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24 fevereiro 2010

Finanças Comportamentais e Publicação

Apesar dos conceitos de finanças comportamentais já estarem relativamente difundidos, a aceitação por parte dos cientistas tradicionais não foi fácil. Até o final da década de setenta, os artigos desta área não eram publicados nos periódicos tradicionais de finanças ou economia. Isto mudou em 1984, com a publicação de um artigo de Hersh Shefrin e Meir Statman no Journal of Financial Economics. Esta publicação foi relevante por três motivos:

  1. O editor deste periódico era Black, conhecido pelo desenvolvimento da teoria de opções e defensor da abordagem racionalista de finanças. Black apoiou a publicação do artigo, por achá-lo brilhante.
  2. O fato é mais importante já que o Journal of Financial Economics foi fundado por Eugene Fama, Michael Jensen e Robert Merton, todos eles financistas de visão tradicional e racional.
  3. O texto discute a questão da distribuição de dividendos, um assunto de ocupou Modigliani e Miller já em 1961

Mas o papel de Black foi mais além. Como presidente eleito da American Finance Association também em 1984 chamou Shefrin para organizar uma apresentação sobre finanças comportamentais. Em tal evento, Richard Thaler teve oportunidade de divulgar um estudo realizado juntamente com Werner de Bondt, hoje um clássico na área, sobre reação das pessoas a novos eventos.

Um ano mais tarde, Black escreveria um artigo denominado "Noise".

Fonte: FOX, Justin. The Myth of the Rational Market, cap. 11.

03 fevereiro 2010

EMH e Finanças Comportamentais

Os estudiosos de Finanças Comportamentais sabem da divergência com a eficiência do mercado e o conceito do homem racional. Uma história muito instrutiva foi contada no livro The Myth of the Rational Market, de Justin Fox (p.192), e ilustra muito bem a forma como os dois grupos entendem o ser humano.

Em 1979, depois da publicação do artigo Prospect Theory, Daniel Kahneman e Amos Tversky foram visitar Richard Thaler na University of Rochester. Thaler, fazendo as honras da casa, preparou um jantar para seus convidados e estava presente Michael Jensen. Jensen, um rigoroso teórico das finanças, mas defensor da idéia do mercado eficiente, não gostava muito das idéias comportamentais de Kahneman e Tversky. Além disto, Jensen era muito rigoroso com as pessoas.

Tversky perguntou a Jensen o que ele achava das decisões que eram tomadas por sua esposa. Jensen reconheceu que ela não tomava boas decisões. Tversky então quis saber o que Jensen achava do então presidente Carter. Jensen respondeu que Carter era um idiota. E a política econômica do Chairman do Federal Reserve, questionou Tversky para Jensen. Tudo errado, disse Jensen. Tversky continuou querendo saber de Jensen o que ele achava de vários tipos de pessoas, e a opinião de Jensen não era muito boa.

Tversky finalmente fez um fechamento no seu bate-papo com Jensen: "Quando nós falamos das pessoas, especialmente os policy makers, eles fazem grandes erros nas suas decisões. Mas no agregado, eles estão corretos?"

O que Tversky chamou a atenção é algo muito interessante. Para os defensores da eficiência do mercado existe um mecanismo regulador nas decisões individuais que mesmo que algumas pessoas comentam erros, o mercado como um todo estaria correto. A soma dos comportamentos geraria esta eficiência. Mas os estudiosos de finanças comportamentais acreditam que algumas decisões os erros individuais não são anulados no mercado.

Considere o caso do custo perdido. Sabemos pela contabilidade de custos que as decisões passadas não devem afetar as minhas decisões futuras. Os custos perdidos não podem ser considerados no processo decisório. Racionalmente isto é muito fácil de entender e compreender. Mas nas nossas decisões pessoais cometemos constantemente este erro. Quando um número muito grande de pessoas não age de forma racional, a eficiência do mercado deixa de existir.

Sabemos que existem estes problemas e um grande número de pesquisas já mostraram como isto ocorre. O que ainda não sabemos é o impacto disto para o conjunto total de decisões. Os partidários da eficiência do mercado, quando reconhecem as questões levantadas pelas finanças comportamentais, consideram que isto é uma exceção reduzida a regra mais abrangente do bom funcionamento do mercado. Os estudiosos de finanças comportamentais enxergam que os vieses apontados nas pesquisas são importantes demais para serem considerados como residuais.

15 dezembro 2009

Bolha

Repararam como hoje fala-se com familiaridade e naturalidade em bolhas? Até o ano passado, isso era menos frequente e despertava controvérsias. Agora chegamos a encontrar três títulos numa mesma página de jornal com a palavra estampada.

Se antes tínhamos discussões intermináveis sobre as razões para altos e baixos no mercado e economistas renomados se declaravam com urticária ao ouvir a famigerada expressão, hoje o fenômeno virou premissa para a maior parte dos analistas. O debate se resume em quem será capaz de prever com exatidão quando uma bolha poderá estourar.


Continua aqui

30 novembro 2009

Efeito Framing

Finalmente, os efeitos do framing são cada vez mais importantes. Algumas experiências, em alguns produtos e serviços, são mais sujeitos aos efeitos do framing que outros.


Create Your Own Economy, Tyler Cowen, 1149

O efeito framing tem sido objeto de estudo das finanças comportamentais. Entretanto esta é uma afirmação que merece uma comprovação da ciência.

09 novembro 2009

Expressões faciais e cultura


A equipe de Matsumoto estudou milhares de fotografias tiradas dos judocas nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, logo após as lutas terminarem. Os investigadores estavam particular interessados em saber se, e quão rapidamente, os competidores alteraram suas expressões faciais emocionais iniciais depois de ganhar ou perder. A principal conclusão foi que as diferenças culturais emergiram, com atletas originários de culturas coletivistas, como a China, que tendem a mascarar mais suas expressões emocionais do que atletas de culturas individualistas, como o Reino Unido.

A pesquisa também mostrou que a judoca de países mais ricos, densamente povoados, tendem a ser menos preocupados para mascarar suas expressões emocionais do que os concorrentes da zona rural, de países menos populosos.


Facial emotional expressions are universal and culturally specific

06 novembro 2009

Pedir no ouvido direito

Você está num clube de dança e música italiano, quando uma mulher aproxima-se de você. Sob uma música techno ela inclina e grita no seu ouvido: “Hai una sigaretta?”. Se ela falou no seu ouvido direito, é duas vezes mais provável que você lhe dê um cigarro do que se ela pediu no ouvido esquerdo.


Isto é explicado pela assimetria do cérebro. Fonte: Aqui

27 julho 2009

Efeito propriedade

O efeito propriedade é um bem estudado subproduto da aversão a perda, que é o fato que perder algo provoca sofrimente desproporcional. (em outras palavras, a perda gera mais pesar que o sabor de um ganho). Primeiro diagnosticado por Richard Thaler e Daniel Kahneman, o efeito propriedade estipula que uma vez que a pessoa é dona de algo ela deve estabelecer ou imaginar um “direito de propriedade” para o objeto que dramaticamente aumenta o valor subjetivo.

The Endowment Effect, 22/6/2009, Jonah Lehrer

Uma pesquisa recente mostrou que os donos de imóveis tendem a estimar seu imóvel por um valor de 5 a 10% acima do mercado. É a comprovação do efeito propriedade.

20 julho 2009

A Eficiência do Mercado

A eficiência do mercado tem sido objeto de estudo da contabilidade desde que o trabalho de Fama foi publicado. Para este economista, o mercado seria mais ou menos eficiente em razão da reação a informação. Fama entendia que a contabilidade era uma das fontes de informação, embora não fosse a única.

As EMH (Hipóteses de Eficiência de Mercado) têm sido objeto de estudo pelos pesquisadores. Fama classificava suas hipoteses em tres grupos: fraca, semi-forte e forte. Um grupo extenso de pesquisas surgiu no sentido de classificar o mercado num destes grupos. Ou seja, verificar em situações específicas se o mercado agia de forma mais ou menos eficiente.

Neste texto irei comentar três aspectos da EMH: a crença atual, a suposição da correlação e a relação entre eficiência e previsão.

Crença Atual

Um artigo recente, analisado pelo blog Financial Rounds, concluiu, por exemplo, que existem evidências que o mercado de ações dos EUA são altamente ineficientes.

A questão da eficiência já era questionada com a expansão das finanças comportamentais. A constatação que as pessoas não são plenamente racionais abriu uma nova perspectiva em termos de tentar explicar como se comporta o mercado. Existia uma velha piada sobre dois pesquisadores que acreditam na EMH e que um deles, por acaso, encontra uma nota de 50 reais na calçada. Ele diz: “nao é uma nota de 50 dólares no chão?” O outro afirma: “Parece, mas se fosse alguém já teria passado e ficado com ela”.

A crise financeira aumentou o debate sobre a eficiência dos mercados. Diversos textos interessantes foram divulgados nos últimos dias tratando do assunto. Além da crise contribui o lançamento recente do livro The Myth of The Rational Market (de Justin Fox).

Robert Waldmann, em The REH vs the EMH, destaca que a eficiência do mercado não significa necessariamente a hipótese de expectativa racional (REH). Para Waldmann, a EMH não trata de comportamentos individuais ou assume que os investidores possuem, isoladamente, carteiras eficientes.

Ja Gillian Tett, no Financial Times (Credit crunch causes analysts to rethink rational market theory, 16 de junho de 2009, p. 17) cita uma pesquisa realizada entre os membros britânicos do CFA. Quando questionados se acreditam na eficiência do mercado dois terços responderam que já não acreditam que o preço do mercado reflete toda informação disponível. Além disto existe uma elevada discordância que o investidor é racional.

Esta mudança é mais significativa quando imagina que a eficiência do mercado é fundamental para pontos relevantes da contabilidade financeira, como a remuneração dos executivos. Isto naturalmente tem despertado o interesse pelas finanças comportamentais.

Esta conclusão dos estudo do Chartered Financial Analyst Institute também foi destacada por Tom Stevenson em Investors are finally seeing the nonsense in the efficient market theory (Daily Telegraph, 18 de junho de 2009).

Em EMH - The Dead Parrot of Finance, Neil Hume lembra que James Montier, do Soc Gen, deseja que a EMH seja banida da industria de investimento. Isto inclui CAPM, administração de risco entre outros.

A questão da Correlação

John Lounsbury - em The (In)Efficient Market Hypothesis - destaca um problema específico da EMH: questão da existência de correlação constante entre dois ativos no tempo. Lounsbury faz uma correlação entre o dólar e a SP 500 para os últimos 38 anos e encontrou o seguinte resultado:



Pode ser observado que a correlação entre os dois investimentos varia ao longo do tempo. Usando os dados do Banco Central para taxa de câmbio e variação do índice Bovespa fiz este cálculo para o Brasil. O resultado encontra-se abaixo:



A correlação da figura refere-se a variação diária para cada um dos anos. É possível perceber que a correlação entre estas duas variáveis muda com o passar do tempo. Isto significa dizer que a objeção de Lounsburry provavelmente também é válida para o Brasil.

EHM e Previsão
Uma questão que sempre incomodou as mentes mais críticas de finanças refere-se a relação entre a EHM e a bola de cristal. Lembro-me de um livro recomendado por meu mestre e orientador, Alexandre Assaf, que abordava este assunto. Trata-se de Modern Portfólio Theory, The Capital Asset Pricing Model & Arbitrage Princing Theory, de Diana Harrington. Harrington comenta a questão controversa de usar a teoria de finanças para fazer projeção.

Mais recentemente Timmermann e Granger (em Efficient Market Hypothesis and Forecasting) comentam a contradição: os modelos pressupõem um mercado eficiente, onde a existência do chamado lucro anormal não seria possível; mas os “práticos” usam para tentar obter este lucro.

12 julho 2009

Explicando a queda excessiva do mercado

Para explicar o comportamento dos investidores nós teremos que voltar para disciplina de economia comportamental. Em 1979, os psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky sugeriram que as pessoas sentem a dor se sustentar uma perda supera o prazer que sentem quando se tornar um ganho da mesma magnitude. Estima-se que a dor tende a ser duas e meia vez mais intensa que o prazer.

Like a doe caught in the headlights
Sanjay Kr Singh
22 June 2009
Indian Express

08 junho 2009

Entrevista com Shiller

Cultura
Exuberância irracional
29 Maio 2009
Valor Econômico

Estatísticas divulgadas no início desta semana mostraram que os preços dos imóveis não param de cair nos Estados Unidos. É preocupante, porque ninguém acredita que a economia americana voltará a crescer com vigor se o mercado imobiliário permanecer tão deprimido. No mesmo dia em que os números vieram à luz, outra pesquisa indicou que a confiança dos consumidores americanos aumentou muito desde o início do ano. O otimismo contagiou as bolsas de valores e o pregão fechou em alta. No dia seguinte, os investidores voltaram a ter dúvidas sobre a capacidade de recuperação da economia e as ações se desvalorizaram.

O noticiário dos últimos meses está repleto de sinais desorientadores para quem tenta entender o que está acontecendo com a economia mundial. Para o economista americano Robert Shiller, professor da Universidade Yale, isso mostra duas coisas: as pessoas não se comportam como a teoria econômica convencional sugere, e ainda parece cedo demais para comemorar o fim da crise. "Desconfio que a melhora observada nos últimos meses não é sustentável e ainda teremos muitas notícias ruins pela frente", disse Shiller ao Valor na terça-feira, numa entrevista concedida em seu escritório no campus de Yale, em New Haven.

Valor: O que há de errado com a teoria econômica convencional?

Robert Shiller: A noção de que as decisões das pessoas são essencialmente guiadas por escolhas racionais e elas só decidem depois de avaliações quantitativas cuidadosas. Sempre achamos que havia algo errado com isso. Na nossa visão, traços psicológicos evidentes no comportamento humano são mais importantes, e o que faz eles se manifestarem nessa ou naquela direção são as histórias que circulam em cada época. Se as histórias dominantes num determinado período sugerem que a economia está entrando numa boa fase, as pessoas tendem a acreditar nisso e esse otimismo orienta suas decisões econômicas.

Valor: Como o próprio livro reconhece, é muito difícil isolar e medir esses traços psicológicos. Isso prejudica a utilidade prática dos conceitos que o livro desenvolve?

Shiller: É muito difícil quantificar essas coisas com o rigor e a exatidão que seriam necessários para construir novos modelos. Mas é possível fazer muita coisa. Existem vários índices que tentam medir a confiança dos consumidores. O principal, publicado pela Universidade de Michigan, foi criado por um professor de psicologia, George Katona. Os economistas veem esses índices com ceticismo, mas os empresários prestam muita atenção neles, porque sabem que a confiança é um fator importante nas decisões dos consumidores.

Valor: Que reações o livro tem despertado no meio acadêmico?

Shiller: Recebi convites para falar do livro em algumas universidades, mas não sei se ele está recebendo atenção nos círculos acadêmicos mais tradicionais. Na verdade, fizemos com este livro um esforço para alcançar uma audiência mais ampla do que a representada pela nossa profissão. A pesquisa em economia segue o modelo consagrado pelas ciências exatas e acreditamos que isso limita nossa capacidade de compreender o mundo. Os economistas precisam ser mais humildes. Deveríamos reconhecer nossos limites e prestar mais atenção no que outras ciências sociais fazem, incorporando métodos de pesquisa que são muito utilizados por sociólogos e psicólogos mas são desprezados pela maioria dos economistas.

Valor: Por que seus colegas resistem tanto a essa ideia?

Shiller: Milton Friedman escreveu um ensaio na década de 1950 argumentando que os economistas não deviam perguntar nada para ninguém. Ele acreditava que as pessoas jamais seriam capazes de explicar suas motivações sem mentir, ou sem omitir alguma coisa. Se você quisesse entender o comportamento de um jogador de sinuca profissional, por exemplo, Friedman achava inútil perguntar qualquer coisa a ele. O melhor a fazer seria contratar um físico capaz de entender a mecânica do jogo, analisar a movimentação das bolas e construir um modelo matemático que explicasse tudo. Você não precisaria falar com nenhum jogador para tentar aprender algo com ele. Os economistas adoram esse tipo de coisa. Eu acho absurdo.

Valor: O que precisa ser feito?

Shiller: Precisamos repensar os fundamentos da macroeconomia. Muitos dos meus colegas estão atentos para esse problema e fazem pesquisas importantes. Mas é um espanto o fato de que tão poucos economistas tenham previsto a crise atual, e as dificuldades que a profissão tem encontrado para oferecer soluções agora são um sinal claro do fracasso da teoria convencional. Muita gente na academia vai tentar manter os modelos tradicionais fazendo pequenos ajustes, mas não é disso que precisamos. Precisamos de uma revolução na macroeconomia.

Valor: De que maneira isso poderia contribuir para tornar mais eficiente a regulação do sistema financeiro?

Shiller: O comportamento das pessoas precisa ser levado em conta pelos reguladores. Os seres humanos são propensos a cometer erros o tempo inteiro e isso tem que ser considerado. Os engenheiros pensam nesse tipo de coisa quando projetam um avião. Não é à toa que todo avião tem um assento para o piloto e outro para o co-piloto. Um deles pode falhar durante o voo e você precisa de um substituto ali. A regulação do sistema financeiro precisa ser repensada com esse mesmo espírito.

Valor: Dê um exemplo.

Shiller: Uma coisa importante seria aumentar a transparência do sistema e mudar a maneira como as informações circulam. As empresas são obrigadas a publicar inúmeros relatórios, mas pouca gente lê esses documentos. Há alguns anos houve um movimento para forçar as empresas americanas a usar uma linguagem mais simples em seus relatórios, para facilitar sua compreensão. Mas é preciso ir mais longe se quisermos democratizar o acesso das pessoas às finanças e protegê-las contra os malfeitores que existem na praça. Devemos reconhecer os limites das pessoas e ajudá-las a tomar decisões com assessoria especializada.

Valor: Como assim?

Shiller: Hoje em dia, serviços de assessoria em assuntos financeiros são oferecidos apenas por pessoas interessadas em vender produtos financeiros específicos. Corretores de ações e corretores de imóveis são recompensados por fazer recomendações que nem sempre são adequadas para as pessoas, e não há incentivos no sistema atual para corrigir isso. Minha sugestão é que o governo subsidie esse tipo de serviço, para estimular o nascimento de uma indústria de assessores financeiros que sejam desinteressados e deem segurança às pessoas. Na hora de planejar investimentos significativos e tomar decisões importantes como a compra do primeiro imóvel, as pessoas poderiam ter ajuda de um assessor especializado, com quem teriam o mesmo tipo de conexão pessoal que qualquer um tem com seu médico particular.

Valor: De que maneira isso evitaria a formação de bolhas como a que surgiu no mercado imobiliário americano?

Shiller: A crise atual é essencialmente o resultado de falhas na maneira como as pessoas e as empresas administraram os riscos a que estavam expostas. Havia uma enorme bolha se formando e praticamente ninguém aconselhando as pessoas a tomar cuidado. Pelo contrário, todo mundo dizia que o melhor a fazer era comprar o que aparecesse pela frente e se alavancar. As pessoas passaram a acreditar que os preços dos imóveis continuariam subindo para sempre e fizeram suas apostas com base nessa crença, embora os imóveis tivessem se desvalorizado em outros momentos no passado. A teoria financeira convencional diz que as pessoas devem diversificar seus investimentos e buscar proteção contra os riscos que correm. Ninguém seguiu esse conselho enquanto a bolha estava se formando e o resultado foi desastroso, como vimos depois.

Valor: Mas muita gente sabia que estava correndo riscos, não?

Shiller: Faz parte da natureza humana cometer erros desse tipo. Não há o que fazer para evitar que as pessoas cometam loucuras e haverá outras bolhas no futuro. Mas é possível evitar que os problemas criados por erros desse tipo tenham a intensidade da crise atual. É possível desenhar instituições financeiras em que as pessoas tenham mais proteção.

Valor: É função do governo proteger as pessoas contra seus próprios erros?

Shiller: Em qualquer esporte há juízes. Eles são necessários. Se eles não existissem, não saberíamos quem ganhou o jogo, os times iam brigar e as pessoas iam se machucar. O resultado disso não seria aceitável para ninguém. Os jogadores precisam de um juiz e o público também quer. É a mesma coisa com a regulação da economia. Se o governo não estabelecer as regras do jogo, os bancos e as empresas farão isso. Foi essencialmente o que eles fizeram nos últimos anos. Não é que o governo precisa proteger as pessoas contra sua própria natureza. Somos nós que decidimos que queremos um jogo com regras claras e um juiz para arbitrar conflitos, porque é do nosso interesse.

Valor: O governo tem condições de atuar como um árbitro isento numa situação como a dos Estados Unidos, em que o Estado passou a controlar uma fatia tão significativa do sistema financeiro?

Shiller: Todo mundo espera que os juízes sejam imparciais, mas às vezes eles podem ser subornados, ou fazem apostas por baixo do pano. Você pode concluir que a natureza humana é tão definitivamente corrompível que não resta nada a fazer. Mas nem todo mundo é corrompível, e é por isso que as sociedades em geral funcionam. Uma noção importante para a teoria econômica convencional é a ideia de que as pessoas são inexoravelmente egoistas, capazes de desrespeitar as leis e fazer qualquer coisa para maximizar seus lucros. Tem algo errado aí.

Valor: A crise fez os americanos parar de consumir e eles estão economizando mais. É apenas uma estratégia para enfrentar a recessão ou um sinal de transformações mais profundas no comportamento das pessoas?

Shiller: Não sei ao certo. Acabamos de ver um salto nos índices de confiança dos consumidores e muitas pessoas parecem acreditar que o pior da crise ficou para trás. Muita gente acha que os preços dos imóveis vão se recuperar em breve, embora continuem caindo. Como argumentamos no livro, os espíritos animais têm vida própria. Mas desconfio que a melhora observada nos últimos meses não é sustentável e ainda teremos muitas notícias ruins pela frente. A questão é saber se esta crise será mesmo um evento transformador. Acho que a recessão vai se prolongar por mais tempo. Isso levará a um aumento nas taxas de poupança dos Estados Unidos e a uma atitude menos especulativa.

Valor: A maior aversão das pessoas a riscos vai enfraquecer as fundações do capitalismo americano?

Shiller: Não vamos exagerar. Tivemos depressões e pânicos no passado. Depois esquecemos tudo, voltamos a cometer os mesmos erros e o capitalismo sobreviveu. Apesar de tudo que ocorreu nos últimos meses, existe atualmente um crescente reconhecimento do valor do capitalismo como um sistema capaz de produzir e distribuir riqueza. Não acredito que a atual recessão vá acabar com isso.

Valor: As medidas adotadas pelo governo americano para combater a crise estão na direção certa?

Shiller: Temos que dar tempo ao governo. Tem muita gente boa lá dentro e eles sabem o que é preciso fazer. Defendemos no livro a ideia de que os bancos centrais precisam ter como meta manter a oferta de crédito em condições que garantam pleno emprego e estabilidade econômica. A preocupação com a inflação não pode ser o único objetivo. O atual presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, sabe bem disso, porque discutiu essa ideia nos seus estudos sobre a Grande Depressão. E o Fed já está trabalhando nessa direção.

Valor: O aumento dos investimentos do governo ajuda?

Shiller: A maioria dos economistas acredita hoje em dia que o aumento dos gastos públicos provocado pela Segunda Guerra Mundial foi o que acabou com a Grande Depressão. Mas não acredito que os gastos do governo tenham sido o fator determinante. O que a guerra fez foi mudar a maneira como as pessoas viam a economia e o momento que o país estava atravessando. Durante a Grande Depressão, elas foram tomadas por expectativas ruins que se autoalimentavam e davam a impressão de que aquilo ia durar para sempre. Com o esforço coletivo em torno da guerra e a reunião das famílias depois que o conflito acabou, as pessoas abandonaram esse estado mental e passaram a se comportar de outra maneira, dando impulso à recuperação da economia.

Valor: Uma empresa que o senhor ajudou a fundar, a MacroMarkets, está lançando um fundo que permitirá aos investidores fazer apostas na evolução dos preços dos imóveis. Por quê?

Shiller: A crise atual mostrou que faltam instrumentos para proteger as pessoas contra os riscos do mercado imobiliário. Isso é fundamental. Construtoras, corretoras e pessoas que adquiriram imóveis antes que a bolha estourasse agora encontram enorme dificuldade para se ajustar. Queremos criar um mercado para produtos financeiros que reflitam a evolução dos preços dos imóveis. Tentamos fazer isso no mercado de futuros antes da crise, mas não houve interesse. Acho que os investidores não entendem bem como o mercado imobiliário funciona e por isso não compraram nossa ideia. Desta vez vamos lançar um fundo com ações negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. Tivemos dificuldade para obter aprovação dos órgãos reguladores. Vamos ver agora se as pessoas terão interesse em participar.

03 junho 2009

Custo Perdido

Um estudo de 6380 contas de investimentos de 1987 a 1993 por Odean para o livro Are Investors Reluctant to Realize their Losses? descobriu que os investidores tendem a vender ações que valorizaram do que as que perderam. O estudo constatou ainda que as ações vencedoras, que foram vendidas, superaram o mercado em uma média de 2,3% no ano seguinte, enquanto as que perderam e foram mantidas tiveram um desempenho abaixo do mercado de 1,1%.

Assim, se os investidores tivessem mantido os títulos vendidos e vendessem os títulos mantidos, isto teria aumentado seu desempenho anual de 3,4%, aponta Mangot. O autor chama isto de falácia do custo perdido. (...)

Investing logic - R. Sreeram - 28 Maio 2009 - Money Today

01 junho 2009

Psicologia do investidor

Psicologia do investidor
26 Maio 2009
Valor Econômico

Ganhador do Prêmio Nobel de Economia de 2002, apesar de não ser economista de formação, o psicólogo israelense Daniel Kahneman chama a atenção por seu estilo extremamente atencioso para com seus interlocutores. Autor da chamada "Teoria da Perspectiva", juntamente com Amos Tversky, em 1979, o psicólogo mostrou que as decisões econômicas dos indivíduos nem sempre são racionais. A pesquisa econômica até então assumia que pessoas são motivadas por incentivos materiais e tomam decisões de modo a sempre maximizar os ganhos. Kahneman e Tversky mostraram que isso não é bem assim.

Aos 75 anos, o professor de psicologia na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, é uma das estrelas do 5º Congresso Anbid de Fundos de Investimento, que começa hoje. A participação de Kahneman será amanhã. Por telefone, ele falou ao Valor e disse que o atual otimismo dos mercados pode ser considerado irreal. Para Kahneman, as mudanças regulatórias adotadas pelo governo americano ajudam, mas não são capazes de evitar novos problemas.

Valor: Os investidores tendem a colocar muito peso na performance passada das aplicações. Como a atual turbulência afeta as expectativas das pessoas no que se refere a seus investimentos?
Daniel Kahneman: Não tenho certeza se haverá grandes impactos no comportamento do investidor. Os mercados estão atualmente otimistas, por diferentes razões, porque a situação não está tão ruim quanto se esperava. E quando as coisas não vão tão mal quanto se esperava, as ações tendem a subir. Você perguntou se haverá grandes mudanças na forma como as pessoas pensam o mercado acionário e eu acho que é ainda muito cedo para dizer.

Valor: Temos visto os mercados acionários se recuperando rapidamente. Isso pode ser uma bolha?
Kahneman: Você sabe que sou um psicólogo, e acho que, hoje, nem os economistas sabem responder essa pergunta. Houve uma queda grande dos mercados e agora há uma recuperação muito rápida, mas acho que nenhum economista seria capaz de responder a essa pergunta. Alguns economistas conhecidos estão muito pessimistas, mas eles já estavam pessimistas no passado...

Valor: O senhor trabalha na fronteira entre a psicologia e a economia. Quais dificuldades e desafios você enfrenta nesse trabalho?
Kahneman: As finanças comportamentais são uma abordagem da economia muito influenciada pela psicologia, mas não acredito que os mercados são perfeitos ou profundamente racionais. Algumas teorias sobre a percepção do mercado estão completamente erradas. Na minha opinião, um dos mais importantes momentos da crise é o que chamo de "a confissão de Alan Greenspan", quando o ex-presidente do banco central americano disse no Congresso que sua teoria, de que os bancos agem como agentes racionais, estava errada. O fato de essa teoria ter se provado errada levará a maiores precauções na economia por um bom tempo e, no momento, está aumentando a credibilidade das finanças comportamentais.

Valor: Por que esse momento foi o mais importantes da crise?
Kahneman: Não tenho certeza se foi um dos mais importantes momentos para a economia, mas foi importante para seu desenvolvimento intelectual. Alan Greenspan representa aqueles que não acreditam em regulação, que acreditam no mercado, na racionalidade das instituições. A atitude dele, portanto, foi particularmente surpreendente. Ele era claramente a figura mais importante na aplicação dessas teorias.

Valor: Na Teoria da Perspectiva, os investidores se mostram frequentemente irracionais em suas decisões. Na outra ponta, há economistas que acreditam que o mercado é eficiente. Como o senhor vê esses dois pontos de vista nesta crise?
Kahneman: Pelo menos nos Estados Unidos, está claro que houve irracionalidade das pessoas que especularam com imóveis. No que diz respeito à especulação feita pelo bancos, é difícil chamar de irracionalidade, porque os banqueiros já são ricos. A teoria de que bancos ou instituições financeiras podem ser agentes racionais caiu por terra. Não há conexão com o que aconteceu e a Teoria da Perspectiva, mas há a uma ligação direta com as ideias de que o mercado corrige os erros. Os bancos, ou seja, o mercado, amplificaram os erros.

Valor: A crise veio após alguns anos de exuberância. Isso levou os investidores a tomarem mais risco do que estavam preparados?
Kahneman: Não há dúvida disso. O maior desafio ao se tomar risco acontece não porque as pessoas tomam esse risco, mas porque elas não conhecem o risco que estão correndo. Até certo ponto, é o que pode ser ver nesse otimismo irreal. Há uma importante contribuição do livro "Cisne Negro", escrito por Nassim Taleb, antes da crise, mostrando que há sempre mais risco do que as pessoas conhecem. Ele diz que todo evento é maior do que as pessoas pensam, esperam.

Valor: Certa vez o senhor disse que as pessoas seriam melhores investidores se tomassem menos decisões. A atual turbulência mostrou que os indivíduos tendem a comprar na alta e entrar em pânico quando os mercados caem?
Kahneman: É absolutamente o caso. Em geral, quando se observa os fundos de investimento, por exemplo, e as pessoas que investem neles, vê-se que as pessoas compraram no pico. Há um grande número de indivíduos que negociam com o comportamento errado. Está muito claro que, na média, eles fazem isso de forma muito simplista. E quanto menos as pessoas fizerem isso, melhor.

Valor: Alguns dizem que a origem desta crise está no fato de os americanos gastarem mais do que podem e pouparem menos do que deveriam. O senhor concorda?
Kahneman: Isso é um fato. O grau de poupança nos Estados Unidos está historicamente baixa, até negativo nos últimos anos. Estava claro que essa era uma situação insustentável. Talvez não tenha precipitado a crise, mas com certeza foi um dos seus motivos, e não há sinais que isso deve voltar ao normal tão cedo.

Valor: Os reguladores estão ajudando a tornar o sistema financeiro mais frágil ao encorajarem a consolidação dos bancos? Isso pode ser perigoso para os investidores?
Kahneman: Aqui também vou voltar ao meu amigo Taleb. Para ele, a globalização tende a trazer um crescimento muito rápido para as instituições, mas também deixar sua situação mais frágil. Ele diz que nós temos um sistema que é naturalmente robusto, mas a consolidação das instituições contribui para sua fragilidade. Acho que é ingênuo não acreditar nisso.

Valor: As medidas dos governos serão capazes de prever futuros problemas de crédito?
Kahneman: Haverá um ambiente regulatório mais restrito nos EUA por causa da crise. Taleb diz que devem ser tomada as devidas precauções para evitar uma crise como esta. Mesmo assim, não será possível evitar os 'cisnes negros', os eventos imprevistos, mas provavelmente se reduzirá a incidência e amplitude. As medidas podem tornar o sistema mais eficiente. O meu palpite é que haverá uma forte onda regulatória nos EUA, mas se isso vai funcionar ou não está totalmente fora da minha expertise.

Valor: Depois dessa crise, as pessoas mudarão a forma como encaram suas finanças?
Kahneman: Aparentemente, houve um efeito de longo prazo depois da Grande Depressão. As pessoas que viveram nessa época são muito mais inseguras quanto ao futuro. O que estamos vendo agora não é tão severo quanto a Grande Depressão. Acho que as pessoas vão pelo menos pensar um pouco mais, pelo menos por um tempo. Elas terão menos confiança no futuro e provavelmente irão poupar um pouco mais, o que é bom. Claro que, no curto prazo, há um paradoxo, pois poupar agora não é bom para a economia.

Valor: O plano de resgate da economia americana mudará a visão sobre a teorias econômicas?
Kahneman: Haverá algumas mudanças nas teorias, principalmente nas que dizem respeito à estabilidade dos mercados, e isso vai influenciar os governos. Nos EUA, hoje, há uma situação interessante, em que as finanças comportamentais têm uma grande influência na administração de Barack Obama. Particularmente, uma das figuras principais nesse campo (Cass Sunstein) será responsável pelas regulações na Casa Branca. Ele não aceita a tese de que as pessoas são racionais ou o mercado é perfeito. A teoria que influencia o governo irá mudar. Ou melhor, já está mudando.

07 maio 2009

Heurística

Heurística II - fazendo a pergunta correta

(...) A polêmica a que me referi no início dessa série refere-se a um questionamento levantado por Gerd Gigerenzer e Ralph Hertwig em The conjunction fallacy revisited: how intelligent inferences look like reasoning errors. Os autores perguntam até que ponto esse seria realmente um erro de julgamento ou se talvez o experimento teria sido mal-formulado. (Note que tal crítica é dirigida a Kahneman, Prêmio Nobel de Economia em 2002.)

Para eles, ao usar lógica matemática como base para determinar se julgamentos são racionais ou irracionais ignora-se o contexto do problema - o que pode ocasionar falhas de interpretação. O cerne da questão reside, segundo Gigerenzer e Hertwig, na interpretação do termo "provável". Sem uma clara definição da pergunta, o entrevistado pode buscar o que é mais "sensato", "crível", "freqüente", "plausível" ou "evidente".

(...) A lição que tiro disso tudo é que deve-se tomar cuidado com a forma como obtemos as respostas. Muitas vezes não temos as perguntas adequadas - como no caso de Linda - ou a forma como as fazemos interferem na resposta - como no caso dos pais.