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28 janeiro 2009

Finanças comportamentais

Forma de apresentar informação pode fazer diferença
22/01/2009
Valor Econômico

Quando, em meio à maior crise financeira das últimas décadas, você escuta o ministro da Fazenda dizer que os bancos brasileiros não vão quebrar, o que vem à cabeça? Para muitos, soa como alarme: "Se se está falando nisso, é porque tem perigo! Onde há fumaça, há fogo." Por via das dúvidas, grandes bancos anteciparam a exposição dos balanços tranqüilizando clientes e mercado sobre sua saúde financeira.

A maneira de apresentar informações pode fazer diferença sobre como elas serão captadas. Os psicólogos econômicos Kahneman e Tversky chamaram isso de "framing effects" - como no enquadramento de uma foto, privilegiar uma porção da cena, deixando-se de lado o restante. Em 2008, antes da completa deflagração da crise financeira nos EUA, um pesquisador chamou a atenção para o fato de o dinheiro que o governo Bush distribuiu à população para tentar reativar a economia pelo consumo poderia não ter sucesso. Denominado "rebate", o termo é associado à devolução do imposto de renda, que dispara reação de poupar entre os contribuintes. Para ele, deveria vir com o nome "bônus" para que as pessoas se sentissem inclinadas a gastá-lo.

Pouco a pouco, conhecimentos gerados pela psicologia econômica e economia comportamental começam a ser incluídos na agenda de debates de governos e gestores, ou "policy-makers". Em períodos de crise, com a necessidade imperiosa de se buscar explicações e soluções, todos se voltam mais facilmente para a esfera psíquica, sobretudo ao componente emocional, tão inegavelmente poderoso sobre os movimentos de investidores e autoridades.

Já tínhamos exemplos ao redor do mundo. Em 2005, o economista comportamental Peter Earl elaborou detalhado relatório para o governo neozelandês com apresentação da disciplina, diagnóstico e recomendações de medidas psico-econômicas para favorecer o desenvolvimento do país.

Nos EUA, o também economista comportamental Richard Thaler, que integra a equipe de assessores de Barack Obama, e o advogado Cass Sunstein, bolaram um engenhoso programa, já adotado em alguns estados, para aumentar as contribuições previdenciárias. Por meio de uma simples mudança na apresentação das alternativas disponíveis, eles melhoraram a adesão a planos de pensão. Como alternativa padrão, aparece agora aquela que, automaticamente, faz o funcionário aumentar suas contribuições ao plano na mesma proporção dos aumentos salariais, no lugar de lhe deixar como opção-padrão ter que pensar e decidir cada vez que o salário subisse, decisão sempre suscetível às tentações de usar aquele extra para consumo. A medida obteve expressivo crescimento dos índices de contribuição e integra o cardápio do chamado "paternalismo libertário", que ao lado de induzir à escolha mais favorável - para o funcionário, que deseja ter aposentadoria confortável mais tarde, mas tem dificuldade para controlar seus impulsos consumistas agora -, mantém-se a liberdade de recusá-la e ficar com outras opções.

Para Thaler, essa perspectiva seria necessária já que, se deixados por conta própria, agimos todos como "Homer Simpson", o personagem do desenho animado que dispensa comentários... Aliás, vale anotar que a tradução do ótimo "Nudge", ou "empurrão", livro em que eles discutem essas propostas, saiu há pouco pela Campus/Elsevier). A crise atual só fez aumentar o interesse pelos fatores psíquicos. Abre-se caminho, portanto, para incluirmos este conhecimento na agenda dos "policy-makers", com o intuito de contribuir para decisões mais acertadas por parte da população.

No Brasil, muitas áreas poderiam ser alvo desse debate com a inclusão de variáveis psicológicas, tais como o esclarecimento da população em geral sobre a economia, o funcionamento psíquico e as inúmeras ciladas que nossa própria mente nos prega. Poderiam, ainda, ser debate no campo das microfinanças (decisões financeiras de populações de baixa renda) e meio-ambiente e sustentabilidade (recursos naturais são também bens finitos, envolvendo, portanto, decisões psico-econômicas). Poderiam também evitar a atração por golpes e a vulnerabilidade a tombos financeiros entre investidores, sem falar na evolução do Bolsa-Família rumo à autonomia e orientação sobre o uso do crédito consignado e de qualquer outra natureza.

Vera Rita de Mello Ferreira "Psicologia Econômica" e "Decisões econômicas - você já parou para pensar?"

Um comentário:

  1. "(...) essas duas alternativas são equivalentes às anteriores, porém com outra redação, uma nova perspectiva - ou um novo framing, como se diz tecnicamente."

    http://rodolfo.typepad.com/no_posso_evitar/2009/04/o-pequeno-gigante-ou-o-enorme-anao.html

    Abraço, Rodolfo.

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