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02 janeiro 2013

Tripé: contabilidade, auditoria e transparência

No mundo inteiro dos negócios, o tripé contabilidade, auditoria e transparência promove retidão e mais qualidade de vida. Elenco abaixo algumas das principais travas para o desenvolvimento sustentado do Brasil decorrentes da falta de prestação de contas via contabilidade e a falta de auditoria independente no país. Não há democracia e retidão, de fato, quando abrimos mão no Brasil de prestação de contas entendíveis e de transparência via contabilidade para todas as entidades privadas, públicas e governamentais.

A Receita Federal do Brasil tem dispensado, desde 1995, a apresentação de prestação de contas via contabilidade para empresas com receitas anuais até R$ 48 milhões. Criou uma alternativa supersimples de apuração denominado regime de lucro presumido (atualmente, cerca de um milhão de empresas) e para empresas no regime simples (cerca de quatro milhões de empresas) com receitas anuais até R$ 3,6 milhões. A base de tributação é o valor das receitas declaradas (dispensando prestação de contas entendíveis via contabilidade). Dentro do bom senso deveria ter sido revogada antes de 2000.

Em vez de haver moções da sociedade brasileira e das entidades contábeis de forma unificada para acabar com a anomalia denominada de apuração de lucro pelo regime presumido (que dispensa contabilidade), existem ações no Congresso Nacional para elevar o limite atual de R$ 48 milhões para R$ 79,2 milhões.

Qual é a lógica de recolher imposto de renda e contribuição social de lucro líquido com base em receitas?

A anomalia de prestação de contas é estendida para o Sped (Serviço Público de Escrituração Digital). Todas as empresas que adotam o regime de apuração do lucro presumido não estão, hoje, obrigadas a submeter os informes contábeis de suas atividades para a Receita Federal. Com o eventual aumento do limite, mais empresas ficarão dispensadas de prestar contas via Sped contábil. Segundo se noticia, muitas empresas, desde 1995, abandonaram a contabilidade. O reporte para a Receita Federal só com base em rendas declaradas precisa ser abolido de forma gradual e programada, acompanhada de processos educativos. Atualmente, apenas cerca de 200 mil empresas fazem declaração anual de imposto de renda com base no lucro real e encaminham tempestivamente para a Receita Federal todos os informes do Sped contábil - devidamente parametrizado com o plano contábil prescrito pela mesma.

O problema é que o Sped contábil, com todas as simplificações, está distanciado das normas contábeis brasileiras e internacionais de prestação de contas. Prestação de contas contábeis e de transparência entendível é praticado por todas as empresas no resto do mundo. Qual é a lógica de recolher imposto de renda e contribuição social de lucro líquido com base em receitas? Se a Receita Federal mantiver a anomalia, seria o caso de mudar o imposto de renda e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para um nome mais correto: impostos sobre receitas declaradas?

Na maioria dos países, a auditoria independente de prestação de contas anual é obrigatória, excluindo as microempresas. Exemplos de países com auditoria obrigatória: Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Bélgica, Bolívia, Canadá, Colômbia, Dinamarca, Egito, Equador, El Salvador, Espanha, Filipinas, Finlândia, França, Guatemala, Grã-Bretanha, Grécia, Holanda, Índia, Japão, México, Noruega, Nova Zelândia, Portugal, Singapura, Suécia, Suíça e Tailândia. Nos Estados Unidos, as companhias abertas não são obrigadas a ter auditoria independente. Todavia, é bastante comum que o façam por exigências de acionistas, credores, instituições financeiras ou outros agentes.
Aqui no Brasil, a obrigatoriedade somente existe para as companhias abertas, sistema financeiro nacional, de seguros, planos de saúde, empresas de grande porte e entidades filantrópicas com receitas anuais acima de R$ 3,6 milhões. Somos um dos países menos auditados do mundo.
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Segundo a organização World Audit, os dez países com melhor nível de retidão são Nova Zelândia, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Singapura, Holanda, Suíça, Austrália e Canadá. O Brasil situa-se em 54º lugar. Na pesquisa da entidade Transparência Internacional, o Brasil ocupa a 73ª posição entre 200 países, muitos nem ranqueados por falta de informações.

Em termos de retidão, estamos mal na fotografia. Existe uma correlação direta entre a qualidade de prestação de contas e de auditoria obrigatória. Quanto mais, melhor é a percepção de retidão. É interessante também notar que, onde há mais retidão, há muita qualidade de vida. Não é isto que queremos?

É necessário destacar que todos ou a maioria dos profissionais ligados às entidades profissionais estão de acordo com os pleitos acima, e que muitos dirigentes das entidades defendem com entusiasmo tais melhorias.

Se prestação de contas via contabilidade com mais auditoria independente e transparência na prestação dessas contas promove retidão e qualidade de vida, o que estamos esperando? A contabilidade, quando bem feita, atendendo as novas normas contábeis em vigor no Brasil com reconhecimento universal, é extremamente necessária para todos os empresários, o governo e a sociedade em geral. Não podemos abrir mão de prestação de contas com qualidade.

Charles B. Holland é contador, empresário, diretor executivo da Anefac e da Holland Consulting. Ex-diretor nacional e regional do Ibracon e ex- conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade de São Paulo.

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