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Mostrando postagens com marcador narrativas. Mostrar todas as postagens
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17 janeiro 2022

Como cometer uma fraude

Há algumas regras que um fraudador típico explora dos incautos. No Stumbling and Mumbling uma relação de várias delas que não deixa de ser um alerta para as pessoas. O texto lá também tem uma conotação política, que também pode ser aplicado. Fizemos algumas adaptações no texto

Explore o otimismo – Experimentos mostraram que as pessoas que recebem incentivos na previsão de ativos para preços mais elevados tendem a fazer previsões mais otimistas do que as pessoas que recebem incentivos para preços em queda. As pessoas são otimistas e gostam de receber informações com este tom. Isto inclui saber que a tecnologia permite saber da saúde de uma pessoa com uma gota de sangue (vide Theranos) ou que a empresa encontrou nova jazida de petróleo (caso do Eike Batista)

Medo de ficar de fora é poderoso – A síndrome do medo de ficar de fora ou síndrome de FOMO (fear of missing out) é algo real para muitas pessoas. Cerca de dois terços dos usuários de redes sociais padecem de FOMO, o que faz com que tenham o vício de se manter atualizado, inclusive em tempo real. Para a área de finanças, o medo de ficar de fora acontece quando o investidor não quer perder a próxima oportunidade de investimento, o que inclui starups (Theranos), bolha do mercado de ações ou modismo.

Glamour importa muito – Três pesquisadores chegaram a criar o emotion beta na tentativa de mensurar com ações de “alta emoção” possuem uma atração especial. Elizabeth Holmes é glamourosa, com sua voz rouca, roupas à la Jobs e juventude. A Theranos, de Holmes, era uma empresa glamourosa. Investir em tecnologia – mesmo que não faça sentido – também possui um glamour.

Similaridade – Ou “like atrai like” ou fraudes são mais fáceis quando conquista a confiança das pessoas que possuem uma similaridade com você. Este é inclusive um verbete da Wikipedia: Affinity Fraud. Madoff conquistou muitos investidores entre os judeus ricos e respeitáveis, como ele. Mas há muitos exemplos de fraude que ocorreu entre os membros de uma igreja ou de uma comunidade.

Histórias são poderosas – as finanças comportamentais já mostraram que as histórias são mais poderosas do que os dados frios. Narrativas são tão poderosas que o prêmio Nobel de Economia Robert Shiller escreveu um livro, chamado Economic Narratives, sobre elas. Damodaran, um especialista em avaliação de empresas, também dedicou uma obra, Narratives and Numbers para discutir as histórias. Até no meio acadêmico isto funciona: ao escrever um artigo, contar histórias pode ajudar nos argumentos. Isto não é muito científico, mas funciona. Os políticos adoram sair da objetividade de sua proposta para contar uma história. O fraudador sabe disto e usa a seu favor: você certamente já ouvi falar do bilhete premiado da loteria esportiva.

Deferência – Em 1968 experimentos mostraram que motoristas são menos propensos a buzinar para outros automóveis quando o veículo é caro. Fingir que é um policial ou funcionário de um banco faz com que as pessoas tenham uma “deferência” para o fraudador. O filho de alguém – que na língua portuguesa virou fidalgo – tem um poder de persuasão maior que um simples mortal. O pai de Eike Batista era figurão no governo e isto abriu muitas portas.

Ser diferente, mas não tanto, é bom – Os vendedores de tônicos prosperam quando diferenciam seu produto. Holmes era uma mulher no meio de um ambiente predominantemente masculino. Batista era um “empreendedor” em um ambiente cheio de regras. Derek Thompson alerta para o poder de ser inovador e, ao mesmo tempo, familiar (similaridade, acima) para ser um Hit Makers. O projeto da Theranos era realmente uma tecnologia nova, mas familiar para o leigo.

Ao final do texto do Stumbling and Mubling o autor chama a atenção: as pessoas são fraudadas não por serem estupidas. A história ensina de Isaac Newton e Jonatham Swift investiram seu dinheiro, e perderam, na bolha do South Sea. Mesmo pessoas brilhantes podem cair em lorotas, pois existem muitas maneiras de enganar as pessoas.

Foto: The Day Book, 30 de dezembro de 1913

19 junho 2020

Mercado Narrativo

Certa vez, em conversa com o Pedro, do blog, ele comentava sobre a dificuldade de postar aquilo que todo mundo já tinha lido em algum lugar. Esta é uma frustração que enfrento, especialmente diante de minha promessa de tentar postar pelo menos três tópicos por dia. Como solucionar este problema.

Uma postagem de David Perrel levanta uma questão interessante: o mercado narrativo. Na visão dele - que talvez não seja a mais correta - em lugar de fazer com que a narrativa encontre a realidade, muitas vezes fazemos com que nossa narrativa encontre a demanda dos leitores.

Um exemplo citado por ele: um repórter fez uma entrevista sobre o declínio da educação superior e a substituição pelo ensino online. A pergunta foi: a pandemia irá matar as universidades? Perrel acha que a pergunta não é esta e sim "qual a grande mudança provocada pela educação online?". Basicamente é chute afirmar que a pandemia irá matar as universidades, assim como afirmar que o ensino superior perdeu sentido com a educação online self-service. Como a opinião dele não estava coerente com o "esperado", não foi considerada na versão final da matéria.

Segundo Perrel, as narrativas da mídia tem um feedback em forma de loop. Se uma narrativa capta a atenção do público, mais jornalistas irão escrever sobre ela e mais a narrativa irá captar a atenção pública. Estas narrativas podem mudar ao longo do processo; algumas sairão do foco.

Veja o gráfico a seguir:
Ele mostra o ciclo de notícias em 2019. A questão da fronteira com o México teve popularidade no primeiro trimestre e depois foi esquecida (segundo item do gráfico). Epstein foi notícia no meio do ano e depois foi lembrado esporadicamente. E assim por diante.

12 maio 2017

A economia brasileira, segundo as empresas e seus relatórios

Algumas empresas brasileiras já divulgaram os resultados do primeiro trimestre do ano. Para algumas empresas, o período é “desafiador”, uma palavra muito comum nas narrativas apresentadas neste período. A grande maioria evita comentar sobre o cenário; quando fazem, tratam do cenário específico do setor onde atuam, não comentando o momento atual da economia brasileira.

Mas existe uma pequena parcela de empresa que mesmo que brevemente traçam um panorama da situação atual. Neste grupo, conforme pesquisado por este blog nas demonstrações trimestrais apresentadas, há muito mais um cenário positivo, do que negativo.

A seguir alguns exemplos coletados nas demonstrações contábeis trimestrais:

Fibria Celulose = “O ano de 2017 começou mais positivo para o mercado de celulose”

Romi = “O início de 2017 continua demonstrando fraca atividade econômica, contudo, alguns sinais de uma possível recuperação da economia brasileira, mesmo que lenta e gradual, puderam ser notados, como, por exemplo, a evolução nos índices de confiança apresentados a seguir.”

Klabin = “No primeiro trimestre de 2017 o aumento da confiança em relação à retomada da economia brasileira foi percebido na queda da inflação e das taxas de juros, na maior estabilidade cambial e na valorização do Ibovespa”

Grendene = “Em fevereiro deste ano, quando divulgamos nosso Relatório de Administração referente aos resultados de 2016, nossos comentários sobre a economia doméstica e as expectativas de sua recuperação em 2017 foram cautelosos, mas também nos declaramos confiantes no desempenho da Grendene e adiantamos que o início do ano estava nos surpreendendo positivamente. Os resultados obtidos comprovaram esta tendência”

Irani = “O primeiro trimestre de 2017 teve sinais positivos da economia brasileira.”

Cielo = “O primeiro trimestre de 2017 não apresentou alteração no comportamento do negócio, ainda pressionados por um cenário econômico desafiador, exigindo foco constante na disciplina em nossas operações.”

Suzano = “O primeiro trimestre foi marcado por um desempenho forte do mercado de celulose”

Profarma = “A atividade econômica brasileira, no início de 2017, apresentou alguns sinais de retomada. Fatores com efeitos mais estruturais, como o ajuste fiscal de longo prazo, a aceleração do afrouxamento monetário e o controle da inflação, contribuíram para uma percepção mais favorável e proporcionaram maior confiança dos agentes econômicos”

SulAmerica = “Começamos o ano de 2017 de maneira positiva”

Magazine Luiza = “O primeiro trimestre de 2017 deve ser o início de uma gradual recuperação na economia brasileira.”

Portobello = “A leve retomada da economia e melhora das expectativas de consumo trouxeram algum otimismo ao mercado”

20 abril 2017

Texto Como Dado

As primeiras pesquisas na área contábil usavam os números produzidos pela contabilidade e os preços das ações das empresas. Nos últimos anos, cresce as pesquisas que extrapolam o conforto de tomar as cotações das ações e fazer relações estatísticas com alguma variável (divulgação de uma notícia, desempenho da empresa, evolução temporal são alguns dos itens de uma lista grande). Os pesquisadores começaram a perceber que contabilidade não significa só número. Quando uma empresa divulga suas demonstrações contábeis, a grande maioria das informações, nos dias de hoje e para grandes empresas, são apresentadas em textos. Somente uma pequena parcela sãos os números das demonstrações contábeis. Mais ainda, a comunicação de desempenho de uma empresa com seus investidores não ocorre somente em quatro datas fixas ao longo do ano; nos dias de hoje, uma empresa está entregando informações sobre seu desempenho cada vez que divulga uma informação na rede social ou num fato relevante ou numa declaração de um gestor para algum canal de comunicação.

Se o número tem o poder de dar uma informação de forma “precisa”, o texto pode ser amorfo. Se a coleta do valor do lucro de uma empresa é feita rapidamente através da linha deste item na demonstração do resultado, o mesmo não se pode dizer do sentimento da empresa sobre as suas perspectivas futuras, que poderia estar expressa no relatório da administração ou num comentário do seu twitter oficial.

Assim, não é surpresa nenhuma olhar a história da pesquisa contábil e certificar que a grande maioria dos artigos tiveram nas suas informações numa base de dados numérica. Além disto, o pesquisador que se aventurou em usar os dados textuais – oral ou escrito – teve que enfrentar dois grandes desafios. O primeiro é a coleta e tratamento dos dados. As narrativas geralmente não estão disponíveis a um clique da base de dados existente na minha universidade; elas precisam ser coletadas, reunidas, convertidas de PDF para um arquivo texto e criadas as condições de análise. O trabalho é enorme.

O segundo grande desafio é a subjetividade da informação. Quando um pesquisador coleta um lucro de 134 milhões de reais num exercício social de uma empresa, esta é a informação “precisa” e clara que ele irá usar. Mas quando um executivo de uma empresa escreve “outra conquista importante foi conviver e superar um contexto macroeconômico hostil” o que isto significa? (Esta frase peguei por acaso o Relatório da Administração da CEB) Isto é uma afirmação otimista ou pessimista? E junto com a subjetividade existe a desconfiança sobre a existência de “erros” na pesquisa.

Mas o aparente esgotamento das pesquisas estritamente numéricas, a exigência dos avaliadores de que uma pesquisa deve trazer algo mais que uma aplicação de um método quantitativo para um conjunto de números que estão disponíveis, a expansão da comunicação não numérica entre empresa e usuário, além do surgimento de instrumentos para este tipo de pesquisa, podem ser um anúncio de que as pesquisas com textos serão promissoras.

Neste sentido, o artigo “Text as Data”, de Matthew Gentzhow, Bryan Kelly e Matt Taddy não somente destacam a relevância deste tipo de pesquisa, como indicam algumas das ferramentas existentes e apresentam alguns exemplos relevantes. Um exemplo é sua utilização para preços das ações. Outro, a determinação de autoria de um texto. Também é possível usar a pesquisa narrativa para determinar o sentimento de um banco central nos seus comunicados. Ou observar o sentimento da imprensa. E assim por diante.

Futuros pesquisadores: o desafio está lançado.

06 agosto 2015

Melhoria na Evidenciação

O Financial Executives Research Foundation (ferf) e empresa de auditoria EY estão conduzindo uma pesquisa, que pode ser respondida aqui, sobre as iniciativas que as empresas estão fazendo para melhorar as demonstrações. A pesquisa iniciou no dia 10 de julho e já apresenta alguns resultados interessantes, parcialmente divulgados aqui

Os respondentes indicaram que existe um esforço no sentido de melhorar as informações. A figura apresenta alguns destes resultados.Observe o destaque para três pontos: redução de informações desatualizadas, redução de redundâncias e de informação pouco expressiva. Também é interessante notar que 31% das empresas estão trabalhando na redução das narrativas; em seu lugar, mais figuras.