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13 novembro 2008

Fusão e acionistas

Fusão de bancos e direitos de acionistas
João Luiz Coelho da Rocha
Valor Econômico – 12/12/2008

A fusão do Banco Itaú com o Unibanco é, como natural, fruto de decisões tomadas pelos seus acionistas controladores, através de seus prepostos, devendo a matéria, sob o ponto de vista legal, ser aprovada pelos órgãos superiores de ambos os bancos, que, como os de qualquer sociedade anônima, são as respectivas assembléias gerais, conforme o artigo 121 da Lei nº 6.404. Como, sob o ponto de vista de cada banco, se trata de uma fusão com outra sociedade bancária, cada assembléia geral necessariamente a ser convocada (artigo 228 da mesma lei), pelo evidente voto dos controladores, vai aprovar o protocolo da fusão com suas linhas básicas e vai nomear os peritos avaliadores dos patrimônios líquidos de ambos os bancos, sendo certo que a lei aí proíbe os acionistas de votar o laudo da avaliação do patrimônio líquido de sua própria sociedade.

Tais assembléias gerais, que serão extraordinárias, dentro da moldura legal - artigo 135, inciso IV da lei -, devem contar com um quórum de dois terços dos acionistas votantes na primeira convocação, pois os estatutos serão evidentemente alterados, e em segunda convocação, com qualquer quórum. Contudo, para que a fusão seja aprovada por cada banco, pelo menos o voto de acionistas com metade das ações votantes é obrigatório, conforme o artigo 136 da lei, o que já nos faz crer que a convicção firme do processo de fusão pelos controladores, tal como exibido na mídia, indica terem eles consigo tal posição acionária mínima. Ora, o artigo 137, inciso II da Lei nº 6.404 dispõe que o acionista, acaso insatisfeito com a fusão, pode exercer seu direito de retirada, ou de recesso, pelo qual a companhia se obriga a pagar aos dissidentes um valor por suas ações (artigo 45 e seus parágrafos) correspondente ao valor de patrimônio líquido pelo último balanço aprovado, ou - como deve ser por certo o caso do Itaú e do Unibanco - se o último balanço foi aprovado há mais de 60 dias, com base em balanço especial que seja aprovado atendendo a esse prazo máximo antes da fusão. Vale dizer, a lei quer assegurar ao acionista, acaso inconformado com a fusão, o recebimento do valor patrimonial atualizado de suas ações. E ainda nos atrevemos a dizer que, dentro dos princípios descritos no artigo 45 da Lei das S.A., ali falando-se em hipótese de "valor econômico", talvez o acionista dissidente possa pleitear, caso se mostre interessante em números, o método do fluxo de caixa descontado, para se chegar ao valor de sua parcela de capital a ser paga pela companhia. Este método, mais recente nas práticas avaliatórias - e aqui dele lembramos porque, no caso de ambos os bancos, pelos resultados mostrados nos vários anos antecedentes deve produzir montantes bem altos - é admitido no corpo da própria Lei nº 6.404, em seu texto atualizado, para aumentos de capital e oferta pública de ações. De resto, em operação não muito longe no tempo, onde a Petroquisa e aPetrobras consultaram a superintendência de empresas públicas (SEP) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para tal uso daquele método, o órgão respondeu positivamente, em 29 de maio de 2006, anotando que a CVM o tem admitido. Nessa hipótese tratada da fusão de dois grandes bancos, é certo que a lei restringe, nesses casos, o direito de retirada, se existir no mercado liquidez e dispersão para aquelas ações detidas por cada acionista (artigo 137, inciso II da lei). Isso significa, com evidente sentido, que se houver mercado aberto e suficientemente disseminado dessas ações, o acionista pode ali, no uso do mercado, vender seus títulos, dispensando-se a companhia de ter que gastar recursos com sua aquisição. Mas o legislador tomou o cuidado de definir precisamente o que seria entendido como característica de liquidez e de dispersão de ações, para tais finalidades e efeitos legais, no artigo 137, inciso II, alíneas "a" e "b". No nosso caso, parece óbvio que ambas as ações em suas espécies, sejam do Itaú, sejam do Unibanco, apresentam liquidez como descrita está na lei, pois têm elas cotação usual na Bovespa. Mas, para que sejam tidas como dispersas para tais finalidades, a lei demanda que os controladores das sociedades respectivas, sejam eles diretos ou indiretos via outras sociedades, não cheguem a ter metade das ações de cada espécie ou classe em consideração. Isso compreenderia, é claro, todo o pacote acionário das famílias Setubal e Moreira Salles, holdings por eles detidas, acordo de acionistas entre eles existentes etc. Cabe, portanto, aos minoritários de ambos os bancos verificar tal circunstância no controle acionário. Configurada a existência desses requisitos que lhes garantam o direito de retirada, é preciso analisar se é melhor continuarem como acionistas menores da nova empresa bancária ou deferirem suas parcelas acionárias, caso a avaliação patrimonial da empresa atualizada, ou mesmo o cálculo do fluxo de caixa descontado, aponte um valor superior ao negociado na bolsa. Lembra-se ainda que, para exercer tal recesso, é preciso estar atentos à observância dos prazos, contado a partir da data da publicação da ata que aprovar o protocolo ou acordo da fusão, e requisitos formais da lei.

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