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09 janeiro 2009

Capital de Giro

O texto a seguir mostra a dificuldade de se fazer administração de capital de giro num momento de crise. Entre colchetes, minhas observações.

Em tempos de crise, o caixa é rei
Executivos redobram a vigilância sobre o entra-e-sai de dinheiro das empresas para evitar surpresas
Patrícia Cançado

Durante anos, nove entre dez empresas americanas cresceram guiadas pelo princípio de caixa curto e alto endividamento. Com o fim da hiperinflação no Brasil, a equação passou a fazer a cabeça de muitos financistas e empresários por aqui. Essa tal "alavancagem" era uma atitude não só estimulada pelos bancos como aplaudida pelos acionistas.

[Discordo. Alguns bancos não estimulam a alavancagem. Não é tão simplista assim]

A quebra do Lehman Brothers inverteu a regra do jogo. Muitas acordaram nos dias seguintes - e não é apenas modo de dizer - sem dinheiro disponível para tocar suas operações com folga. "Com os bancos e a bolsa fechados, o caixa passa a ser o principal ativo das empresas em qualquer lugar do mundo", afirma o diretor da Boston Consulting Group, Fernando Machado. "No curtíssimo prazo, o caixa é rei. Quem tiver, vai passar melhor por essa situação."

[É questionável a afirmação que o caixa é o principal ativo. Existe aqui uma confusão entre a idéia de “estoque”, que está expresso no balanço, e a idéia de “fluxo”, que estaria nas demonstrações do Resultado e dos Fluxos de Caixa. O principal ativo é aquele que permite gerar – no sentido de fluxo – caixa]

Ninguém está a salvo, embora alguns tenham mais urgência em recompor ou preservar o capital que os outros. Desde que as perdas com derivativos de quase R$ 700 milhões vieram à tona, o presidente do Conselho de Administração da Sadia, Luiz Fernando Furlan, não encerra o expediente sem antes verificar o fluxo de caixa da companhia. Nos tempos de fartura, essa função era do gerente de tesouraria das empresas. O que Furlan tem feito é o que os especialistas em reestruturação de empresas chamam de "sentar no caixa". Ou seja, controlar o entra-e-sai de dinheiro tal como um dono de padaria, calculando cada centavo.

[Aqui neste parágrafo refere-se ao fluxo de caixa.]

Outros executivos - com mais ou menos pressa - estão no mesmo barco. "Se você não fizer isso, o dinheiro vai embora rápido porque o horizonte é incerto. É preciso estar preparado para mais 12 meses sem crédito fácil", diz José Carlos Aguilera, especialista em reestruturação de empresas e atual presidente da Brasil Ecodiesel. "A Vale tem R$ 14 bilhões em caixa e, mesmo assim, está reduzindo produção e demitindo funcionários para se adequar à nova realidade de consumo de minério. O ideal seria fazer conta para ver se vale a pena demitir. Mas, em crise de caixa, as soluções são imediatistas."

[Não é possível afirmar – ou deixar implícito – que 14 bilhões de caixa da Vale é elevado. A determinação do volume de dinheiro que deve ser retido no caixa é muito difícil e depende de cada empresa]

O remédio não é igual para todos. Em primeiro lugar, as empresas tentam renegociar contratos e dívidas, alongar prazo de pagamento a fornecedores e encurtar o de clientes, cortar custos (inclui demissões), liberar estoques, cancelar investimentos e liquidar ativos não operacionais, como aviões e imóveis. Nos últimos meses, tanto aqui quanto lá fora, não houve um dia sequer sem que uma empresa - as montadoras, em particular - anunciasse medidas nesse sentido.

[Observe que as medidas dizem respeito ao ciclo financeiro da entidade – fluxo da atividade operacional - e ao fluxo de investimento.]

Quando nada disso é suficiente, parte-se para doses mais radicais, como a venda de unidades que não fazem parte do negócio principal ou de participação minoritária.

[O problemas das medidas citadas é a crise. O dinheiro é curto e não aparecem compradores para as unidades colocadas à venda. Neste momento, a demanda de caixa para fins especulativos, na definição de Keynes, torna-se importante. Os 14 bilhões da Vale, por exemplo, podem ser usados para adquirir boas oportunidades que estão sendo colocadas a venda por outras empresas. Mas quantas empresas podem fazer isto hoje?]

Foi o que fez, por exemplo, a InPar ainda no começo do semestre. Ela colocou à venda imóveis não residenciais com o objetivo de levantar R$ 400 milhões. Não foi o bastante para estancar a sangria. Estrangulada pelo furo bilionário, a Sadia estaria disposta a abrir mão de até 20% das ações para recompor seu caixa. Até aqui, 18 fundos se interessaram pelo negócio, segundo o próprio Furlan.

A Brasil Ecodiesel, maior produtora de biodiesel do País, é outro caso dramático. A situação já era difícil antes da crise e só piorou depois dela. Quando Aguilera foi convidado para assumir o comando do negócio, em maio deste ano, a dívida era de R$ 290 milhões. Em agosto, ele conseguiu esticar o prazo de 85% desse valor. "Tirei parte do problema da frente. Mas não resolvi o capital de giro. Os bancos estão nos financiando, mas o custo é alto e o dinheiro não é garantido", explica Aguilera.

[Ficou confuso o texto. Afirma, em primeiro lugar, que a empresa aumentou o prazo da dívida. Mas teve que assumir financiamentos de capital de giro, tipicamente de curto prazo. Afinal, a empresa aumentou ou não o prazo da dívida]

A Ecodiesel tem poucas saídas. Alongar o prazo de pagamento dos fornecedores, como têm feito as usinas de açúcar e álcool, é impossível. Ela só pode pagar à vista. Por outro lado, encurtar o prazo para clientes também não resolve, porque o jogo de forças é desequilibrado. O cliente da Ecodiesel é ninguém menos que a Petrobrás. "No meu caso, sobram duas alternativas: adequar as vendas ao tamanho do caixa atual ou aumentar o capital, com novos e antigos acionistas", revela Aguilera. A meta é a segunda opção. "Em setembro, não conseguia falar com ninguém. Em dezembro, vários investidores se interessaram por analisar."

[Este é o problema das medidas elencadas quando a empresa é o elo mais fraco da cadeia de valor, como é o caso da Ecodiesel. Quem determina o sucesso de medidas de alongamento do ciclo financeiro é a empresa mais forte, no caso a Petrobrás.]

Hoje, o poder está do lado do comprador. Ele tem agora a oportunidade de pagar barato por um negócio que pode se valorizar mais adiante. As ações das companhias brasileiras de capital aberto estão depreciadas, o que abre o apetite de fundos de participações, os chamados private equity. Quem tem cacife para comprar está de olho, aguardando o fundo do poço. "É um jogo de forças. Quem piscar primeiro, leva. A sensação é que esse tempo de espera passou", diz Aguilera.

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