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05 janeiro 2023

Privatização de aeroportos e receita como medida de desempenho

O que ocorre quando um aeroporto é privatizado? Uma pesquisa, publicada recentemente (via aqui), mostra que a privatização de aeroportos pode ser boa. O trecho a seguir foi extraído da pesquisa. Achei importante que a receita, uma medida contábil, é considerada uma medida de desempenho para o estudo da privatização. O trecho foi traduzido pelo Vivaldi:


Quando os fundos de private equity compram aeroportos dos governos, o número de companhias aéreas e rotas atendidas aumenta, a receita operacional aumenta e a experiência do cliente melhora.

... Em 2020, quase 20% dos aeroportos do mundo haviam sido privatizados. O private equity (PE), geralmente por meio de fundos de infraestrutura dedicados, está desempenhando um papel crescente na privatização, comprando 102 aeroportos de um total de 437 que já foram privatizados.

... Uma métrica chave da eficiência do aeroporto são os passageiros por voo. Quanto mais clientes um aeroporto puder atender com as pistas e portões existentes, mais serviços poderá oferecer e mais ganhos poderá gerar. Quando os fundos de PE compram aeroportos de propriedade do governo, o número de passageiros por voo aumenta em média 20%. Não existe esse aumento quando empresas privadas, que não sejam da PE, adquirem um aeroporto. O tráfego geral de passageiros aumenta sob os dois tipos de propriedade privada, mas o aumento nos aeroportos pertencentes à PE, de 84%, é quatro vezes maior que o dos aeroportos privados não pertencentes à PE. Os volumes de frete e o número de voos, outras medidas de eficiência, mostram um padrão semelhante. Evidências de dados de imagens de satélite indicam que os proprietários de PE aumentam o tamanho do terminal e o número de portões. Essa expansão de capacidade ajuda a permitir que os aumentos de volume e pontos no aeroporto tenham sido restringidos financeiramente sob propriedade anterior.

... As empresas de PE tendem a atrair novas transportadoras de baixo custo para seus aeroportos, o que, por sua vez, pode levar a uma maior concorrência e oferecer aos consumidores melhores serviços e preços mais baixos. No que diz respeito às rotas, os adquirentes de PE aumentam o número de novas rotas, especialmente rotas internacionais, mais do que de outros compradores. Os passageiros internacionais costumam ser os usuários mais lucrativos do aeroporto, especialmente nos países em desenvolvimento.

Uma aquisição de PE também está associada a um declínio nos cancelamentos de voos e a um aumento na probabilidade de receber um prêmio de qualidade. Quando um aeroporto muda de propriedade não-PE privada para PE, suas chances de ganhar um prêmio aumentam 6 pontos percentuais. A chance média de ganhar esse prêmio é de apenas 2%.

As taxas cobradas pelos aeroportos para as companhias aéreas aumentam após as privatizações do aeroporto. Quando o comprador é uma empresa de PE, também há um esforço para desregular os limites do governo nessas taxas. Por exemplo, depois que três aeroportos australianos foram privatizados, em meados da década de 90, os limites máximos de preços que regem as receitas aeroportuárias foram substituídos por um sistema de monitoramento de preços que permite ao governo intervir se taxas ou receitas se tornarem excessivas.

O efeito líquido de uma aquisição de PE é uma duplicação aproximada da receita operacional de um aeroporto, devido principalmente a maiores receitas de companhias aéreas e varejistas no terminal, em vez de redução de custos. As forças motrizes por trás dessas melhorias parecem ser novas estratégias de gerenciamento, que provavelmente incluem maior remuneração para os gerentes, além de investimentos em nova capacidade, além de melhores serviços e tecnologia de passageiros.

Foto: Artur Tumasjan

05 dezembro 2020

Privatização da CEB

Esta semana ocorreu a privatização da CEB-Distribuidora. Em 2017, publiquei, em co-autoria com Amanda Schmidt, um artigo com o seguinte resumo:

Esta pesquisa tem como propósito demonstrar como a ferramenta de avaliação de empresas, pelo método do fluxo de caixa descontado, pode ser utilizada com a finalidade de avaliar a qualidade dos gastos públicos realizados sob a forma de investimentos em empresas estatais. A pesquisa consistiu em um estudo de caso de uma empresa brasileira do setor de energia elétrica, a CEB Distribuição S.A., subsidiária integral de uma sociedade de economia mista. O valor da empresa foi calculado com base em premissas determinadas a partir da análise do desempenho histórico da entidade e projeções macroeconômicas obtidas de outras fontes. Ressalta-se que foram utilizadas somente informações disponíveis ao público. O valor obtido como resultado indica que a entidade analisada não está gerando o retorno financeiro desejável em vista dos recursos públicos nela investidos e permite inferir que o valor recuperável do investimento da controladora nessa empresa é menor do que o valor contábil reconhecido. Essa conclusão pode servir como guia de ação na área pública, pois demonstra a necessidade de melhoria da qualidade dos gastos públicos realizados na empresa analisada, situação que pode se estender a outras empresas estatais brasileiras. Desta forma, sugere-se que sejam realizadas pesquisas utilizando esta metodologia para analisar outras empresas estatais do país.

O valor obtido no leilão foi muito alto e isto pode ser explicado por dois fatores. Primeiro, a maldição do vencedor. Existindo disputa em um leilão, o lance vencedor geralmente significa um valor acima do razoável. O segundo fator é que a análise foi realizada tendo por premissa a história da CEB como empresa pública, com suas ineficiências. O vencedor do leilão está apostando que consegue "ganhos" de produtividade/gestão. 

13 agosto 2020

Vendeu vento, negociou brisa

A questão da privatização de empresas estatais volta a discussão com a saída de Salim Mattar do governo. A análise de Anne Warth é bastante interessante neste sentido (Análise: Salim Mattar 'vendeu vento' e 'negociou brisa', O Estado de S.Paulo, 12 de agosto de 2020):

Para quem chegou no governo dizendo que arrecadaria R$ 1 trilhão com a venda de estatais, Salim Mattar fez pouco. Para os críticos, ele "vendeu vento" e "negociou brisa". (...)

A inclusão de estatais no PND é apenas a primeira etapa de um longo processo até a privatização, que inclui a elaboração de notas técnicas, contratação de estudos, aprovação de órgãos de controle e realização de audiências públicas e de assembleias de acionistas.

Desde a redemocratização, todos os presidentes venderam empresas públicas. Até mesmo o governo Michel Temer, que teve uma gestão mais curta, licitou seis distribuidoras da Eletrobrás e a Celg, distribuidora de energia que pertencia também ao governo goiano.

A equipe econômica costuma dizer que muita gente joga contra as privatizações. Ninguém gosta de admitir, mas o Congresso não precisa dar aval à venda de quase nenhuma, a não ser Petrobrás, Eletrobrás, Banco do Brasil, Caixa e Correios. Em quem jogar a culpa, portanto? 

É verdade que se trata de um rito longo, próprio do setor público, e que quem vem do setor privado costuma criticar como moroso e burocrático. Mas, uma vez que todas as etapas são cumpridas, é possível privatizar as estatais. Ninguém disse que é fácil, mas não é impossível. Mais do que falar, é preciso fazer.

Sabendo que o processo é moroso - a estimativa é que cada estatal leve, em média, dois anos para ser vendida - é preciso ter foco. Cada presidente, desde a redemocratização, concluiu uma grande privatização. (...) 

Em tempo: na contabilidade pública, recursos arrecadados com a venda de estatais de controle direto são de natureza financeira e não orçamentária. Portanto, eles não entram no caixa do Tesouro e não tem o condão de zerar o déficit primário - outra promessa do governo que não será cumprida, porém essa não foi feita por Salim Mattar, mas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

Foto: aqui

11 novembro 2019

Privatização da Eletrobras

Após sucessivos adiamentos, o governo encaminhou ao Congresso, na última 3ª feira (5.nov.2019), o projeto de lei que trata da privatização da Eletrobras. A expectativa é realizar o processo de venda da estatal no 2º semestre de 2020. O cronograma, no entanto, dependerá do tempo dos congressistas. A discussão deve se alongar, principalmente, pela relevância da empresa para o setor elétrico nacional.

Criada oficialmente em 1962, a estatal tem papel relevante na geração e transmissão de energia elétrica no Brasil. As 227 usinas da empresa correspondem a 1/3 da capacidade de geração instalada no país. A produção é responsável por atender cerca de 3 milhões de lares.
(...)

O aval do Congresso é necessário para incluir a Eletrobras no PND (Programa Nacional de Desestatização). O PL também traz as diretrizes para o processo de capitalização. Serão emitidas novas ações ordinárias (que dão direito a voto) para diluir a participação da União no capital social, hoje de 60%, para menos de 50%.

A intenção é que a Eletrobras se torne uma corporação, ou seja, uma empresa com controle pulverizado. Para garantir isso, o projeto determina que nenhum acionista poderá ter mais de 10% do capital votante da Eletrobras.

Na avaliação do economista e advogado do Souto Correa Advogados Victor Gomes, o texto evita uma concentração de mercado. “Se, por exemplo, 1 player atual pudesse ter o controle da Eletrobras, inibiria a competição no setor elétrico. Nesse contexto de reforma setorial, que visa aumentar a competição, acertaram nessa proposta”, afirmou.

A operação deverá arrecadar, no mínimo, R$ 16,2 bilhões. O montante, já contabilizado no Orçamento, corresponde ao pagamento pela mudança de contrato de concessão de usinas hidrelétricas. A mudança permitirá que a empresa negocie o preço da energia livremente no mercado. Pelo contrato atual, a estatal se comprometeu a praticar valores pré-fixados.

A mudança, segundo Joísa Dutra, aumentará eficiência da empresa como gerador, já que poderá negociar os preços com diversos fornecedores. “Tem 1 impacto muito positivo. Pretende retornar ao gerador o direito de negociar os preços e disputar direito de ser fornecedor de consumidores residenciais, comerciais e Indústrias”, explicou.

CUSTO DA OPERAÇÃO PARA ELETROBRAS
O texto também determina que empresa terá que fazer aportes financeiros ao Cepel (Centro de Pesquisas de Energia Elétrica) por 4 anos após a desestatização. Ainda, terá obrigação de repassar R$ 3,5 bilhões para o programa de revitalização do rio São Francisco e recursos para abater em subsídios do setor elétrico.

Apenas duas das empresas do grupo Eletrobras ficarão de fora da privatização. A Eletronuclear, que controla as usinas do complexo de Angra, e a Itaipu Binacional –que pertence 50% ao Paraguai. Como a Constituição determina ambas fiquem sob controle da União, o PL permite a criação de uma nova estatal.

Outros 3 programas ficarão sob o guarda-chuva da nova estatal: o Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica); Luz para Todos, que atende famílias de baixa renda; e o Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica. (...)

Fonte: Aqui

25 janeiro 2019

Governo e Eletrobras começam a negociar modelo de privatização

O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior, vai iniciar as discussões com o novo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, sobre o total de participação da União que será diluído dentro do plano de capitalização da empresa. Ainda não está claro se o novo plano resultará na venda do controle da elétrica, mas o executivo, defensor da privatização, pretende mostrar ao governo que a desestatização trará mais valor para as ações da companhia que ficarão nas mãos da União. "Nunca tratamos da diluição [da participação da União na Eletrobras]. Vamos começar a tratar agora. Que vai haver uma diluição não tem dúvida", afirmou Ferreira.
[...]

Segundo o executivo, a ideia é mostrar ao ministro que o plano que prevê a perda do controle da empresa pela União, a partir da criação de uma corporação, com "golden share" e limitação de concentração por acionistas é o que vai valorizar mais as ações do governo na companhia

Segundo o executivo, a expectativa é que o modelo da capitalização seja definido ainda no primeiro semestre. A partir da definição, a companhia levará no máximo nove meses para preparar a operação. Ele contou que tem se reunido semanalmente com o ministro e sua equipe, a fim de afinar esses planos.

Fonte: Aqui

11 julho 2018

Incentivo perverso

É uma questão de incentivo: para vender as distribuidoras da Eletrobrás, o Congresso decidiu repartir para todos os brasileiros, via conta de luz, as ineficiências das subsidiárias da região Norte, incluindo os furtos de energia. Isto deveria ser pago pelos clientes da empresa.

O projeto, no entanto, propõe liberar a Eletroacre (Acre) e a Ceron (Rondônia) de cumprir essa regra e coloca o ressarcimento dos custos que elas tiveram com os “gatos” desde 2009 na conta de todos os consumidores brasileiros.


Isto, naturalmente, pode facilitar a venda. Mas pune as pessoas que não tiveram nenhuma relação com esta ineficiência.

16 outubro 2017

Horizonte temporal na privatização


O valor de uma empresa é dado pelo fluxo de caixa futuro descontado pelo custo de oportunidade de capital. Uma das questões no processo de fazer a mensuração deste valor é quão longe deve ser o valor futuro. Ou seja, qual o horizonte de tempo que devemos considerar. Quando a empresa possui vida futura delimitada por um contrato, o correto seria considerar este horizonte temporal. Se o horizonte de tempo não estiver delimitado, o usual é considerar um fluxo de cinco ou dez anos (ou outro período de tempo qualquer) e ao final considerar um fluxo em perpetuidade.

No caso das concessões governamentais, a estimativa deve levar em consideração o prazo do contrato. Se estamos avaliando uma empresa que explora uma rodovia e o contrato possui mais oito anos, o horizonte de tempo será oito anos. Ao final deste período, a rodovia volta para o governo, que irá fazer um novo leilão. Mas o valor da empresa criada para explorar esta rodovia deve ser estimado considerando estes oito anos, mais o eventual valor residual, que irá corresponder ao pactuado no contrato de concessão.

Para o governo, transferir uma concessão para o setor privado envolve obter os recursos, que podem ser maiores se o objeto da exploração foi vantajoso ou não. O preço obtido no leilão pode aumentar se as regras forem claras, não existir contestação provável, o objeto de exploração pode gerar um fluxo de caixa futuro atrativo, entre outros aspectos. Ao fazer um leilão para concessão de um bem do governo, quanto maior a atratividade, maior o preço a ser obtido no leilão. Muitas vezes o governo chega a garantir fontes de financiamento a juros subsidiados como uma forma de atrair mais interessados.

A regra para obter um valor substancial num leilão é simples: melhorar, no máximo, a chance da concessão gerar um elevado fluxo de caixa futuro.

No processo de discussão sobre a oferta da Eletrobras anunciou-se que o governo estaria estudando aumentar o horizonte de tempo do contrato da usina Tucuruí (Fonte: Ritter, Daniel. Novo Contrato de Tucuruí torna-se decisivo para oferta da Eletrobras, Valor Econômico, 2 de outubro de 2017, B1). Originalmente o contrato termina em 2024. Neste ano, o governo teria que fazer um leilão para decidir quem iria explorar esta usina. Tucuruí é uma hidrelétrica muito importante para a Eletrobras: equivale a 8400 mW, mais que o dobro das quatro usinas que foram leiloadas recentemente pelo governo federal e que eram da Cemig. Se o processo sair em 2018, isto corresponde de 6 a 7 anos de exploração. A proposta, conforme divulgada na mídia, seria prorrogar por 30 anos a concessão. Seria um grande incentivo para atrair interessados.

A ideia possui uma transferência temporal de riqueza. Em lugar de receber recursos em 2024 numa eventual prorrogação da concessão, o governo antecipa deste recebimento. Isto seria muito interessante para um governo que está com dificuldades de fechar as contas públicas, neste ano e provavelmente no próximo.

Neste caso, para o eventual interessado em adquirir a Eletrobras, o horizonte temporal seriam os trinta anos de exploração de Tucuruí.

31 agosto 2017

Eletrobras destruiu R$562 bilhões de valor do acionista em 22 anos

A notícia da possibilidade de privatização da Eletrobras trouxe também a oportunidade de analisar o papel desempenhado pela entidade nos últimos anos. Para fazer isto, usei os dados da empresa de 1995 até 2016. Ou seja, minha análise contempla o início do processo de estabilização, a mudança drástica do setor promovida no governo Dilma e inclui o último resultado da empresa.

Método - Na minha análise utilizei o conceito de lucro econômico. Esta medida de desempenho nada mais é do que considerar, após o lucro contábil, uma remuneração mínima para os acionistas. Em termos gerais, é possível provar que no longo prazo o lucro econômico equivale ao fluxo de caixa descontado, que é o método mais defensável de mensuração de desempenho de uma entidade. Para um determinado exercício social, o lucro econômico é medido da seguinte forma:

Lucro Econômico = Lucro Contábil - Taxa de Desconto x Capital Investido pelo Acionista

O lucro contábil é obtido numa base de dados; no meu caso, eu usei os dados das demonstrações consolidadas disponível na Economática (gráfico abaixo). No capital investido pelo acionista foi utilizado o patrimônio líquido contábil, apresentado pela empresa nas suas demonstrações. Apesar de parecer estranho, a mensuração do lucro econômico realmente utiliza o valor apurado pela contabilidade. Como se deseja saber o valor do retorno obtido pelo investimento na empresa, o montante utilizado corresponde ao valor inicial.

Um problema típico deste tipo de avaliação é determinar a taxa de desconto. Uma vez que o principal acionista da empresa é o governo federal, considerei nos cálculos do custo de oportunidade do capital. Basicamente é preciso imaginar qual o uso alternativo do dinheiro investido na empresa. Assumi que o mais razoável seria a taxa Selic:



Como estamos comparando valores de épocas distintas, faz-se necessário considerar a inflação. Afinal, nos primeiros anos da série a inflação chegou a 22% e não usar valores constantes poderia dar uma visão distorcida do desempenho da empresa. Escolhi como inflator o IPCA, do IBGE, um índice que expressa a inflação brasileira bem melhor que o IGP, muito usado no mercado, ou índices específicos. Assim, todos os valores estão corrigidos para o final de 2016.



Agregando valor para a empresa - a expressão do lucro econômico mostra que a agregação de valor depende de três variáveis: o lucro contábil, o custo de oportunidade de capital e o valor investido. No período analisado, a empresa gerou lucro em quase todos: somente de 2012 a 2015 o resultado foi negativo em 31 bilhões de reais, nominais. Em termos reais, o resultado contábil corrigido foi de 45 bilhões de reais. Aparentemente nada ruim para uma empresa estatal.

A segunda variável é o custo de oportunidade do capital. Quanto maior o custo, mais difícil é para a empresa conseguir agregar valor. Em razão das elevadas taxas da Selic dos primeiros anos, este custo de oportunidade apresentou um valor médio de 17,7%, nominais, sendo 7,57% ao ano o menor valor. Em termos reais, desde 2007 a taxa Selic ficou na casa de um dígito. Observe que quanto maior o custo da Selic, maior deve ser o lucro contábil para compensar o percentual.

A terceira variável é o capital investido. Durante o período a média do PL da empresa ficou em 66 bilhões de reais, sem considerar a inflação. Já quando se considera a inflação é possível observar um padrão nítido de descapitalização da empresa, conforme pode-se notar na figura abaixo. É verdade que o capital nominal sofreu uma forte redução nos últimos anos, passando de 77 bilhões no final de 2011 para 44 bilhões no último exercício social.

A redução do capital investido é boa em termos de agregação de valor: isto indicaria que os acionistas estão colocando menos recursos na empresa e continuam obtendo resultado. O problema é que a soma do lucro contábil obtido, da taxa Selic e do capital investido revela um resultado econômico ruim. O gráfico a seguir apresenta os números obtidos:



 Em nenhum exercício, a empresa foi capaz de gerar lucro econômico positivo. Vamos falar de outra forma: de 1995 a 2016 a Eletrobras só fez destruir valor. Em termos numéricos, isto significa uma destruição anual média corrigida de 25 bilhões de reais.



Observe que o gráfico possui a linha do zero no topo, indicando que todos os valores são negativos. Também é possível perceber que o desempenho de 1995 é claramente destoante; existe aqui uma explicação: a elevada taxa Selic, imposta no início do Plano Real. Assim, o número anterior está claramente influenciado pelo outlier de 1995. Veja o gráfico apresentado, sem o valor de 1995:



A média de destruição de valor anual foi de 20,8 bilhões de reais, corrigidos, sendo o melhor desempenho da empresa ocorrido em 2016.

Justificando a destruição de valor - Seria interessante verificar o efeito do lucro contábil, da taxa Selic e do capital investido no lucro econômico. O que queremos é tentar estabelecer o que foi mais relevante para a destruição de valor da empresa: o baixo desempenho do seu resultado contábil, o elevado custo de oportunidade do capital ou o montante excessivo de capital investido na empresa? Usamos aqui uma análise de correlação ao longo do período, retirando da série o ano de 1995.

Usando somente os valores nominais, a maior correlação foi com a Selic (-0,77). Já com valores sem o efeito da inflação, tanto o capital investido, quanto o custo de oportunidade do capital foram relevantes (-0,70 e -0,71).

Como estamos usando uma série histórica longa, uma questão surge naturalmente: qual a influência da pessoa que estava sentada na cadeira mais importante do Palácio do Planalto? Usando variáveis binárias para marcar os períodos do governo do PSDB, o governo Lula e Dilma, cheguei a uma constatação surpreendente: nenhum governo foi diretamente responsável pelos problemas da empresa. Mesmo no governo Dilma, com sua confusa mudança regulatória, a Eletrobras teve um desempenho diferente dos anos anteriores. Mesmo observando o gráfico acima, com a série histórica do lucro econômico corrigido, não podemos responsabilizar o PSDB pelo fracasso da empresa. (Se retirarmos os efeitos das decisões macroeconômicas, o resultado da empresa não apresenta diferença estatística)

A conclusão é a seguinte:

(a) a política não é uma variável relevante para explicar o desempenho da empresa;

(b) de 1995 a 2016, a Eletrobras destruiu valor para seu acionista no total de R$562 bilhões ou R$2.700 para cada brasileiro.

26 agosto 2017

Fato da Semana: Privatização da Eletrobras

Fato: Privatização da Eletrobras

Data: 21 de agosto

Contextualização - Na segunda a Eletrobras informou que faria a proposta de desestatização da empresa. Logo depois, o governo anunciou que o processo seria estendido para aeroportos, Casa da Moeda, etc. O movimento de privatização foi provocado pela má gestão pública dos últimos anos. O crescimento das despesas e a dificuldade de conseguir novas receitas mostraram os problemas do uso político das empresas do governo. As estatais não conseguem gerar caixa para o governo; pelo contrário, estão demandando mais dinheiro, quando o governo não possui mais recursos.

Relevância - A privatização pode ajudar a tornar o Estado menor. Representando um terço da economia, o governo é útil para os políticos, mas não para quem gostaria de uma melhor aplicação dos seus recursos.

Qual a relação com a contabilidade? Teremos agora algumas situações interessantes. A Petrobras avisou esta semana que irá colocar dinheiro na BR para melhorar as chances de privatização. As contingências da Eletrobras necessitam de efetiva verificação da sua probabilidade. O custo da Casa da Moeda pode ser discutida de forma mais clara.

Notícia boa para contabilidade? - Sim. Os aspectos apresentados anteriormente podem trazer algumas discussões interessantes.

Desdobramentos - Conforme afirmamos numa postagem na semana, o processo será demorado.

Mas a semana só teve isto?
- A denúncia do diretor de governança da Petrobras foi outro tema relevante.

24 agosto 2017

Pontos a destacar na proposta de privatização

O governo apresentou uma proposta de privatização da Eletrobras e de diferentes negócios, incluindo a Casa da Moeda, aeroportos, loterias e rodovias. A notícia foi bem recebida pelo mercado e provocou uma alta nos preços das ações da Eletrobras. Alguns pontos a destacar:

a) Ineficiência - a privatização de alguns destes negócios pode colocar um ponto final - ou pelo menos reduzir - as ineficiências destes negócios. Uma estimativa feita por uma gestora e divulgada ontem aponta que somente na Eletrobras, ao longo dos últimos quinzes anos, houve uma perda de 228 bilhões de reais. Este valor inclui investimentos inadequados, desvio de recursos por políticos corruptos, formação de preço inadequada, atraso em projetos, entre outros fatores.

b) Ganhos para o contribuinte - a privatização pode não trazer, a curto e médio prazo, um ganho para o contribuinte. O mais provável é um aumento nos preços dos produtos, com a cobrança de pedágios nas rodovias ou a redução de subsídios artificiais. Mas para a sociedade como um todo, a privatização torna mais claro quem está pagando pelos serviços prestados. Se uma tarifa de um aeroporto está abaixo no custo, alguém está pagando por isto. Existindo rombo, o governo cobre com os recursos dos tributos. Assim, quem paga o imposto termina por assumir esta diferença que deveria ser paga pelo usuário do serviço. A transparência é um grande ganho quando o governo decide sair dos negócios que ele não deveria fazer. Mas a longo prazo, a privatização deverá valer a pena.

c) Resistência política - um programa como este terá resistências. A primeira delas é dos políticos, que hoje indicam apadrinhados para os cargos no sistema Eletrobrás, por exemplo. Lógico que eles não irão colocar este argumento e sim afirmar que o processo é contra os interesses do país e da classe trabalhadora. Esta resistência será pesada e difícil de vencer. Outro foco de resistência encontra-se no próprio governo. A Infraero, que irá perder a sua grande fonte de renda, o aeroporto de Congonhas, já afirma que o governo deverá ter um custo de 3 bilhões a mais com o processo, sem sequer conhecer como o mesmo será feito.

d) Modelo de privatização - ainda não está claro como o processo será realizado, mas este aspecto será fundamental para o sucesso ou fracasso do programa proposto pelo governo. Alguns já especulam que a Eletrobras, por exemplo, ficará sem controle definido. Outros já calculam o valor do dinheiro que o governo irá receber. É certo que talvez o momento não seja o mais adequado (perdemos um bom momento em 2005, por exemplo, quando o mercado mundial estava confiante e com muitos recursos disponíveis), mas quanto mais o governo garantir a geração de fluxo de caixa futuro melhor. O processo conduzido pelo governo anterior, com ênfase na menor tarifa, foi um fracasso. Um aspecto crucial do processo é garantir os direitos daqueles que estão participando do processo.

e) Melhoria na transparência - o anúncio do processo poderá ajudar a melhorar a transparência das informações contábeis das empresas estatais. Um texto do Valor já fez uma estimativa, a maior, que as contingências da Eletrobras chegam a 64 bilhões. Mas esqueceu da conta de chegada entre esta estatal e a Petrobras. Este fato, por sua vez, pode ajudar na privatização da BR.

f) Quem serão os interessados? - as privatizações do governo Dilma foram um fracasso por não garantir a sustentabilidade do negócio. Além disto, ocorreu um erro de análise (e projeção) por parte das empresas. Muitos dos potenciais investidores estão com sérios problemas, seja de caixa ou com a justiça. Os participantes no passado, composto por empreiteiras e fundos de pensão, não participarão do processo atual. Afinal, quem serão os interessados? Interessados em Congonhas será fácil de encontrar, mas na Casa da Moeda e em algumas usinas/empresas elétricas será mais difícil. O modelo irá incluir o pequeno investidor e o investidor estrangeiro? São questões relevantes que ainda precisam ser respondidas no futuro. Como será vencida a resistência política? O atual governo tem usado a estrategia da compra de opinião. Isto será a melhor opção agora?

26 fevereiro 2016

Privatização nos estados

Segundo informação do Valor Econômico (Estados poderão ter ganho imediato com venda de estatais para União, Leandra Peres e Assis Moreira, 25 de fevereiro de 2016), a União está estudando uma proposta de privatização das empresas dos estados. O processo ocorrerá da seguinte forma:
Na primeira etapa, o Estado repassa para União o controle ou a participação acionária na empresa. O valor é estimado na avaliação do mercado. Este valor será usado para abater a dívida do Estado com a União. Após a venda das ações, o valor a maior ou a menor é acertado na diferença.

Alguns aspectos relevantes desta operação precisam ser levados em consideração. Uma hipótese básica do modelo em estudo é que a União teria condições de fazer a privatização de maneira mais rápida e eficiente. Em outras palavras, o governo federal teria maior possibilidade de fazer a privatização. Obviamente que as considerações políticas sobre o tema ficam sob a responsabilidade do governo federal.

Sobre a operação de privatização é importante considerar o valor do dinheiro no tempo. Como provavelmente as fases não ocorreram simultaneamente, o processo deverá prever a “atualização” da avaliação. Por exemplo, admita que um Estado repasse a empresa ABC por $1 milhão; dez meses depois é feita a privatização, num valor de R$1,1 milhão. Em razão do valor do dinheiro no tempo, é necessário trazer o valor de R$1 milhão para a data da venda efetiva (ou do pagamento).

Como os momentos de tempo são distintos, o governador que fizer a transferência poderá ter fortes incentivos para tomar a decisão de passar a empresa para a União ou não. Se estiver em término de mandato e concorrendo a reeleição, esta decisão poderá tirar mais votos; é um fator importante para não tomar a decisão. Isto é um fato que o governo deve considerar: aumentar os incentivos políticos para uma decisão positiva.

Finalmente, ao assumir a empresa a União tem um compromisso de efetuar a venda. E se isto não ocorrer? O ônus aqui será do governo federal, que deverá explicar qual a razão de ter feito uma promessa de privatização e não ter levado adiante.

Em linhas gerais: aparentemente o plano proposto pelo Tesouro tem mais contras que prós.

26 março 2014

Concessão de ferrovias

Quatro gigantes do agronegócio - Bunge, Cargill, Maggi e Dreyfus - mais a estruturadora de negócios Estação da Luz Participações (EDLP) pretendem se associar para criar uma empresa de logística que participará dos leilões de concessão de ferrovias. Juntas, elas respondem por 70% das exportações de grãos do País.
Essas empresas estão dispostas a construir e operar novas linhas em Mato Grosso. O alvo principal da sociedade, porém, é atuar como transportadora independente de carga ferroviária. É uma figura que não existe hoje no Brasil, mas será criada com base no novo modelo para ferrovias proposto pelo governo.
O plano foi informado na terça-feira ao ministro dos Transportes, César Borges. Deverá ser detalhado nos próximos dias à presidente Dilma Rousseff, que já estava informada das linhas gerais dos estudos. "As empresas se comprometem a serem líderes no processo", afirmou o senador licenciado Blairo Maggi (PR-MT).
Com o plano da nova empresa, o grupo apresentou a Borges uma proposta de mudança nas linhas que serão oferecidas como concessão federal em Mato Grosso. O projeto, batizado de Pirarara, prevê investimentos de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões. Pirarara é um peixe que pode atingir 60 quilos e 1,5 metro, encontrado nos Rios Amazonas, Tocantins e Araguaia.
Atualmente, o programa federal prevê a concessão de apenas um ramal no Estado, um trecho da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico), de 883 km, saindo de Lucas do Rio Verde e seguindo rumo ao leste até Campinorte (GO), onde se interligará com a Ferrovia Norte-Sul. De lá, a carga seguirá para o mar pelo Porto de Itaqui (MA).
Após estudar 40 mil rotas de escoamento de grãos no País, o grupo concluiu que o ideal seria encurtar a linha em 500 km. Ela começaria mais a leste, em Água Boa, e terminaria em Campinorte. Esse ramal reduzido está sendo chamado de "Fico Leste".
Por outro lado, seriam criadas duas ferrovias. A principal sairia do centro de Mato Grosso, em Sinop, e seguiria por 1.000 km até o porto de Miritituba, no Rio Tapajós, no Pará. Lá, a carga seguiria por mais 1.000 km de hidrovia para ser exportada pelos portos ao norte, como Vila do Conde e Santarém.
Essa linha, batizada de Ferrovia do Grão ou Ferrogrão, seria o canal de saída para metade da produção de soja, milho e farelo de Mato Grosso, que deverá atingir 50 milhões de toneladas em 2020. Hoje, ela é de 30 milhões de toneladas. Por causa da posição estratégica, Itaituba, da qual Miritituba é um distrito, já conta com praticamente todas as grandes empresas do agronegócio.
Um terceiro ramal sairia do oeste de Sapezal (MT) e seguiria para Porto Velho (RO), às margens do Madeira. O trajeto faz parte de antigos estudos da Fico, por isso é chamado de "Fico Oeste". De lá, a carga iria por rio até o Porto de Itacoatiara (AM) ou para os portos do Pará.
Economia. Maggi explicou que o grupo não é contra a Fico tal como está proposta pelo governo. Porém, os estudos indicaram que a melhor solução é diferente da que vem sendo analisada e era praticamente um consenso entre os interessados. Grande empresário do setor e ex-governador de Mato Grosso, ele se confessou surpreso com as conclusões.
"Em relação à situação que temos hoje, o frete ficaria mais barato em R$ 40 por tonelada", disse o presidente da EDLP, Guilherme Quintella. Coube a ele, que é chairman para a América Latina da União Internacional de Ferrovias, elaborar os estudos. Construídos os três ramais, 98% da produção de soja, milho e farelo do Estado sairiam por ferrovia.
O grupo pediu a Borges que abra Processos de Manifestação de Interesse (PMIs) para as três linhas sugeridas. Essa é a forma pela qual o governo vem contratando estudos econômicos e projetos de engenharia, depois que o virtual monopólio da Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP) foi questionado pelo Tribunal de Contas da União.
Fonte: aqui

21 janeiro 2014

Ativos Estatais

[...] Politicians push privatisation at different times for different reasons. In Britain in the 1980s,

Margaret Thatcher used it to curb the power of the unions. Eastern European countries employed it later to dismantle command economies. Today, with public indebtedness at its highest peacetime level in advanced economies, the main rationale is to raise cash.

Taxpayers might think that the best family silver has already been sold, but plenty is still in the cupboard (see article). State-owned enterprises in OECD countries are worth around $2 trillion. Then there are minority stakes in companies, plus $2 trillion or so in utilities and other assets held by local governments. But the real treasures are “non-financial” assets—buildings, land, subsoil resources—which the IMF believes are worth three-quarters of GDP on average in rich economies: $35 trillion across the OECD.

Some of these assets could not or should not be sold. What price the Louvre, the Parthenon or Yellowstone National Park? Murky government accounting makes it impossible to know what portion of the total such treasures make up. But it is clear that the overall list includes thousands of marketable holdings with little or no heritage value.

[..] Governments seem strangely reluctant to exploit these revenue-raising opportunities. That is partly because privatisation always faces opposition. Particular sensitivities surround land, as Ronald Reagan discovered when his plan to sell swathes of America’s West were shot down by a coalition of greens and ranchers who enjoyed grazing rights, and as the British government found in 2010 when environmentalists scuppered its attempt to sell Forestry Commission land.

[...]There are ways of encouraging sales. Data collection on public property is shockingly poor. It is patchy even in Scandinavia, where governments pride themselves on their openness. Governments need to get a better idea of what they hold. Effective land registries, giving certainty to title, are essential: Greece’s registry remains a mess. Too many governments use a flaky form of “cash basis” accounting that obscures the costs of holding property. Too few produce proper balance-sheets. Better bean counting would make it easier to ascertain what might be better off in private hands.

Governments also need to sweat whatever remains in state hands. There is no single model for managing public assets, but any successful strategy would include setting private-sector-style financial benchmarks, replacing cronies with experienced managers and shielding them from political interference. Not only is this good in itself, but it can also lead naturally to privatisation. That was the case in Sweden a decade ago, when creating a professionally managed holding company for state assets revealed many to be non-core, leading to a selling splurge by a left-leaning government.

[...]Governments also need to learn from mistakes made in past waves of privatisation. Without robust regulation, sell-offs enrich insiders and lead to backlashes. That happened in Britain (over rail and utilities) and emerging markets (telecoms, banking and more). The Royal Mail sale was a reminder of the political risks: price an asset too high and the deal might flop; price it too low and the taxpayer feels cheated. Nevertheless, for governments that are serious about bringing their spending in line with revenues, privatisation is a useful tool. It allows governments to cut their debts and improve their credit ratings, thus reducing their outgoings, and it improves the economy’s efficiency by boosting competition and by applying private-sector capital and skills to newly privatised assets.




Fonte: aqui

31 dezembro 2013

A Privatização do Royal Mail

Recentemente o governo do Reino Unido privatizou o serviço de correios, o Royal Mail. Foi uma das maiores ofertas iniciais de ações (ou IPO no jargão do mercado) dos últimos anos na Europa. Assim que as ações chegaram no mercado, ocorreu uma alta de 40% no preço, de 3,2 libras por ação para 4,6 (gráfico).



 Isto, naturalmente, trouxe questionamentos sobre o processo de privatização. E retomou uma discussão antiga nas finanças: o preço das IPO é subestimado. Esta discussão já tinha ocorrido anteriormente quando do lançamento das ações do LinkeIn e o preço ofertado estava muito abaixo do valor transacionado alguns minutos depois da ação ter chegado no mercado.

New York Times lembra pesquisas acadêmicas que comprovaram que as IPOs, nos Estados Unidos, estavam subestimadas nos últimos anos. A diferença entre o valor fixado na oferta inicial e o valor de mercado, nos últimos vinte anos, foi de 125 bilhões de dólares nos Estados Unidos.

Uma possível explicação para o que ocorreu no Royal Mail e nas outras ofertas iniciais é a existência de assimetria da informação. Uma das explicações é que investidores desinformados compram as ações nos primeiros dias, pagando um preço acima do que deveria, numa situação próxima a “teoria do abacaxi”, numa tradução menos literal, de Akerlof. (Talvez o leitor já tenha recebido oferta do gerente do seu banco recomendando a compra de uma ação que será lançada)

Outra explicação possível é que os bancos de investimentos determinam um preço subestimado para seu benefício próprio. Outros participantes também podem exercer influencia sobre o preço inicial, em razão dos seus interesses próprios. Alguns administradores irão beneficiar da venda de ações recebidas como forma de remuneração e possuem interesse em aumentar estes preços. O litígio que podem existir após o lançamento também ajuda a explicar a diferença de preço: a desvalorização poderia conduzir a um litígio em razão da potencial omissão de informação. Finalmente, o comportamento pode ser resultante da irracionalidade dos investidores.

02 dezembro 2013

Farsa das privatizações: subsídios públicos para grupos privados

Sob a ótica do governo, os recentes leilões de concessão têm mostrado, ao contrário do que dizem os críticos, um imenso interesse do capital privado em projetos públicos. Os aeroportos do Galeão e de Confins, por exemplo, não somente atraíram vários grupos, como o ágio pago pela concessão teria, em tese, superado todas as expectativas.
Mas a verdade é outra. Novamente, para atrair capital privado, o governo se vale de maciços subsídios e capital público. No caso dos aeroportos, o BNDES deverá financiar cerca de 70% dos investimentos do grupo vencedor do leilão. A estatal Infraero, sócia minoritária com 49% do capital, também deve participar dos investimentos, bancada por aportes do Tesouro Nacional.
O curioso é que o próprio ministro da Secretaria de Aviação Civil, Moreira Franco, havia alertado que a entrada da Infraero nos consórcios seria um “sacrifício” de recursos. Moreira Franco foi prontamente corrigido por Gleisi Hoffmann, ministra da Casa Civil, que insistiu na presença da Infraero para que a estatal aprenda com os parceiros privados como melhor gerir aeroportos.
Moreira Franco estava certo. Já com dificuldade de fechar as suas contas e enfrentando protestos por melhores serviços, o governo deveria colocar foco em atividades de alto impacto social e com menor interesse pelo setor privado. Mas um aeroporto de grande porte não só tende a atender populações de mais alta renda, como também é, por si só, um ótimo negócio – um monopólio local, com receitas mais ou menos estáveis, incluindo aquelas advindas de atividades acessórias como lojas e restaurantes. Por que, então, subsidiar grupos privados se o projeto, em si, é naturalmente lucrativo?
Em vez de querer que a Infraero aprenda como gerir aeroportos, é o próprio governo que deveria aprender como melhor gerir os nossos recursos
A resposta a essa pergunta reside numa prática muito recorrente em concessões e privatizações no Brasil: o uso de subsídios pela porta dos fundos para inflar o resultado dos leilões. No atual governo, com uma inclinação até mais forte de microgerenciar preços, a prática tem tomado proporções ainda maiores. Empresários têm dito que os subsídios são necessários para compensar a pressão do governo de limitar os lucros dos concessionários privados.
Mas isso é apenas trocar seis por meia dúzia, com a agravante de tornar o processo pouco transparente para a população. Além disso, chegamos a uma situação surreal em que o governo tem de compensar investidores privados pelos riscos de intervenção que ele próprio cria. Isso é ainda mais crítico no caso de projetos naturalmente mais arriscados que os aeroportos. No último leilão de transmissão elétrica, de 13 lotes leiloados, só 10 atraíram interesse, sendo 6 com forte participação de estatais.
Defensores desse modelo dizem que a presença estatal é uma forma de evitar a tão demonizada “privatização” dos serviços públicos. Mas, na prática, o que está sendo feito é simplesmente passar o controle da atividade para grupos privados à custa de subsídio e capital público coadjuvante. Como minoritária, a Infraero terá capacidade limitada de influenciar as operações. No fundo, não deixará de ser uma privatização irrigada por subsídios para quem não precisa.
A estratégia deveria ser outra. No caso de projetos naturalmente lucrativos, como os aeroportos, o governo deveria eliminar o financiamento público e criar um marco para monitorar os investimentos contratados, os preços cobrados e a qualidade dos serviços. Com isso, sobrariam mais recursos para apoiar projetos de maior impacto social e mais difíceis de serem financiados somente no âmbito do setor privado. Transporte urbano barato, saneamento básico, prisões e rodovias em áreas remotas são exemplos.
Em vez de querer que a Infraero aprenda como gerir aeroportos, é o próprio governo que deveria aprender como melhor gerir os nossos recursos, cada vez mais escassos.
Fonte: Sérgio Lazzarini - O Estado de S. Paulo, 28/11/2013

26 novembro 2013

Concessão ou privatização?

Um debate sobre o significado e o alcance da palavra “privatização” se tornou recorrente na política nacional e certamente estará presente nas eleições do próximo ano.

Trata-se de saber se concessões de serviços públicos, que o governo petista de Dilma Rousseff tem feito em proporções crescentes, são privatizações, abominadas nas campanhas eleitorais do partido.

Há, é óbvio, uma diferença entre vender empresas estatais, como foi feito com a Telebrás e a Vale, e transferir por tempo determinado a administração de bens públicos, como Dilma fez com os aeroportos do Galeão, no Rio, e de Confins, em Minas.

As duas operações, no entanto, podem ser chamadas de privatizações.

O dicionário Houaiss, por exemplo, diz que privatizar é: “1) realizar a aquisição ou incorporação de (empresa do setor público) por empresa privada; 2) colocar sob o controle de empresa particular a gestão de (bem público)”.

A lei que criou o programa de privatização _desestatização é o nome oficial_ também contempla a modalidade de concessão.

“Considera-se desestatização”, diz a legislação, ao listar suas modalidades, “a transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos explorados pela União, diretamente ou através de entidades controladas”.

Mais importante que filigranas semânticas e jurídicas, tanto na venda de uma empresa como na concessão de uma rodovia há uma escolha de trocar a administração estatal pela de uma empresa privada _o que propicia um debate ideológico mais profícuo.


Fonte: Folha de S Paulo

23 novembro 2013

Privatização de aeroportos

A privatização dos aeroportos do Rio e BH foi notícia nos jornais. A Folha tentou explicar a diferença de preço para o aeroporto de Guarulhos, indicando o prazo de pagamento (25 versus 20 anos):

Cinco anos a mais, além de tornar a parcela menor, fazem uma enorme diferença numa concessão porque é no fim do período --com os maiores investimentos já feitos-- que entram muitos recursos e saem poucos.

Em outro site, a mesma justificativa:

Para o presidente da Infraero, Gustavo Vale, a diferença é explicada pelos prazos de concessão. “O prazo de concessão do Galeão é cinco anos maior”, disse à DINHEIRO, após o leilão. A concessão do Galeão será válida por 25 anos, ante os 20 anos de Cumbica. Isso permitiria aos vencedores mais tempo para pagar os investimentos e obter retornos.

Mas isto não justifica, já que o valor do dinheiro no tempo reduz esta diferença substancialmente. Além disto, existe a maldição do vencedor, fato já comprovado nas finanças comportamentais: quem ganha um leilão é o grande perdedor, pois pagou muito acima do razoável.

Um fato interessante foi a reação do mercado para a empresa que perdeu o leilão: o preço das ações aumentou, o que pode ser um sinal de mau negócio para quem ganhou.

14 setembro 2013

Intervenção do governo no setor elétrico

A Eletrobras assumiu ontem a administração de duas empresas estaduais de distribuição de energia afundadas em dívidas: a Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA) e a Companhia Energética de Roraima (CERR). Por meio de acordos de gestão compartilhada, a estatal federal indicará o presidente e metade da diretoria e do conselho de administração de cada companhia, mas, por enquanto, não vai incorporar as duas distribuidoras, para não contaminar suas próprias contas.

Eis um típico exemplo de gerenciamento de resultados. Outro aspecto interessante é que as empresas são de médio porte. Mesmo assim, existe a preocupação de piorar, ainda mais, a contabilidade da Eletrobras.

Os governos estaduais vão receber empréstimos de R$ 2 bilhões da Caixa Econômica Federal — R$ 1,4 bilhão para o Amapá e 600 milhões para Roraima — e injetar recursos nas empresas para que elas possam investir e pagar dívidas com fornecedores. No fim do processo de saneamento, que deverá durar dois anos, as distribuidoras poderão ser compradas pela holding federal.


Dinheiro do contribuinte. E as empresas continuaram com o governo.

Outra empresa que está sob regime de gestão compartilhada com a Eletrobras é a Companhia Energética de Goiás (Celg). Nesse caso, já está sendo negociado o processo de federalização. Por serem inadimplentes, a CERR e a CEA, há vários anos, não têm autorização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para reajustar tarifas, o que agrava a situação financeira de ambas.

Para Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, era preciso encontrar uma solução para as empresas, mas a questão é se a Eletrobras deve fazer isso, “considerando sua má performance na administração de distribuidoras, que lhe trazem prejuízos bilionários”. Para Sales, seria melhor privatizar as companhias.


A privatização não é considerada aceitável no atual governo. Além disto...

O governador do Amapá, Camilo Capiberibe (PSB), disse que é contra a privatização da CEA. “Isso não é bom para o desenvolvimento, e não é o que deve ser feito, de acordo com o discurso o governo federal”, disse. Segundo o atual presidente da companhia, José Ramalho de Oliveira, se, depois do saneamento, a Eletrobras quiser vender a distribuidora, o governo estadual vai assumi-la de volta.


Empresas estatais são geralmente usadas com a finalidade política. A privatização tira dos governantes este importante instrumento de captura de votos. A resistência à privatização tem uma justificativa real.

Socorro federal no setor elétrico - PAULO SILVA PINTO - Correio Braziliense - 13/09/2013. Cartoon aqui

20 fevereiro 2013

Privatização

Logo no início do livro Privatize Já (CONSTANTINO, Rodrigo. Privatize Já. São Paulo: Leya, 2012) uma citação de Milton Friedman: “se colocarem o governo federal para administrar o deserto do Saara, em cinco anos faltará areia”. A obra de Rodrigo Constantino defende as vantagens da iniciativa privada, em detrimento da participação do estado na economia. O autor faz uma aposta: nos próximos cinco anos, os países que mais diminuírem a presença do estado irão avançar mais do que os países que mais aumentarem. Ou seja, ele acredita naquilo que escreve.

O livro está dividido em cinco partes. Na primeira, o autor aponta as vantagens da privatização, usando exemplos de diversos países. A seguir, uma discussão sobre como a privatização melhorou a vida no nosso país. A análise passa por diferentes setores que experimentaram o processo, como a telefonia e a mineração. Com muitos dados de emprego, crescimento da receita, prestação de serviço, entre outros, Constantino mostra que o processo de privatização realizado na década de noventa foi um sucesso. Na terceira parte, o autor afirma que os setores onde o estado ainda atua – correios, petróleo, bancos, por exemplo – podem ganhar eficiência se as atividades fossem executadas pela iniciativa privada. A quarta parte defende que muitas atividades que são executadas pelo governo teriam mais resultado se uma empresa fosse responsável. É o caso, por exemplo, da exploração espacial. A última parte é uma discussão sobre a posição política do partido governista.

A leitura do livro é fácil e agradável. Os argumentos apresentados são baseados em fatos. Num país onde os políticos têm medo de afirmar que defendem a iniciativa privada e muitos mamam nas tetas do governo, é um livro necessário. É bem verdade que a obra seria melhor se tivesse umas cem páginas a menos. Vale a pena? Vale.