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25 agosto 2008

Clubes e Contabilidade 2

Investimentos
Perda do passe estimulou criatividade dos clubes
28/07/2008
Valor Econômico

Parece difícil, mas a situação dos clubes de futebol é ainda pior do que sugerem os principais números que vieram a público nos últimos anos, depois que as entidades desportivas profissionais passaram a ser obrigadas a divulgar as demonstrações financeiras. O fato é que os clubes lançaram mão dos mais variados artifícios para cobrir o rombo aberto nos balanços com o fim da famigerada "Lei do Passe", derrubada em 1998 pela "Lei Pelé". Perder o direito sobre os atletas foi um baque e tanto para entidades que já estavam em dificuldades e, em muitos casos, tinham sérios problemas de gestão.
Some-se a isso o constrangimento de publicar os números pelos padrões da Lei das Sociedades por Ações, uma exigência da nova lei, que pretendia equiparar clubes a empresas.
A solução foi buscar formas de preencher as lacunas - e as alternativas encontradas vão das mais conservadoras às mais ousadas.
A equiparação de debêntures (um título de renda fixa) a ações pelos ex-administradores do Vasco da Gama é um caso a ser estudado pelas escolas de contabilidade e é de longe a solução mais criativa. De forma geral, os clubes foram mais conservadores, usando brechas da própria lei societária. Empresas em dificuldades adoravam fazer "reserva de reavaliação", um "lifting" contábil que eleva o patrimônio e dá aparência mais saudável a contas raquíticas.
Alvo de sérias críticas dos acadêmicos, o artifício foi extinto no fim de 2007, na reforma da Lei das S.A. Um estudo feito pelo Valor com as demonstrações financeiras de 2007 de 25 clubes brasileiros mostra que 20 deles traziam essas reservas, num total de R$ 1,6 bilhão. O patrimônio líquido somado desses clubes era de R$ 636,2 milhões - não é preciso ser contador para saber que há mais "reservas" do que patrimônio nessa história.
O problema da reavaliação de ativos (como terrenos e estádios de futebol) é que ela mina a estrutura do balanço - o custo histórico - atualizando o valor dos bens. Há ainda o problema da qualificação de quem faz o trabalho, os critérios adotados e a curiosa tendência de o valor sempre ser para mais. Os contadores brincam que nunca viram reavaliação reduzir os ativos.
Flamengo e Fluminense têm reavaliações respeitáveis - R$ 197,6 milhões e R$ 264,8 milhões, respectivamente -, o que, no caso do clube da Gávea, não impediu que o patrimônio ficasse negativo (passivos maiores que os ativos). O tricolor, com R$ 22 milhões no patrimônio (apesar de ter a maior reavaliação da amostra), não está longe disso, já que os prejuízos também pesam na conta. E de prejuízo os clubes cariocas entendem: foram R$ 211,7 milhões em 2007, 70% do total registrado pelos 25 clubes avaliados pelo Valor. O Fluminense representa 45%. O que fazer diante do que parece ser inevitável? O Fluminense planeja reduzir as dívidas trabalhista, cível e bancária. No final de 2007, as dívidas do clube, entre curto e longo prazo, somavam R$ 288 milhões, segundo cálculos de Humberto Palma, superintendente de planejamento e controle.
A dívida trabalhista é a maior e a que mais preocupa. Soma R$ 89,5 milhões, entre curto e longo prazos e provisões. Em abril, o Fluminense foi excluído do chamado ato trabalhista, um acordo pelo qual se organizou uma fila de credores na Justiça. O acordo definia que um percentual das receitas do clube iria diretamente para o Judiciário para pagar os credores, evitando penhoras judiciais. Ao ser excluído, o clube ficou com uma dívida de R$ 40 milhões em execução."Chamamos os credores e estamos fazendo acordos com cada um", diz Palma. No dia 18 de julho, ele contabilizava 30 acordos homologados e outros 20 acordos informais. Outra frente aberta pelo clube refere-se à dívida tributária. Palma afirma que o clube assinou uma confissão de dívida, o que lhe permitiu ingressar na Timemania, programa do governo para que os clubes paguem as dívidas em atraso. No balanço de 2007, o Fluminense declara como exigível a longo prazo, dentro passivo, R$ 114,6 milhões com a Timemania. Palma reconhece que as provisões para contingências fiscais, cíveis e trabalhistas, de R$ 70 milhões, tiveram impacto negativo no balanço de 2007. Segundo ele, o clube também está buscando alongar o perfil da dívida bancária, hoje com vencimento médio entre 120 e 180 dias, para um prazo de dois a três anos. O clube ainda quer aumentar o peso da bilheteria, marketing e venda de jogadores na receita. Hoje 50% da receita vêm das transmissões dos jogos. Os clubes do futebol profissional do Rio têm pouca receita com sócios, e o campeonato estadual é deficitário. Entre janeiro e abril, a receita dos clubes tende a cair em função da redução de bilheteria.
O balanço do Flamengo, em 2007, mostra uma dívida de R$ 295 milhões. O clube teve receita de R$ 89,4 milhões e um déficit de R$ 59,2 milhões. Luiz Gomes Martins Junior, superintendente de finanças, disse que o clube vem reconhecendo as dívidas no balanço. Para 2008, a previsão é faturar R$ 100 milhões, número que poderá chegar a R$ 150 milhões em 2009, diz Martins. A receita subirá, segundo ele, com venda de jogadores e renovação de patrocínios.
O Valor procurou o Botafogo, mas o presidente do clube, Bebeto de Freitas, não quis falar sobre a situação financeira do clube.

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