Translate

Mostrando postagens com marcador Petrobras. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Petrobras. Mostrar todas as postagens

19 maio 2017

House of Cards 2

Todos nós estamos acompanhando as notícias recentes sobre a delação dos executivos da empresa JBS e o envolvimento de pessoas importantes, incluindo o atual presidente da república. Talvez o principal sintoma da relevância das notícias sobre a contabilidade financeira seja o comportamento de ontem do mercado acionário brasileiro. A Bovespa perdeu R$219 bilhões em valor de mercado, depois de meses de crescimento. O índice caiu para 61.597 pontos, sendo a maior queda diária desde 2008. Pior foi o desempenho de algumas empresas: Petrobras, com queda de 15,7%, e JBS, com 9,6%.

Outro efeito foi o aumento do risco Brasil, medido pelo CDS. Este seguro contra calote chegou a 269 pontos no final da tarde de ontem, uma alta de quase 30% em relação ao dia anterior.

De forma mais conservadora, a Standard Poors afirmou que colocou as notas do grupo JF, que inclui JBS e Eldorado Celulose, sob observação. Em até 90 dias a agência de risco deverá apresentar um conclusão.

Como as notícias afetaram as empresas? A incerteza política aumentou o risco político. Empresas que atuam em infra-estrutura deverão perder projetos públicos e algumas privatizações podem ser adiadas. O ambiente de negócios, que melhorou substancialmente com a gestão da economia, também deve ser afetado.

Para as empresas do grupo JF a notícia da delação premiada dos principais executivos foi uma grande surpresa. O cerco sobre o grupo e seus negócios estranhos realizados nos últimos anos parece que foram suficientes para incentivar a denúncia. A Operação Greenfield, que levou a uma multa bilionária, era só o começo. Além disto, a imagem era muito ruim para os investidores. Afinal, a empresa cresceu baseado em operações estranhas. O recente resultado positivo da empresa deveu-se, conforme comentamos aqui, a despesa financeira.

A Petrobras também foi afetada com as notícias. Dois aspectos podem justificar isto. Primeiro, a possibilidade de mudança de gestão com a incerteza política. O atual presidente tem optado por caminhos que agradam ao mercado, enxugando a empresa e tentando melhorar seu desempenho. Segundo, um dos reflexos da crise foi a alta do dólar. Apesar do presidente afirmar que o movimento da moeda estrangeira é positivo para a empresa, só um inocente acreditaria nisto ("Em função da combinação das receitas, que são em dólar, das despesas que você tem uma parte em dólar e uma parte em reais, e da dívida, que a maior parte é em dólar... Quando você faz essa resultante, essa resultante é positiva para a empresa")

Os últimos resultados da empresa dependeram, substancialmente, da redução do dólar, que ajudou na redução do passivo oneroso da empresa.

Mas como sempre, nada que ocorre na JBS chega sem uma grande desconfiança. No caso, rumores dão conta que a empresa comprou moeda estrangeira nos últimos dias, entre 750 milhões de dólares a 1 bilhão. A desvalorização cambial ocorrida ontem fez com que esta compra fosse suficiente para pagar a multa do acordo de leniência da empresa. Além disto, os executivos da empresa venderam 300 milhões de reais em ações da empresa recentemente, o que aumenta seus ganhos.

Espera-se que a CVM ou outro regulador possa investigar estas operações. A CVM já avisou que está acompanhando e monitorando o mercado.

Finalmente é importante destacar que as notícias também tiveram repercussão em outros mercados. A bolsa espanhola fechou em baixa e um dos motivos foi a crise brasileira. As empresa Mapfre, de seguros, e o Banco Santander, foram quem mais perderam.

14 maio 2017

Fato da Semana: Recuperação da Petrobras?

Fato: Recuperação da Petrobras?

Data: 11 de maio

Contextualização 
Nos últimos meses a divulgação do resultado da Petrobras tem sido destaque. Um dos alvos da investigação de corrupção no Brasil, a empresa tenta se recuperar.

Os últimos resultados foram ruins, em razão da redução do valor de alguns ativos. Na quinta a empresa divulgou finalmente um resultado positivo. E sem grandes baixas contábeis.

Relevância
A divulgação do resultado da empresa marca o início da recuperação? Tudo indica que sim. O problema da dívida ainda não foi resolvido, mas a empresa, de forma consistente, está conseguindo gerar fluxo das operações.

O resultado apresentado foi ajudado pelo câmbio, que ajudou a reduzir a dívida e não comprometeu o resultado financeiro. Mas a empresa precisa cuidar do volume do caixa, que sofreu uma grande redução nos últimos meses.

Notícia boa para contabilidade?
Sim. A divulgação foi vista como um retrato da empresa, que afinal é o objetivo da contabilidade.

Desdobramentos
Talvez a diretoria atual da empresa tenha um prazo de validade, de menos de dois anos. O novo presidente da república, que será eleito em 2018, pode mudar a atual gestão. A empresa está preparada?

Mas a semana só teve isto?
Além da Petrobras, outras empresas divulgaram seus resultados.

13 maio 2017

Sorte ou Boa Gestão?

Na quinta a empresa Petrobras divulgou os resultados do primeiro trimestre de 2017. O destaque foi o lucro de R$4,5 bilhões e a redução do endividamento da empresa. A empresa estatal possui grandes eixos para ser analisada: a qualidade dos ativos, em especial do seu imobilizado, e o endividamento.

Ativo - O primeiro eixo, do ativo, tem contribuído com os resultados contábeis ruins. No passado, a empresa tomou muitas decisões erradas, fazendo investimento ruins. Hoje já sabemos que estas decisões ruins foram frutos de corrupção e megalomania dos seus dirigentes e da controladora. Isto fez com que o ativo da empresa estivesse mensurado de forma muito otimista, não refletindo o potencial de geração de riqueza. A Petrobras investiu, por exemplo, numa refinaria de baixa qualidade nos Estados Unidos. O valor de aquisição, constante do balanço da empresa até recentemente, não refletia nem o valor de utilização nem um possível valor de negociação. Diante do exposto, a empresa tem feito uma série de reconhecimento de perda de recuperabilidade de vários destes ativos nos últimos meses. O efeito deste reconhecimento é a redução do ativo e um efeito negativo sobre o resultado. Em lugar de fazer um único reconhecimento logo que ficou claro que existiam sérios problemas de mensuração na contabilidade da empresa, optou-se por fazer lançamentos parcelados das perdas. O balanço divulgado na quinta indica que este processo está encerrando. Ou seja, as próximas demonstrações podem apresentar resultados melhores do que aqueles obtidos nos períodos anteriores.

Dívidas - O segundo eixo de análise refere-se ao endividamento (gráfico ao lado). Se em março do ano passado a dívida total da empresa era de R$450 bilhões (ou R$370 bilhões a dívida líquida), neste ano a dívida caiu para R$365 bilhões (ou R$301 bilhões de dívida líquida). Em um ano a empresa conseguiu reduzir seu endividamento em R$85 bilhões (ou 69 bilhões considerando a dívida líquida). Mas esta redução deve ser considerada com cautela por dois motivos: em primeiro lugar a empresa hoje é menor que há doze meses, o que significa que a proporção da dívida sobre o ativo ainda é elevada; em segundo lugar, a dívida em dólar diminui somente US$10,7 bilhões, indicando que parte da redução pode ser creditada mais ao comportamento do câmbio do que aos esforços da gestão. Com efeito, o câmbio médio no primeiro trimestre de 2016 era de R$3,90/US$, enquanto que no primeiro trimestre de 2016 era de R$3,10.

Boa gestão ou sorte - O resultado da Petrobras no primeiro trimestre de 2016 parece ter sido uma combinação de sorte e gestão. É inegável que a gestão da empresa está tomando algumas decisões , que passam pela venda de ativos, redução do número de funcionários e revisão de algumas obras, que influenciam neste resultado. Mas o câmbio favorável e a recuperação nos preços também ajudaram no resultado. Prova disto é que o valor de mercado da empresa aumentou 54% nos últimos meses. Além disto, a comparação com as gestões de Gabrieli e Foster ajuda muito a atual gestão.

Em análise das demonstrações anteriores destacados que a empresa, apesar de estar numa situação ruim, ainda conseguia gerar caixa com as atividades operacionais. Mostramos também que este fluxo de caixa mantinha-se razoavelmente constante ao longo do tempo, ao contrário da variabilidade do resultado líquido. Este comportamento do resultado líquido era decorrente do reconhecimento das perdas com os ativos de baixa qualidade que a empresa estava fazendo no passado.

Mas as medidas que a gestão tomou nos últimos meses tem um preço. No primeiro dia de 2016 a empresa tinha caixa de 98 bilhões. Em três meses este volume caiu para 78 bilhões. Em mais um ano, R$17 bilhões saíram a mais do caixa e equivalentes. A dúvida é se esta queima de caixa irá persistir nos próximos meses.

Existe uma frase famosa que diz: o melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo; o segundo melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo mal administrada. A Petrobras mostrou que a segunda parte não é verdade.

05 maio 2017

Ainda Petrobras e Corrupção

Investigadores dizem ter comprovado desvios em contratos da petrolífera [Petrobras] e pagamentos de propinas viabilizados até pelo menos junho de 2016, já durante o governo Michel Temer e com a nova administração da Petrobras, empossada em 31 de maio do ano passado (Vieira, Após três anos de Lava-jato, corrupção continua a assolar setores da Petrobras, Valor 5 de maio de 2017)

Três aspectos no texto. Primeiro, uma empresa do tamanho da Petrobras talvez seja difícil eliminar os desvios em contratos, mesmo com os esforços realizados. Segundo, há uma diferença entre a situação atual e das três gestões passadas, onde foi institucionalizado um esquema de corrupção; isto é diferente - até onde se saiba - da situação atual, onde os problemas são localizados. Até onde se saiba, a atual gestão está fazendo esforços para resolver o problema. Como consequência, o título do texto foi muito infeliz ao afirmar que a corrupção "continua a assolar" a empresa baseada numa fonte genérica - "investigadores".

É interessante que a empresa publicou, no mesmo jornal, uma página comentando sobre a corrupção com o título "uma lei [Lei Anticorrupção] que já mudou a cultura das empresas". Parece que a publicidade da empresa foi muito mais jornalística que o texto de Vieira.

17 abril 2017

Aramco, governança e valor de mercado

A Saudi Aramco (ou Aramco) é uma empresa da Arábia Saudita, que explora o petróleo e derivados daquele país. A empresa possui a maior reserva de petróleo do mundo, sendo também a maior produtora. Isto faz da empresa a maior do setor de petróleo e derivados.

A empresa nasceu nos primórdios da exploração do petróleo na Arábia Saudita. Com a crise de 1973 e por conta do apoio do governo dos Estados Unidos a Israel, o governo daquele país começou a adquirir ações da empresa até que tomou o controle total em 1980, com 100% das ações.

Estima-se que a receita da empresa, em 2010, tenha sido de 311 bilhões de dólares ou 977 bilhões de reais na conversão atual (a receita da Petrobras é de 320 bilhões). Com 65 mil funcionários (a Petrobras possui 78 mil) e reservas de 260 bilhões de barris (ve1rsus 13 bilhões da empresa brasileira), produção de 12 milhões de barris por dia (versus 2,8 milhões), a empresa é um gigante no setor.

Quanto é o seu valor? A estimativa varia entre 1,25 trilhão a 10 trilhões de dólares, o que faz da empresa aquela de maior do mundo. Recentemente, o governo da Arábia Saudita anunciou a possibilidade de abrir o capital da empresa em 2018, vendendo 5% das ações. Aparentemente o governo daquele país pretende aumentar a participação do setor privado na economia, incluindo o mercado de capitais. Mas a bolsa da Arábia Saudita é pequena para comportar uma empresa avaliada em 2 trilhões de dólares por seus proprietários. Além disto, a participação dos investidores estrangeiros é reduzida naquele mercado (4%). Outro problema é a grande chance de existir preço diferenciado na privatização, onde os investidores locais receberiam um desconto.

Mas um ponto central é a questão da governança. Há dúvidas se os padrões sauditas de governança são adequados. Ao mesmo tempo, alguns mercados financeiros mundiais oferecem a possibilidade, para empresas internacionais, de abrir o capital sem cumprir padrões de governança local, o que seria um atrativo para a empresa saudita. Atualmente a empresa é supervisionada por um conselho de nove diretores, sendo três sem influência do governo.

Oferecendo 5% de uma empresa com valor de 2 trilhões de dólares, a oferta da Saudi Aramco seria a maior oferta pública de ações da história: 200 bilhões de dólareas. Mas um artigo de Gregory Brew questiona esta estimativa oficial. Este valor foi fruto da multiplicação do valor das reservas por US$ 8 por barril:

261 bilhões de barris x 8 = 2,1 trilhão.

(Por esta expressão, o valor da Petrobras seria 13 bilhões x 8 = 104 bilhões de dólares ou 327 bilhões de reais). Esta regra usada pelo governo para estimar o valor da empresa é falha. A Bloomberg (via aqui) usou o múltiplo para Rosneft (Rússia) e chegou a uma valor de 272 bilhões, versus 64 bilhões no valor de mercado. Até a ExxonMobil, uma empresa privada, seria supervalorizada com este múltiplo. E a Petrobras não vale 327 bilhões de reais.

Um estudo independente sugere um valor de 400 bilhões de dólares, que inclui no preço o fato da Saudi Aramco ser uma empresa estatal (e nós, brasileiros, sabemos como isto interfere no valor de uma empresa de petróleo). Além disto, como as demonstrações contábeis não são divulgadas, não se sabe a estrutura de custos da empresa. Não é possível saber sequer quanto são os impostos; as informações disponíveis informam que a empresa paga royalties sobre as receitas e imposto de 85% sobre o lucro. Este peso dos tributos possui impacto sobre o valor.

15 abril 2017

Reescrevendo a história

Em março de 2017, quando a divulgação do resultado da Petrobrás, publicamos uma observação sobre a tendência da empresa em reescrever a história:

Obviamente que a empresa atrai a atenção pelos problemas de corrupção dos últimos anos. É interessante que a área responsável pelas demonstrações contábeis usa o espaço para reescrever a história. Por seis vezes a palavra “vítima” aparece nas informações contábeis

Mais adiante afirmamos:

Há muitas controvérsias. É interessante notar que Graça Foster assumiu a empresa em fevereiro de 2012. Mas Nelson Cerveró permaneceu como diretor financeiro da BR até 2014. Precisa dizer mais alguma coisa?

Agora, com os depoimentos da Odebrecht, há uma acusação que o ex-presidente da Petrobras, Bendine, recebeu 3 milhões de reais enquanto presidente da Petrobras. Bem depois de 2012.

25 março 2017

Fato da Semana: Petrobras em 2016



Fato: Petrobras em 2016

Data: 22 de março de 2017

Contextualização - Com a operação lava-jato foi constatado que a empresa estatal Petrobras estava sendo usada num esquema que envolvia políticos, empreiteiras, diretores e elevados cargos republicanos. A consequência contábil era que os ativos da empresa estavam subestimados, assim como diversas decisões foram tomadas a partir do dinheiro da corrupção, ignorando qualquer conselho técnico. Somente após um elevada amortização dos ativos, o balanço da empresa foi publicado.

Entretanto, tudo leva a crer que o valor reconhecido como perda em 2014 não foi suficiente. Nos balanços seguintes, o valor do impairment levado a resultado foi gigantesco, atingindo a 113 bilhões de reais ou 17% dos ativos existentes no final de 2013.

Ao mesmo tempo, a empresa não tem condições de receber aporte do seu maior acionista - a União - e apresenta um volume de dívida que impede um reconhecimento imediato destas perdas.

As demonstrações publicadas nesta semana mostram um prejuízo de quase 15 bilhões de reais, o não pagamento de dividendos pelo terceiro ano consecutivo e uma dívida elevada. Mas, por outro lado, a empresa continua gerando lucro operacional (desconsiderando a perda do impairment) e caixa das operações.

Relevância - Três aspectos foram destacados pelo blog na sua análise. O primeiro é a baixa rentabilidade das aplicações financeiras, abaixo até da inflação. O segundo é a tentativa de reescrever a história através das demonstrações contábeis, dizendo que o esquema de corrupção ocorria entre 2004 a abril de 2012. E a tentativa de assumir um papel de vítima do esquema de corrupção.

As demonstrações contábeis da Petrobras começam a representar um retrato do que ocorreu na empresa nos últimos anos. E como tudo isto ocorreu sem que o auditor soubesse, os sistemas de controle funcionassem e os investidores não punissem a empresa com a queda no preço das ações.

Notícia boa para contabilidade? Não. Analisar as demonstrações contábeis é perguntar como tudo isto aconteceu. As perdas de 113 bilhões de reais acumuladas ao longo dos três últimos anos representam mais de 500 por brasileiro. É muito dinheiro desviado, sem que fosse detectado pelos sistemas de controle (aí incluindo a auditoria). A contabilidade, como responsável por relatar a situação de uma entidade, falhou.

Desdobramentos - Creio que as próximas demonstrações terão resultados melhores. Mas a falta de dividendos pelo terceiro ano seguido pode gerar uma discussão interessante. Se for constatado que a empresa não relatou todas as perdas já em 2014, as demonstrações de 2014 e 2015 podem ser contestadas. Quanto aos três aspectos destacados pelo blog (papel de vítima, baixa rentabilidade das aplicações financeiras e tentativa de reescrever a história) somos céticos, infelizmente.

Mas a semana só teve isto? Dois outros fatos se destacam. O primeiro são as consequências da operação Carne Fraca, que atingiu o setor de proteínas brasileiro. O blog destacou a questão da gestão de riscos, mas outras análises podem ser feitas. O segundo fato é o acordo PwC e MF Global.

22 março 2017

Petrobras divulga resultado de 2016

Ontem a Petrobras divulgou os resultados do quarto trimestre de 2016 e do exercício social de 2016. Há boas e más notícias. São centenas de páginas: 705 se considerar o arquivo PDF do formulário de referência ou 243 páginas do relatório de administração mais as demonstrações contábeis.

Os principais pontos destacados pela imprensa e pela área de relações com investidores foram: fluxo de caixa livre positivo pelo sétimo semestre consecutivo, redução da receita em 12%, redução do endividamento que ainda está em níveis elevados, lucro líquido trimestral de 2,5 bilhões de reais e prejuízo líquido no ano de 14,8 bilhões, não pagamento de dividendos pelo terceiro ano consecutivo.

Vamos fazer alguns comentários genéricos sobre pontos mais interessantes deste resultado.

Lucro Operacional – O lucro operacional é aquele proveniente das operações da empresa. No Brasil muitas pessoas possuem o costume de excluir deste lucro as receitas financeiras, que conceitualmente deveria fazer parte do resultado gerado pelos ativos. Quando se considera sob esta ótica temos que o lucro operacional em 2016 foi 28 bilhões maior que no ano anterior. É um bom resultado, principalmente que ocorreu uma redução da receita de 39 bilhões e de 8,6 bilhões no lucro bruto. O grande destaque foi, sem dúvida nenhuma, a redução nas amortizações do impairment, que reduziram de 48 bilhões em 2015 para 20 bilhões em 2016. Dito de outra forma, a melhoria no lucro operacional ocorreu pela redução nesta despesa.

Por sinal, a soma nos três últimos anos, da perda no valor de recuperação de ativos foi de 113 bilhões. Como o total de ativos no final de 2013 era de 658 bilhões, o valor levado a resultado corresponde a 17% do ativo.

A figura a seguir faz um paralelo interessante da empresa:

Nesta figura consideramos o lucro operacional da forma como foi divulgado, somamos a receita financeira – para manter uma coerência teórica – e somamos a perda por impairment. Veja como fica interessante a informação: a exceção do ano de 2014, nos demais o resultado operacional da empresa tem sido bastante regular.

Um pouco desta regularidade também aparece na DFC, especificamente no caixa operacional. Em 2013 a empresa gerou 56,21 bilhões, aumentando para 62,241 e 86,407 nos dois anos seguintes. Em 2016 o caixa gerado nas atividades operacionais foi de 89,709 bilhões, bem acima do total apresentado acima (quase 150 bilhões).

Projeção dos Analistas – Na terça, o Valor Econômico publicou uma projeção de cinco empresas para a receita, o Ebitda e o Lucro do trimestre da empresa. A figura a seguir é uma reprodução destas estimativas, com o acréscimo do valor divulgado no dia de ontem e a previsão que mais se aproximou do valor efetivo.

De uma maneira geral, os analistas foram otismistas com a receita da empresa em quase 3 bilhões de reais, a exceção do Morgan Stanley que previu 69,1 bilhões versus 70,5 bilhões divulgados na DRE da empresa. O lucro médio previsto esteve um pouco acima do valor divulgado, mas como o lucro acumulado era substancialmente negativo isto não afetou o resultado.

Receitas Financeiras – Anteriormente consideramos as receitas financeiras para análise da rentabilidade da empresa. Vamos considerar agora como a empresa tem atuado nas suas aplicações financeiras. Em 2016 as receitas financeiras chegaram a 3,638 bilhões. Será que este número é positivo ou não.

Na tabela acima tomamos os títulos e valores mobiliários e as aplicações financeiras de curto prazo. Estes valores foram obtidos a partir da nota explicativa e corresponde ao balanço encerrado em 31 de dezembro de cada ano. Os valores são expressivos; a título de exemplo, somente em 31 de dezembro de 2016 a empresa tinha aplicado do seu ativo 70 bilhões de reais ou 9,6% do total. É o segundo maior grupo de ativo, atrás apenas do imobilizado. A tabela mostra que este valor aumentou de 44 bilhões para 98 bilhões no final de 2015 e sofreu um redução de 28 bilhões.

As receitas financeiras foram obtidas na Demonstração do Resultado da empresa. Este é um valor um pouco impreciso já que as notas explicativas mais confundem do que esclarecem.

Calculamos a rentabilidade de duas formas. A primeira, dividimos as receitas financeiras sobre o valor existente inicialmente no ativo. Esta forma deixa de considerar as novas aplicações realizadas durante o ano. O segundo cálculo da rentabilidade foi realizado dividindo as receitas pelo valor médio das aplicações. Os resultados foram diferentes, obviamente, favorecendo a empresa na primeira forma nos anos anteriores e na segunda expressão em 2016. Mas é perceptível que a rentabilidade destas aplicações está em queda.

Mas o pior é quando comparamos com inflação. Nos dois últimos anos, o resultado das aplicações financeiras da empresa sempre esteve abaixo da inflação oficial. Observe que a comparação é com a inflação e não com a rentabilidade da Selic (13,65% em 2016, 14,15% em 2015 e 11,15% em 2014 ). Ou seja, um resultado horroroso.

Reescrevendo a história – Obviamente que a empresa atrai a atenção pelos problemas de corrupção dos últimos anos. É interessante que a área responsável pelas demonstrações contábeis usa o espaço para reescrever a história. Por seis vezes a palavra “vítima” aparece nas informações contábeis:

apesar de a Petrobras ser vítima nesse processo e de, em nenhum momento, haver se beneficiado direta ou indiretamente dos ilícitos.

A Petrobras reforça, por fim, que está sendo oficialmente reconhecida pelas autoridades públicas como vítima nesse processo de apuração.

De qualquer forma, entendemos que fomos vítimas do sistema de corrupção desvendado pela Operação Lava Jato e buscamos demonstrar e comprovar essa posição, conforme já foi reconhecido pelo Judiciário brasileiro.

Somos oficialmente reconhecidos como vítima dos crimes apurados na “Operação Lava Jato” pelo Ministério Público Federal e pelo juiz competente para julgar os processos criminais relacionados ao caso.

A nossa posição de vítima foi reconhecida também em decisões do Supremo Tribunal Federal.

A Petrobras não é um dos alvos das investigações da “Operação Lava Jato” e é reconhecida formalmente pelas Autoridades Brasileiras como vítima do esquema de pagamentos indevidos

Isto é conhecido como vitimização. O problema mais grave é tentar reescrever a história. Veja o que diz o relatório da empresa:

O referido esquema envolvia um conjunto de empresas que, entre 2004 e abril de 2012, organizaram-se em cartel para obter contratos com a Petrobras

o referido esquema consistia em um conjunto de empresas que, entre 2004 e abril de 2012, se organizaram em cartel para obter contratos com a Petrobras

foi concluído, com base nos depoimentos, que o período de atuação do esquema de pagamentos indevidos foi de 2004 a abril de 2012.

incluindo também os aditivos aos contratos originalmente assinados entre 2004 e abril de 2012.

Há muitas controvérsias. É interessante notar que Graça Foster assumiu a empresa em fevereiro de 2012. Mas Nelson Cerveró permaneceu como diretor financeiro da BR até 2014. Precisa dizer mais alguma coisa?

08 março 2017

CVM determina refazimento das demonstrações da Petrobras

Eis a nota divulgada pela CVM sobre o refazimento das demonstrações da Petrobras de 2013 a 2015 e dos ITR em razão da contabilidade de hedge:

Trata-se de pedido de efeito suspensivo, formulado pela Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras (“Companhia”), visando a não divulgação imediata do teor do Ofício nº 30/2017/CVM/SEP/GEA-5 (“Ofício”), de 03.03.2017, por meio do qual a Superintendência de Relações com Empresas – SEP determinou à Companhia o refazimento e a reapresentação das demonstrações financeiras (“DFs”) e Formulários DFP 31.12.2013, 31.12.2014 e 31.12.2015, e dos Formulários ITR 2013 (2º e 3º), 2014, 2015 e 2016 por conta de inconsistências na adoção da contabilidade de hedge (hedge accounting) pela Companhia.

Após o recebimento do Ofício, ainda em 03.03.2017, a Companhia apresentou expediente destacando sua discordância com as conclusões do Ofício, por razões a serem demonstradas no prazo recursal previsto na Deliberação CVM nº 463/2003 (“Deliberação 463”) e solicitando efeito suspensivo: (i) à determinação de refazimento e reapresentação; e (ii) à publicação do conteúdo do Ofício.

A Companhia alegou, essencialmente, que a determinação do refazimento das DFs poderia impactar o seu processo de reestruturação, com graves prejuízos a legítimos interesses da Companhia e de seus acionistas, podendo gerar forte instabilidade na cotação das ações, além do risco de suscitar incorreta associação entre a determinação e os fatos relacionados à Operação Lava-Jato.

Nesse sentido, a Companhia apontou que seria de fundamental relevância que a determinação de republicação, e a divulgação do teor do Ofício, apenas ocorressem após decisão definitiva do Colegiado, evitando-se que tal determinação fosse interpretada como decisão final da CVM.

Em resposta, considerando o pleito da Companhia e na premissa de que será interposto recurso contra a determinação de republicação, a SEP informou o deferimento do pedido de efeito suspensivo relativo à determinação, nos termos do inciso V da Deliberação 463.

13 fevereiro 2017

Blindagem da Petrobras

A discussão sobre a redução da influência política nas empresas estatais preocupa-se com a normatização. Eis um exemplo:

Todos os presidentes, diretores e gerentes executivos das empresas que integram o grupo Petrobrás são hoje obrigados a passar por esse crivo, que leva em conta não apenas a verificação da qualificação profissional para o cargo, mas também o seu envolvimento com partidos políticos (como contribuições), rastreamento de ações na Justiça e outras centenas de dados pessoais. É feito uma espécie de dossiê do indicado.
Mesmo com esses e outros reforços na governança adotados desde meados de 2015, a pergunta que todo mundo tem feito (principalmente agências de risco que avaliam a nota de crédito) é se as mudanças vão de fato se perpetuar no futuro. Se a blindagem da empresa é para valer e vai continuar.

(...) Basta ver o que o já aconteceu nos Correios e na Caixa, onde o governo passou por cima da lei para agradar à base alisada. O banco estatal comandado por Gilberto Occhi, indicado pelo PP, trocou 12 vice-presidentes no fim de 2016 para agradar a sete partidos: PMDB, PSDB, DEM, PR, PRB, PP e PSB. Já os Correios, presidido por Guilherme Campos, do PSD, teve de recorrer a uma decisão judicial que mandou afastar seis vice-presidentes dos respectivos cargos porque a empresa não comprovou que eles tinham a qualificação mínima exigida pela nova lei. A diretoria da estatal, que tem o monopólio do envio de cartas, tem indicações do PSD, PSDB, PMDB e PDT.

No caso da Petrobrás, o problema é mais grave porque a empresa adotou regras internas que são mais duras do que a lei e o decreto de regulamentação. Ou seja, a legislação está aquém do que vem sendo praticado. A lei é menos forte. Na prática, isso pode levar a uma situação esdrúxula. O que poderá acontecer, se houver uma nomeação de alguém de fora do quadro de pessoal da empresa, cuja indicação cumpre os critérios da Lei, mas não atende as regras internas de governança?

Especialistas avaliam que essa situação mostra que a Petrobrás não está de todo blindada. O problema tem sido discutido na área econômica e na própria empresa, que considera importante que institucionalmente a companhia esteja mais protegida. As mudanças de governança devem ser incluídas no estatuto.


Existe uma forma bastante eficiente de blindagem: a privatização. A discussão ficou mais interessante já que a SP elevou a nota da empresa para BB-. Apesar disto, a nota ainda está abaixo do bônus Brasil e corresponde ao terceiro patamar do grau especulativo.

06 fevereiro 2017

Cobrando perdas por corrupção

Segundo Juliano Basile (Petrobras quer ser ressarcida de fraudes, Valor Econômico, 6 fev 2017, na capa, e Petrobras cobrará perdas por corrupção, p. B5), a empresa entende que foi vítima do esquema de corrupção e que pedirá para ser ressarcida pelos prejuízos que teve com os desvios de corrupção nos seus contratos. A primeira parte da frase anterior é muito complicada: a empresa se diz vítima, mas quando toda direção parecia estar envolvida no esquema, pode-se dizer isto? Parece razoável imaginar que uma empresa que foi tomada por um grupo de pessoas que desviaram recursos seja “vítima”; mas supor que a justiça irá trabalhar com esta premissa parece forte demais. É mais fácil a justiça cobrar as multas e deixar que a empresa possa buscar a reparação em outro processo.

O segundo aspecto é interessante pois a emprega alega ter a receber R$5.7 bilhões pelos desvios “que foram apurados até aqui pela Lava-Jato”. Este é um número mágico e para muitos setores da empresa confortável. Não por coincidência, é um valor que se aproxima bastante daquele que foi apresentado pela empresa no balanço do terceiro trimestre de de 2014, ainda na gestão de Graça Foster. Assim, a empresa pretende insistir neste número mágico, que discordamos fortemente. Nossa estimativa é que o rombo foi de 20 bilhões, mas devemos destacar que a própria empresa reconheceu que seu número mágico de 6 bilhões é baseado numa estimativa grosseira. Importante destacar que a comissão cobrada era de 3% do valor dos negócios; isto representaria negócios de 190 bilhões (5,7 dividido por 3%), numa empresa que somente o imobilizado era superior a 500 bilhões de reais. Somente ao departamento de Justiça dos Estados Unidos a Braskem, onde a Petrobrás é acionista, tem-se um pagamento de 957 milhões de dólares.

30 dezembro 2016

Novo auditor

A Petrobras irá contratar KPMG como auditor, em substituição a PwC. Esta é uma notícia da semana passada. Mas somente agora este blogueiro percebeu a manchete do Going Concern, com uma observação: "não a Deloitte, obviamente"


14 novembro 2016

Custo da Corrupção

A Petrobrás, a partir de auditorias internas, tem uma estimativa preliminar de que o grupo Odebrecht participou do desvio de aproximadamente R$ 7 bilhões da estatal. Os valores levam em consideração não apenas obras de engenharia. Incluem todo um passivo que teria sido criado com superfaturamentos aplicados em contratos de construção de unidades operacionais, de fornecimento de equipamentos, como sondas, e de prestações de serviços, como exploração de petróleo, e que ajudaram a cobrir o pagamento de propinas no esquema de corrupção que envolveu executivos da Petrobrás e políticos. (Petrobrás estima em pelo menos R$ 7 bi desvios em contratos com a Odebrecht, Alexa Salomão, O Estado de S Paulo, 14 de nov 2016)

No dia anterior o jornal tinha divulgado que a delação dos executivos da empresa irá duplicar a Lava-Jato. O número que o jornal apresenta mostra como a estimativa realizada no passado sobre o efeito da corrupção na empresa esta subestimado. Reforça isto a seguidas amortizações que a empresa fez, inclusive no último trimestre. Em suma, a empresa foi pouco conservadora na amortização e perdeu uma grande chance de limpar efetivamente o seu balanço; uma justificativa desta atitude talvez esteja no índice de endividamento.

11 novembro 2016

Prejuízo de 16,4 bilhões da Petrobras

A demonstração contábil da empresa estatal Petrobras do terceiro trimestre apontou um prejuízo de 16,5 bilhões de reais. O principal fator foi o resultado do teste de recuperabilidade. Com a elevação da taxa de desconto (em razão do risco Brasil e seus efeitos) e a postergação de vários projetos, em influencia no fluxo de caixa, resultou numa amortização de 15,7 bilhões. Além disto, o resultado da venda de alguns negócios não foi lucrativo para a empresa. Dois outros fatores foram citados: os processos judiciais e as demissões voluntárias.

Em razão disto, pode-se dizer que o terceiro maior prejuízo da empresa deveu-se ao passado. Projetos de rentabilidade duvidosa estão sendo agora levados a resultado; o inchaço da empresa contribui para a necessidade de redução dos gastos de pessoal; e a expansão no exterior, que resultou em Pasadena, precisam ser reconhecidos como erros grosseiros de gestão.

18 agosto 2016

Sobrepreço na Petrobras mostra que a empresa foi conservadora

Ao análise as contas da construção das unidades de destilação atmosférica (UDA) e das unidades de hidrotratamento (UHDT) da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), no Estado de Pernambuco, o TCU chegou a conclusão que ocorreu superfaturamento. Conforme nota do TCU

Em auditorias anteriores foi apurado dano potencial ao erário no montante de R$ 2,1 bilhões, em valores atualizados. Esse valor foi obtido com a análise do superfaturamento decorrente de preços excessivos verificados nos contratos originalmente firmados. Não foram analisados, ainda, quantitativos decorrentes de aditivos contratuais nas duas obras.

O objetivo do processo atual foi apurar o valor exato do prejuízo e imputá-lo aos responsáveis envolvidos. Na avaliação, o tribunal constatou que o montante do prejuízo superou o valor dos pagamentos indevidos aos agentes da Petrobras. Isso porque tais pagamentos ilícitos afetaram a lisura das licitações, permitindo a cartelização e a prática de preços acima dos de mercado pelas empresas contratadas.

O dano constatado foi dividido em duas parcelas, a primeira é referente à diferença entre os preços contratados e o valor da estimativa de custo da Petrobrás. A outra parte do superfaturamento é oriunda da diferença entre o orçamento estimativo da Petrobrás e os valores de referência utilizados pelo TCU.

Os percentuais dos sobrepreços apropriados nos contratos da UDA e UHDT são da ordem de 69% e 88%, respectivamente. Além disso, foram verificados o recebimento de vantagens indevidas sobre o valor total dos contratos e a prática de diversos atos que direcionaram as licitações. Entre eles estão a divulgação de informações sigilosas da Petrobras, a não-inclusão de novos concorrentes após o cancelamento de um procedimento licitatório por preços excessivos e a omissão para evitar que o cartel de empresas obtivesse contratos com o valor próximo ao limite máximo permitido pela Petrobras.


Isto reforça a tese deste blog que o valor estimado pela empresa Petrobras para fazer a amortização referente a corrupção foi baixo.

13 agosto 2016

Fato da Semana: O balanço da Petrobras

Fato: Balanço da Petrobras

Data: 11 agosto de 2016

Precedentes
2014 - A operação lava-jato revela que foi construído na empresa um grande esquema de corrupção.
abr/15 -A empresa divulga os resultados do terceiro trimestre e do final do ano de 2014, com um prejuízo enorme
2015 - Os balanços do ano apresentam uma empresa com menor capacidade de geração de lucro.
mar/16 - Divulga o balanço de 2015, ainda com os efeitos da corrupção.
ago/16 - No balanço do primeiro semestre de 2016 ainda estão presentes os efeitos da corrupção na empresa.

Notícia boa para contabilidade?
Apesar do esforço da empresa em divulgar o Ebitda, o comportamento das vendas, a evolução da dívida e o fluxo de caixa, o que as pessoas estão lendo é o lucro contábil. A razão é simples: é neste item que percebemos claramente os efeitos da gestão criminosa ocorrida na empresa durante a presidência Gabrielli e Foster. Em agosto perguntamos no fato da semana se a empresa tinha chegado ao fundo do poço. O balanço responde que não: agora as amortizações da Comperj estão afetando o resultado.

Desdobramentos - O resultado do semestre mostra que a empresa teve sorte com a questão cambial, que ajudou substancialmente na redução da dívida em dólar. Mas sorte não basta e a queima do caixa preocupa.

Mas a semana só teve isto? O balanço do BTG também foi destaque. E o estudo de Oxford, mostrando que os custos do Rio 2016 não foram tão elevados assim.

07 julho 2016

Parte interessada

A imprensa (aqui e aqui) informa que a empresa Petrobras entrou com um pedido no Supremo para ser “assistente de acusação” do presidente da Câmara Eduardo Cunha. Cunha teria recebido 5 milhões de dólares de propina por contratos de navios-sonda com a petroleira.

Não é muito comum uma empresa ser assistente de acusação, mas a solicitação da Petrobras está coerente com sua estratégia sobre as acusações de corrupção que ocorreram na empresa. Nos últimos meses a linha de defesa da empresa é tentar separar a questão da corrupção das falhas nos controles internos. Basicamente é afirmar que a empresa foi uma vítima de um esquema praticado por terceiros. Isto está claro na afirmação: “a estatal sustenta não haver dúvidas de que foi a maior vítima do esquema de corrupção apurado pela Operação Lava Jato”. Ou nos termos do pedido da empresa onde se diz que “[a empresa] sofreu diretamente os efeitos negativos do delito praticado”.

Sem dúvida nenhuma este é um assunto bastante intricado. Ao adotar a estratégia de vítima, a Petrobras tenta preservar a continuidade. Mas um questionamento óbvio é que provavelmente os maiores prejudicados foram seus acionistas e, também em razão do modelo monopolista adotado no Brasil na produção e distribuição do petróleo, os consumidores do seu produto. Alguns stakeholders parecem que não foram atingidos pelos problemas da empresa. Durante anos os consumidores pagaram um combustível mais caro em razão dos elevados custos de produção e da necessidade de manter o “nosso” petróleo; aqueles que compraram as ações da empresa, incluindo os que adquiriram algum tipo de cota de fundo de investimento com renda variável, também sofreram perdas e foram, e são, vítimas da gestão da empresa.

Outro aspecto interessante da questão é a teoria da agência. A Petrobras é um excelente estudo de caso da aplicação desta teoria. Os objetivos dos agentes, que foram diretores e corrompidos durante anos, eram completamente diferentes daqueles que compraram as ações da empresa em 2011 (outro exemplo está aqui). E não foram criados mecanismos para que houvesse uma convergência dos objetivos; pelo contrário, os mecanismos de governança e gestão de riscos permitiam que as distâncias entre os objetivos fossem gritantes.

Mas um aspecto interessante da teoria da agência é que seus autores afirmam que uma empresa é uma ficção legal (aqui um caso cômico onde isto é demonstrado). Poderia uma ficção legal ser uma parte interessada?

01 junho 2016

CVM e Petrobras

A Comissão de Valores Mobiliários fez agora um pronunciamento divulgando os processos envolvendo a empresa Petrobras. São VINTE processos, sendo seis inquéritos administrativos, quatro processos sancionadores e dez processos administrativos. Nos processos administrativos apura-se a responsabilidade de Almir Barbassa (diretor de RI), de Guido Mantega e outros membros do Conselho de Administração, além dos ex-presidentes Gabrielli e Foster. Nos processos administrativos, destaco os referentes as empresas de auditoria e a denúncia sobre o teste de recuperabilidade.

Eis a lista:

Inquéritos Administrativos (levantamento e apuração de informações. Status em 27/05/2016: em instrução junto à Superintendência de Processos Sancionadores – SPS):

(i) 14/2014: tem por objeto apurar eventuais irregularidades relacionadas à possível inobservância de deveres fiduciários de administradores da companhia no que concerne, especificamente, à Pasadena Refinery System Inc.;

(ii) 05/2016: tem por objeto apurar eventuais irregularidades relacionadas à possível inobservância de deveres fiduciários de administradores da companhia no que concerne, especificamente, à construção da Refinaria Abreu e Lima – RNEST;

(iii) 06/2016: tem por objeto apurar eventuais irregularidades relacionadas à possível inobservância de deveres fiduciários de administradores da companhia no que concerne, especificamente, à construção do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – COMPERJ;

(iv) 07/2016: tem por objeto apurar eventuais irregularidades relacionadas à possível inobservância de deveres fiduciários de administradores da companhia no que concerne, especificamente, à contratação da SBM Offshore;

(v) 08/2016: tem por objeto apurar eventuais irregularidades relacionadas à possível inobservância de deveres fiduciários de administradores da companhia no que concerne, especificamente, à contratação de construção dos Navios Sonda Petrobras 10000, Vitória 10000 e Pride DS-5; e

(vi) 09/2016: tem por objeto apurar eventuais irregularidades relacionadas à possível inobservância de deveres fiduciários de administradores da companhia no que concerne, especificamente, à contratação de construção do Navio Sonda Titanium Explorer.



Processos Administrativos Sancionadores (acusação formulada):

(i) RJ-2014-3402: apura a responsabilidade de Almir Guilherme Barbassa, na qualidade de Diretor de Relações com Investidores da Petrobras, pelo descumprimento ao parágrafo único do artigo 6° da Instrução CVM 358, combinado com o § 4° do artigo 157 da Lei 6.404 (Status em 27/05/2016: na Superintendência Geral – SGE - para análise de proposta de Termo de Compromisso apresentada);

(ii) RJ-2015-2386: apura a responsabilidade de Guido Mantega, Miriam Aparecida Belchior, Francisco Roberto de Albuquerque, Luciano Galvão Coutinho, Marcio Pereira Zimmermann, Sérgio Franklin Quintella, Jorge Gerdau Johannpeter e José Maria Ferreira Rangel, na qualidade de membros do Conselho de Administração da Petrobras, pelo descumprimento ao artigo 155, caput, da Lei 6.404 (Status em 27/05/2016: com o diretor-relator do processo, Pablo Renteria);

(iii) RJ-2015-10276: apura a responsabilidade da Petrobras; de Almir Guilherme Barbassa; de José Sergio Gabrielli de Azevedo; de Maria das Graças Silva Foster; do Banco Bradesco BBI S/A; e de Bruno D'Avila Melo Boetger em decorrência da infração às Instruções CVM 400 e 480 (Status em 27/05/2016: na Procuradoria Federal Especializada – PFE/CVM - para análise da legalidade da proposta de Termo de Compromisso apresentada); e

(iv) RJ-2015-10677: apura a responsabilidade da União Federal, na qualidade de acionista controladora Petrobras, por infração ao art. 116, parágrafo único, da Lei 6.404 (Status em 27/05/2016: O diretor relator do processo, Roberto Tadeu, encaminhou o referido para consulta junto à Superintendência Geral – SGE).



Processos Administrativos (procedimentos de análise):

(i) RJ-2013-7516, aberto em 12/07/2013: análise de ITR (Status em 27/05/2016: Gerência de Acompanhamento de Empresas 5 – GEA5);

(ii) RJ-2014-13943, aberto em 8/12/2014: análise da atuação da PricewaterhouseCoopers Auditores Independentes junto à Petrobras (Status em 27/05/2016: Gerência de Normas e Auditoria – GNA);

(iii) RJ-2014-14590, aberto em 18/12/2014: análise da atuação da KPMG Auditores Independentes junto à Petrobras (Status em 27/05/2016: Gerência de Normas e Auditoria – GNA);

(iv) RJ-2015-1020, aberto em 02/02/2015: análise de informações eventuais de companhia (Status em 27/05/2016: Gerência de Acompanhamento de Empresas 5 – GEA5);

(v) RJ-2015-3346, aberto em 23/04/2015: analisar as DF/DFP da Petrobras, divulgadas em 22/04/2015 (Status em 27/05/2016: Gerência de Acompanhamento de Empresas 5 – GEA5);

(vi) RJ-2015-5549, aberto em 02/06/2015: análise da atuação da PricewaterhouseCoopers Auditores Independentes junto à Petrobras (1ª ITR2015) (Status em 27/05/2016: Gerência de Normas e Auditoria – GNA);

(vii) SP-2015-356, aberto em 02/10/2015: reclamação de investidor (Status em 27/05/2016: Gerência de Acompanhamento de Empresas 3 – GEA3);

(viii) RJ-2016-687, aberto em 21/01/2016: suposta irregularidade na divulgação de informações pelo administrador da Cia (Status em 27/05/2016: Gerência de Orientação aos Investidores – GOI1);

(ix) RJ-2016-3626, aberto em 28/03/2016: reclamação de investidor (Status em 27/05/2016: Gerência de Acompanhamento de Empresas 5 – GEA5);

(x) SP-2016-182, aberto em 16/05/2016: denúncia a respeito do impairment realizado pela companhia em seu balanço patrimonial (Status em 27/05/2016: Gerência de Orientação aos Investidores – GOI1).



Por fim, cabe lembrar que:

(i) a Lei que criou a CVM (6385/76) e a Lei das Sociedades por Ações (6404/76) disciplinaram o funcionamento do mercado de valores mobiliários e a atuação de seus participantes, dentre os quais as companhias abertas, seus controladores, administradores, investidores, bolsa de valores e intermediários;

(ii) a Autarquia tem poderes para disciplinar, orientar e fiscalizar a atuação dos diversos integrantes do mercado de valores mobiliários;

(iii) a Lei atribui à CVM competência para apurar, julgar e punir irregularidades eventualmente cometidas no mercado. Nesse contexto, diante de qualquer possível desvio de conduta no âmbito da sua jurisdição, a Autarquia inicia uma apuração específica dos fatos, que pode levar a abertura de um procedimento sancionador (inquéritos administrativos ou termos de acusação), bem como, no que diz respeito a matérias não abrangidas pela sua esfera de competência, informa os fatos aos órgãos ou entidades competentes, para adoção das providências cabíveis;

(iv) a CVM realiza as suas atividades de supervisão, dentre outras ações, mediante o acompanhamento da divulgação de informações relativas a companhias abertas, demais participantes do mercado e aos valores mobiliários negociados;

(v) as informações sobre a existência de processos administrativos em trâmite na CVM, as partes envolvidas e a última movimentação interna podem ser pesquisadas na página da Comissão na Internet (www.cvm.gov.br), no link ‘Consulta a Processos’, a partir, por exemplo, do nome da companhia envolvida;

(vi) é possível, ainda, consultar as respostas da companhia a questionamentos da CVM acessando as informações divulgadas pela Petrobras, por meio do Sistema IPE, no site da Autarquia;

(vii) ressalta-se que o resultado da pesquisa acima citada pode não incluir apurações preliminares, investigações ou processos que estejam tramitando em sigilo; e

(viii) os autos dos processos administrativos da CVM podem ser objeto de pedido de vista, nos termos da regulamentação específica.