu, um dos maiores nomes da contabilidade brasileira, possui um currículo que justifica qualquer contrato. No entanto, o Itaú alega que Eliseu Martins tem uma relação societária com Broedel, o que violaria as normas internas do banco. Assim, surge a acusação de conflito de interesse.

Broedel deixou o Itaú em junho e irá assumir uma posição no Grupo Santander, na Espanha. A investigação teria começado após fornecedores denunciarem o ex-diretor. O Itaú comunicou os fatos à CVM e ao Banco Central, solicitando uma apuração, e contactou a sua empresa de auditoria para analisar os potenciais impactos nos resultados. Como os valores envolvidos são relativamente pequenos diante do tamanho da instituição, uma eventual republicação das demonstrações financeiras foi descartada.

De um lado, temos uma das maiores instituições financeiras do país, com presença em 21 países, 55 milhões de clientes, e operações em banco de varejo, corporativo, seguros e outros serviços. Do outro, dois profissionais de destaque na área contábil. Eliseu Martins dispensa apresentações: autor de livros, artigos e professor renomado, é considerado um dos principais nomes da contabilidade brasileira, ao lado de Sérgio de Iudícibus. Ambos foram fundamentais para a excelência da Universidade de São Paulo na área contábil. Eliseu já ocupou cargos importantes como diretor do Banco Central e da CVM. Por sua vez, Broedel construiu uma carreira notável, com doutorado pela USP e atuação na Fundação IFRS, além de sua posição de destaque no Itaú até recentemente.

Nos próximos dias, podemos esperar uma guerra de versões e acusações. Após a divulgação da denúncia pela imprensa, Broedel e Eliseu emitiram notas sobre o caso. A denúncia pode, inclusive, afetar a possibilidade de Broedel assumir o cargo no Santander, na Espanha.

Uma das críticas a Broedel é que, enquanto atuava como executivo do Itaú, ele teria emitido pareceres contábeis para outras empresas. Essa questão deve gerar um debate extenso, já que o banco possui um amplo leque de operações, o que pode gerar sobreposição entre seus negócios e os pareceres realizados por Broedel. Isso, de fato, pode configurar um conflito de interesse incomum para um executivo.

Por outro lado, a defesa dos denunciados argumenta que Eliseu prestava serviços ao Itaú há décadas e que os pagamentos estavam, aparentemente, de acordo com as normas da instituição. A alegação de que Broedel teria uma sociedade com Eliseu pode ser facilmente confirmada ou descartada com base nos registros documentais preenchidos por Broedel no passado. Outra acusação é de que o banco contratou 40 pareceres, recebeu 36 e encontrou apenas 20 deles. Eliseu Martins alega que alguns pareceres foram entregues de forma oral. Este ponto será analisado pela justiça, que deverá decidir sua validade. Embora a justificativa de Eliseu pareça plausível, ela pode não ser considerada adequada legalmente.

Há algo peculiar na postura do Itaú. Sabe-se que os valores envolvidos são pouco materiais, mas divulgar o caso pode comprometer a credibilidade da governança da instituição. O esperado seria que a entidade conduzisse uma investigação interna, adotasse as medidas cabíveis e mantivesse a situação sob discrição. Contudo, em vez disso, o banco protocolou uma ação na justiça e comunicou o caso aos reguladores, gerando maior repercussão.

Em meio a essa controvérsia, o caso levanta questões importantes sobre governança corporativa, ética profissional e os limites das relações entre executivos e fornecedores. Independentemente do desfecho, ele serve como um alerta para a necessidade de maior transparência e rigor nos processos internos das organizações, especialmente em grandes instituições financeiras como o Itaú. Cabe agora à justiça e aos órgãos reguladores conduzirem uma investigação imparcial, garantindo que os fatos sejam devidamente esclarecidos e que eventuais responsabilidades sejam atribuídas de forma justa e adequada.