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11 novembro 2010

Panamericano e políticas de crédito

A surpreendente decisão do Banco Panamericano de recorrer a um bilionário aporte privado pode ser um sinal antecipado de que as políticas de estímulo para acelerar crescimento do crédito no país surtirão efeitos inesperados.

O banco informou na noite de terça-feira que receberia um empréstimo emergencial para corrigir "inconsistências contábeis" --gerando temores entre investidores sobre a saúde financeira de bancos concorrentes que também viram seus ativos e concessões de crédito incharem nos últimos anos.

O que está em jogo é a credibilidade do modelo baseado no amplo acesso a crédito "livre de riscos", segundo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros no governo.

Investidores podem "ficar preocupados" ... especialmente em relação a instituições financeiras de médio-porte até que haja maior clareza sobre se isso está limitado ao Panamericano, ou se outros bancos também estão sujeitos a investigação pelo BC", disse o analista do setor bancário da Barclays Capital, Roberto Attuch.

As ações de instituições financeiras de médio porte no país despencaram nesta quarta-feira com o temor de investidores com as práticas de contabilidade e administração corporativa no setor após o aporte do Banco Panamericano. Mas autoridades governamentais negam que os problemas do Panamericano sinalizem um risco sistêmico do setor.

O Grupo Silvio Santos, controlador do Panamericano, fez um empréstimo de 2,5 bilhões de reais junto ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC).

Os ativos e a carteira de crédito do Panamericano triplicaram desde 2006 --gerando desgaste nas taxas de solvência e lucratividade do banco.

Para Ann Milne, analista do Bank of AmericaMerrill Lynch, instituições financeiras como o Banco Panamericano podem ver um salto no custo de financiamentos. Esses bancos já levantaram um recorde de 3,5 bilhões de dólares em emissões de bônus globais --que são sua principal fonte de financiamento-- em 2010.

"Bancos menores dependem de financiamentos e, portanto, da confiança de investidores institucionais", disse o analista da JPMorgan Chase, Frederic de Mariz, em nota nesta quarta-feira.

Já o analista da BTG Pactual, Eduardo Nishio, afirma que os bancos podem enfrentar um "efeito de fuga (para ativos de maior) qualidade" --com os depósitos indo para concorrentes maiores como o Banco do Brasil .

"Mesmo se for apenas um caso isolado, a situação levanta perguntas sobre como sustentá-los", disse Milne.

INOVAÇÃO DO PRODUTO

O empréstimo com desconto na folha de pagamento, lançado pelo governo Lula em 2003, de fato mudou o relacionamento conflituoso entre consumidores e bancos, transformando-a em uma inovação financeira lucrativa.

Desde o lançamento desse produto de crédito, ambos os lados se beneficiaram: o consumidor viu as taxas de juros caírem pela metade e os bancos hoje enfrentam menos riscos.

O crescimento do crédito no Brasil foi explosivo desde então, chegando a 46 por cento do PIB em setembro ante 20 por cento em janeiro de 2003, quando Lula tomou posse.

Com o surgimento da crise do crédito que paralisou os mercados globais no final de 2008, o governo passou a agir de forma mais agressiva para evitar a estagnação do crédito no Brasil. Lula instruiu bancos públicos a comprar os portfólios de crédito de concorrentes menores e até adquirir bancos especializados em concessão de crédito para consumidores das classes média e baixa e instituições de médio-porte.

Alguns segmentos do setor de crédito ao consumidor cresceram mais de um terço desde o começo do ano passado, enquanto os empréstimos imobiliários dobraram no período.

A Caixa Econômica Federal comprou 49 por cento do capital votante do Panamericano em dezembro como parte dessas medidas. À época, ambos os bancos afirmaram que a entrada da Caixa ajudaria o Panamericano a impulsionar seu poder de empréstimo sem risco de prejudicar suas taxas de solvência e liquidez.

"A situação parecia sólida e continua parecendo sólida mas este novo fato provavelmente forçará (investidores) a ver as notícias boas com desconfiança", disse um administrador de Nova York que investiu em bônus de instituições financeiras brasileiras.

O analista da JPMorgan, Mariz, concorda. A visibilidade limitada e a escassez de informações sobre as circunstâncias que levaram ao resgate do Panamericano dificultam avaliar se outras instituições do setor também enfrentam "inconsistências contábeis" semelhantes, observou.


ANÁLISE-Aporte do Panamericano destaca boom de crédito no Brasil - Reuters Focus - Por Guillermo Parra-Bernal (Reportagem adicional de Elzio Barreto, Luciana Lopez e Silvio Cascione em São Paulo)

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