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28 maio 2013

Entrevista com Armínio Fraga


O almoço com Armínio Fraga foi combinado numa troca de e-mails. "A regra do  jogo é o entrevistado escolher o lugar, e o jornal paga a conta", dizia a  mensagem que propôs o encontro. "Frequento quatro ou cinco restaurantes aqui na  área", devolveu ele, minutos depois. "Se escolher um, os outros me  envenenam."
Agora, o repórter passa batido na frente de vários restaurantes bacanas da  avenida Ataulfo de Paiva, no bairro carioca do Leblon, e entra num prédio  comercial, onde fica a Gávea Investimentos, a maior gestora independente de  recursos do país, com uma carteira de R$ 15 bilhões. No sétimo andar, a  recepcionista dá as boas-vindas e leva o visitante para uma sala de reuniões.  Vamos comer no escritório, mesmo.
Armínio aparece pontualmente às 13h e constata que a fotógrafa do Valor já havia montado suas câmeras e luzes ali mesmo.  "Preparei a mesa numa sala lá de cima. A vista é outra coisa. Esta cidade é  muito bonita." Todos sobem uma escada interna para conferir o que o oitavo andar  tem a oferecer. À frente, Armínio segue falando. "Não saio muito no almoço. É  ótimo comer fora, mas não dá para conversar direito. Fica todo mundo  olhando."
Ele trabalha numa área compartilhada com colegas - por isso a mesa está  posta numa sala para encontros privados. A vista é bonita como prometido, com  montanhas ao fundo, mas conclui-se que a luz da sala de reuniões anterior era  melhor. "Vamos para lá", diz Armínio. "Cada um leva o seu", propõe, agarrando  pratos e talheres, sob protestos de auxiliares do escritório.
Já sentado à mesa, Armínio abre uma tupperware. "É um salpicão leve, tudo  orgânico", explica, apresentando uma salada com repolho e cenoura trazida de sua  casa, que fica a cinco quadras dali. Ele apanha as embalagens plásticas dos  sanduíches, ainda com etiquetas com preço do Talho Capixaba, uma delicatessen  vizinha. "São feitos com o famoso pão completo." Integrais, sem adição de  açúcar, com grãos de linhaça. Temos duas opções de recheio: queijo com salmão e  queijo minas com presunto. Armínio se estica e apanha uma Coca-Cola num frigobar  atrás dele. "O que vocês tomam?" A fotógrafa vai de água mineral, e o repórter,  de Coca Zero.
A imagem bem americana de Armínio almoçando um sanduíche com salada no  escritório, vestindo calça de sarja e camisa branca com uma camiseta por baixo,  leva à questão sobre sua real identidade, entre as cidadanias do Brasil e dos  Estados Unidos. O pai de Armínio, Sylvio, foi um renomado dermatologista que fez  residência na Filadélfia. Lá, ele se apaixonou por Margaret, uma descendente de  irlandeses que vive no Rio desde 1956, mas, apesar da distância, não deixou de  ser uma radical democrata, partido de esquerda nos padrões americanos. Armínio e  suas três irmãs nasceram no Brasil.
Eu me humilhei muito jogando futebol e me humilho  todas as semana jogando golfe. E no mercado também, né? O mercado é  cruel
"Fomos criados falando português em casa. Aprendi inglês depois", diz. "Claro  que crescemos com os valores dos dois, tem muita coisa americana, muita coisa  brasileira. Mas, apesar de admirador dos Estados Unidos, sempre me senti mais  brasileiro."
E carioca. Até sair do país para fazer doutorado na Universidade Princeton,  Armínio viveu uma vida típica de classe média no Jardim Botânico, um bairro da  zona sul, e estudou no colégio jesuíta Santo Inácio, um dos mais tradicionais do  Rio.
Uns dez anos atrás, a revista americana "Newsweek" o definiu como "o "nerd"  que salvou o Brasil" na crise cambial de 1999, mas ele não se reconhece no  rótulo. Embora estudioso, diz que teve outros interesses, como jogar futebol.  Não escapava de fazer provas finais em disciplinas pelas quais tinha menos  interesse, como história e português, e se saía melhor em ciências exatas, já se  direcionando para a medicina.
Esse parecia o caminho natural para quem veio de uma família de médicos,  começando com o avô, que saiu da pobreza no interior da Bahia para estudar  medicina e, mais tarde, tornar-se um dos primeiros bolsistas da Fundação  Rockefeller, nos Estados Unidos. Quando prestou vestibular, Armínio questionou  sua vocação para a profissão, ao ver o pai dedicar dias e noites ao trabalho, e  por eliminação foi fazer economia na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do  Rio. "Acabei dando sorte e me encantando pela área", diz hoje da escolha.
Depois de viver três períodos nos Estados Unidos, o último deles trabalhando  no legendário fundo de hedge de George Soros, Armínio e sua mulher, Lucyna,  decidiram que era hora de voltar para o Brasil, no fim do ano escolar americano,  em junho de 1999. Os filhos adolescentes estavam num momento crítico de definir  a nacionalidade. Chamado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso para assumir  o Banco Central, ele antecipou o regresso ao país em seis meses e comprou uma  casa no Leblon, onde mora até hoje. A sua filha, Mariana, hoje vive nos Estados  Unidos. O filho, Sylvio, mora no Rio e joga golfe com o pai.
Armínio faz parte do conselho de desenvolvimento econômico que assessora o  prefeito do Rio, Eduardo Paes. Uns tempos atrás, alguém jogou no ar a ideia de  fazê-lo o candidado do PSDB a prefeito ou a governador. Armínio abre a lata de  Coca-Cola. "Não sou político, não tenho vocação. Mas pretendo continuar a  participar do debate nacional, principalmente econômico." Isso inclui a troca de  ideias com Aécio Neves, o mais provável candidato a presidente pelo PSDB nas  eleições de 2014. "Tenho tido algumas conversas com ele, não muitas, mas boas. E  volta e meia outros políticos me procuram." O governador de Pernambuco, Eduardo  Campos, que ensaia uma candidatura pelo PSB, seria um deles? "Ainda não tive a  chance de falar com ele. Mas amigos em comum já comentaram que, eventualmente,  seria muito interessante bater um papo. Certamente teria o maior prazer."
Em 2010, Armínio e o sócio, seu primo Luiz Fraga, venderam o controle da  Gávea Investimentos para o JP Morgan, e o contrato estabeleceu que eles  permanecerão no comando do negócio por pelo menos cinco anos. Em uma entrevista  ao Valor, Armínio disse que queria se tornar um "cochairman"  junto a Luiz, ou copresidente do conselho, para a Gávea deixar de ser "a gestora  do Armínio". Com 55 anos, ainda parece cedo para se aposentar - o que ele pensa  para o futuro? Armínio faz um longo silêncio. E diz: "A resposta é rápida, só  demorei porque você me pegou de boca cheia. Eu me vejo dedicando menos tempo ao  dia a dia. São dias longos, com jornadas de 12 a 14 horas e, como nosso fundo  multimercado é global, com frequência acordo no meio da noite. Mas não há  pressa."
Na troca de e-mails que combinou o almoço, Armínio topou adiantar um pouco do  que estava lendo e pensando. Entre os vários tópicos encaminhados de véspera,  estava o nome de Isaiah Berlin. Uma rápida pesquisa no Google esclarece que é um  pensador liberal russo-britânico.
"Eu me vejo como uma pessoa da linha liberal, com coração, movida pelas  carências do Brasil em que me criei e vivo até hoje. E o Berlin é um filósofo  que fala muito em pluralismo. Acredito muito nisso. Ninguém pode dizer o que é  importante para os outros." Não é um liberalismo selvagem, esclarece. "Nunca fui  defensor de um Estado minimalista. Sinto falta de um Estado com "E" maiúsculo.  Acredito em igualdade e numa rede de proteção social."
Um dos temas que estão na cabeça de Armínio é a "reestatização do Estado", na  linha do artigo "O Capitalismo Depois da Crise", de autoria do professor Luigi  Zingales, da Universidade de Chicago. A tese central é que a economia americana,  apesar de ser o país do mundo mais aberto ao princípio de liberdade econômica,  entrou na crise porque foi capturada por grupos de interesse que são fortes em  Washington. "Esse é o modelo que Zingales chama de pró-business. O Estado tende  a ser mais capturado, tende a pensar menos no bem comum", afirma Armínio. "O  mercado resolve bem muitas coisas, de forma mais imparcial, desde que seja  genuinamente competitivo."
O sanduíche já começa a sumir na mão de Armínio, o que revela a desvantagem  de almoçar um lanche rápido em vez de uma demorada refeição completa. O tema  corta repentinamente da filosofia para a economia no governo Dilma Rousseff.
"Com toda essa crise de infraestrutura, o governo está claramente repensando  a sua trajetória. É digno de elogio. Muita gente não muda de opinião na vida."  Como exemplo, cita os aeroportos, que primeiro mudaram de um esquema de  concessão para um modelo mais estatal com a Infraero, e depois da Infraero de  volta para a concessão. "Não tem sido suficiente todo o esforço do BNDES. As  empresas tomam dinheiro do BNDES com frequência para projetos que não  necessariamente não teriam acontecido de um jeito ou de outro. Para ir além de  uma taxa de investimento de 18% do Produto Interno Bruto (PIB), é preciso  trabalhar as condições que fazem o investimento acontecer". O quê? "Segurança e  clareza nas regras. E regras um pouco melhores."
Com quase uma hora de almoço, a conversa entra na macroeconomia do governo  Dilma. "O governo vem trabalhando com o pé no acelerador na área fiscal,  monetária e creditícia. Isso nos trouxe à inflação alta. Há sempre uma certa  tendência de atribuir a inflação alta a um dado preço ou outro, mas o fato é que  há uma alta mais generalizada de preços. Seria preciso segurar as três frentes.  Segurar o fiscal, dar liberdade para o Banco Central trabalhar a política de  juros sem grandes constrangimentos e tomar cuidado do lado do crédito."
Os pratos já estão vazios. A questão é se a inflação alta não seria causada  pela falta de uma atitude mais firme do Banco Central presidido por Alexandre  Tombini, que muitos no mercado financeiro veem como mais preocupado com o  crescimento econômico do que com a inflação. "Houve, sim, uma demora [em agir].  Conheço muito bem o Tombini, um profissional de mão cheia, muito equilibrado.  Então tenho que atribuir ao ambiente [de falta de liberdade para o Banco Central  agir] pelo menos parte dessa situação que temos hoje de inflação bastante alta.  Essa inflação, sem as intervenções pontuais que o governo tem promovido,  provavelmente está mais próxima de 8%. O Banco Central, em tese, deveria  desconsiderar essas intervenções. Então, com uma inflação próxima de 8% e a  economia em pleno emprego, os juros em 7,5% ao ano parecem bem baixos.  Normalmente não entro nesse detalhe sobre política monetária. Mas é o que  penso", diz o economista.
Para Armínio, o momento exige "sangue frio". "Quem está lá, em Brasília,  sentindo as pressões sociais, tende a focar no curtíssimo prazo", afirma. "É uma  certa ilusão porque, se a inflação está mais alta, lá na frente a coisa vai  ficar mais cara. Melhor encarar logo isso, resolver de uma vez. Torço para que  isso ocorra."
Mas o quadro econômico não seria confuso, com pleno emprego e inflação alta,  mas também baixo crescimento? "Para o país crescer, é preciso que haja demanda,  mas é preciso que haja oferta. A oferta em geral responde mais devagar", afirma  Armínio, referindo-se à capacidade da economia para produzir bens e serviços.  "Não é uma proposta razoável do ponto de vista macroeconômico ficar esperando a  oferta reagir em vez de fazer um ajuste na demanda. É preciso ajustar a demanda  ao longo do caminho, sob pena de a inflação ficar alta e a economia se  reindexar."
Armínio concorda que as condições internacionais excepcionais impõem certos  desafios à administração macroeconômica, sobretudo à política cambial. "O  ministro [da Fazenda, Guido] Mantega, foi feliz ao trazer o assunto da "guerra  cambial" à tona", afirma Armínio, enquanto cata algumas migalhas de pão no  prato. "Fica difícil dar uma resposta a isso. Acho que deveria insistir em uma  certa ortodoxia para que o juro possa continuar baixo e cair mais. É verdade que  o juro caiu bastante, mas o juro de curto prazo caiu mais do que deveria. O juro  mais longo caiu, mas caiu na mesma magnitude dos juros de outros países."
Quer dizer que, para ele, todo esse movimento de queda nos juros reais de  equilíbrio não é para valer? A taxa Selic aos menores patamares da história  tornou-se uma das marcas do governo Dilma Rousseff.
"Não acredito na queda estrutural de juros. Aliás, toda vez que ouço a  palavra "estrutural", eu começo a me coçar. Não tem nada muito estrutural", diz  Armínio.
"Há uma trajetória de queda do juro real que começou lá atrás. O Brasil  chegou a ter juro real de 20% quando tinha câmbio fixo. Depois caiu para 10%,  para 6%, e vinha caindo. Mas há um longo caminho a percorrer. Se o juro com  prazo de dez anos está em 3% ou 4% no Brasil e em 1% negativo nos Estados  Unidos, a diferença é menor do que parece. Há espaço para cair mais. Essa  tendência não é dada pela natureza e não vai acontecer independentemente do que  for feito na política macro. Vai continuar se mantivermos certa disciplina",  completa.
Armínio também anda preocupado com a política econômica - monetária e fiscal - dos Estados Unidos, Europa e Japão. Ele afirma que os Bancos Centrais estão  sob pressão. "É o que no Brasil conhecemos muito bem. Quando o problema é de  demanda fraca, a vida é boa, o Banco Central baixa os juros. Se a demanda está  aquecida demais e provocando mais inflação, aumenta os juros e reequilibra as  coisas. Mas se acontecerem problemas de outra natureza, como crises de balanço  de pagamentos, bancárias, geopolíticas, guerras, a coisa pode mudar. O Banco  Central pode se ver diante de um dilema. A inflação pode não estar cedendo por  falta de confiança no padrão monetário ou choque de oferta, e aí virá o teste,  se isso acontecer. Ninguém sabe. O que sabemos, entre aspas, é que "coisas  acontecem"."
E o Brasil estaria preparado para um risco como esse? "Não existe nada de  muito complicado no curto prazo, salvo essa tensão com relação à inflação, mas é  preciso certo cuidado", afirma Armínio. "Temos uma relação dívida líquida e PIB  relativamente baixa, mas no conceito de dívida bruta o Brasil é um dos maiores  do mundo emergente. Essa política de usar o balanço do governo para expandir  muitos programas, para o governo ser uma espécie de intermediário financeiro, é  também uma receita de médio prazo perigosa." Ele defende uma política fiscal  anticíclica, mas com uma meta de superávit primário em 3% do Produto Interno  Bruto (PIB), que seria superada nos anos bons e ficaria menor nos anos ruins. Na  política atual, 3% do PIB é um teto, se muito.
Armínio observa que sobraram sanduíches na mesa. "Não sei se vocês  perceberam, mas eu comi os meus", diz. "Vou distribuir para alguém, a não ser  que vocês queiram levar." Visto de perto, Armínio é simples e informal. No Banco  Central, preferia dispensar os garçons e se servir sozinho. "É um pouco a minha  criação. Meu pai sempre foi assim", explica. "Ninguém é melhor do que ninguém  por ter alguma coisa. Fui criado fazendo esporte e, no esporte, a gente aprende  muito. Eu me humilhei muito jogando futebol e me humilho todas as semana jogando  golfe. E no mercado também, né? O mercado é cruel."
Quando deixou o mercado financeiro para assumir o Banco Central, cargo em que  ficou até 2002, Armínio foi chamado por um senador de "gênio do mal", e  sindicalistas fizeram protestos, comparando-o a uma raposa tomando conta do  galinheiro. Ele é o homem que derrubou a Tailândia na crise asiática, de 1997,  quando trabalhava para Soros, segundo relato do jornalista britânico Sebastian  Mallaby no livro "More Money Than God: Hedge Funds and the Making of a New  Elite", publicado em 2010.
Foi uma combinação de sagacidade e disciplina nos estudos. Armínio, conta o  livro, ouviu numa apresentação do então segundo homem do Fundo Monetário  Internacional (FMI), Stanley Fisher, que depois da crise no México a região que  inspirava cuidado era a Ásia. Esse comentário, disse Fraga mais tarde, "pôs uma  coisinha na minha cabeça". Depois, ele leu um estudo do Federal Reserve, chamado  "Twin Crises", sobre como uma crise cambial em países como a Tailândia poderia  interagir com uma crise bancária. Até hoje Armínio levanta muito cedo, por volta  das 6 da manhã, para ler. Só sai para a Gávea às 9 h. "É a hora mais produtiva  do meu dia." O Soros Fund ganhou cerca de US$ 750 milhões com a queda da moeda  da Tailândia, o baht. Armínio diz que aprendeu lições que ajudaram muito no  BC.
"Ninguém consegue acertar tudo", diz Armínio, sobre atuar no mercado  financeiro. "Você vive num ambiente de grande incerteza, tem que administrar o  risco, o erro, a psicologia do erro. A minha vida eu passo me humilhando,  errando todos os dias."
É a deixa para uma pergunta sobre o investimento da Gávea na companhia aérea  BRA, um péssimo negócio - a empresa entrou em recuperação judicial pouco depois.  "Aquele caso foi muito duro. Mais para os meus colegas, porque tenho experiência  com os altos e baixos da exposição pública", afirma. Armínio pondera que aquele  era um fundo de US$ 220 milhões que tomou a má decisão de investir US$ 10  milhões na BRA, mas que também acertou na mosca em colocar US$ 30 milhões no  McDonald"s da América Latina, uma aposta que se multiplicou por dez. "O mercado  exige uma boa média. E também jogar bem na defesa, não tomar muitos gols. Se  tomar cinco gols logo no primeiro tempo, você está fora do jogo."
O almoço dura quase duas horas, e Armínio pega uma água com gás no  refrigerador, sem demonstrar nenhuma pressa de sair dali. Sobra tempo para  caminhar por temas mais amenos, como a participação dele no programa  "Casseta&Planeta" alguns anos atrás. Ele fez o papel de um taxista que foi  reconhecido por um passageiro interpretado por Marcelo Madureira. "O Marcelo é  meu amigo. A ideia foi dele. Eu fui, contrariando a opinião de um ou de outro  que consultei", relata. "Qual é o problema? Passei uma manhã agradabilíssima no  Recreio dos Bandeirantes, nos estúdios."
No finalzinho da conversa, já em pé, Armínio cita um texto acadêmico dos  economistas Charles Jones e Paul Romer sobre o que faz uma economia crescer e se  desenvolver. Além de capital físico, as ideias, instituições, população e  capital humano. E discute as vantagens da abertura da economia, que, para ele,  traria ganhos até mesmo se feita de forma unilateral.
Armínio nota que o sanduíche de presunto era meio caro, mas em seguida  observa que se tratava de um "jamón" ibérico. "O combinado foi o jornal pagar a  conta", diz o repórter, de forma protocolar. "Você tem grana?", pergunta  Armínio, entrando no jogo. Diante da resposta afirmativa, faz umas contas  rápidas em voz alta. "Dá 75 pratas." A conta fica em R$ 74, por falta de  troco.

Fonte: aqui

13 maio 2013

O Samba do Bacen


Por Alex Ribeiro | De Brasília
Quando o sistema de metas de inflação foi adotado, há mais de uma década, o Banco Central abriu um concurso público para selecionar um time de economistas de primeira linha para o seu recém-criado departamento de pesquisas econômicas. Foi um grande fiasco: das 30 vagas em disputa, apenas uma foi preenchida. Todos os demais candidatos foram reprovados.
De lá para cá, outros concursos tiveram mais êxito em atrair talentos, e muitos dos funcionários da casa cursaram pós-graduação em centros de excelência. Assim, o Departamento de Pesquisa Econômica (Depep), o cérebro do Banco Central, firmou-se como uma referência na produção de conhecimento sobre política monetária, finanças e economia bancária no Brasil.
Um dos marcos é o desenvolvimento de um modelo de projeção econômica de última geração, batizado como Samba, que usa técnicas da chamada "economia artificial" e que coloca o Banco Central do Brasil no primeiro pelotão entre países emergentes.
"Nos primeiros anos do regime de meta de inflação, os modelos eram bem básicos", afirma o professor Fábio Kanczuk, da Universidade de São Paulo (USP), especialista em estudo de política monetária com formação em economia pela Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e por Harvard. "Com o Samba, o Depep deu um salto. Não deve nada aos seus pares."

Ruy Baron/ValorDa esquerda para a direita, Benjamin Miranda Tabak, Eduardo Araújo Lima, Angelo Marsiglia Fasolo, Aquiles Rocha de Farias e Nelson Ferreira Souza Sobrinho
Nesses anos, o Depep subiu ao poder no Banco Central. Seu primeiro chefe, o economista Alexandre Tombini, é hoje o presidente da instituição. De seub s quadros também saiu o diretor de política econômica, Carlos Hamilton de Araújo, doutor pela Escola de Pós-Graduação em Economia (EPGE) da Fundação Getulio Vargas (FGV). Pela primeira vez, houve o reconhecimento de que um funcionário do próprio Banco Central estava preparado para assumir a cadeira central na gestão do regime de metas de inflação, depois de uma linhagem de economistas vindos de fora que inclui Sérgio Werlang (Princeton), Ilan Goldfajn (MIT), Afonso Bevilaqua (Berkeley) e Mário Mesquita (Oxford).
O Depep ganhou o reconhecimento até de um dos maiores críticos da abordagem excessivamente científica da economia - o ex-ministro da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura Antonio Delfim Netto. "Nem nossos mais sofisticados economistas [do mercado] ou da academia podem competir com as informações armazenadas nas cabeças dos profissionais que habitam o Departamento de Estudos e Pesquisa (Depep) do Banco Central", escreveu Delfim, em artigo recente no Valor.
Neste exato momento, as projeções de inflação produzidas pelo Banco Central estão no centro das discussões sobre a alta dos juros básicos. De um lado está o Depep e, de outro, os economistas do mercado financeiro. O pelotão de elite entre os analistas do setor privado, os chamados "Top 5", formados pelos cinco departamentos econômicos que mais acertam suas projeções para a variação de preços, prevê para 2014, ano que está no radar da política monetária, uma inflação de 6%. Já as estimativas do Depep indicam uma inflação de 5,1%.
Se os economistas do mercado financeiro estiverem certos, o processo de alta de juros iniciado pelo Banco Central em abril, com aumento de 0,25 ponto percentual, de 7,25% para 7,5% ao ano, terá que ter uma dose mais forte para fazer a inflação convergir para o centro da meta anual, de 4,5%. Se o Depep estiver correto, ainda assim será preciso seguir com a alta de juros, mas com uma dose menos intensa.
O Banco Central guarda a sete chaves os seus modelos econômicos. O Samba é apenas uma das várias famílias desenvolvidas internamente para ajudar nas decisões de política monetária. Esses modelos ficam armazenados num computador desconectado da internet, para evitar a ação de piratas, dentro de uma sala à qual, para ter acesso, é necessário ao mesmo tempo um crachá restrito e uma senha.
O que se tem conhecimento desses modelos foi apresentado em seminários, textos acadêmicos e publicado em relatórios trimestrais de inflação. Neles, estão descritas apenas as linhas gerais do modelo e sua mecânica básica. São mantidos sob reserva os parâmetros numéricos que decifram como a economia e, sobretudo, a inflação reagem a diferentes situações, como uma alta no preço de petróleo, um aumento na gastança do governo ou uma elevação de juros.
O banco central da Inglaterra batizou seu primeiro modelo com a sigla BEQM, numa homenagem ao jogador de futebol David Beckham
Dos vários modelos, a menina dos olhos é o Samba, sigla em inglês que, com seu molejo brasileiro, tem um significado quase impenetrável: "Modelo Analítico Estocástico com uma Abordagem Bayesiana". O que os economistas do Banco Central fizeram foi, basicamente, tropicalizar um tipo de modelo que se tornou bastante popular entre bancos centrais, o chamado DSGE, outra sigla que, traduzida do inglês, é apenas para iniciados: "Modelo Dinâmico Estocástico de Equilíbrio Geral".
Chefe-adjunto do Depep, o economista Nelson Ferreira Souza Sobrinho, 39 anos, é um dos pesquisadores que trabalharam no projeto Samba. Ele foi aprovado duas vezes em concursos do Banco Central. Na primeira, em 2002, abriu mão do cargo para embarcar num doutorado na Universidade da Califórnia, em Los Angeles.
De volta ao Brasil, passou num outro concurso e, dessa vez, assumiu. "O nome Samba surgiu de uma votação entre os pesquisadores", relata. "A ideia era ter uma palavra bem brasileira que tivesse relação com o modelo."
O banco central da Inglaterra batizou seu primeiro modelo com a sigla BEQM, numa homenagem ao jogador de futebol David Beckham. Na Colômbia, é o Patacon, uma referência a um tipo de tortilha de bananas verdes fritas muito popular no país. O Canadá criou o ToTEM, numa alusão àquela escultura indígena de madeira encontrada no norte do continente. A Nova Zelândia colocou uma fruta local, o Kiwi, dentro da sigla de seu modelo.

Ruy Baron/ValorAquiles Rocha de Farias, chefe-adjunto do departamento
Os modelos DSGE são uma resposta à chamada crítica de Lucas, feita pelo economista americano Robert Lucas em 1976. Seu alvo foram os velhos modelões macroecômicos muito populares entre os banqueiros centrais nas décadas de 1970 e 1980. Um dos principais alvos da crítica foi a "curva de Phillips", muito usada na época, segundo a qual a inflação e o desemprego variam em sentidos opostos.
Sobretudo, essas ferramentas, conhecidas como "modelos da tradição de St. Louis", assumem a hipótese de que os agentes econômicos, como firmas e indivíduos, iriam reagir sempre da mesma forma a qualquer cenário econômico. Ou seja, o que aconteceu no passado seria uma boa matéria-prima para prever o que vai acontecer no futuro.
Lucas argumentou que, na prática, as coisas não funcionam bem assim. As pessoas e empresas tendem a reagir de forma diferente diante de situações novas. Um ingrediente essencial é a expectativa sobre as intenções do Banco Central no manejo dos juros e do governo na política fiscal.
Os modelos DSGE contornam a crítica feita por Lucas. Neles, há agentes inteligentes, incluindo empresas, famílias e governo, que dão respostas diferentes a cada situação nova. São agentes simplificados, uma caricatura, que vivem apenas dentro do computador, agem de acordo com a teoria microeconômica e não têm a pretensão da complexidade dos agentes de carne e osso. Uma das premissas é que todos os agentes são racionais. Daí alguns chamarem esses modelos de "economia artificial", embora os modelões de St. Louis também tenham um quê de reproduzir em laboratório o que acontece no mundo econômico real.
O grupo do Banco Central, coordenado pelo economista André Minella, Ph.D pela New York University, hoje secretário-adjunto de Política Econômica no Ministério da Fazenda, levou cerca de cinco anos para desenvolver o Samba. O primeiro passo foi olhar o que já havia sido feito por aí, com uma pesquisa da literatura econômica, visitas a bancos centrais que já estavam em estágios mais avançados na nova tecnologia e convite a especialistas estrangeiros para virem ao Brasil.
No mundo dos modelos DSGE, a grande referência é um trabalho feito para a zona do euro pelos economistas Frank Smets, do Banco Central Europeu (BCE), e Raf Wouters, do Banco da Bélgica. Economistas do Depep foram assistir a apresentações de Smets e Wouters em congressos no exterior. Um dos colaboradores muito próximos da dupla, Kai Christoffel, do departamento de pesquisa em política monetária do BCE, participou de um seminário de metas de inflação promovido pelo Banco Central.
O trabalho de tropicalização do DSGE consistiu basicamente em colocar no modelo alguns traços bem característicos do Brasil. Um deles são as metas de superávit primário. Outro são os indivíduos que não têm acesso ao sistema financeiro e, por isso, não podem tomar empréstimos para suavizar os ciclos de consumo de suas vidas. O Brasil também tem a peculiaridade de importar muitos bens intermediários, que são insumos para a produção da indústria nacional, e relativamente poucos bens finais.
Na equipe do Samba, todos são pós-graduados em economia, como Solange Gouvea - única mulher entre os autores -, que tem um Ph.D pela Universidade da Califórnia, Santa Cruz. Mas a base em engenharia de alguns dos pesquisadores ajudou bastante na computação avançada.

Ruy Baron/ValorBenjamin Miranda Tabak, consultor sênior do Depep
Uma coisa é escrever as relações econômicas que formam a espinha dorsal do modelo, algo que economistas fazem com conforto. Outra coisa bem diferente é passar essas equações matemáticas cabeludas para o computador encontrar respostas. Marcos de Castro, um dos autores, é engenheiro mecatrônico de formação, e Rafael dos Santos, engenheiro civil.
O DSGE exige certa capacidade de computação para ser rodado, ao contrário dos velhos modelões macroeconômicos, que cabem numa planilha normal de Excel. A área de informática do Banco Central cedeu para o Depep um pedaço de seus computadores centrais, com mais memória e velocidade, para fazer o serviço. O computador levava de semanas a meses tateando os dados até encontrar os valores mais prováveis para a economia brasileira.
O gaúcho Ângelo Marsiglia Fasolo, 35 anos, entrou no Banco Central por concurso há uma década e hoje é consultor do Depep. Quando a equipe do Samba começava a ser formada, em 2006, ele obteve uma licença remunerada do Banco Central para fazer doutorado na Duke University, nos Estados Unidos. De volta ao Brasil, foi convidado por Minella para fazer a revisão final do modelo Samba.
"O DSGE não é um monstro. Já é uma técnica bem comum na academia", relata. "No primeiro dia de aula do meu Ph.D, o professor avisou logo que teríamos que dominar os modelos DSGE para concluir o doutorado."
A publicação final do Samba ocorreu em abril de 2011, mas ele viria a ser realmente conhecido além dos ciclos acadêmicos mais restritos apenas em setembro de 2011, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) citou o novo modelo em uma de suas atas para justificar uma inesperada mudança na direção da política monetária, de aperto para relaxamento.
O BC guarda a sete chaves os seus modelos econômicos. O Samba é apenas um dos desenvolvidos internamente para ajudar nas decisões
O Samba, na ocasião, apontava que a deterioração no ambiente internacional que se avizinhava teria impacto no Brasil equivalente a um terço da crise da quebra do banco Lehman Brothers, de 2008, ajudando a conter a alta de preços na economia. Para alguns, o Copom usou o modelo Samba de forma oportunista para dar sustentação teórica a um desejo de baixar os juros. Para outros, foi a prova da genialidade do modelo, que anteviu o que então estava fora dos cálculos dos analistas econômicos.
O Banco Central não deixa claro o peso do Samba nas suas projeções atuais. O que se sabe é que os modelos antigos não foram completamente abandonados. "É como aquele Chevette velho, cheio de defeitos, mas que você conhece as manias, sabe ajustar direitinho o motor e está bem treinado para dirigir de um lado para o outro", afirma Kanczuk, da USP.
Bons modelos são essenciais em regimes de metas de inflação - um universo em que, basicamente, o Banco Central gera projeções de inflação e, se elas são diferentes da meta, os juros sobem ou descem para fazer a alta de preços na economia chegar ao nível desejado. Um dos principais teóricos dos regimes de metas de inflação, o sueco Lars Svensson, professor em Princeton, gosta de se referir ao sistema como "regime de projeções de inflação".
Muitos economistas culparam os modelos pela crise de 2008. Exatos, eles transmitiam a impressão de que eram infalíveis. Na prática, porém, o processo não é tão mecânico assim. São homens, e não computadores, que tomam as decisões, julgando as projeções feitas pelos modelos. "É preciso, em primeiro lugar, conhecer as limitações dos modelos", afirma Souza Sobrinho. "Eles são muito úteis, porque são assentados na teoria econômica e servem para disciplinar as discussões. Evitam ficar apenas no blá-blá-blá."

Ruy Baron/ValorNelson Ferreira Souza Sobrinho, chefe-adjunto
A primeira equipe do Depep, chefiada por Tombini, um Ph.D pela Universidade de Illinois, Urbana Champaign, foi formada com a reunião de 17 economistas do próprio Banco Central que estavam dispersos por diversos departamentos da instituição. "Houve um interesse muito grande para entrar no Depep", afirma Benjamin Tabak, 43 anos, um doutor em economia pela Universidade de Brasília (UnB) que se juntou ao Depep nas primeiras horas e, desde então, tornou-se um dos mais produtivos da equipe. Ele é autor ou coautor de 55 trabalhos para discussão publicados pelo Banco Central, num universo de 305.
Para o departamento ganhar corpo, em 2001 o Banco Central publicou um ambicioso edital de concurso público para contratar 30 pesquisadores em economia e finanças. A prova eliminatória tinha apenas questões de inglês, língua corrente na produção acadêmica em economia, mas não de português. Na prova classificatória de títulos, a pontuação máxima era dada a quem tivesse feito doutorado em cinco dezenas de universidades basicamente dos Estados Unidos e do Reino Unido ou num conjunto bem restrito de universidades brasileiras. Foi aprovado apenas um candidato, Pedro Calhman de Miranda, que hoje integra a assessoria econômica de Tombini.
Bancos centrais de países como Inglaterra, Espanha e Estados Unidos estão livres das amarras de concursos públicos e disputam doutores recém-formados com universidades e bancos em ambientes como o congresso da Associação Americana de Economistas, onde ocorre uma feira paralela de jovens talentos.
"O Banco Central tem atraído um bom capital humano. Muita gente boa disputa os concursos, até porque os salários estão mais altos recentemente", afirma o professor Carlos Viana de Carvalho, da PUC-Rio, um Ph.D pela Universidade de Princeton que trabalhou na área de pesquisa econômica do Federal Reserve (Fed) de Nova York. O salário de ingresso do BC é de R$ 15,7 mil mensais, e pesquisadores mais experientes, como os que participaram do desenvolvimento do modelo Samba, têm ganhos da ordem de R$ 22 mil. "Mas outros bancos centrais competem pelos melhores talentos do mundo", afirma Carvalho.
Atualmente, o Depep tem 50 pesquisadores, dos quais 39 são doutores e 11 têm mestrado. Entre os doutores, 9 são Ph.D. Boa parte foi formada dentro de um programa de incentivo ao estudo do Banco Central. Hoje, são selecionados até 40 funcionários para fazer mestrado ou doutorado nas melhores universidades do Brasil e do exterior, recebendo o salário normalmente.
O trabalho de tropicalização do modelo consistiu em introduzir alguns traços bem característicos da realidade do Brasil
A contrapartida é que o funcionário termine a pós-graduação e que permaneça no BC pelo mesmo período que ficou de licença. Um dos beneficiários do programa é o atual chefe do Depep, Eduardo José Araújo Lima, engenheiro agrônomo de 46 anos que fez mestrado e doutorado na Universidade de Brasília (UnB). "O investimento em pessoas foi grande. Não só o Depep, mas o Banco Central como um todo evoluiu com isso."
Outras áreas do Banco Central têm ganhado projeção em pesquisas sobre temas como meios de pagamentos, operações bancárias, política monetária e administração das reservas internacionais. O Departamento Econômico (Depec), responsável por divulgar estatísticas, como o balanço de pagamentos, desenvolveu um indicador de atividade econômica de ponta. O IBC-Br mostra antes, com quase perfeição, o que vai aparecer meses depois no Produto Interno Bruto (PIB) divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Não está livre de erros, como qualquer indicador antecendente, mas sua acurácia fez com que ficasse conhecido como o "PIB do BC".
Embora o Depep esteja definitivamente no centro do debate econômico brasileiro, sua importância no cenário internacional é menos relevante. Um sinal de prestígio dentro do país é que, na edição mais recente do encontro da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec), em 2012, foram apresentados oito trabalhos de pesquisadores do Banco Central.
Já no encontro anual de 2012 da Society for Economic Dynamics, apontado como a mais prestigiada reunião mundial de acadêmicos em economia, não havia nenhum representante do Banco Central do Brasil. É muito mais difícil para um pesquisador brasileiro entrar nesses encontros do que, digamos, um americano ou europeu, já que a seleção desses eventos privilegia temas de interesse de economias desenvolvidas. Ainda assim, em 2012 havia um pesquisador do Banco Central do Chile e trabalhos de pesquisadores vinculados a universidades brasileiras, como a USP, a Fundação Getulio Vargas (FGV) do Rio e de São Paulo e a PUC-Rio.

Ruy Baron/ValorEduardo Araújo Lima, chefe do departamento de pesquisa
Outro critério muito usado para medir a qualidade da pesquisa são publicações em revistas especializadas de economia. Desde que o Depep foi criado, 45 de seus trabalhos de discussão foram reproduzidos em publicações acadêmicas classificadas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), no ranking Qualis. Por esse critério, dois trabalhos com participação de pesquisadores do Banco Central foram publicados em duas das revistas de economia mais importantes do mundo, o "Journal of Econometrics" e a "Economic Theory". Outros 11 trabalhos para discussão saíram em revistas acadêmicas classificadas no segundo melhor grupo entre as publicações econômicas e financeiras.
Os textos para discussão do BC vão muito além da pura elucubração acadêmica. Seu forte é a economia aplicada. Entre as publicações mais recentes, há uma linha de estudos para compreender a política econômica depois da grande crise da quebra do Lehman Brothers. Um deles é um trabalho sobre a eficácia das compras de dólares em mercado pelo Banco Central para suavizar a apreciação do real, num ambiente de ampla liquidez criada pela impressão de moeda nas economias desenvolvidas. Outro é a investigação do papel dos depósitos compulsórios como instrumento tanto para garantir a estabilidade financeira quanto para auxiliar no controle da inflação.
Carvalho, professor da PUC-Rio, lembra que, mundo afora, sobretudo nas universidades, há incentivos financeiros para quem publica. "No Fed de Nova York, os pesquisadores dedicam parte do tempo a gerar bons conselhos para quem toma decisões de política econômica, mas parte do tempo é livre para fazer a pesquisa que quiserem", afirma. "O Fed se beneficia quando seus pesquisadores estão na fronteira do conhecimento."
No Banco Central do Brasil, a pesquisa acadêmica é, muitas vezes, uma atividade das horas vagas. Um outro chefe-adjunto do Depep, Aquiles Rocha de Farias, 40 anos, doutor pela UnB, dedica o tempo em que está no Banco Central a demandas da própria instituição. "Alguém tem que preparar a ata do Copom e o relatório de inflação", afirma. "Pesquisa, eu faço em casa, de noite."
Uma outra forma de checar a qualidade do Depep são as suas projeções de inflação apresentadas no relatório trimestral de inflação. Os números, porém, não são bons. De junho de 2004 para cá, em média as projeções do relatório de inflação para os 12 meses seguintes é 0,58 ponto percentual menor que a inflação média de fato ocorrida. É um desempenho menos favorável do que a dos economistas do mercado financeiro, que subestimam em 0,46 ponto percentual a inflação efetivamente ocorrida.

Ruy Baron/ValorAngelo Marsiglia Fasolo, consultor e revisor final do Samba
Uma ponderação importante é que as previsões apresentadas no relatório trimestral de inflação não são exatamente projeções. Uma das camisas de força é que, no chamado cenário de mercado, elas consideram a trajetória de câmbio e juros esperada pelos analistas privados.
Se o Depep usasse a trajetória que considera mais provável para essa variáveis, talvez os resultados fossem diferentes. Um outro argumento em defesa dos economistas do Banco Central é que as premissas e os cenários econômicos que alimentam os modelos rodados pelo Depep são traçados pelos membros do Copom, e não necesariamente pelo Depep.
Apesar de toda a evolução qualitativa desde 1999, o Depep segue como um departamento econômico menos independente do que alguns de seus similares, sobretudo de países desenvolvidos. Nas reuniões do comitê de política monetária do Fed, por exemplo, os técnicos da casa, que têm um compromisso de longo prazo com a instituição, apresentam projeções independentes. Membros do comitê que tiverem visão diferente estão livres para apresentar suas próprias projeções.
"Uma coisa curiosa é que, no passado, quando o Depep não tinha a qualidade técnica de hoje, ele parecia ter um peso muito maior nas decisões do Copom", afirma Kanczuk. "Agora, quando o departamento ficou muito melhor, seu peso nas decisões parece bem menor."

Leia mais em:
http://www.valor.com.br/cultura/3117896/o-samba-dos-juros#ixzz2SvXgsyms

17 abril 2013

Erro

Um estudo sobre crescimento econômico em diversos países do mundo cometeu um erro grasso:

O estudo apontava uma média de crescimento de -0,1%. Mas observe a figura com atenção: ao calcular a média cometeu-se um erro na marcação das células, excluindo Dinamarca, Canadá, Bélgica, Áustria e Austrália. A média correta seria de 2,2%.

22 novembro 2012

Economia

A economia que é atualmente apresentada nos livros didáticos e ensinada na sala de aula não tem muito a ver com a gestão de negócios, e menos ainda com o empreendedorismo. O grau com que a economia está isolada dos negócios comuns da vida é extraordinário e infeliz.

Que não era o caso no passado. Quando a economia moderna nasceu, Adam Smith imaginou-a como um estudo da "natureza e as causas da riqueza das nações." Seu trabalho seminal, A Riqueza das Nações, foi amplamente lido por empresários, embora Smith os menospreze muito por sua ganância, falta de visão e outros defeitos. (...)


Saving Economics from the Economists - Ronald Coase - Harvard Business Review

Fantástico. Coase, ganhador do Nobel por ideias que ainda hoje são debatidas, tem 102 anos.

21 julho 2012

Entrevista com Edmar Bacha

Correio Braziliense
POR ROSANA HESSEL

Primeiro brasileiro a concluir o doutorado em economia na prestigiosa Universidade Yale, o economista Edmar Bacha é considerado um dos pais do Plano Real, lançado em 1994, no governo Itamar Franco. Bacha coordenou o Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), de onde saiu a equipe que desenvolveu o programa. “Desde 1982, discutíamos alternativas para a estabilização. Em 1993, estávamos prontos para colocar as ideias em prática”, conta.

Bacha ganhou notoriedade ao escrever, nos anos 1970, a fábula da “Belíndia”, em que dizia que o regime militar estava criando um país dividido entre os que moravam em condições similares às da Bélgica e aqueles que tinham padrão de vida da Índia. Nos anos 1980, no governo José Sarney (1985-1990), participou do Plano Cruzado e presidiu o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com Fernando Henrique Cardoso, comandou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por cerca de um ano.

Para Bacha, um dos erros na execução do Plano Real foi o país não ter dado continuidade às reformas necessárias. Entre os acertos, destaca o fato de o país ter se livrado do estigma de que nada aqui dava certo. Ele recorda a histórica frase “Le Brésil n’est pas un pays sérieux”, atribuída ao ex-presidente francês Charles de Gaulle (1959-1969): “Nenhum candidato a De Gaulle pode hoje dizer que o Brasil não é um país sério”, afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O Plano Real chega à maioridade. Mas, apesar dos os avanços dos últimos 18 anos, o Brasil ainda não consegue crescer de modo sustentável sem enfrentar o fantasma da inflação. Onde o país falhou?

É uma falha relativa. Comparado com nosso próprio passado, não há falha alguma. Comparado com o resto do mundo depois de 2008, também não há qualquer falha. Falhamos ao não realizar plenamente o potencial de crescimento do país. Depois do mensalão, em 2005, faltou determinação de continuar as reformas econômicas. Sem reformas, a produtividade estancou e o investimento não cresceu.

É possível pensar em um Plano Real II, agora com o intuito de fazer as reformas abandonadas e ampliar a infraestrutura? O que é preciso para obter a unidade que levou ao Real em julho de 1994?

Pensar é possível e desejável. O que falta é a decisão política. Em 1994, havia a consciência de que, ou estabilizávamos a economia ou cairíamos num buraco sem fim. Agora falta o consenso de que é preciso reformar o setor público para termos crescimento sustentável. Mas já há um começo, tanto na comissão comandada por Gerdau (Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do Comitê de Gestão e Competitividade da Presidência), quanto na recente comissão parlamentar para a reforma do setor público.

A que o senhor atribui o sucesso do real? Por que o país fracassou tantas vezes até conseguir derrotar a hiperinflação?

Foi um aprendizado penoso. Os militares resolveram conviver com a inflação e aperfeiçoaram a indexação. Aí houve a crise da dívida externa. Depois os percalços da redemocratização, culminando com o trauma do Plano Collor. Naquela altura, ninguém aguentava mais a superinflação. Na PUC-Rio, vínhamos desde 1982 discutindo alternativas para a estabilização. Em 1993, estávamos prontos para colocar as ideias em prática. Então, Itamar Franco nomeou Fernando Henrique como ministro plenipotenciário e o resto foi história.

Se o Plano Real fosse elaborado hoje, o que teria de diferente? Haveria um processo total de desindexação da economia? Em vez do câmbio fixo já se adotaria logo o sistema de taxas flutuantes?

O projeto original previa a desindexação total. Mas a negociação no Congresso exigiu a manutenção de alguma indexação residual. Além disso, o ajuste fiscal foi menos forte do que o necessário, pois não foi possível aprovar as reformas constitucionais. Tudo o que se conseguiu foi o Fundo Social de Emergência (hoje chamado de Desvinculação das Receitas da União). Com isso, o câmbio teve que fazer o papel de âncora, com as altas taxas de juros. Se fôssemos começar de novo, seria preciso mudar a história, fazendo a revisão constitucional em 1995 e não em 1993. Com um reforma constitucional, seria possível adotar mais cedo o regime de câmbio flutuante e baixar as taxas de juros.

Nos últimos anos, o crescimento do Brasil foi baseado no consumo das famílias. Esse modelo está esgotado? Por que ainda resistimos tanto a adotar um choque de investimentos? As taxas de juros estão no menor patamar da história, mas as empresas se recusam a ampliar a produção.

Não sei se é inteiramente verdadeira essa afirmação. A taxa de investimento em preços constantes aumentou continuamente de 2005 até 2011 (exceto em 2009, por causa da crise externa). O Brasil ainda investe pouco, mas muito mais do que investia em 2005. Agora, há uma crise séria na economia mundial que desalenta o setor privado. Por outro lado, o investimento público está paralisado. E há uma enorme resistência no governo a fazer o óbvio: transferir para o setor privado a responsabilidade por investimentos que não consegue fazer na infraestrutura — em portos, aeroportos, estradas, energia, etc. É preciso é superar essa paralisia e oferecer alternativas de investimento para o setor privado.

O Brasil enfrentou muitas crises internacionais ao longo de quase duas décadas. Caiu de joelhos na maioria das vezes por causa da fragilidade das contas externas. Com o mundo em recessão, os preços das commodities tendem a desabar. Há riscos de uma nova tempestade no balanço de pagamentos?

O volume de reservas internacionais é suficiente para enfrentar problemas que possam se manifestar na área externa. Também não há perspectiva de o preço das commodities desabar. Afinal, a limitação dos recursos naturais é o problema central do planeta quando se olha o futuro.

Como o senhor avalia a política macroeconômica do governo Dilma? Ela está sendo bem conduzida? Quais são os principais pontos positivos e negativos?

De positivo, estar aproveitando a crise mundial para reduzir os juros. De negativo, não conseguir superar a paralisia de investimentos em infraestrutura.
O governo adotou um viés intervencionista na economia. Essa presença maior do Estado no setor produtivo pode pôr a perder conquistas do Real?

Tão ruim como o intervencionismo é o protecionismo. Com isso estão tentando evitar o processo schumpeteriano de criação destrutiva, que é a base da prosperidade no capitalismo. Com essa política absurda de conteúdo nacional, continuaremos a produzir carroças e não vamos chegar ao pré-sal.
O Brasil ganhou voz no mundo e hoje é ator influente na política global. Em que a estabilidade econômica contribuiu para isso? Essa relevância veio para ficar?

O Plano Real só tem 18 anos. Daqui a 32 anos poderemos fazer essa avaliação, se a estabilidade interna, que é a base da relevância externa, veio para ficar. Mas nenhum candidato a De Gaulle vai poder hoje dizer que o Brasil não é um país sério, como disse o general francês na década de 1960. Mérito da redemocratização, do real e da continuidade de políticas econômicas e sociais desde então.

Qual é maior legado do Plano Real e o que ainda precisa ser feito para aperfeiçoá-lo?

O maior mérito é ter mudado a cara do Brasil. Antes, éramos uma nau sem rumo, hoje somos uma economia emergente. Para aperfeiçoar, é preciso voltar às reformas.

14 julho 2012

Carmen Reinhart


Um pouco da história de Carmen Reinhart:

Born in Havana as Carmen Castellanos, she is quick-witted and favors bright, boldly printed blouses and blazers. As a girl, she memorized the lore of pirates and their trade routes, which she says was her first exposure to the idea that economic fortunes — and state revenue in particular — “can suddenly disappear without warning.”

She also lived with more personal financial and social instability. After her family fled Havana for the United States with just three suitcases when she was 10, her father traded a comfortable living as an accountant for long, less lucrative hours as a carpenter. Her mother, who had never worked outside the home before, became a seamstress.

“Most kids don’t grow up with that kind of real economic shock,” she says. “But I learned the value of scarcity, and even the sort of tensions between East and West. And at a very early age that had an imprint on me.”

With a passion for art and literature — even today, her academic papers pun on the writings of Gabriel García Márquez — she enrolled in a two-year college in Miami, intending to study fashion merchandising. Then, on a whim, she took an economics course and got hooked.

When she went to Florida International University to study economics, she met Peter Montiel, an M.I.T. graduate who was teaching there. Recognizing her talent, he helped her apply to a top-tier graduate program in economics, at Columbia University.

13 julho 2012

Esther Duflo


Nova York - A francesa Esther Duflo nunca se interessou por tecnologia além dos comandos básicos de um celular ou computador, não gosta de falar de negócios e passou toda a sua carreira na universidade.

Mesmo assim, ela encontrou mais afinidades do que diferenças em sua primeira conversa com o empresário Bill Gates, criador da Microsoft e o segundo homem mais rico do mundo, em 2009. Foi um breve encontro após uma palestra realizada por ela na Califórnia, sobre seu trabalho à frente do Poverty Lab, laboratório de estudos de combate à pobreza ligado ao Mas­sachusetts Institute of Technology (MIT).

Ela contou como criou do zero uma rede de dezenas de pesquisadores que vão a campo descobrir estatisticamente o que funciona quando o assunto é investimento social. É tudo o que Gates, que já dedicou mais de 20 bilhões de dólares a causas desse tipo, queria ouvir.

Por meio da Fundação Bill e Melinda Gates, o empresário se tornou um dos maiores investidores do que é hoje a maior rede global de pesquisa sobre o assunto, com 65 pesquisadores em 52 países.

Aos 39 anos, Duflo, por sua vez, virou uma conselheira cada vez mais requisitada não só por Gates, mas por dezenas de investidores e organizações pelo mundo. “O laboratório produz evidência científica que ajuda a tornar o esforço de combate à pobreza mais eficiente”, afirmou Gates recentemente em seu blog.

Por trás da evidência científica está uma abordagem nada convencional de pesquisa acadêmica — até pouco tempo atrás vista pela maioria dos economistas como custosa demais para ser adotada em larga escala. O método conhecido como randômico é a base do laboratório, criado em 2003 por Duflo e o indiano Abhijit Banerjee, também economista no MIT.

Com fundamentos emprestados dos testes clínicos da medicina, consiste basicamente em separar duas amostras da mesma população aleatoriamente. Uma delas é submetida a uma solução contra um problema específico, como um método para aumentar a taxa de vacinação entre crianças.

A outra parcela não recebe nada. O contraste entre as duas indica se o programa social teve o efeito desejado. “O método joga luz numa discussão em geral mais emocional e retórica do que prática”, disse Duflo a EXAME.

Após se formar em economia pela École Normale Supérieure, em Paris, em 1994, Duflo se mudou para os Estados Unidos para obter o título de Ph.D. pelo MIT. Nessa época, aproximou-se do indiano Banerjee.

Logo os dois amadureceram a ideia de iniciar uma empreitada, digamos, aventureira — deixar o campus, nas redondezas de Boston, para visitar cidades onde boa parte dos habitantes vive com menos de 1 dólar por dia. Eles não foram os primeiros.

Nos anos 90, o economista Michael Kremer, também egresso do MIT, realizou um teste no Quênia, no qual demonstrou que a distribuição gratuita de livros didáticos em escolas rurais não havia melhorado a nota dos alunos. “O mérito de Duflo foi ter multiplicado o método numa escala inédita”, diz Kremer, atualmente professor de economia na Universidade Harvard.

De lá para cá, o time coordenado por Duflo e Banerjee já analisou 335 projetos em todos os continentes e seu orçamento cresceu mais de 30 vezes, para 10 milhões de dólares atualmente. Em 2010, a pesquisadora recebeu sua distinção acadêmica mais expressiva — a medalha John Bates Clark, concedida a economistas promissores com menos de 40 anos e considerada um passo para o prêmio Nobel.

Para Duflo, é preciso conhecer de perto o comportamento das pessoas para chegar a políticas sociais eficientes. Na Índia, por exemplo, os pesquisadores descobriram que, mesmo com uma campanha gratuita, as mães não levavam seus filhos para vacinar. A frequência aumentou drasticamente com um incentivo simples — a oferta de um pacote de lentilha por criança vacinada.

O microcrédito, bandeira do indiano Muhammad Yunus, vencedor do Nobel da Paz em 2006, também foi alvo de estudos. Duflo — que interrompeu temporariamente a intensa rotina de viagens neste ano, com o nascimento de seu primeiro filho — constatou que a oferta de crédito para famílias muito pobres em geral só ajuda a endividá-las ainda mais e não necessariamente estimula o empreendedorismo.

Essas e outras histórias estão no livro Poor Economics (“A economia dos pobres”, sem versão para o português), escrito em parceria com Banerjee e eleito pelo jornal Financial Times a melhor obra de economia do ano.

Assim como Jeffrey Sachs, economista da Universidade Columbia, Duflo acredita que investimentos a fundo perdido de países ricos podem aliviar a pobreza mundial (críticos como William Esterly, professor da Universidade de Nova York, defendem o contrário).

Mas, segundo ela, a grande questão hoje não é investir mais, e sim investir melhor. “Não existe uma fórmula única”, diz. “Mas queremos desvendar esse caminho passo a passo.”


17 maio 2012

Futuro do Euro


Algumas considerações do professor de economia Miguel Leon Ledesma sobre a crise da dívida soberana na Europa:

Do you think the euro is a viable project? Will it survive?

The Euro is not viable in its current form and it will only survive if politicians design a credible strategy for its survival in the very short run. The fiscal compact as a survival strategy, with its reminiscence of the old stability pact rules, is almost ludicrous. It is not credible, and that is already a reality. If the stability pact was violated by the key players for years without any consequences and during less difficult times, does anyone believe that the pact is achievable or even beneficial to some member states during the deepest and longest recession for 70 years? Obviously not. The euro cannot survive unless there is a move towards more fiscal union pertaining debt and fiscal transfers. The union can be limited, there is no need for a grand transfer scheme and there are imaginative proposals out there about designing an efficient system for backing weaker states’ new sovereign debt issues. There is also a need for a true banking union with common regulatory rules. But the short run is much shorter than many like to believe. The state of denial cannot continue. Whether the euro can survive, thus, is a question that will be answered in the next few months.

30 março 2012

Entrevista com Daron Acemoglu


De acordo com Ideas/Repec, Daron Acemoglu, economista turco e professor do MIT, está entre os 10 economistas mais citados do mundo e, em 2005, foi premiado com o prêmio John Bates Clark Medal. Atua nas áreas de crescimento e desenvolvimento econômico, desigualdade de renda e capital humano. Sua fama está relacionada aos trabalhos que realiza acerca do impacto do ambiente político sobre o crescimento econômico.

Na última semana, juntamente com James Robinson lançou o livro Why Nations Fail:The Origins of Power, Prosperity and Poverty. A principal tese do livro é que o sistema político e suas instituições são a chave para o crescimento e desenvolvimento econômico e explicam as diferenças de renda entre as nações. Países que têm o que eles chamam de sistema político "inclusivo" - aqueles que estendem os direitos políticos e de propriedade tão amplamente quanto possível e, ao mesmo tempo, fazem cumprir as leis e fornecem alguma infra-estrutura pública - experimentam maior crescimento no longo prazo. Por outro lado, Acemoglu e Robinson afirmam que os países com sistema político "extrativista" - em que o poder é exercido por uma pequena elite - ou não conseguem crescer de forma ampla ou definham após curtos períodos de expansão econômica.

Segundo Acemoglu, o crescimento econômico depende de inovação tecnológica generalizada. Mas, a inovação somente se sustenta nos países em que promovem os direitos políticos e de propriedade, dando às pessoas mais incentivo para inventar coisas..O NYT publicou uma resenha otimista sobre o trabalho, enquanto a The Economist fez algumas criticas negativas sobre a tese do livro. Porém, a resenha mais interessante é de Francis Fukuyama.

Na entrevista abaixo, Acemoglu fala de desigualdade de renda e comenta sobre cinco livros que tratam do tema. Eis alguns trechos interessantes:

Inequality is in the news a lot right now. How should we be thinking about it and trying to get our heads around it?

Inequality is one of the things that has changed quite a lot in the United States and other economies over the last three decades or so. A lot of things don’t change radically, but inequality has. Understanding why that has happened and what it implies for our society is important. So it’s a good thing that it’s in the news, it’s an important topic and there is no reason for it to be taboo. Having said that, there is no broad consensus among social scientists about how to talk about inequality, and the average economist probably thinks about it very differently than the average layman. I’m not saying one is right and one is wrong, but the conversation needs to be expanded to bring these different viewpoints to the table.

What’s the economist’s view?

The default position of economists is that inequality reflects the unequal human capital or productive capabilities of different workers. If you start with that premise – that what people earn is commensurate with their contribution to their employer, and also perhaps to society – then greater inequality tells you something about how people’s productivities have evolved over time...We’ve seen a big increase in inequality, measured in various ways, and this reflects the fact that the top people, the more educated, high earners have become more skilled. Technology has favoured them, globalisation has favoured them, and inequality has increased for that reason.

Let’s go through your books. Your first choice is The Race between Education and Technology, published by Harvard University Press. You mentioned in an earlier email to me that it is “a must-read for anyone interested in inequality”. Tell me more.

Acemoglu: It highlights in a very clear manner what determines the productivities of different individuals and different groups. It takes its cue from a phrase that the famous Dutch economist, Jan Tinbergen coined. The key idea is that technological changes often increase the demand for more skilled workers, so in order to keep inequality in check you need to have a steady increase in the supply of skilled workers in the economy. He called this “the race between education and technology”. If the race is won by technology, inequality tends to increase, if the race is won by education, inequality tends to decrease.

One is that technology has become even more biased towards more skilled, higher earning workers than before. So, all else being equal, that will tend to increase inequality. Secondly, we’ve been going through a phase of globalisation. Things such as trading with China – where low-skill labour is much cheaper – are putting pressure on low wages. Third, and possibly most important, is that the US education system has been failing terribly at some level. We haven’t been able to increase the share of our youth that completes college or high school. It’s really remarkable, and most people wouldn’t actually guess this, but in the US, the cohorts that had the highest high-school graduation rates were the ones that were graduating in the middle of the 1960s. Our high-school graduation rate has actually been declining since then. If you look at college, it’s the same thing. This is hugely important, and it’s really quite shocking. It has a major effect on inequality, because it is making skills much more scarce then they should be.

One of the things they point out is that top income shares in the US and the UK started to increase during the Reagan and Thatcher administrations. Isn’t rising inequality just the result of Reagan and Thatcher reducing taxes on the rich?

I personally don’t think that’s the main thing, though it certainly played a role. It played a role for capital income. When you look at the top 0.1%, many of them are capital earners. So if you tax capital heavily, then the rich are not going to have as much capital left and capital income is not going to be as unequally distributed. There is a very mechanical effect from taxation there. But there are two other, more subtle, effects from taxation. One is that more progressive taxation – higher taxes at the top – may discourage people from working very hard and putting in effort. That will reduce their earnings and thus inequality. That may be inefficient, but it’s one of the things that happen when you have high taxes. Secondly, it might change the way in which people bargain with their companies and engage in “rent-seeking” activities in order to increase their pay or their bonuses. In the extreme – and I don’t think this contributes a lot, but just to illustrate – if top incomes were taxed at 99%, then no CEO would be tempted to do semi-illegal things in order to increase his pay, because there would be nothing to gain from doing so. If the top tax rate is 30%, on the other hand, and CEOs get pay from options, they may be tempted to do things like the Enron CEO, Kenneth Lay, did, because they get a lot of money in return. So while high tax rates at the top may inefficiently reduce these people’s labour supply, it may also reduce their rent-seeking activities.

OK, so to get more of a sense of your own view, let’s talk about your book, Why Nations Fail: The Origins of Power, Prosperity and Poverty.

In terms of understanding this top inequality, I mentioned the possibility that it might be about politics. How should we think about politics? What are the levers of politics? For that we need a conceptual framework and that’s what this book tries to provide. It’s co-authored with my long-term collaborator and friend Jim Robinson – and it’s not about US or UK or Canadian inequality. It runs through several thousand years of history, and tries to explain how societies work and why, often, they fail to generate prosperity for their citizens. It’s a very political story.

...The absolutist institutions created a very unequal distribution of political power and a very unequal distribution of economic gains in society and the two became synergistic – the very unequal distribution of political power locked in a very unequal distribution of economics gains. This created a vicious circle, but the conflict it engendered sometimes led to a breaking down of the institutions that this unequal distribution depended on, opening the way for more open institutions, which are one of the engines of prosperity.

06 março 2012

Entrevista com Jeffrey Sachs



Jeffrey Sachs, um dos economistas mais importantes e influentes do mundo, concedeu entrevista ao Valor Econômico, onde trata de desenvolvimento sustentável e da Rio+20. Eis alguns pontos interessantes:

Valor: O senhor disse em discurso nas Nações Unidas que a Rio+20 deveria ser honesta e admitir as mais de duas décadas de fracasso global na área ambiental. O que quis dizer?

Jeffrey Sachs: A conferência do Rio em 1992 foi uma grande conquista da legislação ambiental internacional. Três grandes tratados ambientais saíram de lá: a Convenção do Clima, a da Biodiversidade e a do Combate à Desertificação. Quando olhamos para tudo isso 20 anos depois, temos três fundamentos da lei internacional, mas sem muito resultado. A mudança climática piorou dramaticamente e não temos um arcabouço no qual trabalhar. Registramos perdas gigantes em biodiversidade e enfrentamos secas cada vez mais fortes nas regiões áridas. Acho que é justo dizer que nos últimos 20 anos houve muito debate sobre legislação e acordos, mas não muito progresso em ações concretas. Penso que teríamos de sair da Rio+20 com caminhos práticos. Em outras palavras: esses problemas não devem ser deixados mais ao crivo de advogados. É preciso encontrar abordagens de desenvolvimento sustentável que façam sentido, que sejam mensuráveis e possíveis de replicar. É disso que se trata.

Valor: Mudando de assunto: o Brasil descobriu um volume imenso de petróleo no mar. Poderia trilhar o caminho errado, do passado?

Sachs: Há dois pontos bem diferentes quando se pensa sobre o que fazer com o petróleo no mar. O primeiro é como explorar esse petróleo de maneira segura. Os EUA viveram um enorme desastre nesse campo em 2010 e frequentemente essas empresas são desonestas, míopes, corrompem os legisladores. Os EUA têm um sistema regulatório todo corrompido por empresas que cortaram custos onde não deviam, comportaram-se mal e terminamos com um grande desastre. Mesmo em um país como o Japão, vimos como o sistema que controlava uma usina nuclear era horrivelmente mal gerenciado. Então, a primeira coisa que eu diria é que o Brasil deveria ter um sistema de gerenciamento ambiental muito sério, capacitado e técnico. O segundo ponto é sobre o que vamos fazer com o petróleo nesse mundo. Claro, continuaremos usando petróleo por algumas décadas ainda e evidentemente o Brasil vai explorar seu petróleo. Mas é preciso colocar a questão do combustível fóssil dentro de uma moldura climática séria.

Valor: Estamos vivendo o fim do capitalismo?

Sachs: Penso que precisamos modernizar o capitalismo. Veja as economias que, na minha opinião, têm o melhor desempenho: Noruega, Suécia, Dinamarca, Holanda e Alemanha.

Valor: Por que o senhor escolhe essas?

Sachs: Porque equilibram mercado com políticas sociais e ambientais. Fazem isso de maneiras diferentes e não são perfeitas, mas são países altamente produtivos, orientados pelo mercado, com baixa desigualdade, taxas bem baixas de pobreza, igualdade entre homens e mulheres. São generosos nas licenças-maternidade e paternidade e nas férias porque acreditam em uma vida equilibrada. São economias baseadas em mercados dentro de regimes capitalistas, mas não são a face implacável do capitalismo. Os governos dos países escandinavos têm níveis de corrupção muito baixos porque não deixam os negócios ditarem a política, deixam os governos regulamentarem os negócios. Acho que são bons modelos. Não são perfeitos, mas mostram que podemos ter uma economia de mercado e ao mesmo tempo uma sociedade muito humana. Os EUA são um modelo muito pobre neste momento. É corrupto, altamente desigual, ambientalmente negligente e tem preços excessivos no sistema de saúde porque deixaram o setor privado dominar a nossa política. É um exemplo de mercado que foi longe demais. Os modelos escandinavos são de sociedades equilibradas, éticas e moderadas. Espero que esses países continuem muito prósperos. Neste momento eles estão muito bem, dão ótimas condições de vida às pessoas, mostram como evitar a corrupção e provam, no meu ponto de vista, que é possível ter um capitalismo não imprudente. Eles usam a bandeira da social-democracia. Isso, na minha cabeça, são boas descrições.