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11 fevereiro 2017

Fato da Semana: Realidade e Ficção



Fato: Realidade e Ficção

Data: 6 de fevereiro de 2017

Contextualização
Na novela Sol Nascente, um personagem afirmou que "advogado e contador é tudo trambiqueiro". Isto gerou uma reação da entidade de classe federal, que encaminhou uma correspondência ao diretor de dramaturgia da novela da TV Globo. No ofício, o presidente da entidade afirma que os profissionais de contabilidade (não os contadores, que é diferente) sentiram menosprezados e desrespeitados na sua honra com a afirmação do personagem.
O presidente da entidade solicitou que o veículo de comunicação se "retrate perante os profissionais de contabilidade".
Em primeiro lugar, há uma confusão entre "contador" e "profissional de contabilidade" na própria correspondência do conselho. Ao afirmar que são mais de 500 mil profissionais, claramente o conselho falou em nome somente daqueles que estão registrados. Segundo, ao confundir uma simples afirmação de um personagem fictício de uma novela com a necessidade de exigir a retratação parece existir um certo exagero; talvez uma jogada para a plateia. Talvez uma tentativa absurda de fazer uma censura ao veículo de comunicação. E a censura acabou no Brasil há anos.
Não consegui deixar de lembrar da presença de um dos maiores fraudadores da história contábil no congresso de contabilidade promovido por este conselho. E que recebeu um grande valor por uma palestra sobre "governança corporativa". É o mesmo conselho de também no congresso anterior chamou um político que despreza o contador, que não se manifestou em nenhum momento sobre os problemas gravissimos de corrupção no Brasil, que elege seus dirigentes por voto indireto, entre outros problemas.

Relevância
O oficio foi extensamente divulgado entre os próximos dos conselhos regionais. Mas somente isto.




Notícia boa para contabilidade?

Não. O conselho não soube separar uma novela de uma afirmação da vida real.

Desdobramentos
Esperamos que a Globo ignore a correspondência.

Mas a semana só teve isto?
Tivemos o início da divulgação das demonstrações contábeis do exercício findo em 31 de dezembro de 2016. Mas o número ainda é pequeno para se ter uma ideia dos efeitos da recessão nos resultados.

Links

Necessidade de previsão contratual para capitalização de juros: decisão da justiça.

A irritante razão pela qual as pessoas confiantes são premiadas

As cinco características da negação científica e o aquecimento global (ao lado)

Drogas inteligentes podem melhorar o desempenho no Xadrez

Rir é o melhor rmeédio


09 fevereiro 2017

Livro


A Editora ATLAS tem o prazer de comunicar a publicação da obra:

César Augusto Tibúrcio Silva e Jorge Katsumi Niyama-Contabilidade para Concursos e Exame de Suficiência / 4|2017 [ 4216681 / ISBN: 978-85-970-1064-0] - Preço capa: R$ 120,00 / Quantidade de páginas: 536 - Data de publicação: 08/02/2017


Curso de Contabilidade Básica: Olhando os grandes números; olhando as grandes variações

Uma das regras básicas de analisar as demonstrações contábeis de uma empresa é observar os grandes números. Será nas contas mais expressivas de uma entidade que estariam os aspectos mais relevantes. Outra regra, derivada desta, é prestar atenção nas grandes variações e tentar procurar respostas para estas questões. Vamos mostrar este aspecto com as informações contábeis da Cielo, uma empresa que o leitor provavelmente conhece: ao fazer o pagamento de suas compras, provavelmente estará usando uma das máquinas da empresa.

A figura abaixo é a reprodução do Balanço Patrimonial da Controladora e do Consolidado referente ao exercício encerrado em 31 de dezembro de 2016, em comparação com aquele encerrado em 31 de dezembro de 2015 (Fonte: http://cielo.riweb.com.br/).

Dentro da ideia de observar os grandes números, o leitor poderia iniciar verificando as três maiores contas do ativo da empresa. Comece com a coluna da controladora em 31/12/2016. Pode ser encontrado que as três contas mais relevantes são: investimentos (9,8 bilhões de reais), fundo de investimento em direitos creditórios (8,3 bilhões) e contas a receber operacionais (1,7 bilhão). Podemos fazer o mesmo para a próxima coluna, que corresponde aos dados da controladora em 31/12/2015. As três contas mais relevantes são: contas a receber operacionais (10,2 bilhões), investimentos (9,9 bilhões) e depósitos judiciais (1,3 bilhão).

Aqui nós temos a segunda regra: as grandes variações. Perceba o leitor que contas a receber operacionais diminuiu de 10,2 bilhões para 1,7 bilhão e que a conta fundo de investimento em direitos creditórios saiu de zero para 8,3 bilhões.

Vamos fazer o mesmo para o Consolidado. Começamos com a coluna de 31/12/16 e temos que os maiores valores são: intangível (13,4 bilhões), contas a receber operacionais (11 bilhões) e caixa e equivalentes de caixa (2,7 bilhões). No exercício anterior as três maiores contas eram: intangível (14,3 bilhões), contas a receber operacionais (11,2 bilhões) e depósitos judiciais (1,3 bilhão). Aqui a mudança não foi tão drástica.

A próxima etapa é tentar entender a razão das mudanças que ocorreram na controladora em duas contas: contas a receber operacionais e fundo de investimento em direitos creditórios. Na primeira, o valor diminuiu de 10,2 bilhões para 1,7 bilhão ou uma redução de 8,4 bilhões. Na segunda, ocorreu um aumento de zero para 8,3 bilhões.

Dois pontos a serem notados: em primeiro lugar, que a variação de uma conta foi quase o mesmo valor que ao da outra; em segundo lugar, na imagem acima a empresa faz uma referência à nota explicativa que irá detalhar cada uma das contas. Observe que ao lado de contas a receber operacionais aparece que a nota explicativa é a número 5 e que ao lado de fundo de investimento em direitos creditórios a nota explicativa é a número 6.

Vamos iniciar pela nota 6, que possui o nome mais complicado. Eis o que diz o início:


Observe que este fundo começou a funcionar em 2016. Por esta razão, o valor correspondente em 31/12/2015 era igual a zero. O que ocorreu aqui é que a empresa controladora tomou grande parte de “contas a receber operacionais” e transferiu para um “fundo de investimento”. Este fundo irá administrar estes valores – que na nota explicativa corresponde às “cotas”. Provavelmente a empresa entendeu que a gestão destes recursos seria melhor se estivesse separado da administração dos outros ativos. A empresa deve ter estudado a legislação citada e verificado que seria interessante trabalhar com um fundo de investimento. Em lugar de ter “contas a receber”, a controladora possui agora cotas de um fundo.

Esta operação não alterou em nada o consolidado, já que tanto contas a receber quanto as cotas do fundo são da Cielo. Para fins de análise, ambos se equivalem.


Links

O Caso Odebrecht na América Latina (inclui a campanha de Santos de 2014 na Colômbia)

Melania Trump processa jornal em 150 milhões de dólares

Na Austrália um servidor público recebe dez vezes o salário do primeiro ministro

As celebridades morrem de 3 em 3?

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08 fevereiro 2017

Links

Canção composta para embalar bebê

Estudo de caso: O dilema de Graça

Deutsche Bank está tentando sair da crise cortando pessoal

Reprodução das pesquisas científicas

Balanço do Bradesco

Após olhar o balanço do Bradesco, publicado no dia de hoje, poderia comentar dos 15 bilhões de reais de lucro (abaixo dos 17 do ano anterior), da receita de intermediação financeira de 162 bilhões de reais, dos 62 bilhões de caixa operacional (versus -35 bilhões de 2015), entre outros aspectos.

Muitas vezes o que não é dito é tão importante quanto aquilo que é dito. Isto também é uma verdade na contabilidade. O que faltou dizer na demonstração publicada hoje? Se no dia de hoje você pensar no ano de 2016, qual assunto seria o mais importante: (a) Olimpíadas do Rio; (b) Operação Lava-Jato e outras operações de combate a corrupção; e (c) cassação do mandato de Rousseff? Talvez uma resposta em cima do muro seja as três alternativas.

Na mensagem aos acionistas, o presidente do Conselho de Administração do Bradesco enfatiza a conclusão da operação de aquisição do HSBC, o patrocínio das Olimpíadas e Paraolimpíadas e "os desafios impostos pelo atual cenário econômico". No Relatório de Administração o conteúdo está focado principalmente nas realizações da entidade. A entidade simplesmente ignora o item (b) e (c). É bem verdade que na nota explicativa 18, item d, ironicamente entitulada de "outros assuntos", comenta-se sobre a Operação Zelotes e a Operação Greenfield. No formulário 20F a entidade afirma:

nossa subsidiária Banco Bradesco BBI S.A. (“Bradesco BBI”) é parte em alguns processos judiciais e administrativos instaurados contra a Petrobras e outros réus, devido à sua atuação em uma oferta de títulos da Petrobras. Nós ou nossas subsidiárias podemos nos tornar parte em outros processos judiciais e/ou administrativos contra a Petrobras ou outras companhias, que ainda não foram instaurados

Deve ser um grande dilema para uma entidade fazer comentários sobre a situação política do principal mercado onde atua. Provavelmente o acionista não deseja que a entidade divulgue comentários como fazia o saudoso empresário Salvador Arena, que escrevia sobre a burocracia, os elevados impostos e outros assuntos. Mas dois fatos recentes incomodam este "esquecimento" do Bradesco. Primeiro, em 2014 o atual presidente, sr. Luís Trabuco, foi convidado para ser ministro da fazenda do governo Rousseff. O segundo, foi uma reunião ocorrida no Planalto, em fevereiro de 2016, onde este mesmo senhor tomou a palavra para dizer que

Hoje, temos uma pauta única no Brasil: o que nos angustia é como tirar o país da recessão

(Não era verdade, tanto é que a pauta de 2016 foi principalmente política, não econômica)

Ao ignorar o assunto, a diretoria do Bradesco nada mais faz do que confirmar a fama de dilmista (1). A entidade perdeu uma grande oportunidade de analisar os efeitos políticos dos acontecimentos recentes nos resultados, passados e futuros.

Um contra-argumento é que a instituição deve comentar estes aspectos no formulário 20F, entregue à SEC. Não concordo; o relatório de administração tem espaço para isto e a própria entidade resolveu abrir um item denonominado "Controle Integrado de Riscos", onde o assunto poderia ser tratado. Um subitem, 12.3 Fatores de Riscos, remete ao 20F, afirmando:

"O Formulário 20F é arquivado anualmente na SEC e pode ser acessado ..."

Mas a versão existente é de 2015. (Embora tenha sido colocado na página em abril de 2015, quando já estava em andamento o processo de impeachment). A entidade cometeu um grave erro contábil: ignorou o que realmente ocorreu no ano de 2016.

Prêmio Abrasca - No início do Relatório de Administração, o Bradesco afirma que conquistou "mais uma vez" o Prêmio Abrasca de Melhor Relatório Anual, que "reconhece o compromisso das empresas com a transparência no relacionamento com acionistas, clientes e partes interessadas". Não sou acionista, nem cliente, nem parte interessada. Mas se depender da minha opinião, o Bradesco não deveria ganhar o prêmio este ano.

(1) Vide em http://observatoriodaimprensa.com.br/crise-economica/dilma-e-o-bradesco/

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07 fevereiro 2017

Teoria Econômica é uma Fábula!

Resumo:

What on earth are economic theorists like me trying to accomplish? This paper discusses four dilemmas encountered by an economic theorist:

The dilemma of absurd conclusions: Should we abandon a model if it produces absurd conclusions or should we regard a model as a very limited set of assumptions that will inevitably fail in some contexts?

The dilemma of responding to evidence: Should our models be judged according to experimental results?

The dilemma of modelless regularities: Should models provide the hypothesis for testing or are they simply exercises in logic that have no use in identifying regularities?

The dilemma of relevance: Do we have the right to offer advice or to make statements that are intended to influence the real world?

Respostas na conclusão do artigo:

Like us, the teller of fables confronts the dilemma of absurd conclusions, because the logic of his story may also lead to absurd conclusions. Like us, the teller of fables confronts the dilemma of response to evidence. He wants to maintain a connection between his fable and what he observes; there is a fine line between an amusing fantasy and a fable with a message. Like us, the teller of fables is frustrated by the dilemma of fableless regularity when he realizes that sometimes his fables are not needed to obtain insightful observations. Like us, the teller of fables confronts the dilemma of relevance. He wants to influence the world, but knows that his fable is only a theoretical argument. As in the case of fables, absurd conclusions reveal contexts in which the model produces unreasonable results, but this may not necessarily make the model uninteresting. As in the case of fables, models in economic theory are derived from observations of the real world, but are not meant to be testable. As in the case of fables, models have limited scope. As in the case of a good fable, a good model can have an enormous influence on the real world, not by providing advice or by predicting the future, but rather by influencing culture.13 Yes, I do think we are simply the tellers of fables, but is that not wonderful?

Fonte: Rubinstein, Ariel, (2006), Dilemmas of an Economic Theorist, Econometrica, 74, issue 4, p. 865-883,

Governo e Laudos de Avaliação

Quando o governo decide repassar para a iniciativa privada a exploração de um serviço ou uma entidade, sob a forma de privatização, é usual utilizar da avaliação de empresas e dos seus métodos. São dois os objetivos do governo: garantir que o serviço seja ofertado - ou que a empresa permaneça em continuidade e gerando emprego - com a qualidade adequada e obter recursos que possam ser usados em outras atividades.

O processo de alienação de um serviço ou um ativo precisa seguir algumas "regras" típicas do setor público, que inclui transparência do processo, certeza que o preço obtido foi adequado, entre outros fatores.

Um aspecto relevante, que não existe numa operação de compra e venda da iniciativa privada, é que se tenha a continuidade ou até melhoria no serviço. Se uma rodovia é privatizada, o governo irá desejar que os usuários fiquem satisfeitos, já que isto ajuda a legitimar o processo. Assim, no processo de privatização estabelecem metas que devem ser cumpridas pela empresa vencedora.

Em geral o processo de alienação é muito mais demorado que na iniciativa privada, já que existe um ritual que deve ser cumprido. Isto faz com que exista uma grande possibilidade de que os estudos preliminares que deram origem ao lance inicial do leilão fiquem defasados.

Neste texto iremos destacar estes dois aspectos: a questão da defasagem dos laudos na área pública e a necessidade de garantir uma qualidade mínima do serviço privatizado.

Qualidade mínima - O governo brasileiro descobriu, da pior forma possível, que a privatização de serviços por valor mínimo pode ser perigosa. No governo Dilma, a burocracia federal resolveu fazer leilões de rodovias usando o menor lance. Funcionava da seguinte forma: a empresa interessada deveria gerenciar uma rodovia e fazer alguns melhoramentos futuros previstos no edital. Para financiar estes gastos, o governo permite que a empresa cobre pedágios ao longo da estrada. A empresa é declarada vencedora quando fixar o menor preço possível deste pedágio.

Suponha que esteja sendo privatizado um trecho rodoviário de 350 quilômetros, com a possibilidade de implantar cinco postos de pedágio, sendo necessários desembolsos de investimento para reformar trechos em estado precário e valores para conservação ao longo do contrato. A empresa faz uma análise, estimando o potencial de geração de receita de pedágio e confronta com a expectativa de despesa futura. Posteriormente calcula o valor presente do fluxo de caixa a ser gerado.

Ao fazer a análise, a empresa deve levar em consideração os potenciais concorrentes. Fatores como a maldição do ganhador podem conduzir a um lance bastante reduzido, que pode ser inferior àquilo que seria razoável em termos de lance de um leilão. Nos leilões do governo tem ocorrido lances que tornam inviável a prestação de um serviço com qualidade mínima. Esta situação é politicamente desastrosa para o governo.

O governo agora está propondo uma forma de tentar resolver este problema (1). A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) está considerando impor uma regra no leilão onde quando menor o preço oferecido - em relação ao valor estipulado no laudo - maior a necessidade de integralização de capital. Esta proposta tem uma consequência imediata que é aumentar o valor do lance mínimo ganhador. E isto pode ser ruim para o usuário, que estará pagando mais por um serviço. A razão disto é simples: como a taxa de desconto é composta do custo do capital próprio (ke) e o custo do capital de terceiros (ki). Geralmente o Ke é bem maior que o Ki; ao impor uma necessidade de capital, aumenta-se a participação do capital próprio e, consequentemente, o custo ponderado de capital. Para compensar o efeito do aumento da taxa de desconto, a empresa deve aumentar o valor a ser cobrado no pedágio.

Defasagem dos laudos - os laudos de avaliação de concessão de rodovias ou privatização de empresas estatais costumam ficar defasados em razão da lentidão do processo no governo. A necessidade de aprovação em diversos órgãos e a complexa costura política podem atrasar meses, aumentando a distância entre a data do laudo e o evento.

É sempre bom lembrar que um laudo é feito numa data específica. As estimativas foram construídas a partir das informações existentes naquele momento. Por este motivo, é comum que a mudança no cenário econômico possa alterar a qualidade do laudo, assim como o valor mínimo (ou máximo, dependendo do tipo de alienação).

Notícia recente informa que o governo pretende leiloar quatro aeroportos (Salvador, Fortaleza, Florianópolis e Porto Alegre) tendo por base dados de final de 2015 (2). O clima econômico naquele momento era bem diferente do existente no início de 2017. O volume de passageiros em cada um dos aeroportos caiu e isto afeta a previsão futura de geração de receita, variável relevante para a determinação do preço. O risco que o governo corre é não aparecer candidato ou se ter lance único, sendo necessário rever o processo de leilão.


(1) RITTNER, Daniel. Leilões de rodovias ganham nova regra contra lance "irresponsável". Valor Econômico. 1 fev 2017, p. A2.
(2) WARTH, Anne; NAKAGAWA, Fernando. Aeroportos vão a leilão com menos passageiros. Estado de S Paulo, 4 fev 2017, p B4

Listas: Celebridades mais bem pagas

1) Taylor Swift - 170 milhões de dólares
2) One Direction - 110 milhões de dólares
3) James Patterson - 95 milhões de dólares
4) Dr. Phil McGraw - 88 milhões de dólares
Cristiano Ronaldo - 88 milhões de dólares
6) Kevin Hart - 87,5 milhões de dólares
7) Howard Stern - 85 milhões de dólares
8) Lionel Messi - 81,5 milhões de dólares
9) Adele - 80,5 milhões de dólares
10) Rush Limbaugh - 79 milhões de dólares

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Antes do café:





06 fevereiro 2017

Cobrando perdas por corrupção

Segundo Juliano Basile (Petrobras quer ser ressarcida de fraudes, Valor Econômico, 6 fev 2017, na capa, e Petrobras cobrará perdas por corrupção, p. B5), a empresa entende que foi vítima do esquema de corrupção e que pedirá para ser ressarcida pelos prejuízos que teve com os desvios de corrupção nos seus contratos. A primeira parte da frase anterior é muito complicada: a empresa se diz vítima, mas quando toda direção parecia estar envolvida no esquema, pode-se dizer isto? Parece razoável imaginar que uma empresa que foi tomada por um grupo de pessoas que desviaram recursos seja “vítima”; mas supor que a justiça irá trabalhar com esta premissa parece forte demais. É mais fácil a justiça cobrar as multas e deixar que a empresa possa buscar a reparação em outro processo.

O segundo aspecto é interessante pois a emprega alega ter a receber R$5.7 bilhões pelos desvios “que foram apurados até aqui pela Lava-Jato”. Este é um número mágico e para muitos setores da empresa confortável. Não por coincidência, é um valor que se aproxima bastante daquele que foi apresentado pela empresa no balanço do terceiro trimestre de de 2014, ainda na gestão de Graça Foster. Assim, a empresa pretende insistir neste número mágico, que discordamos fortemente. Nossa estimativa é que o rombo foi de 20 bilhões, mas devemos destacar que a própria empresa reconheceu que seu número mágico de 6 bilhões é baseado numa estimativa grosseira. Importante destacar que a comissão cobrada era de 3% do valor dos negócios; isto representaria negócios de 190 bilhões (5,7 dividido por 3%), numa empresa que somente o imobilizado era superior a 500 bilhões de reais. Somente ao departamento de Justiça dos Estados Unidos a Braskem, onde a Petrobrás é acionista, tem-se um pagamento de 957 milhões de dólares.

Rir é o melhor remédio


05 fevereiro 2017

História da Contabilidade: livro “Elementos do Commercio” (1867)

Para fazer uma postagem sobre a história da contabilidade, este autor passa algumas horas pesquisando o acervo da Biblioteca Nacional, especialmente a sua hemeroteca digital, na seção dos jornais. O volume de informação é tão expressivo, que resolvi fazer uma pesquisa por década. Usando palavras como “contabilidade”, “guarda-livros”, “escripturação”, entre outras, podemos encontrar inúmeras referências sobre o assunto nos jornais antigos. Só para que o leitor tenha uma ideia, pesquisando “contabilidade” na década de 1860 é possível encontrar milhares de referências; somente o jornal Amazonas foram mais de quarenta vezes que o termo foi capturado pelo instrumento de busca. A grande maioria dos casos a pesquisa é desapontadora: são legislações, algumas específicas (e minha experiência mostra que a legislação pode ser um marco de referência para a evolução das estruturas jurídicas do país, mas muitas delas foram normas que não foram efetivamente aplicadas; além disto, creio que já explorei demais este assunto), termos fora do contexto, situação de pouco interesse ou repetições de pontos já abordados nas postagens. Às vezes é possível descobrir temas interessantes, como foi o caso da postagem de 23 de janeiro passado, sobre a Mucuri.

O tema de hoje é um anúncio publicado justamente no Amazonas, em 12 de outubro de 1867 (ano II, número 71) onde João Baptista de Figueiredo T. Aranha oferece o livro Elementos do Commercio, para “juventude estudiosa dedicada a profissão mercantil e da syntelologia”.

A primeira coisa que intriga é o termo syntelologia. No livro “Principios de Syntelologia”, de 1831, José Ferreira Borges explica que é a ciência que trata dos meios de prover as necessidades do estado político com recursos do estado social. Corresponderia ao que denominamos de finanças públicas, pelo que entendi da explicação de Borges. De qualquer forma, o termo não vingou e caiu no esquecimento.

O segundo aspecto que me interessou no anúncio é o fato de ser uma obra editada por um professor do Liceu paraense. Em 1872 o Brasil fez o primeiro censo demográfico e tinha quase 10 milhões de habitantes. Mas boa parte desta população não era alfabetizada, o que limita o potencial de venda de uma obra como esta. Mais ainda, trata-se de uma obra escrita e impressa no norte do país, onde o número de habitantes sempre foi, historicamente, reduzido. Mesmo assim, é interessante saber que uma obra como esta tinha um autor que se aventurava em publicá-la e isto pode ser uma demonstração que também existia pessoas interessadas em comprar o livro.

Arrisco a considerar duas justificativas para a publicação desta obra, e a existência de leitores. Em primeiro lugar, como já destacamos várias vezes nas postagens históricas do blog, a contabilidade era ensinada desde os primeiros anos de estudos na época do Império. Assim, todas as pessoas que estivessem em processo de alfabetização poderiam adquirir o livro. Em segundo lugar, o que se entendia por contabilidade era algo bem mais amplo; além das partidas dobradas, ensinava-se conversão do câmbio e de outras medidas, alguns aspectos jurídicos de empresas, noções de comércio, entre outros assuntos. Assim, um texto como este poderia ser de interesse do comerciante, quando necessitava fazer uma conversão cambial entre a moeda do império e a libra esterlina, por exemplo.

Ao final da minha leitura do anúncio fiquei imaginando como podemos pesquisar a riqueza do ensino de contabilidade no passado em cada província ou cidade. Como seria importante que os trabalhos de conclusão de curso também se interessassem em saber os primórdios da contabilidade em Sergipe, Goiás Velho e outras tantas localidades existentes no país. Material é que não falta. Fiquei imaginando que esta postagem teria um imenso valor para seu autor se soubesse que o texto provocou o interesse de professores e alunos em se dedicar ao passado. Afinal,

“o que foi feito é preciso conhecer, para melhor prosseguir” (Brandt e Nascimento)

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04 fevereiro 2017

Links

Os piores filmes que venceram o Oscar (e quem foi derrotado) (ao lado, Cidadão Kane, um dos derrotados)

A invenção dos animais de estimação

Somente 0,1% dos artigos em economia são replicados

As melhores e as piores publicidades do Super Bowl 51

Fato da Semana: Resultado do Tesouro

Fato: Resultado do Tesouro

Data: 30 de janeiro de 2017

Contextualização

A relação entre as receitas e despesas públicas tem apresentado deterioração nos últimos anos. O governo não consegue arrecadar mais por dois motivos: concedeu "incentivos" para alguns setores e a recessão econômica reduziu a fonte do dinheiro do setor produtivo. Podemos acrescentar outra razão: a carga tributária é tão elevada que torna-se difícil aumentar as alíquotas.
Já do lado da despesa o governo não consegue fazer mais com o recurso que obtém. Temos aqui um problema da qualidade do gasto público. Falta também definir prioridades na despesa.
Além disto, temos o problema da previdência. O país está perdendo uma oportunidade representada pela presença de jovens na força de trabalho; brevemente, a pirâmide da idade irá mudar e teremos mais pessoas idosas, e aposentadas, para sustentar. É uma questão de distribuição de renda entre gerações: permanecendo como está a situação da previdência do país, os jovens de hoje terão que trabalhar muito mais daqui há vinte/trinta anos; e as crianças de hoje irão retardar sua aposentadoria. É justo?

Relevância

A divulgação do resultado mostra o fracasso da contabilidade pública por três motivos (pelo menos). Primeiro, o regime de competência ainda é um sonho no setor. Segundo, os resultados são de difíceis compreensão. Terceiro, mesmo com a LRF, ainda é possível esconder resultados e manipular a contabilidade (por exemplo, através das pedaladas).

Notícia boa para contabilidade?

Não. Temos tido a incapacidade de melhorar a contabilidade pública.

Desdobramentos

No ano de 2017 ainda teremos despesas maiores que receita. O governo tem-se mostrado lento em cortar os gastos; não consegue aumentar a receita em razão dos problemas econômicos. É bem verdade que está conseguindo aprovar algumas reformas.

Mas a semana só teve isto?

Não. Tivemos quatro fatos importantes. Primeiro, a notícia do falecimento de Ijiri, um grande nome da contabilidade internacional, que passou desapercebido (falha lamentável). Segundo, a Apple não pagou a multa para comunidade européia. Terceiro, o Deustche Bank divulgou seus resultados, que incluiu o pagamento de multa por fraudes. Finalmente, começaram a temporada de balanços.

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03 fevereiro 2017

Teoria Moderna de Finanças é um lixo!

No artigo abaixo, Eugene Fama diz que boa parte da Teoria Moderna de Finanças é inútil. Segundo ele:

1) Modelos de precificação de ativos não têm validade empírica.
2) Estimar o custo de capital é muito difícil.
3) Beta individual é lixo. Beta de indústria são muito instáveis.
4) Estimativas de prêmio pelo risco não são confiáveis e não têm utilidade prática.
5) Proposições de Modigliani e Miller não têm importância.
 6) Fama também é cético em relação às Finanças Comportamentais.

Acho que isso é novidade apenas para acadêmicos. Traders e fundos de hedge bem -sucedidos já sabem disso há várias décadas. Como acadêmicos não correm riscos no mundo real, eles podem continuar ensinando essas porcarias para seus alunos.

Resumo:

  In a conversation held in June 2016 between Nobel laureate Eugene Fama of the University of Chicago and Joel Stern, chairman and CEO of Stern Value Management, Professor Fama revisited some of the landmarks of “modern finance,” a movement that was launched in the early 1960s at Chicago and other leading business schools, and that gave rise to Efficient Markets Theory, the Modigliani‐Miller “irrelevance” propositions, and the Capital Asset Pricing Model. These concepts and models are still taught at prestigious business schools, whose graduates continue to make use of them in corporations and investment firms throughout the world. But while acknowledging the staying power of “modern finance,” Fama also notes that, even after a half‐century of research and refinements, most asset‐pricing models have failed empirically. Estimating something as apparently simple as the cost of capital remains fraught with difficulty. He dismisses betas for individual stocks as “garbage,” and even industry betas are said to be unstable, “too dynamic through time.” What's more, the wide range of estimates for the market risk premium — anywhere from 2% to 10% — casts doubt on their reliability and practical usefulness. And as if to reaffirm the fundamental insight of the M&M “irrelevance” propositions — namely, that what companies do with the right‐hand sides of their balance sheets “doesn't matter” — Fama observes that “we still have no real resolution on the key questions of debt and taxes, or dividends and taxes. But if he has reservations about much of modern finance, Professor Fama is even more skeptical about subfields now in vogue such as behavioral finance, which he describes as “mostly just dredging for anomalies,” with no underlying theory and no testable predictions. Although he does not dispute that a number of well‐documented traits from cognitive psychology show up in individual behavior, Fama says that behavioral economists have thus far failed to come up with a testable theory that links cognitive psychology to market prices. And he continues to defend the concept of “efficient markets” with which his name has long been closely associated, while noting that empirically based asset pricing models such as his (with Ken French) “three‐factor” CAPM have produced much better results than the standard CAPM.

Fonte: Fama, Eugene F. and Stern, Joel M., A Look Back at Modern Finance: Accomplishments and Limitations (Fall 2016). Journal of Applied Corporate Finance, Vol. 28, Issue 4, pp. 10-16, 2016. Available at SSRN: https://ssrn.com/abstract=2902370 or http://dx.doi.org/10.1111/jacf.12206



Grupo Reckitt Beckinser negocia aquisição da Mead Johnson por US$ 16.7 bi

A Reckitt Benckiser, fabricante dos materiais de limpeza Veja e Vanish, além dos preservativos Durex e das pastilhas Strepsils, divulgou nesta quinta-feira (2) que está em conversas avançadas para comprar a Mead Johnson Nutrition, fabricante do suplemento alimentar Sustagen.

O valor total da aquisição seria de cerca de 16,7 bilhões de dólares (algo em torno de 52,6 bilhões de reais).

Cada ação da Mead Johson seria comprada por 90 dólares, pagos em dinheiro, um prêmio de cerca de 30% sobre valor de cotação dos papéis antes de a operação ser divulgada.

A negociação está em fase de due dilligence (investigação de informações) e discussão de contrato, segundo a Reckitt.

A compra deve ser financiada com uma combinação de dinheiro em caixa e dívida.

A companhia alerta, porém, que não há garantias de que o acordo seja de fato fechado.

A britânica Reckitt Benckiser tem diversas marcas de produtos de limpeza, higiene e medicamentos no portfólio. Nos 9 primeiros meses de 2016 (últimos dados disponíveis), ela teve uma receita líquida de 7,13 bilhões de libras, um aumento de 9% na comparação anual.

Os itens de higiene pessoal compõem a maior parte das vendas (42%). O setor de alimentos, que ganhará reforço se a compra da Mead Johnson for concretizada, responde por 4% do faturamento líquido.

Ela tem 37.000 funcionários no mundo.

Já a americana Mead Johnson vende mais de 70 produtos, entre suplementos e alimentos para dietas especiais, principalmente para crianças.

Em 2016, sua receita líquida chegou a 3,7 bilhões de dólares, crescimento de 8% frente ao ano anterior.


Fonte: Aqui

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01 fevereiro 2017

Links


Comparativo Pablo Escobar e Chaco

Cartões engraçados para do Valentine´s Day (ao lado)

Viajar para muitos países muda a personalidade (maior flexibilidade nas crenças, inclusive morais)

Devo e não pago

Há meses a Apple foi condenada pela Comunidade Europeia por usar a Irlanda para reduzir sua carga tributária. A empresa deveria repor aos cofres do governo irlandês 13 bilhões de euros como compensação por usar o país para pagar menos impostos. Descobriu-se que a empresa paga menos de 1% de imposto do lucro apurado, uma alíquota real bem camarada, já que a alíquota média dos países é de dois dígitos.

É bem verdade que o governo da Irlanda não se esforçou muito para cobrar os impostos, com medo de que uma punição para Apple poderia gerar a saída da empresa do país, gerando desemprego. A Apple afirmou na época que iria recorrer.

Pois bem, a CNBC lembrou que o prazo de pagamento venceu no dia 3 de janeiro. E que a empresa não efetuou o pagamento. Pelo balanço da empresa, a mesma tinha um caixa acima de 200 bilhões de dólares, um valor bem superior ao da multa. A empresa não quis comentar o questionamento da CNBC, mas o governo irlandês falou que o valor era expressivo e que ainda pode existir recurso para o caso.

O Going Concern pergunta se um contribuinte qualquer que estivesse devendo para o fisco teria a mesma compreensão. Bom, se fosse no Brasil muitos achariam que isto é coisa do terceiro mundo. Não é.

Mulheres e negócios

Acompanho o site Feminist Frequency, que pesquisa sobre a participação das mulheres. Aqui o relatório anual da entidade, com as realizações e um pequeno fluxo de caixa (afinal somos um blog de contabilidade). Este site também produz vídeos sobre as realizações das mulheres.

Também percebo a grande presença de homens no principal jornal de negócios do Brasil, o Valor Econômico (foto ao lado). Isto é perturbador, quando sabemos que a diretora de redação é mulher, além de termos um dos editores-executivos do sexo feminino (dos três), duas chefes de redação (ou 100%) e cinco repórteres especiais (em onze). Ou seja, quem faz o Valor não é um bando de homens. Mas se o leitor olhar as páginas do jornal, as fotografias são preponderantes do gênero masculino. Na edição de hoje, 28 fotos de homens e um retrato de uma mulher, na seção internacional. Ontem foi um pouco melhor: 23 homens estamparam suas faces no jornal versus 9 mulheres; mas observe que nesta edição tivemos um caderno especial sobre educação continuada, onde das onze fotografias, cinco eram de mulheres. De qualquer forma, em duas edições - eu sei que a amostra é limitada, mas creio que aumentar o número de jornais pesquisados não irá afetar este resultado - 16% das fotografias eram de mulheres.

Será que o jornal não estaria expressando a realidade do mundo dos negócios, onde a grande maioria seria composta por homens? Apesar da crescente participação das mulheres na força de trabalho, acredito que ainda são minoritárias nos cargos de comando no país. Mas isto está mudando. As mulheres já são quase maioria nos cursos de pós-graduação; no curso de contábeis da UnB, por exemplo, 45% dos discentes são mulheres; e no meu departamento são 30% dos docentes. Tudo parece conduzir para o aumento da participação do gênero feminino.

Frase

Não há dúvidas de que a gestão fiscal melhorou bastante, ainda que essa não fosse a mais árdua das tarefas para quem sucedesse o secretário do Tesouro de Dilma Rousseff, Arno Augustin.

(Editorial do jornal Valor Econômico, 1 de fevereiro de 2017)

Links

Bolsas do Senac em 1947

O que significa uma garrafa de refrigerante em termos de açúcar (cartoon ao lado)

Um experimento de Ariely sobre corrupção e honestidade

O medo do terrorismo e a falha na percepção de risco

Probabilidade de golpe de estado em 2017

Notícias e aprendizagem de máquina

Bancos e cavaleiros templários

Fleet Street, uma das mais movimentadas do centro de Londres, a dez minutos à pé da Trafalgar Square, existe um arco de pedra pelo qual muita gente pode passar e viajar no tempo.

Um pátio tranquilo leva a uma capela estranha, circular, e a uma estátua de dois cavaleiros em cima de um único cavalo. A capela é a Temple Church, construída pela Ordem Dos Templários em 1185, quando ficou conhecida como a "casa londrina dos cavaleiros do Templário".

Mas a Temple Church não tem apenas uma importância arquitetônica, histórica e religiosa. Ela também foi o primeiro banco de Londres.

Os cavaleiros templários eram monges guerreiros. Era uma ordem religiosa, com uma hierarquia inspirada na teologia e uma missão declarada - além de um código de ética -, mas também um exército armado e dedicado à "guerra santa".

Mas então como eles chegaram ao negócio dos bancos?

Os templários dedicaram-se inteiramente à defesa de peregrinos cristãos a caminho de Jerusalém. A cidade havia sido capturada na primeira Cruzada em 1099, e ondas de peregrinos começaram a chegar, viajando milhares de quilômetros pela Europa.

Esses peregrinos precisavam, de alguma forma, bancar meses de comida, transporte e acomodação para todos eles, sem precisarem carregar grandes somas de dinheiro consigo - já que isso os tornaria alvo fácil para ladrões.

Afortunadamente, os Templários tinham uma solução. Um peregrino poderia deixar seu dinheiro na Temple Church em Londres, depois pegá-lo de volta em Jerusalém. Em vez de carregar o dinheiro até lá, ele só precisaria levar uma carta com o crédito. Os Cavaleiros do Templário eram a Western Union (conhecida empresa que faz transferência de dinheiro entre países) das Cruzadas.

Nós não sabemos direito como os Templários faziam esse sistema funcionar, nem como se protegiam contra fraudes. Havia um código secreto para verificar o documento e a identidade do viajante?

Banco privado

Os Templários não foram a primeira organização no mundo a oferecer esse tipo de serviço. Diversos outros países haviam feito isso antes, como a dinastia Tang na China, que usava o "feiquan" - "dinheiro voador", um documento de duas vias que permitia a comerciantes depositarem seus lucros em um escritório regional e depois pegarem o dinheiro de novo na capital.

Mas esse sistema era operado pelo governo. O sistema bancário oferecido pelos Templários funcionava muito mais como um banco privado - embora pertencesse ao papa - aliado a reis e príncipes ao redor da Europa e gerenciado por uma parceria de monges que tinham feito voto de pobreza.

E os Cavaleiros do Templário fizeram muito mais do que apenas transferir dinheiro por longas distâncias. Em seu livro Money Changes Everything ("Dinheiro muda tudo", em tradução livre), William Goetzmann diz que eles ofereciam uma série de serviços financeiros reconhecidamente avançados para a época.

Se você quisesse comprar uma ilha na costa oeste da França - como o rei Henrique 3º da Inglaterra fez nos anos 1200 com a ilha de Oleron, a noroeste de Bordeaux -, os Templários poderiam ajudar a fechar o negócio.

Henrique 3º pagou 200 libras por ano por cinco anos para os Templários em Londres, e quando seus homens tomaram posse da ilha, os Templários zelaram para que o vendedor tivesse recebido todo o dinheiro.

Ainda nos anos 1200, as Jóias da Coroa foram mantidas no Templo como uma forma de segurança para um empréstimo - com os Templários atuando como uma espécie de casa de penhor.

Os Cavaleiros do Templário não foram o banco da Europa para sempre, claro. A Ordem perdeu sua razão de existir depois que os cristãos europeus perderam completamente o controle de Jerusalém em 1244, e os Templários foram dissolvidos por completo em 1312.

Então quem assumiu essa função bancária que eles deixaram?

Se você tivesse presenciado a grande feira de Lyon em 1555, poderia conhecer a resposta. Ela foi o maior mercado para comércio internacional de toda a Europa.

Troca sofisticada

Mas nessa edição da feira, começaram a circular rumores sobre a presença de um comerciante italiano que estava fazendo fortuna no local.

Ele não estava comprando, nem vendendo nada. Tudo o que ele tinha à frente era uma mesa e um tinteiro.

Dia após dia, ele recebia comerciantes e assinava pedaços de papel - e, de certa forma, ficava rico.

Os moradores locais olhavam para ele com suspeita.

Mas para uma nova elite internacional das grandes casas de mercadoria da Europa, suas atividades eram perfeitamente legítimas.

Ele estava comprando e vendendo dívidas - e, ao fazer isso, estava gerando um considerável valor econômico.

Um comerciante de Lyon que quisesse comprar, digamos, lã de Florença, poderia ir a esse banqueiro e pedir um tipo de empréstimo chamado de "conta de troca". Era um documento de crédito, que não especificava a moeda de transação.

Seu valor era expressado em "ecu de marc", uma moeda privada usada para essa rede internacional de banqueiros.

E se os comerciantes de Lyon ou seus agentes viajassem a Florença, a "conta de troca" do banqueiro de Lyon seria aceita pelos banqueiros de Florença, que trocariam sem problemas o documento pela moeda local.

Por essa rede de banqueiros, um comerciante local podia não só trocar moedas, mas também "traduzir" seu valor de compra em Lyon para valor de compra em Florença, uma cidade onde ninguém havia ouvido falar sobre ele. Era um serviço valioso, que valia a pena.

De meses em meses, agentes dessa rede de banqueiros se encontravam em grandes feiras como a de Lyon, conferiam suas anotações e acertavam as contas entre si.

Nosso sistema financeiro de hoje tem muito a ver com esse modelo.

Um australiano com um cartão de crédito pode fazer compras em um supermercado de Lyon. O supermercado checa com um banco francês, que fala com um banco australiano, que aprova o pagamento ao comprovar que ele tem o dinheiro em conta.

Contrapontos

Mas essa rede de serviços bancários sempre teve também seu lado obscuro.

Transformando obrigações pessoais em dívidas negociáveis internacionalmente, esses banqueiros medievais passaram a criar seu próprio dinheiro privado, fora do controle dos reis da Europa.

Ricos e poderosos, eles não precisavam mais se submeter às moedas soberanas de seus países.

O que de certa forma ainda é feito hoje em dia. Os bancos internacionais estão fechados em uma rede de obrigações mútuas difícil de entender ou controlar.

Eles podem usar seu alcance internacional para tentar contornar impostos e regulamentações.

E considerando que as dívidas entre eles são um tipo claro de dinheiro privado, quando bancos estão fragilizados ou com problemas, o sistema monetário do mundo todo também fica vulnerável.

Nós ainda estamos tentando entender o que fazer com esses bancos.

Nós não podemos viver sem eles, ao que parece, mas também não temos certeza de que queremos viver com eles. Governantes há muito tempo procuram formas de controlá-los.

Às vezes, essa abordagem tem sido no esquema "laissez-faire" ("deixai fazer"), outras vezes não.

Poucos governantes tem sido mais duros com os bancos do que o rei Felipe 4º, da França. Ele devia dinheiro para os Templários, e eles se recusaram a perdoar seu débito.

Então, em 1307, no local onde hoje fica a estação Temple do metrô de Paris, Felipe lançou um ataque ao Templo de Paris - o primeiro de uma série de ataques ao redor da Europa.

Os templários foram torturados e forçados a confessar todos os pecados que a Inquisição pudesse imaginar. A ordem acabou sendo dissolvida pelo papa.

O Templo de Londres foi alugado para advogados.

E o último grande mestre dos Templários, Jacques de Molay, foi trazido ao centro de Paris e queimado publicamente até a morte.

*Tim Harford escreve uma coluna de economia no Financial Times. "As 50 coisas que fizeram a Economia Moderna" é um programa transmitido no Serviço Mundial de rádio da BBC.

Fonte: Aqui

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