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21 agosto 2023

Steinhoff: mais um capítulo

Dirk Schreiber, ex-chefe de finanças europeu da Steinhoff International Holdings NV, foi condenado a três anos e meio de prisão por um tribunal alemão devido a um escândalo contábil que quase levou à falência da varejista. O tribunal também condenou Siegmar Schmidt, ex-diretor, a uma sentença suspensa de dois anos. Ambos foram acusados de envolvimento em transações fraudulentas. O ex-CEO Markus Jooste também foi acusado, mas não compareceu ao tribunal. A investigação revelou €6,5 bilhões em transações irregulares ao longo de oito anos. As autoridades alemãs iniciaram a investigação em 2015, suspeitando que a empresa registrava receitas falsas. 

Originalmente a Steinhoff é uma empresa da África do Sul

Ransomware durante a auditoria

O Banco Popular, que atua em Porto Rico, mandou a seguinte correspondência para seus clientes: 

Escrevemos para informar que um dos nossos fornecedores, PricewaterhouseCoopers (PwC), foi vítima de uma violação de cibersegurança que incluiu certas informações pessoais dos nossos clientes. A violação envolveu a comprometimento de um software, o MOVEit, usado pela PwC para transferir arquivos para um pequeno número de seus clientes, incluindo o Banco Popular de Porto Rico (Popular).


Como uma corporação pública que negocia no mercado de ações, o Popular é obrigado a utilizar os serviços de uma empresa de auditoria e contabilidade, como a PwC. A tarefa de auditar o Popular requer, devido à sua natureza, que o Popular compartilhe informações dos clientes para que a PwC possa realizar certas validações independentes necessárias para que o Popular emita demonstrações financeiras.

Ao tomar conhecimento do incidente, a PwC imediatamente lançou uma investigação e cessou o uso do software afetado. Como resultado desta investigação, foi determinado em 24 de julho de 2023, que certos arquivos comprometidos no incidente incluíam informações pessoais dos nossos clientes. As informações pessoais comprometidas incluem o seu nome, número de Seguro Social, número de empréstimo hipotecário terminando em [número], e campos relacionados a hipotecas.

Parece que a PwC não foi a única a usar o software com um ransomware (é um tipo de ataque cibernético no qual os hackers infectam um sistema e exigem um pagamento para restaurar o acesso aos dados ou sistemas afetados). No caso do Banco Popular, foram 82 mil clientes que podem ter sido infectados. Mas tudo leva a crer que Deloitte e EY – mas não a KPMG – também tiveram este problema. O Banco Popular deu detalhes do caso, o que já não ocorreu com o Bank of America, auditado pela EY, por exemplo. 

Foto: Muha Ajjan e Unsplash+

Terrorismo e contabilidade

O Journal of Brief Ideas publica textos que são bastante curtos. São ideias lançadas para discussão. Um dos textos, de Peter Clark (https://doi.org/10.5281/zenodo.8260071), observa as campanhas terroristas sob a ótica econômica. As organizações terroristas usam diversos subterfúgios para obter seguidores, inclusive de forma coercitiva. Uma das formas é a extorsão, protegendo-se contra atos violentos do grupo, caso exista apoio ao movimento. Neste sentido, não difere muito de grupos criminosos.

Mas, ao contrário dos criminosos comuns, que desejam controlar o fluxo de riqueza de uma região, o terrorismo tem o objetivo de obter um poder mais abrangente, por meio de uma mudança política do regime. Para as organizações terroristas, o fluxo financeiro, que inclui a obtenção de recursos e a alocação dos gastos em itens que ajudarão no objetivo final, é tão relevante quanto ocorre em um grupo de criminosos comuns.

Por esse motivo, as entidades terroristas, assim como os grupos de criminosos comuns, devem se preocupar em ter uma "contabilidade". Mesmo que não seja por meio do regime de competência ou seguindo as normas contábeis dos reguladores, os grupos terroristas procuram usar a "contabilidade" para melhor alocar os recursos dentro da organização. A captação de regiões produtivas pode ser vista como um ativo para o grupo, capaz de gerar riquezas futuras.

Rir é o melhor remédio

 

Não usou o Doutor Google

20 agosto 2023

Do Slide ao Powerpoint

Em 1992, em uma sala de reunião do Hotel Regina, o mundo conheceu uma nova tecnologia: o powerpoint. Robert Gaskins, o responsável pelo software, apresentou a maravilha para pessoas vincunladas a Microsoft na Europa. Usando um laptop, Gaskins carregou o programa através de um cabo de vídeo. O público percebeu que a tecnologia iria revolucionar as apresentações e aplaudiu o produto e seu criador. 


A proposta do Powerpoint surgiu na verdade oito anos antes, quando Gaskins era vice-presidente de desenvolvimento de produtos da startup Forethought. A ideia era modificar o setor de apresentações de negócios. O produto criado não somente modificou, como transformou radicalmente a maneira como as empresas entregavam as informações para seu público interno e externo nas convenções anuais. Antes do Powerpoint, as apresentações eram contratadas em empresas especializadas em eventos. Depois, os próprios executivos poderiam produzir suas próprias transparências, em lugar de contratar alguém ou delegar para funcionários internos. 

Além disto, as apresentações não precisavam estar reservadas para grandes reuniões de final de ano ou em outros eventos importantes. Depois, o powerpoint expandiu o conceito de apresentar algo através de uma projeção, seja em uma igreja, nas escolas, nos funerais e casamentos, nas reuniões de família e muitas outras ocasiões. Provavelmente toda pessoa do mundo, a partir do ensino médio, deve conhecer o powerpoint. 

Obviamente, essa evolução específica não foi exclusivamente da Microsoft. Porque talvez a apresentação corporativa mais memorável de todos os tempos - o anúncio de Steve Jobs do iPhone na Macworld 2007 - não fosse um PowerPoint. Foi um Keynote. (Claire L. Evans)

Mas antes da revolução do powerpoint o que existia eram os slides. As grandes empresas, quando queriam impressionar, contratavam pessoas especializadas em fazer apresentação multimídia, com projetores de slides. 

Antes do PowerPoint, e muito antes dos projetores digitais, os slides de filme de 35 milímetros eram os mais usados. Maiores, mais claros e mais baratos de produzir do que o filme de 16 mm, e mais coloridos e com resolução mais alta do que o vídeo, os slides eram a única mídia para os tipos de apresentações de alto impacto feitas por CEOs e altos executivos em reuniões anuais para acionistas, funcionários e vendedores. Conhecidas no ramo como shows "multi-imagem", essas apresentações exigiam um pequeno exército de produtores, fotógrafos e equipe de produção ao vivo para serem realizadas. Primeiro, o show inteiro tinha que ser escrito, com um storyboard e uma trilha sonora. As imagens eram selecionadas em uma biblioteca, as sessões de fotos eram organizadas, as animações e os efeitos especiais eram produzidos. Um técnico com luvas brancas revelou, montou e tirou o pó de cada slide antes de colocá-lo no carrossel. Milhares de dicas foram programadas nos computadores de controle do show - depois testadas e testadas novamente. Porque os computadores falham. As lâmpadas dos projetores queimam. Os carrosséis de slides ficam emperrados. (…)

O negócio era tão rentável que surgiu uma Associação com os profissionais da área. Fundada em 1976, a Association for Multi-Image chegou a ter cinco mil membros. 

Em seu auge, o negócio de múltiplas imagens empregava cerca de 20.000 pessoas e apoiava vários festivais e quatro revistas comerciais diferentes. Uma dessas revistas publicou um perfil brilhante de Douglas Mesney em 1980; quando perguntado sobre seu prognóstico em relação ao futuro dos slides, ele respondeu: "Poderíamos fazer uma fortuna ou ficar fora do mercado em um ano". Ele não estava errado.

O surgimento do powerpoint mudou o setor substancialmente. Todos estes empregos desapareceram. Quem se lembra de um projeto de slide? Somente os mais antigos. 

O último projetor de slides já fabricado saiu da linha de montagem em 2004. A parte interna de sua caixa foi assinada pelos trabalhadores da fábrica e pela cúpula da Kodak antes de a unidade ser entregue ao Smithsonian. Foram feitos brindes e discursos, mas até então eram elogios, pois o PowerPoint já havia dominado o mundo.

Sugestão do BoingBoing, para o excelente texto de Claire Evans

09 agosto 2023

Não se esqueça da matriz de confusão

Uma das formas mais usuais de ser enganado é quando uma pessoa chama a atenção apenas para um lado de uma situação. Vamos trabalhar com um exemplo simples. Alguém diz para você que no passado ele comprou ação de uma empresa quando ninguém acreditava nela. Por esse motivo, agora ele está sugerindo que você compre a ação de uma nova empresa que apareceu no mercado, a XYZ. Afinal, seu passado de sucesso é algo que sustenta essa indicação.

Provavelmente, o leitor já deve ter visto essa situação antes. E isso ocorreu não somente em indicações de investimento, mas também em casos relatados em grupos de mídia social ou por pessoas que tentam argumentar com você usando frases como "eu conheço uma pessoa..."

Para esses casos, pense sempre na grade de possibilidades ou na matriz de confusão. O primeiro nome foi proposto por Daniel Simons e Christopher Chabris, em "Nobody’s Fool". Mas na estatística, o nome é matriz de confusão, e é esse que iremos usar. De forma irônica, a matriz de confusão é capaz de evitar confusões nos argumentos manipulados, como no parágrafo inicial deste texto.

A matriz de confusão é um retângulo com quatro áreas. De um lado, temos o que aconteceu; do outro lado, o que foi sugerido ou previsto. A seguir temos o desenho desta matriz:



Quando alguém afirma que acertou na escolha de um investimento no passado, está falando da caixinha branca da figura acima. A pessoa optou por investir e acertou, pois o retorno foi bom. Veja que a informação que foi passada - "acertei no passado" - não é imparcial, pois não diz nada sobre as outras três áreas da figura.

Vamos começar com a caixinha amarela. Nessa situação, a pessoa decidiu não investir e foi uma decisão adequada, já que o retorno foi ruim. Tanto a caixinha amarela quanto a área branca são as regiões dos acertos. Como as oportunidades de investimento são inúmeras, geralmente não lembramos dos investimentos ruins que não fizemos (área amarela) e valorizamos muito os investimentos acertados.

Agora considere a área laranja e vermelha. A soma das duas representa nossos erros. Veja o caso da caixinha vermelha. A pessoa decidiu não investir em uma aplicação e a decisão não foi boa, já que o retorno foi adequado. São as oportunidades de investimento adequadas que perdemos na vida. Poderíamos ter comprado ações daquela startup logo no seu começo e não fizemos. Mas o pior é a área laranja, já que investimos e o retorno foi ruim.

Se quisermos saber se um investidor é bom ou não, devemos olhar as quatro situações. Talvez isso seja difícil, mas pelo menos observar a área laranja e a área branca. Se alguém acertou no passado (área branca), talvez tenha errado também (laranja) e somente assim poderemos saber se a bola de cristal dessa pessoa está quebrada ou não.

Assim, se alguém afirmar que fez um ótimo negócio no passado e isso é sinal de que ele sabe o que está falando, pense na matriz de confusão. Essa pessoa está confundindo você ao não entregar todas as informações possíveis.

Veja uma situação similar a esta: uma pessoa alardeou que apostou em um placar no futebol e ganhou quinhentos reais. E concluiu dizendo que quando ele apostava sempre conseguia um trocadinho para pagar as contas. Essa pessoa está revelando a área branca da figura, o sucesso. Mas não a área laranja, do insucesso quando faz aposta.

E outra situação: um amigo mandou no grupo que pessoas morreram logo após receber uma vacina. Com isso, alardeia sobre o perigo da vacina e sua decisão de não vacinar, esquecendo de contar o número de pessoas que não morreram exatamente por tomarem a medicação indicada pela ciência.

Mais uma: a empresa de auditoria fracassou após passar por problemas nas Americanas. A auditoria deveria ter percebido o que estava ocorrendo e não o fez. Mas e as vezes em que a auditoria pegou o início de uma fraude e isso não foi relatado por uma questão de sigilo? Dizer que as auditorias são ruins baseado em um caso é esquecer da matriz de confusão." 

07 agosto 2023

Feedback na Contabilidade: Em Busca de Uma Avaliação Significativa

O feedback é uma ferramenta que pode ser poderosa para um profissional ou uma empresa. Dar um feedback é visto como algo importante e, por isso, somos lembrados constantemente de fazê-lo. Mas onde está o feedback na contabilidade?

Uma coisa é afirmar que a contabilidade é um instrumento de feedback da gestão de uma entidade. Neste caso, estamos considerando a contabilidade como uma descrição do que já ocorreu, uma narrativa, sob forma de números, do desempenho da entidade. Na famosa estrutura conceitual do FASB, posteriormente apropriada pelo IASB e traduzida para o português pelo CPC, esta função é denominada de qualidade confirmatória. Temos uma expectativa sobre o que está ocorrendo com a entidade e a contabilidade aparece para dizer se estamos corretos ou não. A contabilidade aqui seria, na linguagem do esporte, uma espécie de VAR para a entidade.

No entanto, não é este o foco do texto. Queremos saber se a função contábil em uma entidade tem um feedback positivo ou negativo. Quando compramos um produto ou serviço, após usá-lo, podemos dar uma nota, que pode ser estrelas, positivo ou negativo, ou outro sistema onde expressamos nossa satisfação ou insatisfação com o produto ou serviço. Poderia existir este tipo de avaliação com a contabilidade?

Inicialmente, vamos considerar um serviço contábil específico, contratado para fazer uma tarefa para uma entidade. Neste caso, a avaliação poderia ser feita por quem fez a contratação do serviço. Ele poderia dizer se o serviço prestado está de acordo ou não com as expectativas. Poderia dar estrelas ou notas. Na realidade, este serviço já existe, muito embora não funcione de forma adequada. Ao entrar no Google Maps e digitar “escritório de contabilidade”, irão aparecer alguns escritórios perto de onde você está, com a nota respectiva. O problema é que não podemos confiar neste resultado, já que, pelo menos na minha região, a maioria dos escritórios tem nota máxima ou não são avaliados. E o número de avaliações é bem reduzido, o que torna difícil acreditar no resultado.

Se você procurar pelos escritórios que receberam alguma advertência relacionada com a ética profissional também não irá resolver. Ou não irá localizar esta informação de maneira acessível. Não temos uma listagem, por exemplo, dos melhores escritórios de uma região ou algo do gênero. Além disso, há controvérsias sobre o que seria a qualidade do serviço prestado.

Outra forma de pensar no feedback do serviço na contabilidade é pedir para as pessoas analisarem o serviço que é entregue. Imediatamente pensamos nas demonstrações contábeis, mas isto seria reduzir a contabilidade à situação de vomitadora de tabelas e quadros. Para um usuário típico da contabilidade, que contrata uma empresa para prestar serviço, o seu grande desejo é que o escritório faça seu serviço e ele possa trabalhar, fazendo aquilo que ele sabe fazer de melhor. Isto pode ser cínico, mas pergunte a um empresário sobre o que ele deseja do seu contador e você irá confirmar que a maioria deles entende que a contabilidade é um mal necessário. Infelizmente isto é verdadeiro e o texto não tem a pretensão de discutir este assunto.

O pensamento de que a contabilidade é um mal necessário conduz a uma avaliação do tipo: se a contabilidade fez o seu papel e não atrapalhou, o feedback do serviço seria positivo. Há exceções aqui, certamente. Em alguns casos, a contabilidade pode assumir um papel estratégico para uma entidade, ajudando nas boas escolhas. Mas tudo leva a crer que isto não é a verdadeira situação na maioria dos casos.

Podemos agora voltar para o caso da contabilidade produzida internamente, dentro de uma entidade. Geralmente, neste caso, a entidade tem um porte maior e há funcionários que terão a tarefa de fazer o serviço contábil. O feedback aqui poderia ser proveniente da chefia imediata, que poderia indicar a qualidade daquilo que é produzido internamente.

Isso parece não ser suficiente para alguns profissionais internos de uma entidade. Receber um tapinha nas costas do chefe ou um sorriso de alguém de outro setor pode funcionar para alguns, mas não para todos. A participação em premiações que avaliam a qualidade do serviço pode ser um reconhecimento. No passado, era comum ver o nome de um profissional no jornal local, seguido de elogios. Estes elogios eram conquistados por uma amizade antiga ou pelo pagamento de uma gratificação e não seriam efetivamente um feedback ao trabalho contábil.


Uma opção é adotar uma visão mais abrangente. Em lugar de uma avaliação pessoal, poderíamos medir qual o feedback da sociedade para com a contabilidade. Isso também é muito difícil e seria necessário uma medida bem objetiva para ter um feedback do nosso trabalho para a sociedade como um todo. Confesso que não saberia dizer que medida seria esta.

No passado, eu sugeri a uma docente que está à procura de um tema para seu trabalho final de curso que perguntasse, via questionário, qual a profissão que uma pessoa desejaria para sua prole. Isso poderia ser uma aproximação da avaliação que a sociedade faz do nosso trabalho, mas também seria uma análise materialista sobre a profissão que seria mais promissora, leia-se “rentável”. Não deixaria de ser um feedback do sentimento da sociedade. Outra possibilidade é procurar verificar como o profissional é representado nos filmes, novelas e jornais. O resultado é enviesado, pois estamos olhando somente uma pequena parcela da visão da sociedade.

Estamos chegando ao final sem ter uma solução para o problema. Afinal, como ter um feedback da contabilidade? Acho que o tema merece mais reflexão. É interessante que é algo que não discutimos; seria um medo não confessado de receber um feedback negativo?

(As reflexões apresentadas aqui começaram após a leitura de um texto sobre Feedback no BehavioralScientist). Foto: Unsplash+

Rir é o melhor remédio


 Indicação de compra

06 agosto 2023

O Infinito ao Junco

O livro "O Infinito em um Junco" é, antes de tudo, uma declaração de amor ao livro e à leitura. Se a história narrada por Irene Vallejo fica restrita, basicamente, aos gregos e romanos, o amor está presente em cada página. Quem gosta de leitura, de livros, de ideias e de história deve ler este livro. Com cerca de 440 páginas, a obra divide-se nos gregos, em sua primeira parte e na maioria das páginas, e nos romanos, logo a seguir. Irene Vallejo consegue contar casos que ocorreram há milhares de anos, como a construção da Biblioteca de Alexandria, a invenção do pergaminho e a cópia dos manuscritos.


É delicioso saber que na antiguidade a leitura era feita em voz alta, que muitas obras só chegaram aos nossos dias graças à tradição de transmitir as histórias entre as pessoas, que sempre existiram pessoas que detestam livros, mas outras que os amam de forma apaixonada. Sua narrativa consegue unir o antigo com fatos mais recentes, como a queima de livros pelos nazistas e o sofrimento amenizado dos prisioneiros dos campos de concentração que conseguiam obras para sua leitura. Saber que Sócrates não era adepto da palavra escrita; que o mel era usado na sociedade judaica para o aluno lamber, de modo que a palavra divina penetrasse em seu corpo; que o plágio já existia entre os gregos, nos concursos de oratória; que o primeiro historiador, Heródoto, contou a versão do inimigo, do outro, algo revolucionário ainda hoje, são coisas surpreendentes.

O livro conta muito mais do que isso. Regularmente, a autora espanhola lança algumas preciosidades, seja sob a forma de fatos curiosos, seja por levantar questões polêmicas, como a tendência moderna de reescrever os clássicos por ter neles palavras inadequadas para a realidade atual. Já no final, nas últimas páginas, há uma discussão sobre a escolha do título das obras – na época dos papiros, os livros geralmente não tinham títulos; quando muito, eram indicados pelas primeiras palavras do texto.

Este livro é muito indicado para aqueles que amam ler. Quem o ler fatalmente o considerará um livro cinco estrelas.

Escrita e a Contabilidade

 Do livro O Infinito em um Junco (p. 121):


Segundo as teorias mais recentes, a arte de escrever tem uma origem prática: as listas de propriedades. Essas teorias afirmam que nossos antepassados aprenderam o cálculo antes das letras. A escrita veio para resolver o problema de proprietários ricos e administradores palacianos, que precisavam lançar mão de anotações porque era difícil fazer a contabilidade de forma oral. A etapa de transcrever lendas e relatos viria depois. Nós somos seres econômicos e simbólicos: começamos escrevendo inventários e, mais tarde, invenções (primeiro as contas, depois os contos)

Foto: Sayla Brown

04 agosto 2023

Perda de produtos culturais devido ao direito autoral

Eis uma discussão importante: a presença de direitos autorais esta fazendo com que muito patrimônio cultural esteja desaparecendo (via aqui). Filmes e outras obras de arte estão sendo perdidas em razão da mudança tecnológica. As velhas fitas VHS não são convertidas aos novos formatos, assim como os DVDs e os catálogos deixam de fazer a transição para uma nova era tecnológica. Sem esta transição, a produção se perde, já que as pessoas ficam com medo de infringir a lei de direito autoral. 

Um site como o Karagarga, onde alguns poucos arquivam filmes cults raros e sucessos são proibidos, seria uma possível solução. 


Ao ler este texto tinha recentemente lido uma passagem sobre a biblioteca de Alexandria no excelente Infinito em um Junco. Irene Vallejo descreve que a memória coletiva permitiu que criação de obras literárias da antiguidade fossem preservadas. Na verdade, parcialmente, pois muito se perdeu. 

IA pode alterar resposta conforme a pergunta

Pesquisa no Google… 

Eu olhei no Google e ele diz … 

Tim Harford lembra que a resposta irá depender da forma como você pesquisa. Perguntei ao Chat, porque o mar é verde e a resposta começava:


O mar pode apresentar diversas cores, incluindo azul, verde e até mesmo tons de cinza ou marrom, dependendo de vários fatores. A cor do mar é influenciada principalmente pela absorção e dispersão da luz pelas moléculas e partículas presentes na água.

A cor predominante do mar é frequentemente uma combinação de reflexão da luz solar na superfície e absorção seletiva de diferentes comprimentos de onda de luz pelas moléculas da água.

Mudei para “porque o mar é azul”? E a resposta iniciava:

O mar é azul devido ao fenômeno chamado dispersão da luz. A luz do Sol é composta por diferentes cores, cada uma correspondendo a um comprimento de onda diferente. Quando a luz solar entra na atmosfera da Terra, ela interage com as moléculas de ar e as partículas presentes na atmosfera.

As moléculas e partículas têm a capacidade de dispersar a luz, ou seja, elas espalham a luz em várias direções. Essa dispersão é mais eficiente para comprimentos de onda mais curtos, como o azul e o violeta, enquanto comprimentos de onda mais longos, como o vermelho e o laranja, são menos dispersos.

Foto: Joel Vodell

Papel da IA no Mundo Atual

O surgimento do ChatGPT também trouxe consigo profecias apocalípticas sobre o fim do mundo, além de previsões variadas sobre a transformação radical do mundo em que vivemos. Alguns textos conseguem abordar o cenário atual sem mergulhar em previsões sombrias. Recentemente, li um artigo no blog "Economics From the Top Dow" que argumenta que a inteligência artificial não resultará no fim da raça humana. O ponto central é que os seres humanos dominam o mundo não apenas por sua "inteligência", mas também pela capacidade de sustentação e reprodução. Embora a máquina que criamos possa superar a "inteligência" consciente, ainda não consegue sobreviver e se reproduzir como nós.

Para atingir o nível humano, a máquina teria que desenvolver vida autosustentável. Entretanto, isso só seria possível criando uma célula artificial que evoluiria ao longo de bilhões de anos, com resultados questionáveis. Em outras palavras, a IA precisaria ter um corpo. O autor do blog destaca que mente e corpo não podem ser separados.


O risco está na forma como utilizamos e controlamos os recursos da IA. Nesse sentido, o autor defende que as ferramentas sejam abertas, permitindo que qualquer pessoa tenha acesso aos códigos usados para criá-las. No caso do ChatGPT, os primeiros modelos eram abertos e os códigos estavam disponíveis. No entanto, a partir da versão 3, o modelo tornou-se proprietário, ou seja, a empresa proprietária do Chat, a OpenAI, é considerada "aberta" apenas de nome.

Outro ponto interessante abordado no texto é o risco da IA substituir empregos na economia, levando a uma grande parcela da população desempregada. O blog "Economics From the Top Dow" lembra que o sistema não pode funcionar com uma grande massa de desempregados estruturais, pois isso acarretaria perda de receita das empresas, uma vez que o sistema depende de um público consumidor. Isso não significa que não haverá alterações na estrutura de empregos, com algumas profissões desaparecendo ou perdendo importância, enquanto outras se tornam mais relevantes.

Ao final do texto, é ressaltado que a regulamentação da IA só será benéfica para os grandes players, pois a captura do órgão regulador favorecerá as empresas mais fortes e garantirá a "certificação" de sua tecnologia. Em suma, o verdadeiro risco da IA está relacionado às escolhas que fazemos em relação a ela.

Foto: Michael Dziedzic

03 agosto 2023

Reclamar do tempo

 

Do Sketchplanations: reclamar do tempo não adianta. 

Fasb: mais informações sobre despesas das empresas para investidores

O Conselho de Normas Contábeis Financeiras (Fasb) propôs uma atualização nas normas contábeis na segunda-feira para fornecer aos investidores mais informações sobre as despesas de uma empresa.


A proposta exigiria que empresas de capital aberto oferecessem divulgações mais detalhadas sobre categorias específicas que compõem certas despesas durante os períodos intermediários e anuais. A atualização proposta forneceria aos investidores informações mais detalhadas sobre os tipos de despesas, como depreciação, amortização, remuneração de funcionários e custos relacionados ao estoque e atividades de manufatura dentro das rubricas de despesas do demonstrativo de resultados, como custo das vendas; despesas de vendas, gerais e administrativas; e pesquisa e desenvolvimento.

Continue leitura aqui. Tradução: ChatGPT

Spotify dá dinheiro para alguns

Os artistas no Spotify ganham, em média, entre $0.003 e $0.005 por reprodução — o que não é muito, mas pode se acumular em uma fortuna se você tem muitos fãs.

Para descobrir quais músicas ganham mais em todo o mundo, a NetCredit identificou as músicas de cada país que passaram pelo menos uma semana no topo das paradas semanais do Spotify, classificou-as por gêneros e multiplicou o número de reproduções de cada faixa pelo valor pago por reprodução. As músicas que mais ganham dinheiro em cada país são mapeadas na visualização abaixo.


Principais descobertas:

O maior ganhador geral é "Sunflower" de Post Malone, que arrecadou cerca de $4.5 milhões com reproduções nos EUA.

"Blinding Lights" de The Weekend é a música que mais ganha dinheiro em dez países — mais do que qualquer outra música no Spotify.

No gênero EDM, a maioria das faixas que mais ganham dinheiro são de um pequeno grupo de artistas, incluindo Avicii, Elton John, SAINt JHN, The Chainsmokers e Tiësto.

As músicas de hip-hop e rap que mais ganham dinheiro geralmente são de artistas locais em cada país.

Fonte: aqui

Acrescento mais um item aqui: a música que faz sucesso no Brasil, "Arranhão" (?), arrecadou 1,3 milhão, abaixo de Malone, a líder do México e da Alemanha. Mas acho que há um problema, pois nos países onde o Spotify não é popular, o líder talvez seja enviesado. 

OBEF

 

Mais informações aqui

02 agosto 2023

Inteligência Artificial, Economia comportamental e Literatura

Encontro entre inteligência artificial, economia comportamental e literatura (via aqui):



Solicitamos ao GPT-4 (um modelo de linguagem de inteligência artificial) que usasse personagens fictícios literários para jogar o jogo Ditador, um experimento clássico de economia comportamental. Nós fornecemos ao GPT-4 148 caracteres, do século XVII ao século XXI. Suas 888 decisões foram usados para comparar personagens ao longo do tempo, bem como personagens com jogadores humanos. Há uma diminuição geral e principalmente monotônica do comportamento egoísta ao longo do tempo em personagens literários. 41% das decisões dos personagens do século XVII são egoístas, em comparação com apenas 21% das decisões dos personagens do século XXI. Na comparação entre humanos e IA, os seres humanos são muito mais egoístas do que [os resultados obtidos com] os personagens da IA, com 51% dos seres humanos tomando decisões egoístas em comparação com 28% dos personagens da IA.

Foto: Gertrūda Valasevičiūtė