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31 maio 2015

História da Contabilidade: Demonstrações após a Independência

Nós sabemos pouco sobre as demonstrações contábeis que se fazia no Brasil após a independência. Mas os documentos que sobreviveram mostram algo de interessante.

Em primeiro lugar, a evidenciação era praticada principalmente pelo terceiro setor e no setor público. Isto pode ser explicado pela necessidade de prestar contas ou divulgar o trabalho realizado (1). Além disto, o setor privado era muito insipiente incipiente no país, consistindo basicamente da exportação de commodities. Não existia uma necessidade de divulgar as informações das fazendas ou dos garimpos de exploração.

Em segundo lugar, já existia um conjunto de profissionais responsáveis pela contabilidade. Alguns deles chegaram ao país com a corte, outros vieram importados, mas existiam aqueles que começaram a ser formados pela Aula de Comércio (2).

Terceiro, dois métodos de escrituração eram praticados: as partidas dobras, apresentada ao mundo por Pacioli, e as partidas simples. Não se sabe o grau de utilização, mas certamente no setor público se utilizava as partidas simples, apesar de legislação de 1808 determinando a utilização das partidas dobradas. Bons profissionais sabia contabilizar pelos dois métodos. A coexistência dos métodos irá perdurar até o final do século XIX e início do seguinte (3).

Quarto, a caligrafia era de fundamental importância, já que não existia máquina de datilografia ou outro sistema que permitia a apresentação mais adequada das palavras.

Mas talvez a característica mais relevante da época é o fato de que a Demonstração do Resultado ser a informação mais destacada, sendo o balanço patrimonial uma figura secundária, quando o mesmo existia. Na realidade não existia um Demonstração do Resultado, mas uma apresenta do que conhecemos nos dias de hoje como Encerramento do Exercício ou Lucro Líquido.

Nos anos 30 do século XIX encontrei duas entidades que apresentaram, de forma mais detalhada, seu desempenho: a Casa de Correição, a Fábrica de Ferro e a Fábrica de Pólvora. Iremos mostrar hoje a evidenciação da Fábrica de Pólvora na Serra da Estrella, utilizando para isto o relatório do Ministério da Guerra, de 1836, edição 10, p. 25, onde os números da Fábrica estão bastante detalhados.

A figura a seguir mostra o resultado da Receita e Despesa da Fábrica. A Receita, posicionada do lado esquerdo, é dividida em Realizada e Para Realizar. A Despesa também obedece esta divisão, sendo apresentado no lado direito. No caso da Receita e Despesa Realizada, a diferença é considerada como “Existente em Cofre”. Isto mostra que esta parte é regime de caixa. E a primeira linha da Receita Realizada é “Pelo que foi achado em Cofre na ocasião da abertura Judicial”, que corresponderia ao caixa inicial. Deste modo, a demonstração é basicamente um fluxo de caixa.

A principal receita é a venda do produto para Marinha e ao Arsenal de Guerra. A principal despesa é a “Férias” dos empregados.
A segunda parte trata da receita e despesa a realizar. São receitas que seriam registradas no regime de competência, mas que ainda não foram recebidas, e despesas já feitas, que não foram pagas. A diferença é denominada de “Excesso do Crédito ao Débito”, que corresponderia ao lucro. Mas no final da página tem a seguinte observação:

N.B. Se aos 18:329$831 addicionarmos os 3:413$860 existente em Cofre, veremos que a Fabrica teve de producto liquido 21:743$691.


(1) O primeiro balanço evidenciado no Brasil foi na Livraria Pública, conforme já exploramos neste blog recentemente. Vide aqui
(2) Isto também foi assunto de postagens recentes. Aqui e aqui.
(3) Vide aqui

2 comentários:

  1. é insipiente mesmo? ou incipiente?
    As duas palavras estão corretas mas o sentido do texto muda completamente...

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