Translate

09 março 2013

Inadimplência dos bancos privados





 [...]
Quer se concorde ou não com a explicação da referida autoridade, o fato é que ela levanta um tema pouco discutido pelos analistas econômicos. O que explica o fato de a inadimplência dos bancos oficiais ser mais baixa do que a dos privados? É improvável que os bancos públicos sejam mais eficientes que os privados ao avaliar o risco de crédito. Uma segunda explicação - que preferimos desconsiderar - seria a existência de uma falha na mensuração da inadimplência dos bancos oficiais que refinanciariam, por alguma razão obscura, devedores incapacitados de honrar dívidas antigas reduzindo a medida de inadimplência.

Embora não acreditemos ser este fator relevante, há que se levar em conta que no passado esse expediente já foi utilizado. Entre 2000 e 2001 os financiamentos em atraso do Fundo Constitucional do Nordeste, administrado pelo Banco do Nordeste (BNB), saltaram de 0,52% para 31,29% dos recursos aplicados, para R$ 2,7 bilhões em valores nominais. Não porque tenha ocorrido uma súbita onda de inadimplência na região, mas porque o Banco Central obrigou o BNB a lançar as "operações em atraso, passíveis de negociação" como de fato em atraso. Até então elas eram refinanciadas e não contabilizadas como inadimplentes.

Uma terceira e mais provável explicação está no dilema enfrentado por uma empresa devedora, diante de uma dificuldade de caixa. Tendo que escolher entre honrar um empréstimo junto a um banco que lhe fornece crédito subsidiado, e outro que lhe cobra uma taxa de mercado, ela sabe que as portas para novos financiamentos se fecharão no primeiro banco, caso ele sofra sua inadimplência. A decisão empresarial mais sensata, então, é priorizar o serviço da dívida de menor custo, preservando essa fonte barata de recursos para futuros empréstimos, e atrasar o serviço da dívida mais cara que será objeto de renegociações e brigas judiciais futuras.

O comportamento das empresas com dificuldade de caixa descrito acima implica que, num ambiente econômico em que alguns bancos concedem empréstimos a taxas subsidiadas, o risco corrido pelos demais bancos é maior do que seria na ausência dos subsídios. Conhecendo os incentivos econômicos à inadimplência, a taxa dos financiamentos não subsidiados embutirá um prêmio de risco de modo a estimular a concessão de empréstimos. Parte dos financiamentos será objeto de renegociação, mas a maior taxa compensa as perdas. O equilíbrio de mercado é uma segmentação na qual os bancos com taxas subsidiadas terão menor inadimplência.

A ampliação da presença estatal na intermediação financeira brasileira, desencadeada a partir da crise dos subprime de 2008, além de não conseguir elevar o investimento e de ampliar o custo fiscal dos subsídios ao crédito, tem elevado o risco corrido pelos bancos privados. Estes, a fim de se protegerem, tendem a ser mais seletivos na concessão de financiamentos aos investimentos. Se o passado for um bom previsor do futuro, a retração do setor privado deverá estimular a ampliação estatal. Essa espiral, que poderá agradar setores mais nacionalistas e de esquerda, provavelmente não implicará em aumento do investimento da economia como um todo, mas simples realocação entre os dois setores.

Pedro Cavalcanti Ferreira e Renato Fragelli Cardoso são professores da Escola de Pós-graduação em Economia (EPGE-FGV)

Um comentário: