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30 março 2014

Fazer um blog é um ato de amor

Eu sou uma pessoa que não entende nada de internet e quanto mais tempo on-line passo, menos entendo. Nunca vou conseguir compreender porque uns posts são mais lidos que outros, porque uns blogs são mais lidos que outros etc. Claro que tem a obviedade: um blog sobre poesia croata com análises no original provavelmente terá pouco acesso, um blog sobre celebridades tem mais chances de ultrapassar o limbo dos cem acessos diários – que é basicamente onde grande parte dos blogs se encontra etc. Mas falar além do óbvio, falar que eu posto sabendo no que vai dar é a maior mentira do universo. Na maior parte das vezes em que um post meu causa problema doméstico ou social o que mais tenho vontade de falar é: “Mas eu já disse tanta coisa pior!”.

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Fico pensando nisso quando vejo essa enxurrada de analista de mídias sociais e internet. Tem até um curso na Escola São Paulo ensinando a fazer “blog pessoal”. Conteúdo programático: como preencher o cadastro do blogspot? O que eles fazem? Viram pro “cliente” e dizem “faz isso aqui que é garantido”? Que furada.

Uma das melhores coisas que já me aconteceu foi trabalhar por duas semanas com uma menina que acredita piamente que compreende a internet. Ela pensa isso por ter um site conhecido, muitos seguidores no Twitter, sono e bocejos. Nunca ocorreu a essa pessoa que todo seu imenso sucesso virtual fosse motivado por: 1) O site ser relativamente legal para um certo público e não cometer erros muito brutais tipo não ter link permanente; 2) Acaso. A pessoa realmente acredita que o site bomba porque ela manja e, portanto, podia fazer outro site e ele fatalmente seguiria o caminho do primogênito. Sabe quantas vezes já ouvi falar do site dela depois de pedir as contas? Nenhuma. Parece que até o primeiro site está miando.

O máximo que eu poderia fazer com alguma honestidade seria ensinar para a pessoa humana virtualmente leiga como ela deveria agir caso tivesse pretensão de ser lida por alguém além da família nuclear, ex-namorados e garotas que a detestavam na escola. Porque eu tenho uma teoria de que qualquer blog tem pelo menos trinta leitores. Daí você me diz “Mentira, o Google Analytics me disse que meu blog passou dias sem um só acesso”. Calma, eu disse que você tinha trinta leitores, não que tinha trinta leitores que entravam todo dia, muito menos trinta pessoas que entravam diretamente no seu site, te dando um pageview e um location de graça. Fato é: existem trinta pessoas que sabem o que está acontecendo no seu blog, então, pare com essa lamúria de “caso algum dos meus três leitores não saiba” etc etc porque essa definitivamente é uma frase que integra o Top 100 de Sentenças Mais Chatas e Repetidas da Internet.

Essas trinta pessoas abençoadas são: sua mãe, todos os seus ex-namorados e as meninas (ou meninos) que não gostavam de você na escola (o que pode evoluir para cursinho, faculdade, trabalho, INSS). Não adianta dizer “ah, minha mãe não sabe ligar o computador”. Confia em mim que ela lê. Não se pode entender leitura como um processo linear e integral. Na melhor das hipóteses alguém vai ligar para sua mãe contando, o que significa que indiretamente ela lê o seu blog. Sabe aquele livro “Como Falar dos Livros que Não Lemos?”, de Pierre Bayard? Famílias são especialistas na versão virtual disso aí. Se não confia em mim vai lá e insere no próximo post “Minha mãe é obesa e viciada em rivotril” e me conta em quantos minutos recebeu uma ligação furiosa.

Fazer um blog é um ato de amor ao próximo. Quando você faz um blog dá a essas trinta pessoas uma função social, coisa de que elas muito careciam. O sujeito deixa de ser seu ex-namorado e vira seu leitor. O leitor é o novo ex-namorado.

Nessa parte eu deveria falar o que acho que o cidadão pode fazer para ser lido por meia dúzia de pessoas além de sua família nuclear, mas vai que um dia eu dou aula na Escola São Paulo? A primeira regra do professor moderno é fingir que está ensinando algo que não pode ser encontrado na primeira página do Google.
Já Matei Por Menos, Juliana Cunha

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