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24 julho 2006

Orçamento Público Impositivo

Uma análise sobre a proposta de mudança no orçamento público, com um orçamento impositivo. Tema da coluna de Ribamar Oliveira no Estadão de hoje:



Mudança incompleta

O envolvimento de mais de 100 parlamentares e de assessores ministeriais na compra superfaturada de ambulâncias coloca sob suspeita a elaboração, a execução e a fiscalização do Orçamento da União. O que se viu foi um conluio que envolveu prefeitos, deputados, senadores, assessores de parlamentares e funcionários públicos, realizado durante cinco anos, sem que os órgãos de controle identificassem as irregularidades. Um esquema tão simples, que pode estar sendo usado para outras compras com dinheiro público federal.

No início deste mês, o Senado aprovou proposta de emenda constitucional (Pec) que torna obrigatória a execução do Orçamento como ele saiu do Congresso. Se passar pela Câmara, o orçamento não será mais autorizativo, mas impositivo. Ou seja, o governo será obrigado a executá-lo. Com as práticas orçamentárias atuais e com os controles existentes, o orçamento impositivo poderá significar a privatização do dinheiro público.

Cada parlamentar teve direito, este ano, a fazer emendas ao Orçamento até o montante de R$ 5 milhões. Eles destinaram esses recursos a pequenas obras em suas bases eleitorais, como a construção de uma ponte, de uma praça, ou a compra de ambulâncias. Além das emendas individuais, eles participaram também das coletivas, chamadas de emendas de bancada, que são os grandes investimentos no Estado ou região que representam. Se o parlamentar mal intencionado tiver certeza de que suas emendas serão executadas pelo governo, ficará ainda mais fácil para ele negociar antecipadamente com prefeitos e empresários, ou seja, montar esquemas fraudulentos.

O orçamento impositivo é o próximo passo da política fiscal brasileira, depois que as finanças públicas foram equilibradas e a cultura da responsabilidade fiscal foi fortalecida pela lei complementar 101, de 2000, também conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Nas nações mais desenvolvidas, o Executivo cumpre o orçamento definido pelo Legislativo.

Hoje, a realidade brasileira é um pouco diferente. Por uma série de razões, entre elas a elevada inflação durante décadas, o Brasil desenvolveu uma cultura de indexação das verbas orçamentárias. Cada vez mais, as receitas foram sendo vinculadas a despesas específicas. Hoje, mais de 90% do orçamento já é impositivo por determinações constitucionais ou legais.

O orçamento deste ano prevê, como mostra a tabela abaixo, despesa primária total de R$ 407,1 bilhões. Esse valor inclui todos os gastos da União, menos as transferências constitucionais de receitas para Estados e municípios e as despesas financeiras, como o pagamento de juros das dívidas. Desse total, R$ 314,95 bilhões são despesas obrigatórias, como, por exemplo, o pagamento do funcionalismo, de benefícios previdenciários e outras.

O que sobra - R$ 92,1 bilhões - é usado para pagar as chamadas despesas discricionárias, ou seja, aquelas sobre as quais o governo tem algum poder de alterar ou reduzir. Mas existem dispositivos legais que tornam obrigatória parte dessas despesas, como é o caso dos gastos com a saúde e a educação, para citar os mais expressivos. Deduzidos esses gastos, o governo terá, efetivamente para cortar ou alterar, cerca de R$ 30 bilhões - ou seja, menos de 10% do total. Mas é nesses R$ 30 bilhões que estão os investimentos e as emendas dos parlamentares.

A Pec aprovada pelo Senado torna obrigatória a execução desses R$ 30 bilhões, ou seja, dos investimentos e das emendas dos parlamentares. A proposta cria uma figura esdrúxula que é o orçamento impositivo totalmente indexado. Por definição, um orçamento impositivo é aquele que tem suas prioridades e metas discutidas e votadas pelo Congresso a cada ano. Depois de aprovado, ele é executado integralmente pelo governo. Orçamento impositivo com vinculação de receitas não faz sentido, pois seria aceitar que o Congresso só discutirá o que será feito dos R$ 30 bilhões, ou seja, com a receita que não está vinculada.

Uma das preocupações do Senado, ao aprovar o orçamento impositivo, é a de acabar com a manipulação dos parlamentares pelo governo. É uma prática comum, na história republicana brasileira, o uso pelo governo da liberação das emendas como moeda de troca em votações consideradas importantes. Essa prática passou a ser um dos ingredientes para a formação da base de apoio do governo no Congresso.

A realização de uma reforma política, que permita ao presidente da República formar com maior facilidade a base de sustentação de seu governo, é condição indispensável para o orçamento impositivo. Além disso, é preciso melhorar os controles orçamentários. O primeiro deles é submeter a leilão eletrônico todas as compras feitas por Estados e municípios com recursos federais. Ao mesmo tempo, a movimentação do dinheiro repassado às prefeituras e governos estaduais deveria transitar pelo Siafi, conforme proposta discutida na Comissão Mista de Orçamento do Congresso, mas que foi rejeitada pelo governo.

Contabilidade Confusa da Bunge

Contabilidade Financeira

Uma reportagem de hoje do Wall Street Journal Americas mostra a forma diferente com que a Bunge contabiliza os empréstimos aos agricultores no Brasil. Veja a reportagem completa a seguir:

Contabilidade da Bunge suscita dúvidas
July 24, 2006 4:05 a.m.

Por David Reilly
The Wall Street Journal

Quem investe em ações da Bunge Ltd. costuma se preocupar com problemas de larga escala, como, por exemplo, o efeito do crescimento da população mundial na demanda por produtos agrícolas ou a relação dos altos preços do petróleo com as oportunidades de combustíveis alternativos.

Assuntos difíceis, mas talvez mais fáceis de lidar do que os balanços financeiros da empresa. Eles são conhecidos por sua complexidade e freqüentemente têm itens não recorrentes que beneficiam o resultado, fazendo com que analistas questionem a qualidade e a sustentabilidade dos lucros.

Enquanto isso, o fluxo de caixa da Bunge — o dinheiro que a empresa fatura com seus negócios centrais menos despesas de capital e pagamentos de dividendos — foi negativo em três dos últimos quatro anos, segundo a Fitch Ratings. Outra preocupação é a forma como a Bunge informa a receita obtida com empréstimos aos agricultores brasileiros.

O Brasil ficou mais importante no fim do mês passado, quando a Bunge avisou que os lucros do segundo trimestre foram parcialmente afetados por interrupções no fornecimento causadas por alguns desses agricultores brasileiros. Os resultados financeiros devem sair esta semana.

A Bunge, cuja sede administrativa fica em White Plains, no Estado americano de Nova York, mas que está juridicamente baseada nas Bermudas, é uma das maiores processadoras mundiais de óleo vegetal e está entre os maiores produtores de fertilizantes da América Latina. Tem um valor de mercado de US$ 6 bilhões. O Brasil é responsável por mais de metade do ativo da empresa. Ela é uma das maiores exportadores agrícolas do País, além de dona de marcas como Delícia e Primor. A maior parte das vendas é feita na Europa e nos Estados Unidos.

A Bunge é vista como uma "caixa preta" pelos mercados financeiros, disse John McMillin, analista da Prudential Equity Group, durante a divulgação do balancete do primeiro trimestre no começo do ano. Mais tarde ele adicionou num relatório sobre a empresa: "Sabemos quando o lucro é de baixa qualidade quando vemos um."

A companhia discorda que haja algo errado em seus balanços, dizendo que qualquer complexidade nas suas contas é simplesmente reflexo de ela ter negócios agrícolas em mercados emergentes. Desde que abriu o capital, em 2001, a empresa tenta explicar claramente assuntos complexos a investidores e "conseguiu ser bem clara com o mercado sobre como os negócios estão indo", disse William Wells, diretor financeiro da companhia, ao Wall Street Journal.

As explicações acalmaram alguns investidores. Um relatório do Citigroup do começo do mês disse que a queda das ações da Bunge logo após seu anúncio de resultados apresentava uma oportunidade de compra diante da potencial força dos mercados agrícolas mundiais futuramente. Uma recente incursão em empreendimentos com álcool combustível também animou os investidores.

Os céticos continuam preocupados com a complexidade dos resultados da companhia, particularmente em relação ao Brasil. Quando a Bunge negocia a compra da safra, ela normalmente adianta dinheiro aos agricultores. Os adiantamentos são garantidos pelas próprias colheitas ou por hipotecas das terras dos fazendeiros.

Até 2003, a empresa informava essa renda como resultado financeiro em sua demonstração de resultados. Depois, reclassificou-a "como um componente do lucro bruto, para refletir a natureza operacional dessa receita". Essa mudança aumentou o lucro bruto, mas também dificultou a capacidade dos investidores de verificar quanto a companhia fatura com esses empréstimos — exatamente no momento em que os adiantamentos aos fazendeiros aumentaram. Os adiantamentos brutos subiram para US$ 831 milhões no fim de 2005, mais que o dobro do nível de dois anos antes, segundo a FTN Midwest, uma firma de análise de Cleveland, Ohio.

Wells disse que, embora os empréstimos tenham subido em dólar, "o valor do aumento com adiantamentos ficou paralelo ao aumento em volume". A renda foi reclassificada porque é "quase como um desconto na compra", acrescentou, de modo que incluí-la no "custo dos bens vendidos reflete mais precisamente como o negócio realmente funciona".

Vários contadores questionam essa estratégia, dizendo que a renda ou deveria ser mantida fora dos resultados operacionais ou pelo menos ser discriminada. A Securities and Exchange Commission, a comissão de valores mobiliários americana, pediu a outras empresas para seguir essa estratégia quando receitas financeiras fossem incluídas no faturamento.

A Bunge disse que se sente confortável com sua escolha.

No centro do debate está quanto essa receita representa, e quando é contabilizada. A Bunge diz em seus informes que cobra juros baseados nas taxas do mercado local. Depois, os agricultores escolhem o momento, baseados em preços de mercado, no qual a colheita será vendida para a Bunge e os adiantamentos serão pagos. A Bunge começa a contabilizar os juros mensalmente, a partir da concessão do crédito. Mas o estoque a que se refere ainda tem de ser entregue.

A Bunge também descreve os adiantamentos como "empréstimos" nos informes, o que alguns contadores dizem dar mais peso ao argumento de que os valores deveriam ser incluídos no resultado operacional.

É fato que o resultado final não é afetado pela mudança de metodologia na renda dos juros. Mas a FTN diz que a apresentação é uma questão importante porque "investidores podem não se dar conta do tamanho total dos 'rendimentos' sobre os adiantamentos" comparados com os ganhos das operações.

22 julho 2006

Taxas de Juros e banco

Contabilidade Financeira

Em Maio a revista The Economist dedicou-se a analisar a questão dos lucros dos bancos brasileiros, a taxa de juros e a persistência desse valor. Um extrato do artigo a seguir:

"O lucro de $5.5 bilhões de reais reportados para 2005 pelo maior banco privado do Brasil, Banco Bradesco, foi o maior de todos os tempos por um banco da América Latina. Isto implica num retorno sobre o patrimônio líquido de 32%, fazendo o Bradesco duas vezes mais rentável que a média dos bancos comerciais europeus ou norte-americanos, e mais rentável que um banco de investimento de Wall Street num bom ano. O crescimento de 80% nos lucros é mais impressionante num ano onde a economia brasileira cresceu somente 2,3%.

Bradesco atribui o bom resultado principalmente ao controle de custo e ao crescimento dos empréstimos. Empréstimos para clientes cresceram durante 2005 de 34% para 39% dos ativos totais, deixando menos dinheiro estacionado nos títulos governamentais.
(...)
As margens líquidas dos bancos na região é cerca de metade mais alta que o resto do mundo em desenvolvimento. Muitos analistas têm perguntado por que e chegam a alguns suspeitos. Bancos na América Latina não diferem muito daqueles dos países em desenvolvimento em termos do seu tamanho, da volatilidade do ambiente econômico ou das taxas que cobram.

Nem, no Brasil, existe uma falta de competição. Cinco bancos dividem metade do mercado, uma taxa similar ao que ocorre na Europa ocidental. Já as taxas de juros (...) uma pesquisa sobre taxa de juros feita pela Anefac encontrou uma taxa mensal de juros de um banco em fevereiro de 8.19% equivalente a taxa anual composta de 157%. Se você toma emprestado de um cartão de crédito, você irá pagar 10.24% ao mês ou 222% ao ano.

(...) Os bancos estão em acordo? João Manoel /Pinho de Mello, uma professor da Pontifícia Universidade Católica no Rio de Janeiro diz que pode parecer um acordo, mas ele sugere uma razão baseada no mercado, seleção adversa, como uma razão para as taxas estarem tão elevadas. "

Capital pulverizado no Brasil

Contabilidade Financeira
Reportagem publicado no Estadão de hoje (p. B12) sobre o mito da pulverização do capital e a oferta Sadia-Perdigão:

Capital pulverizado, mas nem tanto

Para analistas, controle de empresas na bolsa ainda é concentrado

Renée Pereira

A primeira oferta hostil pelo controle de uma empresa no Brasil mostrou que, apesar das inúmeras mudanças, o mercado de capitais ainda precisa amadurecer. Entre os pontos fracos, avaliam especialistas, está a concentração de capital nas mãos de poucos acionistas. No caso da Perdigão, que recebeu proposta de compra por parte da Sadia, os fundos de pensão, mais a Weg Participações, detêm detém 54,5% do capital da companhia. O que facilita a tomada de decisões, sem reunir minoritários.

A situação é semelhante na Embraer e no Submarino, que também têm ação pulverizada no mercado de capitais. Na fabricante de aviões, quatro investidores (Bozzano, Previ, Sistel e BNDESPar) detêm 41% dos papéis pulverizados no mercado. De acordo com os analistas, a empresa que tem menos concentração é a Renner. A empresa foi a primeira a fazer a venda totalmente pulverizada de suas ações, colocando 100% de seu capital à disposição dos investidores.

"O capital é pulverizado, mas nada impede que um investidor tenha 20% de participação numa empresa", avalia o diretor-executivo da Máxima Asset Management, Saulo Sabbá. Segundo ele, assim fica mais fácil se unir com outros acionistas e ter poder decisório sobre o destino das ações. Por isso, a proposta da Sadia acabou sendo recusada apenas pelos fundos, sem que os demais investidores dessem opinião, se aceitavam ou não a oferta. De acordo com o estatuto da Perdigão, afirmam os especialistas, a empresa deveria ter contratado um banco de investimento para fazer o laudo com o preço justo para venda. Depois, teria de consultar a totalidade dos acionistas.

Para o analista da Ativa Corretora, Guilherme Maris, o novo mercado, onde estão essas companhias com capital pulverizado, é recente e prevê maiores garantias para o acionista minoritário. "Está longe de ser perfeito. Mas é melhor que nada." A tendência, na opinião dele, é que um número maior de empresas passe a integrar esse mercado. E, quem sabe assim, a concentração de ações na mão de poucos diminua. Ele lembra que a quantidade de ações da Embraer distribuídas no mercado (o chamado free float) é de 20%; da Perdigão, 52%; e da Renner, mais de 90%.

A diretora-executiva do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Heloisa Bedicks, afirma que a oferta feita pela Sadia é um grande passo para o mercado de capitais. Para ela, a concentração de ações na mão de pouco investidores é resultado de um mercado minúsculo, mas que está se desenvolvendo.

21 julho 2006

Livro do Terceiro Setor - Lançamento

Contabilidade Financeira

Os professores Paulo Olak e Diogo Nascimento estão lançando o livro "Contabilidade para Entidades Sem Fins Lucrativos (Terceiro Setor)".

O lançamento oficial será no Congresso USP de Controladoria, no Stand da Editora Atlas.

19 julho 2006

Governança Corporativa

Artigo do Valor Econômico de hoje

Boas práticas de governança corporativa e seus benefícios

Diogo Teixeira
A competitividade e globalização têm forçado cada vez mais as empresas a atravessarem a fronteira das tradicionais demandas por qualidade e preço. Fatores como responsabilidades ambiental e social, governança, transparência e relacionamento com clientes, funcionários e acionistas apresentam-se igualmente relevantes no desempenho e nos resultados finais das corporações. Entre todos esses itens, é fundamental estar atento à governança corporativa.

Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), as iniciativas de governança se resumem ao sistema pelo qual as empresas são dirigidas e monitoradas, envolvendo os relacionamentos entre acionistas, cotistas, conselho de administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal.

As boas práticas têm a finalidade de otimizar o desempenho de uma companhia ao proteger todas as partes interessadas, como investidores, empregados e credores, facilitando assim o acesso ao capital. Com isso, podem ser criados ferramentas e mecanismos de acompanhamento, fiscalização e até incentivo de seus executivos, garantindo assim que o objetivo e as ações da empresa estejam alinhados.

Geralmente a empresa utiliza a governança para atrair investidores, tornar-se auto-sustentável e também melhorar os processos internos, além de seguir diretrizes que assegurem a todos eqüidade, transparência, prestação de contas ("accountability") e responsabilidade pelos resultados.

Muitas empresas, dos mais diversos segmentos e portes, estão adotando esse tipo de prática em sua gestão. Podemos mencionar a Embratel, que aplica essa estratégia para respeitar os interesses de todos aqueles relacionados com a organização, particularmente seus acionistas. Para isso, a Embratel Participações dispõe de instrumentos, como Estatuto Social, Política de Divulgação e Política de Relações com Investidores, estabelecendo os principais critérios de decisão da diretoria e permitindo ao público acompanhar o processo decisório de forma clara.

Outras empresas que também merecem destaque nesse aspecto são a Embraer, Alpargatas, Banco Nossa Caixa, Gerdau, Gol, Braskem, TAM, Grupo Pão de Açúcar, Hering, Copasa, Klabin, Unibanco Holding, CPFL Energia, UOL, Companhia Vale do Rio Doce, Mangels, Marcopolo, Natura, Weg, Eletropaulo e Net, entre outras.

Nos EUA, após inúmeros escândalos empresariais, as organizações passaram a adotar as práticas da governança corporativa, fortalecidas ainda mais com a lei Sarbanes-Oxley, que significa regulamentar e tornar obrigatório o comportamento ético.

A maioria das empresas americanas reforça que cumprir as normas da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês), ditadas pela Lei Sarbanes-Oxley, envolve despesas, que custam caro para quem nunca as seguiu. Para definir a melhor estratégia que se adapte às novas diretrizes pode ser necessário mais pessoal, mais trabalho e às vezes terceirização. As companhias de capital aberto estão seguindo essas linhas para entrarem e se manterem nas respectivas bolsas de valores.

Não podemos imaginar que esse alvoroço só acontece por lá. No Brasil, sucessivas fraudes e evasões fiscais, entre outras falhas, são evidenciadas ao longo dos anos, isto porque os exercícios de governança corporativa não foram respeitados, notadamente quanto à transparência e prestação de contas (accountability). O CEO e presidente da Citrix, Mark Templeton, diz que princípios sólidos de governança corporativa são imprescindíveis para criar um ambiente em que todos participem, conquistar e manter a confiança dos investidores.

É importante que as companhias, além de assegurarem lucro e retorno sobre o capital, garantam respeito aos direitos dos acionistas minoritários e transparência nos atos e resultados da administração. As empresas que optam por implementar práticas de governança corporativa proporcionam benefícios essenciais aos investidores como maior precisão no cálculo do preço justo das ações, melhora no processo de acompanhamento e fiscalização, maior segurança quanto aos seus direitos societários e redução dos riscos. O simples fato de disponibilizar informações no site das empresas ou em portais de relacionamento com investidores gera bons resultados e aproxima acionistas, funcionários, cotistas e executivos.

Todas estas mudanças tornam imprescindível o gerenciamento por meio de inteligentes práticas de governança corporativa, com foco no respeito e na transparência dos exercícios de empresas de qualquer segmento. Essas ações buscam a comunhão dos ideais daqueles que nela investem.

Diogo Teixeira é coordenador do curso de pós-graduação Gestão de Negócios do Centro Universitário Senac

Cultura da Corrupção: Evidencia em Multas de Estacionamento

Contabilidade Financeira

Nós sabemos sobre a corrupção através da notícia dos jornais falando dos desvios de recursos públicos e da impunidade dos corruptos. Uma forma de medir a corrupção de um país é através de índices de corrupção, criados por institutos de transparência internacional.

Dois pesquisadores, Raymond Fisman e Edward Miguel, resolveram testar a validade destes índices através de uma evidência indireta: o comportamento do corpo diplomático de um país. Especificamente, do corpo diplomático na cidade de Nova Iorque.

Nesta cidade, em especial na Midtown Manhattan, conta com muitos diplomatas que servem nas Nações Unidas. Estes diplomatas possuem isenção de multa de trânsito. Ou seja, as multas de estacionamento proibido podem ser aplicadas aos diplomatas mas não são pagas. De novembro de 1997 ao final de 2002 foram mais de 150 mil multas não pagas.

A conclusão dos pesquisadores é que as violações de estacionamento apresentam uma forte correlação com outras medidas de corrupção.

Além disto, os pesquisadores encontraram uma redução das violações de trânsito dos diplomatas após o 11 de setembro. Conforme os autores:

"cultura, normas e emoções (...) tem um papel fundamental nas corrupção".

No levantamento dos autores, de 146 países, aqueles com maior média de violações de estacionamento no período analisado são:

1o. Kuwait
2o. Egito
3o. Chade
4o. Sudão
5o. Bulgária
6o. Moçambique
7o. Albania
8o. Angola
9o. Senegal
10o. Paquistão

O Brasil ocupa um vergonhoso 29o. lugar, com quase 30 violações por diplomata (contra 246 do Kuwait)

Clique aqui para ler o artigo em PDF e em inglês

Os problemas das Normas Internacionais

Contabilidade Financeira

As normas internacionais tem sido considerada uma avanço na contabilidade. Mas nem todos defendem sua adoção.

Uma pequena notícia do sítio Accountancy Age informa de uma pesquisa realizada pela PricewaterhouseCoopers que mostrou que a adoção das normas internacionais do Iasb (International Financial Reporting Standards) é problema para as companhias britânicas.

De acordo com a notícia, as empresas necessitam conquistar os executivos. Além disto, a pesquisa encontrou que os custos de implementação são mais elevados do que inicialmente se esperava, sem um benefício claro. Ou seja, os custos excedem os benefícios.

18 julho 2006

Globalização e Copa do Mundo

Branko Milanovic escreveu sobre a importância e as lições da Copa do Mundo no processo de globalização. Milanovic chama a atenção para a existência de uma globalização do futebol, com uma conseqüência na concentração da qualidade e sucesso:

"Consider o número de clubes que tem qualificado para a Champion´s League. Se nós olharmos para o período de cinco anos entre 1967 e 1986, o número de diferentes times que qualificaram para as quartas de final variou entre 28 e 30. Nos próximos períodos de cinco anos, entretanto, o número cai para 26 e em períodos mais recentes (2000-2004) eram somente 24. (...) Menos e menos clubes estão fazendo parte da elite do futebol Europeu.

Ligas nacionais são similares. Desde que a English Premier League começou em 1992, somente um campeonato não foi vencido por Manchester United, Arsenal ou Chelsea. Na Itália, todos os campeonatos da Serie A desde 1991 foram vencidos por Juventus ou Milan [Este ano, com a punição, isto deverá ser uma exceção]. Na Espanha, todos os campeonatos desde 1985 foram vencidos por Real Madrid ou Barcelona [Isto não é verdade pois tivemos campeonatos vencidos pelo Sevilha]"

A razão disto está na possibilidade de reunir talentos. Uma outra conseqüência, segundo Milanovic, tem sido a menor discrepância entre os desempenhos das seleções nacionais. A mobilidade do trabalho permite que jogadores de toda a parte do mundo possam participar de equipes e, por conseqüência, melhorar seu desempenho. Estes jogadores irão compor as equipes nacionais de cada país.

E o Brasil? Acredito que a época dos campeonatos estaduais acabou. Cada vez mais a rivalidade deixará de ser entre dois times locais. Mais ainda, em algumas cidades teremos a decadência irremediável de certas equipes. E com o passar do tempo, somente algumas poucas equipes serão as candidatas naturais ao título.

Finanças Comportamentais Novamente

Contabilidade Financeira

Parece que o tema Finanças Comportamentais está nas manchetes. A seguir uma reportagem do Valor Econômico de hoje (18/7) sobre o assunto:

Os parâmetros comportamentais do investidor brasileiro

Martin Casals Iglesias
Diz a lenda que no seu regresso à Espanha, Colombo foi convidado a um banquete, no qual vários comensais comentaram que não viam nenhuma façanha no que ele tinha feito, pois era evidente que dava para chegar às Índias navegando para o ocidente. Colombo pegou um ovo e desafiou os participantes a o colocassem em pé. Após muitas tentativas frustradas, Colombo pegou o ovo e o bateu levemente contra a mesa, provocando um pequeno achatamento que permitiu com que o mesmo ficasse em pé. "Óbvio, desse jeito eu também teria conseguido", disse um dos convidados, que ainda não percebera que aquilo não tinha sido um desafio, mas uma sutil resposta. Há coisas que parecem óbvias, fáceis ou até evidentes, depois de terem sido vistas, feitas ou ditas por alguém.

Uma coisa que intriga muita gente é a baixa exposição ao mercado acionário dos investidores locais. Uma das explicações mais freqüentes é de que no Brasil os investidores são muito conservadores e não estão dispostos a correr o risco do mercado acionário.

A teoria do prospecto de Daniel Kahneman descreve o comportamento do investidor em duas equações, montadas em função de parâmetros comportamentais. Certamente o mais importante deles é o coeficiente de aversão a perdas que Kahneman estimou em 2,25 num experimento realizado por ele em 1992, com alunos de Berkeley e Standford. O coeficiente quer dizer que a perda de uma unidade monetária gera desgosto que só pode ser compensado pelo ganho de 2,25 unidades.

Se de fato existisse algum viés comportamental que inibisse o investidor brasileiro a aplicar em ações, seria de esperar que os parâmetros da teoria do prospecto calculados no Brasil fossem diferentes dos obtidos nos EUA.

Para verificar isso, fui até o laboratório de economia experimental da Fundação Getúlio Vargas. Segui à risca todo o procedimento feito por Kahneman e apliquei a um grupo de participantes exatamente as mesmas perguntas feitas no experimento de 1992. Foi solicitado aos estudantes que optassem entre participar de 64 jogos, nos quais os ganhos (ou perdas) dependiam de probabilidades, ou receber (ou pagar) um valor fixo e desistir de jogar. Todas as perguntas seguiam o seguinte modelo: "Suponha um jogo no qual você tem 90% de chance de ganhar zero e 10% de chance de ganhar R$ 50,00". Os participantes então deviam escolher o valor fixo a ser recebido, pelo qual desistiriam do jogo. Variavam, de uma pergunta para outra, o valor, as probabilidades e se o jogo se referia a chances de ganhos, de perdas ou a uma combinação de ambas.

Os resultados do experimento foram surpreendentemente parecidos aos encontrados nos EUA, a começar pelo coeficiente de aversão a perdas que foi estimado em 2,21 para o Brasil, contra os 2,25 dos Estados Unidos.

A conclusão a que se chega é bastante simples: se acreditamos que a teoria do prospecto de fato explica a forma como as pessoas se posicionam perante o risco, temos de aceitar que a diferença entre o percentual alocado em bolsa no Brasil e nos EUA não se deve a fatores comportamentais.

De certa forma, esta constatação traz esperança sobre o crescimento futuro do mercado acionário brasileiro já que, segundo as conclusões do estudo, não há nada de comportamental que impeça o brasileiro de alocar em risco e, assim sendo, a grande diferença entre as alocações no Brasil e nos Estados Unidos é explicada pelo retorno dos ativos, dentre eles o nível da taxa básica de juros e o prêmio de risco do mercado acionário ("Equity Premium").

A mesma conclusão pode ser vista de outro ângulo. Se os investidores americanos fossem submetidos às condições do mercado brasileiro, teriam basicamente a mesma alocação que os investidores locais, ou seja, uma aparentemente baixa exposição à bolsa.

Se acreditarmos que num futuro próximo os retornos dos ativos serão ajustados com a redução da taxa básica de juros, podemos acreditar que o mercado brasileiro de ações pode vir a se tornar, em termos proporcionais, tão importante e relevante como o dos EUA.

Bem. Se por um lado a constatação da semelhança entre os investidores americanos e brasileiros me parece um fato novo e de extrema importância, por outro lado, sendo bem sincero, o fato de o nível de juros ser um dos principais fatores que inibem o investidor brasileiro a aplicar em bolsa era algo que mesmo antes do teste de laboratório já me parecia óbvio... tal qual o ovo.

Martin Casals Iglesias é gerente sênior do Wealth Management Services do BankBoston

Matricular e ensinar

A reportagem a seguir é uma tradução da revista The Economist, a melhor revista semanal do mundo. Fala sobre a existência de um objetivo que a sociedade deseja atingir, mas que é distorcido. É muito próximo ao que ocorre nas empresas, onde metas são estabelecidas.

Não basta matricular; é preciso saber ensinar, diz avaliação do Bird

The Economist
Uma grande quantidade de tartarugas vivia às margens de um imenso lago. Os meninos costumavam ir à margem e observavam as tartarugas. Algumas vezes as tartarugas andavam em círculos, outras vezes se recolhiam aos seus cascos, como se fossem pedras. Ao ver isso, os meninos davam gargalhadas e batiam palmas. Eles iam para as suas casas e contavam a todos a história das tartarugas. Talvez esta narrativa não seja a mais emocionante, porém menos de metade dos alunos indianos com idades entre sete e catorze anos podia ler este trecho em suas línguas nativas, mesmo se quisessem fazê-lo. Este foi o resultado desanimador de um estudo nacional de alfabetização e conhecimentos em aritmética publicados pela Pratham, uma instituição filantrópica educacional, no começo do ano.

A educação para todos é uma causa popular. Tão popular que a cada década ou duas, governos e agências doadoras prometem colocar todas as crianças do mundo na escola primária até uma certa data, normalmente 10 ou 15 anos mais tarde. Em 1990, estabeleceram o prazo de 2000. Em 2000, passaram para 2015. Tudo o que é preciso, dizem os doadores, é dinheiro e vontade.

O dinheiro pode estar chegando. Em abril, Gordon Brown, o ministro das Finanças do Reino Unido, prometeu gastar US$ 15 bilhões em dez anos para ajudar a concretizar esta meta. A Rússia, anfitriã da reunião de cúpula do G-8 em São Petersburgo, colocou o tema na agenda e US$ 7 milhões do seu dinheiro na mesa. Mas despejar dinheiro no problema não é algo inédito. Desde 1990, o Banco Mundial gastou mais de US$ 12 bilhões em educação primária. O que isso conseguiu realizar? Na semana passada o seu Grupo de Avaliação Independente (IGE, na sigla em inglês) deu o seu veredicto.

Muito mais crianças estão freqüentando a escola primária. Nos 12 países que o IEG estudou em profundidade, os índices de matrícula cresceram a uma média de 19% ao longo dos 10 a 12 anos passados. Em 1996, a Uganda aboliu as taxas escolares para educação primária. Como resultado, as matrículas quase dobraram em um ano, segundo dados oficiais (nos quais alguns estudiosos não confiam). Tanto Quênia como Gana seguiram o exemplo de Uganda.

A iniciativa de reduzir taxas escolares agora é alardeada como um "sucesso imediato", uma das poucas e preciosas vitórias fáceis no tema do desenvolvimento. Realmente, longe de cobrar as pessoas para freqüentarem as escolas, alguns governos, com a ajuda de doadores, agora as subornam para que se matriculem. Eles oferecem refeições gratuitas ou distribuem dinheiro aos pais, sob a condição de estes manterem os filhos na escola. Na Nicarágua, informa o IEG, um plano-piloto que funciona nesses termos elevou os níveis de matrícula em cerca de 22%.

Governos e doadores têm sido muito bem sucedidos em encaminhar as crianças à escola. Mas o que elas aprendem quando estão lá? O estudo do Pratham na Índia é uma das poucas tentativas sérias de apurar isso. Apenas cinco dos 12 países visitados pela IEG realizaram testes padronizados e repetidos para monitorar seu progresso na educação de alunos, em vez de meramente matriculá-los. Os pais não podem preencher esse fosso. Consequentemente, os pais não sabem o que exigir das suas escolas. Essas crianças freqüentemente são os primeiros membros da família a receberem uma educação. No Estado indiano de Uttar Pradesh, 41% das crianças não sabiam ler um único parágrafo, porém apenas 21% dos pais achavam que seus filhos não sabiam ler.

O aumento explosivo na taxa de escolaridade na Uganda veio à custa de uma implosão na qualidade. Três anos depois do início retumbante de 1997, por exemplo, o distrito de Bundibugyo tinha 209 alunos para cada sala de aula. Em 2005, havia uma média de três estudantes por livro escolar no país.

Diante de índices como esses, a resposta óbvia é construir mais salas de aula e imprimir mais livros didáticos - em outras palavras, aumentar os "insumos" na educação. Em Uganda, a reação óbvia é provavelmente a correta. Mas ela pode não ser suficiente. Nos anos recentes, os experimentos demonstraram que simplesmente gastar mais em livros didáticos, lousa ou professores adicionais não eleva necessariamente a média das notas dos alunos.

Mas esses resultados acadêmicos dependem incomodamente dos hábitos dos doadores. No conjunto, eles se distinguem mais por seus contratos de fornecimento que pela pedagogia, são melhores em construção de escolas que em ensino. No Peru, o banco ajudou a melhorar os edifícios, a distribuir livros didáticos e a oferecer treinamento. Mas os professores do Peru continuaram mal remunerados, precariamente motivados e escassamente supervisionados, e raramente são cobrados por resultados. Alguns se recusam a usar livros escolares gratuitos, pois recebem comissões de editoras para darem preferência aos seus livros.

A resposta de Pratham ao generalizado analfabetismo e desconhecimento de aritmética básica foi experimentar. A instituição tentou vários recursos em metade das escolas num distrito ou cidade, escolhendo uma metade aleatoriamente. As escolas remanescentes forneceram um grupo de controle, com o qual foi possível comparar os resultados dos seus esforços. Uma das suas iniciativas mais bem-sucedidas foi contratar alunos com colegial completo, sem capacitação, para oferecer reforço a estudantes que estavam ficando para trás. Esses "balsakhis" (que significa "amigos das crianças") eram baratos, recebiam de US$ 10 a US$ 15 por mês e eram rapidamente treinados, recebendo só duas semanas de instrução prévia. Por desempenharem seu trabalho em saguões ou mesmo debaixo de árvores, não havia nada para os governos ou doadores construírem.

Apesar disso, a educação que ofereceram foi surpreendentemente eficaz. Em Mumbai, elevou em 11,9% a probabilidade de alunos da quarta série entenderem noções de matemática da primeira série. Elevou ainda a probabilidade de superarem o analfabetismo no segundo ano em 9,9%. Os benefícios em outros lugares foram menores, porém ainda assim compensadores.

O tratamento de Pratham pode não se aplicar à África, onde professores plenamente treinados ainda são relativamente baratos. Mas a abordagem das organizações beneficentes - mensurar, testar, avaliar - deveria se enquadrar. Graças aos balsakhis, um número maior de crianças indianas está aprendendo a contar e a ler - bem o suficiente para pelo menos desfrutar as histórias das tartarugas. Se os doadores também estão aprendendo alguma lição é algo que ainda precisa ser verificado.

Pistas sobre a empresa

Uma reportagem muito interessante, enviada por Ricardo Viana.

As pistas que ajudam o investidor a ver que algo vai mal em uma empresa
Luciana Monteiro
17/07/2006

Depois de anos e anos de muita dedicação, o sonho do executivo Dick Harper torna-se, enfim, realidade e ele é convidado para ser o vice-presidente de Comunicação da companhia onde trabalha. Sua primeira missão é anunciar, ao vivo, o resultado da empresa num famoso programa de negócios da TV americana. Ao entrar no ar, no entanto, Dick descobre, a partir das perguntas do entrevistador, que a companhia está não só com sérios problemas financeiros, mas pior: quebrou.

A cena, claramente inspirada nos recentes escândalos corporativos dos Estados Unidos, faz parte do filme "As loucuras de Dick e Jane" e conta a história de uma empresa que teve seu balanço "maquiado" por seu principal executivo, que não hesita em vender suas ações antes de anunciar a falência da companhia e colocar um "laranja" para pagar o pato. Já Dick, vivido pelo ator Jim Carrey, além de perder o emprego, vê todas as suas economias, que estavam em papéis da empresa, irem pelo ralo. Sintomaticamente, ele passa a praticar assaltos, numa alusão à revolta com a impunidade com os crimes cometidos pelos colegas executivos.

O filme retrata bem alguns casos da vida real que se transformaram no pesadelo dos investidores em ações: o risco de suas economias virarem pó após fraudes contábeis. Por isso, cresceu o interesse de quem compra ações em encontrar meios para tentar detectar o menor sinal de manipulação ou de dificuldades das empresas, coisa que o investidor em geral é o último a saber.

Um dos pontos que contribuem muito para aumentar os riscos de falência de uma empresa é a concentração de poder caso a companhia não tenha uma boa estrutura societária e não adote sólidas práticas de governança corporativa. A constatação é de Stewart Hamilton, professor de contabilidade e finanças do International Institute for Management Development (IMD), na Suíça, e que lançou recentemente o livro "Greed and Corporate Failure - The Lessons from Recent Disasters" (Ambição e Fracassos Empresariais, as Lições dos Recentes Desastres, ainda sem tradução no Brasil). O livro trata dos últimos casos de quebra de grandes companhias que trouxeram fortes perdas para investidores. Em entrevista ao Valor, Hamilton dá dicas para os acionistas detectarem problemas antes de chorar as perdas.

Segundo o autor, são poucas as razões pelas quais as empresas vão à falência e os motivos são mais comuns do que se imagina. Ele analisou os oito últimos casos de fracassos corporativos - Barings, Allfirst, Enron, WorldCom, Tyco, Marconi, Swissair, Ahold e Parmalat - e identificou semelhanças entre eles. Para Hamilton, as principais causas para o insucesso são: diretoria ineficiente, decisões estratégicas pobres, expansão excessiva (incluindo-se aquisições em demasia), presidentes dominantes, deficiência de controles internos, além de ambição, excesso de confiança e desejo de poder do controlador.

As razões que levam as companhias à falência também são aplicáveis ao mercado brasileiro, avalia Hamilton. "Nas empresas onde os acionistas não têm direito a voto e o controle é exercido por um pequeno grupo, muitas vezes os fundadores, a tendência é de elas seguirem os objetivos desse pequeno grupo", diz.

Esse é um ponto que merece especial atenção, principalmente no Brasil, onde a maior parte das ações das empresas são preferenciais, sem direito a voto. "Na minha opinião, todos os acionistas deveriam ter direitos iguais", diz Hamilton. "Uma ampla base de acionistas com direito a voto provê importante instrumento de contenção de excessos e meios para a troca de diretores". Além disso, os minoritários deveriam ter algum mecanismo de proteção especial para assegurar que seus interesses não serão desrespeitados. O professor elogia o fato de as recentes aberturas de capital no Brasil terem sido feitas no Novo Mercado - o mais alto nível de governança corporativa da Bolsa de Valores de São Paulo.

Como casos comuns de desrespeito aos minoritários, Hamilton cita a contratação de integrantes da família controladora - quando há executivos mais capacitados no mercado - ou aquisições realizadas por motivos pessoais em vez de razões lucrativas. "Além da inerente injustiça presente nessas situações, se descobertas, essas atitudes causarão depreciação das ações e ficará mais difícil obter retornos com o papel no mercado financeiro", diz. Especialistas calculam que 75% das empresas brasileiras são familiares, mas a maior parte delas não chega à terceira geração justamente por problemas sucessórios, brigas entre parentes ou falta de capacidade dos herdeiros.

Outro conselho do professor é o de que os acionistas devem sempre acompanhar o fluxo de caixa da empresa e sua evolução. Hamilton diz que os investidores devem evitar comprar ações de companhias que realizam muitas aquisições, especialmente compras relacionadas a novos produtos ou de empresas que estão em outras áreas geográficas. Com relação a presidentes dominantes, o professor reconhece que, quando o executivo é competente, isso pode trazer resultados favoráveis à empresa. Mas, nesse ponto, há uma linha tênue entre sucesso e fracasso, alerta Hamilton.

O estudioso dá atenção especial à forma de remuneração dos principais executivos. No Brasil, por falta de cultura e até por uma questão de segurança, as companhias não divulgam como os integrantes da diretoria são pagos ao atingir metas. O mesmo não ocorre nos Estados Unidos, por exemplo, onde a política de remuneração está no estatuto e no balanço. "É importante saber como os executivos são premiados para ver até que ponto os interesses deles estão alinhados com os dos acionistas no curto e médio prazos", diz Hamilton.

Entre os pontos a serem observados pelos acionistas estão: se existem bônus garantidos, como se fossem parte do salário, ou se todos dependem de resultados; como são concedidas as bonificações de ações, se dependem do crescimento dos preços dos papéis em relação a algum índice do setor ou ao crescimento dos lucros no longo prazo; se há o chamado "golden parachute", estratégia concebida para impedir ou reduzir o impacto de uma aquisição e proteger a alta gerência, conferindo-lhe benefícios generosos em caso de demissão; como funcionam os benefícios como contribuições para fundos de pensão, moradia gratuita ou viagens para os principais executivos.

Hamilton chama a atenção também para o fato de que "embora o mercado considere que opções de ações ajudem a alinhar os interesses dos executivos com o dos acionistas, essa estratégia é na verdade uma aposta de mão única". Ele prefere prêmios baseados no crescimento da empresa no longo prazo e na forma de ações com restrições para venda, que devem ser conservadas pelos executivos por um prazo maior, independente de alguma parcela poder ser vendida para pagamento dos impostos.

Na visão do professor, a recente turbulência nas bolsas internacionais não teve um efeito nas taxas de juros e não deve, por si só, aumentar o risco de falência das empresas. "Mas com ações com preços mais baixos, as empresas mais especulativas tendem a sofrer mais que as consideradas defensivas", diz Hamilton. "E se essas companhias estiverem desesperadas para captar dinheiro na bolsa de valores e se deparam com o atual cenário, os riscos de falência delas aumentam".

Valor Econômico