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17 maio 2025

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Solomons


Solomons, David (1912–1995)

David Solomons foi autor de importantes artigos e livros sobre teoria contábil, definição de normas, contabilidade gerencial e educação contábil, sendo também um consultor muito requisitado por institutos profissionais de contabilidade e órgãos normativos.

Solomons é talvez mais conhecido por ter escrito a primeira grande exposição do conceito de "valor para o proprietário" dentro da contabilidade a valor corrente, por ter previsto o declínio do conceito de lucro nas determinações contábeis, por ter atuado como redator principal do Relatório Wheat, que levou à criação do Financial Accounting Standards Board (FASB), por ter redigido a segunda declaração conceitual do FASB sobre características qualitativas da informação contábil e por defender a neutralidade como atributo indispensável para a definição responsável de normas.

Solomons obteve seu diploma de Bachelor of Commerce pela Universidade de Londres em 1932, tendo estudado na London School of Economics (LSE). Tornou-se contador público (chartered accountant) em 1936 e trabalhou em um escritório em Londres até 1939, quando, com o início da guerra, alistou-se como soldado raso no Exército Real e foi promovido no ano seguinte. Durante a guerra, passou quase três anos em campos de prisioneiros na Itália e na Alemanha, onde ensinou contabilidade a seus companheiros de cativeiro.

Em 1946, tornou-se professor de contabilidade na LSE, onde foi fortemente influenciado por Ronald S. Edwards, economista industrial que havia publicado vários artigos importantes sobre história dos custos e teoria contábil na revista Accountant durante a década de 1930. Em 1955, Solomons tornou-se o primeiro professor de contabilidade da Universidade de Bristol e, em 1959, atravessou o Atlântico para assumir uma cátedra na Wharton School da Universidade da Pensilvânia. Obteve o título de Doutor em Ciências pela Universidade de Londres em 1966 e, em 1974, foi nomeado o primeiro Arthur Young Professor na Wharton School. Aposentou-se da universidade em 1983.

Solomons presidiu associações acadêmicas de contabilidade em dois países: em 1958, foi presidente da Association of University Teachers of Accounting (mais tarde renomeada como British Accounting Association), e entre 1977 e 1978 foi presidente da American Accounting Association (AAA). Em 1980, a AAA selecionou Solomons como Educador Contábil Excepcional, e em 1989 o Institute of Chartered Accountants in England and Wales (Instituto Inglês) concedeu-lhe seu Prêmio Internacional. Em 1992, ele foi incluído no Accounting Hall of Fame (Hall da Fama da Contabilidade).

O primeiro artigo importante de Solomons, publicado em 1952, tratava da história da contabilidade de custos. Ele revisou o famoso ensaio de 1950 de Sidney Alexander, professor de economia em Harvard, intitulado "Income Measurement in a Dynamic Economy", após o qual Solomons concluiu, com pesar, em 1961, no artigo "Economic and Accounting Concepts of Income", que não era operacionalmente viável isolar mudanças nas expectativas do conceito de “renda econômica” de Alexander, o que diminuía sua utilidade como medida satisfatória de desempenho empresarial.

Foi nesse artigo de 1961 que Solomons fez sua famosa previsão: “no que diz respeito à história da contabilidade, os próximos vinte e cinco anos poderão ser vistos, posteriormente, como o crepúsculo da mensuração do lucro.” Em 1987, ele reconheceu que sua previsão não se concretizou, e que talvez sua vocação não fosse a de vidente.

Em 1966, Solomons publicou um importante ensaio, "Economic and Accounting Concepts of Cost and Value", sobre a formulação do “valor para o proprietário” de James C. Bonbright, professor de Finanças da Universidade de Columbia, no qual abordava a valoração de ativos. Ele deu impulso a esse conceito nos debates sobre contabilidade a valor corrente, expressando-o em notação de desigualdade. Direta ou indiretamente, esse trabalho influenciou o Comitê Sandilands, no Reino Unido, e o FASB, nos Estados Unidos, em suas deliberações sobre contabilidade em contextos de inflação.

Em 1965, David Solomons escreveu seu primeiro livro, Divisional Performance: Measurement and Control, no qual relatou uma pesquisa com 25 grandes empresas e apresentou recomendações sobre as melhores formas de avaliar e controlar operações descentralizadas. Foi um estudo pioneiro, que lhe rendeu, em 1969, o prêmio Notable Contribution to the Literature Award do American Institute of Certified Public Accountants (AICPA).

Solomons presidiu um comitê formado em 1970 pela American Accounting Association (AAA) com o objetivo de propor um processo mais eficaz para o estabelecimento dos "princípios contábeis geralmente aceitos", diante da ampla decepção com o desempenho do Accounting Principles Board. Após a publicação do relatório do comitê em 1971, ele foi nomeado para integrar o Wheat Study do AICPA, cujas recomendações de 1972 levaram, em 1973, à criação do Financial Accounting Standards Board (FASB). Solomons redigiu o primeiro rascunho do relatório.

Ele também redigiu a declaração de conceitos do FASB sobre as características qualitativas da informação contábil (1980) e prestou consultoria a um comitê especial do AICPA sobre a estrutura e a autoridade do que viria a se tornar o Auditing Standards Board. Em 1989, a pedido do Research Board do Instituto Inglês, elaborou um quadro conceitual conciso para consideração do Accounting Standards Committee do Reino Unido, que publicou naquele ano as Guidelines for Financial Reporting Standards.

Em 1986, ele sintetizou suas ideias sobre definição de normas e o quadro conceitual no livro Making Accounting Policy: The Quest for Credibility in Financial Reporting, uma obra exemplar em termos de rigor, erudição cuidadosa e redação persuasiva. No campo da educação contábil, Solomons foi convidado pelos seis órgãos de contabilidade das Ilhas Britânicas a realizar um importante estudo de longo prazo sobre educação e formação contábil, que concluiu em 1974 com o título Prospectus for a Profession.

Solomons deixou uma marca importante e salutar tanto na literatura contábil quanto nas deliberações de política dos institutos profissionais de contabilidade e dos órgãos de definição de normas.

— Stephen A. Zeff - The History of Accounting

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Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Fiori


Flori, Ludovico (1579–1647)

Em 1633, Ludovico Flori, um jesuíta de Palermo, publicou o segundo manual impresso sobre contabilidade monástica. Trattato del Modo di Tenere il Libro Doppio Domestico derivava seus procedimentos contábeis básicos e grande parte de sua exposição do Indrizzo Degli Economi (1586), do beneditino Dom Angelo Pietra. Ambos os autores descreveram um sistema surpreendentemente semelhante à contabilidade moderna. Ambos acreditavam que as contas monásticas poderiam ser melhor analisadas, não pela inspeção do razão, como faria um comerciante, mas sim por meio do exame de demonstrações financeiras separadas.

Flori foi o primeiro autor a insistir que as transações fossem alocadas aos seus devidos períodos fiscais. Isso exigia uma distinção clara entre receitas do ano corrente e lucros e perdas de períodos anteriores, que deveriam ser encerrados diretamente no capital. Flori contabilizava separadamente os ativos de longo prazo e os de curto prazo; descreveu e ilustrou lançamentos contábeis compostos; e discutiu as vantagens de prever receitas e despesas. Contas de compensação (suspense accounts) aparecem pela primeira vez em seu texto.

Assim como Pietra, Flori defendia o encerramento anual do razão, mas utilizava uma conta de balanço, não apenas para comprovar a exatidão do razão, mas também para facilitar seu encerramento e reabertura. Edward Peragallo e Federigo Melis consideram a obra de Flori a melhor exposição da contabilidade italiana anterior a 1800.

Michael Chatfield - The History of Accounting. Leia também aqui

Contadores dos Medici

Contabilidade dos Médici

O Banco Médici foi fundado em 1397 e durou quase 100 anos, embora tenha operado apenas na Europa Ocidental e nunca tenha se tornado tão grande quanto as casas bancárias Bardi ou Peruzzi. Os Médici utilizavam a contabilidade por partidas dobradas para avaliação de crédito, gestão e controle, auditoria e até para o cálculo de impostos sobre a renda. Todos os anos, em 24 de março, os livros das filiais bancárias eram encerrados e cópias de seus balanços patrimoniais eram enviadas para a sede em Florença.

Esses balanços listavam separadamente o valor devido por cada cliente, de modo que, às vezes, os demonstrativos continham mais de 200 itens de linha. Como as dívidas incobráveis eram a principal ameaça à solvência de um banqueiro medieval, a auditoria feita pelo gerente-geral e seus assistentes envolvia a análise da conta de cada devedor para verificar se não havia sido concedido crédito excessivo e para identificar contas duvidosas ou vencidas. Uma auditoria completa também exigia a presença dos gerentes das filiais. Eles eram convocados a Florença uma vez por ano, se residissem na Itália, e pelo menos a cada dois anos, se vivessem no exterior.

A fraqueza desse sistema de auditoria interna era que as filiais não eram regularmente visitadas por auditores itinerantes. O banco sofreu grandes perdas devido a gerentes de filiais descontrolados e insubordinados, além de uma falta geral de coordenação. Nem mesmo o seu poder, como banqueiro papal, de obter a excomunhão de quem não pagasse receitas da Igreja, foi capaz de salvar o Banco Médici, que faliu em 1494.

A contabilidade de custos industriais, assim como a contabilidade por partidas dobradas, teve origem na Itália renascentista. Durante os séculos XV e XVI, as sociedades industriais dos Médici controlavam duas oficinas de lã e uma fábrica de seda em Florença. Os fabricantes têxteis dos Médici compravam lã bruta e vendiam o tecido acabado, que havia sido produzido por artesãos em suas próprias casas. Como cada fase da produção era realizada por uma guilda diferente, cada etapa do processo de conversão precisava ser registrada em um livro de memorandos separado, que mostrava a quantidade de tecido entregue por cada trabalhador e os salários pagos ou devidos.

Uma conta de compensação, chamada “tecido fabricado e vendido”, combinava o custo de cada lote de material com a receita de sua venda, apresentando, ao final, o lucro obtido com todo o tecido vendido durante o período operacional. Como a manufatura era feita por trabalhadores externos que possuíam suas próprias ferramentas, os custos indiretos (overhead) eram ignorados no cálculo dos preços de venda.

Os comerciantes italianos do sistema de produção descentralizada (putting-out system) talvez não tenham sido os primeiros a usar a contabilidade de custos para racionalizar a produção, mas, em sua época, não tinham rivais. Eles podiam, por exemplo, importar lã bruta da Inglaterra, manufaturá-la e enviar os tecidos acabados de volta para vender na Inglaterra por preços inferiores aos dos produtores locais.

Do verbete The History of Accounting

Não há um nome específico de um profissional contábil responsável pela contabilidade dos Médici. 

Grandes nomes da história mundial da contabilidade: Eugène Léautey


Eugène Léautey (1845–1909) foi um teórico francês da contabilidade de grande influência na transição entre os séculos XIX e XX. Reconhecido por sua abordagem crítica, minuciosa e comprometida com o rigor técnico, destacou-se pela busca de uma doutrina contábil racional, moderna e sistematizada. 

Antes de sua obra mais conhecida, La science des comptes mise à la portée de tous (1889), escrita com Adolphe Guilbault, Léautey publicou dois livros fundamentais:

"Questions actuelles de comptabilité et d'enseignement commercial" (1881), uma crítica feroz à precariedade do ensino comercial francês e à falta de preparo dos professores de contabilidade, propondo sua sistematização e o uso pedagógico da prática profissional.

"L’enseignement commercial et les écoles de commerce en France et dans le monde entier" (1886), um extenso estudo comparativo sobre escolas comerciais, com destaque para a excelência do modelo americano e o exotismo das instituições russas, defendendo um currículo técnico estruturado e um sistema de certificações para a profissão contábil.

Léautey propôs a criação de três níveis profissionais: tenedor de livros, contador e perito-contador, sob supervisão de uma câmara nacional de experts. Ele também criticou duramente a contabilidade pública francesa, defendendo a adoção de balanços estatais anuais — como já fazia a Itália — e apontou as falhas da legislação contábil do Código de Comércio de 1807.

Ao longo da vida, escreveu obras que se tornaram referência, como Principes généraux de comptabilité (1895) e Le rôle social de la comptabilité et des comptables (1904). 

Baseado em Jean-Guy Degos, Les premiers travaux d’Eugène Léautey, théoricien comptable à la charnière du 19è et du 20è siècle

16 maio 2025

Capítulo final (?) na disputa J&F e Paper Excellence

A disputa entre a JeF Investimentos e a Paper Excellence pelo controle da Eldorado Brasil Celulose, que se estendia desde 2018, chegou ao fim ontem [15 de maio de 2025]. A JeF, holding dos irmãos Batista, anunciou o pagamento à vista de R$ 15 bilhões para adquirir a participação de 49,41% da Paper Excellence na Eldorado. 

A controvérsia teve início em 2017, quando a JeF vendeu 49,41% da Eldorado para a Paper Excellence por US$ 1,1 bilhão, com o compromisso de transferir o controle total após 12 meses. Entretanto, divergências sobre o cumprimento das condições contratuais levaram a uma série de litígios judiciais e arbitrais no Brasil e no exterior, incluindo uma arbitragem na Câmara de Comércio Internacional em Paris, na qual a Paper Excellence buscava uma indenização de US$ 3 bilhões. Pelo valor acertado agora, parece que as demandas da Paper Excellence foram atendidas. 

A disputa envolveu cerca de uma centena de advogados e figuras importantes da República, como o então advogado Cristiano Zanin, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente Michel Temer, o ministro Ricardo Lewandowski e a advogada Roberta Rangel, esposa do ministro do STF Dias Toffoli. A Paper Excellence estimou ter gasto aproximadamente R\$ 300 milhões em honorários advocatícios durante o processo.

Com a aquisição da totalidade das ações, a JeF encerra uma das maiores disputas corporativas do país e assume o controle da Eldorado Brasil Celulose.

O desafio de mensurar um objeto histórico


Eis o texto original:

Uma rara cópia original da Magna Carta de 1300 foi identificada nos arquivos da Faculdade de Direito de Harvard. Comprada em 1946 por apenas 27,50 dólares (equivalente a cerca de 477 dólares atualmente), ela foi arquivada incorretamente por décadas e durante muito tempo foi considerada apenas uma réplica. Agora, confirma-se que o pergaminho de pele de carneiro é um dos apenas sete exemplares originais ainda existentes, emitidos pelo rei Eduardo I naquele ano.

Historiadores britânicos descobriram sua importância após encontrarem uma imagem digital em alta resolução na internet. Em seguida, usaram luz ultravioleta e imagem espectral para comparar os textos físicos e verificar sua autenticidade. Eles acreditam que o documento foi enviado originalmente para o distrito parlamentar de Appleby-in-Westmorland, na Inglaterra, e mais tarde adquirido por livreiros de Londres de um herói de guerra da Força Aérea Real, antes de ser vendido para Harvard.

Assinada pela primeira vez em 1215 pelo rei João, a Magna Carta estabeleceu o princípio de que ninguém — nem mesmo um monarca — está acima da lei. A versão de 1300, conhecida como Confirmação das Cartas, reafirmou esses direitos e ajudou a lançar as bases do direito constitucional, incluindo a Constituição dos Estados Unidos.

(Da newsletter 1440). Imagem aqui

Veja a dificuldade de mensuração de um ativo histórico. Em sua origem, o custo histórico de 27,50 dólares poderia hoje equivaler a apenas 477 dólares, se corrigido monetariamente — cerca de 17 vezes o valor original. No entanto, o que o torna um objeto historicamente valioso são suas características. O fato de ter sido considerado uma réplica levou o documento a ser tratado, durante décadas, como um ativo de baixo valor. A descoberta de que o documento não apenas era original, mas também raro, tornou o processo de mensuração de seu valor muito mais complexo.

Do ponto de vista contábil, esse caso evidencia os limites do custo histórico como base de mensuração. Afinal, o exemplo mostra como a contabilidade tradicional pode não refletir a relevância histórica, cultural ou de mercado de um ativo. Mesmo o valor justo pode ser difícil de determinar em situações de raridade extrema e ausência de transações comparáveis. Isso levanta discussões sobre a utilidade das informações contábeis nesse tipo de contexto.


Nudges em aula de matemática


Um estudo de larga escala conduzido por pesquisadores de diversas instituições investigou se "nudges" comportamentais — lembretes enviados por e-mail — poderiam melhorar o desempenho em matemática de alunos do ensino fundamental nos Estados Unidos. A pesquisa envolveu cerca de 140.000 professores e 3 milhões de estudantes que utilizam a plataforma online Zearn Math.

Foram testados 15 tipos diferentes de mensagens semanais enviadas aos professores, com o objetivo de incentivá-los a engajar mais ativamente seus alunos nas atividades matemáticas. O nudge mais eficaz resultou em um aumento de 5,1% no progresso dos alunos, mas, após ajustes estatísticos, esse impacto foi estimado em 3,3%. Em média, os alunos cujos professores receberam os nudges completaram 1,81 lições durante o período de quatro semanas, em comparação com 1,78 lições completadas por alunos cujos professores receberam lembretes mais genéricos.

Apesar de estatisticamente significativos, os efeitos dos nudges foram modestos e menores do que o esperado pelos pesquisadores. Ou seja, os empurrões podem não ser suficientes para melhorar substancialmente o desempenho em matemática dos alunos.

Via aqui