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16 outubro 2006

Hacker é risco de Cliente

Decisões mostram que risco de hacker é do cliente do banco


O cliente de um grande banco acessa sua conta pelo seu computador pessoal e identifica uma transferência de R$ 50 mil não autorizada por ele. O banco se exime da responsabilidade, alegando que a transferência foi feita com o uso do login e senha do cliente, e o caso vai parar na Justiça. Pela jurisprudência do Judiciário brasileiro, cabe ao banco provar que o cliente fez a transferência, certo? Errado. A tendência dos juízes hoje tem sido a de, diante da prova feita pelo banco de que seu sistema de segurança é eficiente, exigir que o próprio cliente comprove que utilizou todas as medidas de segurança possíveis - como a atualização de antivírus - para evitar a ocorrência de fraudes virtuais em sua máquina pessoal. Se o acesso for feito de um cibercafé, por exemplo, a chance de o cliente perder a ação é grande.

De acordo com o advogado especialista em direito digital Renato Opice Blum, presidente do conselho de comércio eletrônico da Fecomercio, trata-se de uma nova interpretação do Código de Defesa do Consumidor que vem ganhando espaço nos Tribunais de Justiça (TJs) - há decisões no Paraná, no Distrito Federal e no Maranhão - e no próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo a recente jurisprudência, os bancos não podem fazer prova negativa contra eles. Em outros tribunais, ainda persiste o entendimento tradicional de que o cliente é parte hipossuficiente na relação com o banco e que, por isso, cabe a este último o ônus da prova - como estabelece o Código do Consumidor.

No caso descrito acima, o juiz de primeira instância da Justiça paulista determinou uma perícia no sistema de segurança do banco e concluiu que não havia prova de negligência da instituição - negando a indenização ao cliente, que está recorrendo da decisão no TJSP.

O caso é um exemplo da jurisprudência que vem sendo formada pelos diferentes níveis da Justiça brasileira com relação a temas que envolvem a internet. Segundo uma pesquisa feita pelo conselho de comércio eletrônico da Fecomercio, há hoje 3.214 decisões judiciais de tribunais superiores que tratam de assuntos relacionados à internet no país - incluindo o STJ, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST). Nos TJs, as decisões já somam 5.146, e nos Tribunais Regionais Federais (TRFs), são 716. A pesquisa foi realizada com a busca da palavra-chave "internet" nos tribunais em que há decisões disponíveis na própria rede - todos os TRFs, os superiores e 21 TJs.

Segundo a opinião de especialistas em direito digital, os temas mais recorrentes no Judiciário são os relacionados a fraudes virtuais, comércio eletrônico, uso indevido de imagens, calúnia, injúria e difamação e concorrência desleal - como a divulgação pela internet de dados confidenciais de empresas. Em todos eles, há divergência de decisões judiciais. Os casos envolvendo comércio eletrônico são dos mais recorrentes. Nas ações, a discussão principal é se a responsabilidade pela indenização do cliente que comprou um produto não recebeu, por exemplo, atinge também o portal que intermediou o negócio, além da empresa que vendeu. O advogado André de Almeida, sócio do escritório Almeida Advogados e coordenador do comitê jurídico da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico, defende um portal que agencia serviços para empresas e que freqüentemente é acionado na Justiça em ações que pedem sua responsabilização por falhas nos serviços adquiridos. "Há decisões o condenando e decisões o inocentando", diz.

A jurisprudência que vem sendo formada pelos tribunais brasileiros é importante pela ausência de legislação que regule os temas da internet hoje. Embora existam cerca de 150 projetos de lei que tratam da rede em tramitação no Congresso Nacional hoje, poucas são as legislações já existentes ou adaptadas para o mundo virtual. Sem legislação, os juízes, ao se depararem com esses temas, acabam julgando de forma divergente nas diversas regiões do país. "As decisões são conflitantes porque quando há um vazio na legislação a Justiça usa de interpretações por analogia, o que é muito subjetivo, cria divergências e provoca insegurança jurídica", diz André de Almeida.

As decisões são divergentes também porque há questões complicadas a serem analisadas pelos juízes no que se refere à internet. Tome-se como exemplo um caso de furto de dados. "A doutrina define furto quando, para subtrair algo, é preciso tornar algo indisponível", diz a advogada especialista em direito digital Patrícia Peck, do escritório Patrícia Peck Pinheiro Advogados. Mas, no caso de furto de bancos de dados de empresas, não é o que acontece. "Na internet se leva mas deixa", afirma. Segundo ela, em casos de roubo de informações virtuais às vezes há dificuldades em se configurar o furto perante a Justiça.

FONTE: VALOR ONLINE - 04/10/2006


Grato Caio Tibúrcio

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