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15 junho 2012

Normas Contábeis do Setor Público e a Crise Financeira

A adoção de normas internacionais de contabilidade para o setor público está vinculada a crise financeira ocorrida em diversos países a partir de 2007. Os desdobramentos da crise tem mostrado a dificuldade de implantação destas normas, já que a contabilidade do setor público de diferentes países tem sido manipulada. Um governo que deseja apresentar um superávit nas suas contas pode usar artifícios contábeis. Assim, os governos podem vender ativos ou captar empréstimos ou adiar gastos inevitáveis. Na atual contabilidade pública de diferentes países isto não é adequadamente demonstrado. Entretanto, se fosse utilizado à contabilidade pelo regime de competência, a postergação de gastos inevitáveis, por exemplo, irá gerar um passivo para as contas do governo. Irwin (2012) apresenta um resumo das consequências da manipulação no setor público

Assim, se o governo decide corta gasto hoje, isto criaria um passivo na contabilidade pelo regime de competência, correspondendo ao quadrante de “gasto diferido” da figura. Ou seja, no futuro (mais tarde) isto corresponderá a gastos que terão que ser realizados. Aumentar a receita hoje, através de impostos, irá provocar redução de investimento na economia, tendo como consequência uma redução futura da receita (quadrante de “desinvestimento” na figura).

Segundo Cotterill, a entidade que cuida da estatística na Comunidade Européia (Eurostat) denomina esta manipulação de “stock-flow adjustments” (SFA), onde os governos fazem transações sem afetar (ou afetando positivamente) o déficit. O campeão de SFA em 2011 foi Portugal, mas outros governos com problemas econômicos também usaram estes ajustes, como Chipre, Grécia, Irlanda e Hungria.

Na realidade, não existe coincidência entre a manipulação contábil e o fato de alguns destes países estarem em crise. O gráfico abaixo, extraído de Irwin, mostra isto claramente. De um lado, os juros cobrados em 2011e de outro a média da influência da manipulação sobre o tamanho da economia, no período de 1993 a 2003. Grécia, Itália e Portugal estão praticando manipulações na contabilidade pública há anos e o resultado está no risco da dívida externa.


Cotterill, em outro artigo, mostra um exemplo bastante didático, reproduzido na figura a seguir

Trata-se do balanço patrimonial do Reino Unido. Nas estatísticas oficiais, a dívida pública corresponde a 67,3% do PIB. No balanço patrimonial do Reino Unido, calculado segundo as normas do IPSASB, tem-se um passivo de 2 421 bilhões de libras esterlinas. Convertendo para dólares (taxa de 0,6442) isto corresponde a 3,76 trilhões de dólares. Como o PIB é de 2,46 trilhões, estimados para 2012, isto corresponde a 153% do PIB, um número bastante divergente dos 67,3% apresentados anteriormente.

Leia mais
IRWIN, Timothy. Accounting Devices and Fiscal Illusions. IMF Staff Discussion Note, março de 2012.
COTTERILL, Joseph. Sovereign debt stats in the stocks. Financial Times, 23 abr 2012
COTTERILL, Joseph. Acrruing better sovereign credit. Financial Times, 29 maio 2012

HM Treasury. Whole of GovernmentAccounts. 2010 

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